Cultivo De Vieiras Em Santa Catarina: Tecnologias Utilizadas E Influência De Fatores Ambientais

Cultivo De Vieiras Em Santa Catarina: Tecnologias Utilizadas E Influência De Fatores Ambientais

INFORMAtiVo TÉCNICO Cultivo de vieiras em Santa Catarina: tecnologias utilizadas e influência de fatores ambientais Guilherme Sabino Rupp¹ resumo – Neste trabalho é apresentada uma síntese das atividades de cultivo da vieiraNodipecten nodosus em Santa Catarina, das tecnologias utilizadas e dos resultados de estudos sobre a influência dos fatores ambientais nas vieiras cultivadas. O cultivo é realizado em lanternas japonesas suspensas em sistema tipo long-line de superfície, no qual as vieiras atingem o tamanho comercial de 7 a 8cm em cerca de um ano, e são comercializadas ao preço de aproximadamente R$ 50,00 dúzia-1. Com base em resultados de pesquisas, são discutidos os principais fatores limitantes para a ampliação da produção de vieiras no Estado, tais como pouca disponibilidade de áreas com condições ambientais adequadas ao cultivo e são sugeridas propostas para superá-los. termos para indexação: moluscos bivalves; Nodipecten nodosus; maricultura Scallop culture in Santa catarina: technologies used and influence of environmental factors Abstract – This paper presents a summary of the aquaculture activities with the scallopNodipecten nodosus in Santa Catarina, the technologies used, and results of studies on the influence of environmental factors on cultivated scallops. The cultivation is carried out in Japanese-type lantern-nets suspended in surface long-lines, in which the scallops reach the commercial size of 7 to 8cm in about a year, and are sold at a price of approximately R$ 50,00 dozen-1. Based on research results, the main constraints for expanding the production of scallops in the State, such as the availability of areas with adequate environmental conditions are discussed and suggestions are made to overcome them. index terms: bivalve molluscs; Nodipecten nodosus; mariculture introdução demais países, tais como, Rússia, Chile, sas do litoral de Santa Catarina, e optou- Coréia, Canadá, Noruega, Brasil, entre se por iniciar estudos com esta espécie. As vieiras são moluscos bivalves da outros, que dividem o restante 0,65% Outra vieira de importância comercial família Pectinidae com ocorrência em da produção. descrita para Santa Catarina, porém de todos os mares e oceanos e que apre- menor tamanho e ocorrência em maior sentam grande importância ecológica e o cultivo de vieiras em San- profundidade, é Euvola (=Pecten) ziczac econômica, sendo alvo de importantes (RIOS, 2009). Nas décadas de 70 e 80, atividades de pesca e aquicultura em ta catarina esta espécie foi alvo da indústria pes- muitos países. No Brasil, estão descritas queira ao largo do litoral de Santa Cata- 15 espécies nativas (RIOS, 2009), sendo As pesquisas visando ao desenvol- rina, Paraná e São Paulo, porém, devido a maioria de pequeno tamanho (meno- vimento do cultivo de vieiras no Brasil à excessiva explotação, seus estoques res que 7cm) à exceção de Nodipecten tiveram início em Florianópolis, nos foram dizimados de maneira irrecupe- nodosus e Euvola (=Pecten) ziczac. primeiros anos da década de 90 (RUPP, rável (PEZZUTO & BORZONE, 2004). O cultivo de vieiras em escala co- 1992; 1994; MANZONI, 1994). A etapa fundamental para o esta- mercial teve início no Japão na década Motivados pelo entusiasmo gerado belecimento de qualquer atividade de de 1960 com a espécie Mizuhopecten pelo então recente estabelecimento do aquicultura é a obtenção de formas (=Patinopecten) yessoensis em Mutsu cultivo comercial de ostras e mexilhões jovens (sementes) em quantidades su- Bay, Prefeitura de Aomori. Nas décadas em Santa Catarina, bem como pelo su- ficientes e de qualidade adequada para de 1980 e 1990, as técnicas de cultivo cesso do cultivo de vieiras em outros suprir a demanda dos produtores. No desenvolvidas foram disseminadas para países, buscou-se identificar uma es- caso do cultivo de moluscos, esta etapa outros países (SHUMWAY & PARSONS, pécie nativa de vieira que apresentasse pode ser realizada através da captação 2006). potencial para aquicultura. Poucas infor- natural, com uso de coletores de se- A produção mundial de vieiras por mações existiam sobre o tema, além de mentes, que são colocados no mar na meio de aquicultura, em 2017, foi de trabalhos de taxonomia e paleontologia época de reprodução da espécie, ou por 2.185.243 toneladas (FAO, 2019), sendo (RIOS, 1985; SMITH, 1991). Identificou- produção em condições de laboratório. a China o maior produtor mundial, com se Nodipecten nodosus como a maior Iniciou-se, então, um estudo sobre 92,6% dessa produção. Em seguida vem vieira do litoral brasileiro (até 18cm), o ciclo reprodutivo e a viabilidade de o Japão com 6,2%, o Peru com 0,55%, e com ocorrência descrita para águas ra- captação de sementes de N. nodosus no Recebido em 30/10/2019. Aceito para publicação em 18/03/2020. ¹ Biólogo, Ph.D., Epagri/Centro de Desenvolvimento em Aquicultura e Pesca, Rod. Admar Gonzaga 188, Florianópolis, SC, 88010-970, e-mail: rupp@epagri. sc.gov.br