Três Conversas Com RUY CASTRO ARTHUR MUHLENBERG

Três Conversas Com RUY CASTRO ARTHUR MUHLENBERG

Torcedor do Liverpool, o vado pela contratação do tempo em que a vida se tor- desta equipe fizeram derre- filósofo Simon Critchley es- técnico Jorge Jesus, o time nou algo ainda mais ime- ter cada uma dessas máxi- creveu em 2017 que a imen- do Flamengo fecha o ano diato, a hiperexposição ao mas, e ainda pôs outras, sa importância que o fute- com uma tríplice coroa - o futebol europeu reduziu a muito queridas, em xeque: bol conquistou no mundo Estadual, com Abel Braga, maioria das ligas domésti- se craque o Flamengo faz se deve a duas razões. o Brasileirão e a Libertado- cas a algo próximo do fol- em casa, por que nenhum Como esporte, proporciona res. A campanha irresistí- clore. Mesmo no cenário in- dos titulares é cria da Gá- aos jogadores uma experi- vel magnetizou a Nação ru- terno, não bastava ter tradi- vea, ou do Ninho? Qual é o ência inigualável de asso- bro-negra, que bateu recor- ção; era preciso reafirmá-la. peso da camada mais popu- ciação. Como evento, gera des de público, promoveu Preso a algumas máxi- lar da torcida, se o clube, uma vívida sensação de co- cenas de amor maciço nos mas, o Flamengo acabou para fazer face à elite da munidade àqueles que se aeroportos e migrou para estagnado nesses 38 anos: a bola, elitiza cada vez mais reconhecem como fiéis a Lima a fim de testemunhar eterna busca por um her- seus ingressos? uma bandeira. Para quem um bicampeonato pelo qual deiro de Zico, a necessidade O GLOBO levou essas torce pelo Flamengo, nada esperou 38 anos. de ter profissionais “identi- perguntas a três pessoas disso é novidade. Mas será Entre o triunfo de 1981 e ficados com o clube”, o peso que, além de torcerem que a identidade rubro-ne- a epopeia de 2019, as quase transcendente da camisa, a como poucos, assumiram gra é a mesma? quatro décadas mudaram falsa certeza do mero “dei- com notável competência a Em 2019, as incríveis de- profundamente o futebol, o xou chegar”. Havia época tarefa de fazer a crônica do monstrações de força do Brasil e a vida cotidiana. em que a solução estava até Mais Querido do Brasil. O time e da torcida do clube Em 1981, ninguém telefona- em botar o time para trei- que você lerá nas próximas mais popular do Brasil fica- va de dentro de um estádio. nar, às vésperas de jogos páginas é o pensar verme- ram incrivelmente paten- Hoje, não só liga como pode grandes, na Gávea... lho e preto do século 21. tes. Reforçado no início do ver, na palma da mão, se A montagem e o sucesso Três conversas com ano, turbinado com quatro havia impedimento num RUY CASTRO jogadores em julho e aditi- lance qualquer. Ao mesmo ARTHUR MUHLENBERG ROBERTO ASSAF O escritor Ruy Castro, 71 River Plate evocou nele os de filhas, como eu. Mas, de cho, que não seriam Fla- Quando você sentiu cisou que o Flamengo fosse que você reinterpreta E como você, um ver- anos, é um dos principais momentos mais doentes de há muito para cá, estou mengo nem se jogassem lá que esse time era Fla- pobre para se identificar essa profecia do Nel- dadeiro escriba da ci- biógrafos do país. Conheci- sua vida de torcedor. mais sossegado. A última por 200 anos. Já Rafinha, mengo de verdade? com ele. Ao contrário, a son, à luz desse 2019? dade do Rio, vê essa do por obras como “Estrela Quando se encontrava vez em que estive num está- Rodrigo Caio, Pablo Marí, Logo depois da chegada prosperidade de outros clu- Acho “Flamengo sessen- coisa de a torcida esco- solitária”, “Chega de sauda- em viagens pelo exterior, dio foi na despedida de Pe- Éverton Ribeiro, Bruno do Jorge Jesus e da implan- bes brasileiros, comparada tão” o maior texto escrito lher o Palmeiras como de” e “Carmen”, esse cario- em Nova York ou Paris, ha- tkovic. Desde então, sou Henrique, Gabigol, todos tação de um tipo de jogo à nossa histórica pindaíba, sobre o Flamengo – fui eu rival preferencial na ca de Caratinga-MG é tam- bituou-se a recorrer ao es- membro da Fla-Sofá. Mas eles parecem ter nascido no que não se satisfaz com o sempre nos humilhou. Mas quem o repôs em circula- hora da zoação? Isso bém autor de “O vermelho e critório da finada Varig só olho para a tela quando a Flamengo. que já tem no placar. A du- agora o jogo virou, e eles ção, naquele livro de Nelson vai durar? o negro”, em que conta a para saber dos resultados bola está com o Flamengo. pla Gabigol e Bruno Henri- que corram atrás. que editei, “À sombra das Lamentei muito aquela história do Flamengo. dos