Clarissa Rocha De Melo Da Universidade À Casa De Rezas Guarani E Vice- Versa: Reflexões Sobre a Presença Indígena No Ensino

Clarissa Rocha De Melo Da Universidade À Casa De Rezas Guarani E Vice- Versa: Reflexões Sobre a Presença Indígena No Ensino

CLARISSA ROCHA DE MELO DA UNIVERSIDADE À CASA DE REZAS GUARANI E VICE- VERSA: REFLEXÕES SOBRE A PRESENÇA INDÍGENA NO ENSINO SUPERIOR A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DOS GUARANI NA LICENCIATURA INTERCULTURAL INDÍGENA DO SUL DA MATA ATLÂNTICA/UFSC FLORIANÓPOLIS, 2014 CLARISSA ROCHA DE MELO DA UNIVERSIDADE À CASA DE REZAS GUARANI E VICE- VERSA: REFLEXÕES SOBRE A PRESENÇA INDÍGENA NO ENSINO SUPERIOR A PARTIR DA EXPERIÊNCIA DOS GUARANI NA LICENCIATURA INTERCULTURAL INDÍGENA DO SUL DA MATA ATLÂNTICA/UFSC Tese a ser apresentada ao programa de Pós- Graduação em Antropologia Social da Universidade Federal de Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do grau de doutora em Antropologia. Orientadora: PROF. Dr.ª ANTONELLA IMPERATRIZ TASSINARI. FLORIANÓPOLIS, 2014 Ficha de identificação da obra elaborada pelo autor, através do Programa de Geração Automática da Biblioteca Universitária da UFSC. Melo, Clarissa Rocha de Da Universidade à casa de rezas guarani e vice-versa : Reflexões sobre a presença indígena no Ensino Superior a partir da experiência Guarani na Licenciatura Intercultural Indígena do Sul da Mata Atlântica/UFSC / Clarissa Rocha de Melo ; orientador, Antonella Imperatriz Tassinari - Florianópolis, SC, 2014. 405 p. Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social. Inclui referências 1. Antropologia Social. 2. Ensino Superior Indígena. 3. Licenciaturas Interculturais Indígenas. 4. Modos de Conhecer. 5. Guarani. I. Tassinari, Antonella Imperatriz. II. Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós- Graduação em Antropologia Social. III. Título. Nós índios, conhecemos o silêncio. Não temos medo dele. Na verdade, para nós ele é mais poderoso do que as palavras. Nossos ancestrais foram educados nas maneiras do silêncio e eles nos transmitiram esse conhecimento. "Observa, escuta, e logo atua", nos diziam. Esta é a maneira correta de viver. Observa os animais para ver como cuidam se seus filhotes. Observa os anciões para ver como se comportam. Observa o homem branco para ver o que querem. Sempre observa primeiro, com o coração e a mente quietos, e então aprenderás. Fotografia: Clarissa Melo, 2013. Quanto tiveres observado o suficiente, então poderás atuar. Com vocês, brancos, é o contrário. Vocês aprendem falando. Dão prêmios às crianças que falam mais na escola. Em suas festas, todos tratam de falar. No trabalho estão sempre tendo reuniões nas quais todos interrompem a todos, e todos falam cinco, dez, cem vezes. E chamam isso de "resolver um problema". Quando estão numa habitação e há silêncio, ficam nervosos. Precisam preencher o espaço com sons. Então, falam compulsivamente, mesmo antes de saber o que vão dizer. Vocês gostam de discutir. Nem sequer permitem que o outro termine uma frase. Sempre interrompem. Para nós isso é muito desrespeitoso e muito estúpido, inclusive. Se começas a falar, eu não vou te interromper. Te escutarei. Talvez deixe de escutá-lo se não gostar do que estás dizendo. Mas não vou interromper-te. Quando terminares, tomarei minha decisão sobre o que disseste, mas não te direi se não estou de acordo, a menos que seja importante. Do contrário, simplesmente ficarei calado e me afastarei. Terás dito o que preciso saber. Não há mais nada a dizer. Mas isso não é suficiente para a maioria de vocês. Deveríamos pensar nas suas palavras como se fossem sementes. Deveriam plantá-las, e permiti-las crescer em silêncio. Nossos ancestrais nos ensinaram que a terra está sempre nos falando, e que devemos ficar em silêncio para escutá-la. Existem muitas vozes além das nossas. Muitas vozes. Só vamos escutá-las em silêncio. "Neither Wolf nor Dog. On Forgotten Roads with an Indian Elder" – Kent Nerbur. AGRADECIMENTOS Agradeço ao povo guarani, que é um povo da terra, originário de yvy mbyte, do Paraguai, da Argentina, do Brasil, da Bolívia, do Uruguai, países que fazem parte do amplo território Guarani. Agradeço pelo aprendizado no silêncio, pela espiritualidade, pela coragem e persistência na busca de viver bem nessa terra. Agradeço às famílias Guarani que me oportunizaram momentos singulares de aprendizado, carinho, paciência que permitiram a criação de laços de amizade, principalmente nas aldeias de Mbiguaçu e Morro dos Cavalos. Gratidão pela confiança! Agradeço à família da Capoeira, pois por mais que eu não estivesse presente com frequência, a capoeira sempre esteve presente dentro de mim: Mestre Plínio, meu professor – Contra Mestre Teo, e toda família Angoleiro Sim Sinhô. Agradeço a toda família Abayomi de Dança Afro, por me oportunizar fazer uma das coisas que mais gosto além da Antropologia: dançar!! Em especial, minha professora de