Este periódico está licenciado conforme Creative Agropecuária catarinense, florianópolis, v.33, n.3, 14-17, set./dez. 2020 14 Commons Atribuição 4.0 Internacional. ambiente natural, cujos resultados não outros, a questões administrativas e vezes maior do que aquelas mantidas foram promissores para propósitos de gerenciais, tais como falta de estrutura em laboratório. A taxa de recuperação aquicultura (MANZONI et al., 1996). A para comercialização. de sementes mantidas no mar por até 8 baixa captação de sementes, associada semanas situa-se entre 40 e 60%. Nes- às caraterísticas reprodutivas e popula- tecnologia de cultivo sa fase, a limpeza da malha externa dos cionais dessa espécie, indicaram que a coletores é muito importante, pois estas captação natural não seria viável para A tecnologia de cultivo de N. nodo- facilmente colmatam devido ao acúmu- abastecer os cultivos, concluindo-se sus em Santa Catarina envolve diversas lo de sedimentos, impedindo o fluxo de que a produção em laboratório seria a etapas que incluem maturação de re- água e, consequentemente, de oxigênio única maneira de viabilizar o aproveita- produtores, larvicultura, assentamento e alimento para as sementes em seu in- mento de N. nodosus para aquicultura. e berçário primário, realizadas em labo- terior. Deve-se também evitar excessiva Estudos foram realizados para o ratório, seguidas das etapas de berçário agitação dos coletores para evitar o des- desenvolvimento de tecnologia de secundário, cultivo intermediário e cul- tacamento das sementes e consequen- produção de sementes de N. nodosus tivo final ou engorda, realizadas no mar te perda ou mortalidade. no Laboratório de Cultivo de Moluscos (RUPP & PARSONS, 2016). Neste infor- Após um período de aproximada- (LMM/UFSC) (RUPP & POLI, 1994; BEM mativo técnico serão abordados alguns mente 6 a 8 semanas no mar, dependo et al., 2001; RUPP et al., 2004a; RUPP et aspectos das etapas de cultivo berçário, das condições do local e da estação do al., 2005; ZANETTE, 2007). Assim que intermediário e final, que são conside- ano, as sementes atingem um tamanho superados os principais entraves para a radas críticas para o sucesso da produ- médio entre 5 e 15mm, quando podem produção de sementes em quantidades ção de vieiras. ser destacadas dos coletores. As semen- suficientes para abastecer produtores, tes devem, então, ser selecionadas por tomou-se a iniciativa, em 2006, de fo- cultivo Berçário tamanho e as menores devem ser trans- mentar a atividade em escala piloto e feridas para lanternas berçário (malha comercial em Santa Catarina. Ao final da larvicultura, as larvas de de 2 a 4mm), ou caixas flutuantes (ma- Através de iniciativa conjunta entre N. nodosus são transferidas para o sis- lha de 2mm), onde apresentam maior Epagri e UFSC, foram feitos seminários tema de assentamento, ainda em labo- crescimento (RUPP et al., 2009a). Já as sobre cultivo de vieiras para extensio- ratório, onde são colocadas em contato sementes com cerca de 10 a 15mm po- nistas e produtores de ostras e mexi- com coletores, constituídos por telas de dem ser transferidas para lanternas de lhões, e iniciou-se o fornecimento de monofilamento (Netlon®) para a fixação cultivo intermediário (malha de 6mm). sementes de N. nodosus para cultivo. A larval. Decorridas aproximadamente 2 a partir de então teve início a produção 3 semanas nesse sistema, quando atin- cultivo intermediário e comercial de vieiras em pequena escala gem um tamanho médio de cerca de 0,5 no Estado, a qual vem se mantendo até - 1mm, os coletores podem ser trans- engorda os dias atuais, porém com pouca evolu- feridos para o mar, onde é realizada a ção nos volumes de produção, que tem segunda etapa do berçário (RUPP et al., Em Santa Catarina as vieiras são cul- variado entre 5 e 37 toneladas nos úl- 2005). Para o transporte, as bolsas cole- tivadas em sistema suspenso-flutuante, timos anos (EPAGRI, 2018). Alguns dos toras são colocadas em sacos plásticos sendo utilizadas as mesmas estruturas produtores de ostras e/ou mexilhões com água marinha filtrada, que por sua onde são cultivadas ostras, ou seja, cultivam vieiras como um produto alter- vez são acondicionados em caixas de iso- long-lines e lanternas japonesas. nativo e de maior valor agregado, não por e levados ao local de cultivo. O cres- Após a etapa de cultivo intermediá- sendo conhecidos atualmente produ- cimento e a sobrevivência das sementes rio (cerca de 3 a 4 meses), quando atin- tores exclusivos de vieiras. Enquanto o dependem das condições ambientais gem um tamanho médio aproximado de preço médio das ostras comercializadas do local para onde são transportadas 30-35mm, as vieiras passam para a eta- pelos produtores em 2017 foi de apro- (IWERSEN et al., 2007). A taxa de cres- pa de engorda ou cultivo final, quando ximadamente R$ 7,70 dúzia-1, as vieiras cimento das sementes em coletores co- podem ser usadas lanternas com aber- atingiram o preço médio de R$ 47,50 locados no mar da região de Porto Belo, tura de malha de 15, 20 e 25mm, suces- dúzia-1 (EPAGRI, 2018).

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