jogos. Quando o Fla- Se você fosse comprar que me lembra a dupla Dida chuteiras imortais”, em atitude e quero crer que – Sou Flamengo desde mengo e Ruy estavam na Esse time campeão uma camisa hoje, ela te- e Henrique, que jogou de Você escreveu “O 1993. Por sinal, li-o em tenha sido um eco da ori- antes de nascer. Uma de mesma cidade, porém, vira- da Libertadores é prati- ria o nome de quem? 1957 a 1961. Até a chegada Anjo Pornográfico” e “tempo real”, quando saiu gem paulista do Gabigol. De minhas estreias foi a parti- va um verdadeiro hooligan. camente um time for- Ao comprar a primeira do Zico, eles eram os maio- fez a curadoria das no número 1 da revista que me interessa o Palmei- da final do tricampeonato – Naquele jogo elimina- mado em 2019. Alguns camisa, por volta de 1958, res artilheiros da história grandes crônicas do “Manchete Esportiva”, em ras ou o Botucatu? O Fla- carioca de 1953-54-55, Fla- tório com o Grêmio no Pa- jogadores são muito re- pedi à minha mãe que cos- do Flamengo, com mais de Nelson Rodrigues. Na 1955. Foi nele também que mengo precisa é que o Vas- mengo 4x1 América, que caembu, pela Libertadores centes para a gente fa- turasse o 10. Era a camisa 300 gols cada, e jogaram crônica “Flamengo Ses- Nelson falou na camisa que co, o Fluminense e o Bota- escutei pelo rádio, com Jor- de 1984, eu e meu colega lar em identificação ru- do Dida – os números ti- juntos no mesmo ataque. sentão”, Nelson escre- jogava sozinha. Acho óti- fogo sejam fortes. Foi a ge Curi. Ainda tenho as Marcos Augusto Gonçalves bro-negra? nham de ser comprados à veu que um dia bastaria mo, é uma imagem bem grandeza deles que nos aju- meias do Flamengo com chegamos atrasados ao es- Neste momento, não im- parte e, claro, não se usava Como esse Flamengo a camisa rubro-negra Nelson, mas prefiro que dou a construir a nossa. que jogava pelada quando tádio. Já não havia ingres- porta muito se esses joga- o nome impresso. Depois, rico, comprador e de “pendurada na baliza, haja um craque dentro dela. era criança – diz Ruy, como sos, e os portões estavam dores se identificam com o foi a do Zico, já com o nú- certa forma elitizado como uma Bastilha se precisasse de mais cre- fechados. Então não con- Flamengo. O Flamengo – mero, mas ainda sem o vai dialogar com o pas- inexpugnável”. Durante denciais além da sala reple- versamos, pulamos o muro. leia-se a torcida – já se nome. Hoje eu compraria a sado e a identidade do muitos anos acreditou-- ta de memorabília rubro- Não era um comportamen- identificou com eles. Eles do Bruno Henrique, que clube do povão? se nesse peso da cami- -negra em seu apartamento to dos mais sóbrios para são diferentes de Edmundo, deve ter um número esqui- Não tem o menor proble- sa, e muitas vezes não de Leblon. A vitória sobre o um homem de 36 anos e pai Alex ou Ronaldinho Gaú- sito, como 39 ou 74. ma. O torcedor nunca pre- foi suficiente. Como é Aos 55 anos, o publicitá- Rubro-Negra da América”, bem no Brasileiro. A partir res que vieram de fora nos história do Flamengo. Juri- da história. O Aerofla Se você comprasse time, que, por sua vez, só rio Arthur Muhlenberg é ele já mandou para a gráfi- daí, o livro se tornou uma anos anteriores. Em 2019, o dicamente nós não sabe- virou moda. Mesmo as- hoje uma camisa desse deu resultado com ele. um dos principais cronistas ca “Heptacular”, sobre o tí- certeza, e já comecei a fazer time está repleto de jogado- mos como está, porque o sim, nas redes sociais, time, seria de qual jo- Aquilo é um psicopata do rubro-negros da internet. tulo brasileiro. Quem é Fla- os contatos. Só tinha o re- res caros, mas o que viabili- clube mantém sigilo e tam- a gente vê o rubro-ne- gador? trabalho. Aquela coisa dele, Ex-titular do “Urublog”, no mengo e navega pela inter- ceio do quanto aquilo pode- zou tudo isso foi a venda de bém precisa se resguardar. gro mais comedido, De Arrascaeta. Sem dúvi- de se esgoelar com o time GloboEsporte.com, escreve net já deve ter esbarrado – ria atrapalhar o meu torcer, Lucas Paquetá e Vinicius Jr. Todo mundo sabe que essas menos oba-oba, com das. Primeiro pelo jogador mesmo com um placar con- atualmente no República- e gargalhado – com algum mas deu tudo certo. Foram eles que permitiram famílias precisam de uma medo do que pode que ele é, que faz o passe fortável, é algo que rompeu PazeAmor.com.br. Este ex- texto de Muhlenberg, na vi- que o Flamengo investisse indenização, que o clube acontecer.

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