dança, Simone Fortes. Aos amigos de uma vida que de algum modo tornaram-se minha família: Paula e Zeca, minha gratidão; à Zé Verzola pela alegria; à minha querida amiga, viajante do mundo: Hanna Limulja; à Cinthia Creatini, minha amiga e colega de doutorado, pelas conversas, pela parceria nas alegrias e angústias da escrita de uma tese; à minha vizinha Ana Carolina Cernicchiaro, pelas conversas antropológicas, pelos textos e pela amizade; à Gabriella de Souza, pelas conversas e amizade; à Viviane Vasconcelos pelos aprendizados compartilhados e pela ajuda no layout final das genealogias. Ao Bruno Andrade pelo mapa das aldeias indígenas; ao Christian Cage pelo design das tabelas. Agradeço os aprendizados junto às colegas de doutorado que compuseram a turma das sete mulheres: Rose, Cinthia, Raquel, Fernanda, Dani, Tati; e as demais amizades construídas ao longo dos encontros antropológicos: Isabel de Rose, Nádia Heusi, Suzana Cavalheiro. Meus colegas e amigos de Mestrado em Antropologia Social – que moram no meu coração. Agradeço aos professores do PPGAS/UFSC que acompanharam minha trajetória, que de algum modo me apoiaram, e outros que foram fontes de inspiração. Aos colegas e professores do NEPI – Núcleo de Estudos de Povos Indígenas, pelo diálogo e troca de conhecimentos: em especial à coordenadora Edviges Ioris e Antonella Tassinari. Agradeço a minha orientadora Antonella Tassinari pela dedicação, pelos aprendizados, pelo apoio e amizade ao logo de quase uma década. À Maria Dorothea Post Darella, pelos ensinamentos durante todos esses anos. Agradeço pelas oportunidades que me proporcionou e pelo incentivo para que eu trabalhasse com os Guarani. Aos professores, colegas e amigos que me inspiram a trabalhar com os Guarani: Maria Dorothea Post Darella, Aldo Litaiff, Deise Lucy, Flávia Mello, Adriana Testa, Diogo Oliveira, Viviane Vasconcelos. Agradeço à banca de doutoramento, pela disposição da leitura e participação na finalização de uma etapa importante da minha vida: Antônio Carlos de Souza Lima, Deise Lucy Montardo, Gersem Luciano Baniwa, Rafael Devos, Edviges Ioris, Aldo Litaiff e José Kelly. Agradeço em especial à equipe de coordenação da Licenciatura Intercultural Indígena do sul da Mata Atlântica – Valmir Muraro, Ana Lúcia, Lucas Bueno, Clóvis Brighenti, Dorothea Post Darella, Murilo Mariano, Ariana; aos docentes e acadêmicos indígenas Guarani, Xokleng Laklãnõ e Kaingang, que fazem desse curso, por me permitir fazer parte dessa história e construir esse trabalho. Grata pela confiança. Agradeço as famílias que hoje fazem parte da minha vida, especialmente àqueles que me colocaram no mundo – meus pais Elizeth e Hermano, pelo amor incondicional; meus avós – Plínio, Maria, Paulo Honório (in memoriam) e Naninha; Agradeço meu irmão Hermano, a Yuri, e meus sobrinhos Yasmin e Hugo que me fazem querer ser uma pessoa melhor. Meus sogros: Eleny e Edson – quem agradeço também ao pelos gráficos, pois sem suas aulas de excell tudo seria mais difícil! Por fim, gratidão Carlos Eduardo Castellano Mostaço por permanecer ao meu lado durante esses cinco longos anos de trabalho – mas de muitas alegrias compartilhadas pela vida e nas aldeias Guarani – com amor, paciência e companheirismo. Ao IBP – Instituto Brasil Plural, pelo financiamento de parte da pesquisa, e a CAPES, pela concessão de bolsa de estudos. Aguydjevete! RESUMO Esta tese trata do encontro entre as políticas públicas voltadas ao ensino superior indígena e a experiência dos acadêmicos – e mais especificamente, os estudantes guarani – na Licenciatura Intercultural Indígena do sul da Mata Atlântica e seus modos de conhecer. Tendo em vista a necessidade de sistematizar dados sobre o ensino superior indígena, esta tese pretende contribuir com um panorama, articulando discussões e reflexões que percorrem toda a América Latina. Nesse sentido, compreender as experiências indígenas, e, mais especificamente, dos grupos Guarani nesse contexto, contribui para reflexões gerais sobre esse processo ainda recente que envolve a presença indígena no ensino superior. O objetivo dessa tese é demonstrar que o Ensino Superior, assim como o Xamanismo – e toda sua complexidade constitutiva –, é um lócus de interesse desses acadêmicos indígenas. Realizam um esforço vislumbrando a possibilidade de trânsito entre mundos: o ―mundo Guarani‖ e todas as especificidades culturais e conhecimentos que o compõem; e o não indígena – buscando os conhecimentos dos brancos que lhes são apresentados na educação escolar e ensino superior. Nesse sentido, a casa de rezas – a opy – e a universidade, são locais centrais de aprendizagem e aquisição de saberes, e esses acadêmicos realizam um movimento de circularidade entre esses espaços, estabelecendo um diálogo entre conhecimentos e modos de conhecer. Destaca-se a importância atribuída por alguns acadêmicos guarani, ao

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