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Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação O CINEMA DE ENTRETENIMENTO JUVENIL1 Uma investigação sobre Bete Balanço Zuleika de Paula Bueno2 Resumo: A investigação sobre o cinema juvenil permite explorar um conjunto de práticas de entretenimento que originam narrativas e produtos diversos articulados por processos integrados de produção, consumo e fruição. Nesta comunicação, a discussão de tais práticas e produtos se dará por meio da análise do filme Bete Balanço (1984), dirigido por Lael Rodrigues e das estratégias de produção, promoção e divulgação que envolveram a sua realização e seu lançamento no mercado de entretenimento brasileiro em meados da década de 80, além das suas características estilísticas e narrativas, diretamente associadas a tais estratégias. Palavras-Chave: Cinema juvenil. Gênero cinematográfico. Práticas sociais. O “gênero” juvenil Os jovens espectadores de High School Musical 3obviamente não se lembram. É possível quem nem mesmo imaginem a legião de protagonistas adolescentes que antecederam Troy (Zac Efron) e Gabriella (Vanessa Hudgens) nos mais variados - e curiosamente semelhantes – filmes de entretenimento juvenil. Jovens talentosos, empenhados em verem suas canções e coreografias serem publicamente reconhecidas é um dos argumentos centrais explorados há décadas pela produção dos teenpictures: vertente da produção cinematográfica norte-americana voltada para os espectadores adolescentes (DOHERTY, 2002). Os filmes juvenis combinam formas e conteúdos já largamente experimentados pelas indústrias de entretenimento, transitam entre os mais variados formatos - de musicais a filmes de horror - e associam aos filmes qualquer situação emergente, oportuna ou bizarra relacionada a temas e protagonistas adolescentes. Tais características, que poderiam 1 Trabalho apresentado ao Grupo de Trabalho Mídia e Entretenimento, do XVII Encontro da Compós, na UNIP, São Paulo, SP, em junho de 2008. 2 Universidade Estadual de Maringá. [email protected] 3 Dir. Kenny Ortega. EUA, 2006. 1 Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação classificar os filmes juvenis como um gênero específico de produção, são igualmente os complicadores de sua definição genérica. O filme de entretenimento juvenil se constrói principalmente a partir de apropriações de componentes de outros gêneros. Afinal, cantar e dançar – como fazem os protagonistas de High School Musical - são componentes muito mais característicos dos musicais do que propriamente de filmes juvenis. Na busca por componentes delineadores do “gênero”, alguém poderia argumentar que um filme juvenil é aquele cuja ação se desenrola num colégio. Contudo, um número considerável de filmes para adolescentes privilegiam as praias, as férias e toda sorte de lugares freqüentados durante o tempo livre. Sexo, drogas e rock´n´roll também são elementos muitas vezes considerados óbvios nessas produções, contudo, uma reunião não muito numerosa de películas bastaria para comprovar que esses são componentes de um universo restrito do cinema de entretenimento juvenil. Até mesmo o principal argumento capaz de aglutinar esta produção numa categoria comum, ou seja, a sua orientação para uma faixa etária específica, é considerado de limites e horizontes imprecisos (TURNER, 1997). Se a busca de um formato capaz de definir o “filme juvenil” pouco oferece para uma discussão sobre o cinema de entretenimento, o deslocamento da concepção de formas para a idéia de práticas na discussão dos gêneros cinematográficos pode se revelar uma orientação metodológica interessante. Sendo uma construção social fundamentalmente moderna, as práticas de entretenimento juvenil não se restringem a países isolados mas avançam num sentido global de integração, revelando-se, assim, extremamente dinâmicas e heterogêneas. Por outro lado, a juvenilização da produção cinematográfica potencializa a integração e a intercambialidade do cinema com outros meios, fortalecendo os processos de convergência entre diversas práticas de entretenimento, estabelecendo uma forte padronização dos produtos culturais destinados ao consumo juvenil. Observando o caso brasileiro, é nítida a contemporaneidade a tendência à juvenilização de um cinema de entretenimento com a cinematografia hegemônica. Do modelo de comédia musical consolidado pela Atlântida na década de 50 e produzido por outras empresas da época, como a Herbert Richers e a Cinedistri, surgiu o embrião de um possível filme juvenil brasileiro, posteriormente desenvolvido na produção cinematográfica da Jovem Guarda durante os anos 60 e consolidado pelas práticas cinematográficas da década de 80 – momento em que surge o nosso objeto de investigação, o filme Bete Balanço. 2 Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação É objetivo desta comunicação mostrar como a investigação sobre o cinema juvenil permite explorar um conjunto de práticas de entretenimento que originam narrativas e produtos diversos, articulados por processos integrados de produção, consumo e fruição.Essa investigação, acredita-se, permite avançar na compreensão de processos de uniformização, identificação e diferenciação do entretenimento brasileiro em relação às suas práticas e formas mundializadas e hegemônicas. Práticas de produção: a organização de um cinema juvenil brasileiro Em meados da década de 1980, o Centro de Produção e Comunicação (CPC) - produtora formada por Lael Rodrigues, Tizuka Yamasaki e Carlos Alberto Diniz - trabalhava num roteiro que pudesse ser resumido num argumento claro, fácil e conciso, capaz de desenvolver um alto potencial mercadológico orientado para o público adolescente.4 A idéia inicial: garota do interior do país abandona sua cidade natal para ser chacrete 5 no Rio de Janeiro. O roteiro, mesclando drama e erotismo, foi desenvolvido por Rodrigues e posteriormente apresentado a Yoya Wursch, uma jovem roteirista que havia se aproximado do CPC a partir de um concurso de roteiros promovido pela empresa. Momentos Cachorros, argumento escrito por Wursch e vencedor do concurso, nunca chegou a ser realizado, contudo, coube à sua vencedora a tarefa de transformar a futura chacrete descrita por Lael Rodrigues em uma garota apaixonada por rock, que fumava maconha e vivia sua sexualidade sem tabus. O trabalho conjunto dos dois profissionais resultou na personagem que deu nome ao filme, Bete Balanço, interpretada nas telas pela atriz Deborah Bloch. Realizado em poucas semanas e com um orçamento de US$ 60 mil dólares, Bete Balanço obteve considerável retorno nas bilheterias, atingindo diretamente adolescentes e jovens, público alvo da fita. Nem mesmo as interdições da Censura e o atraso na data de seu lançamento – previsto para o mês de julho a fim de atingir os estudantes em férias – inibiram a atração do público para as salas de exibição. Lançado em agosto de 1984 no Rio de Janeiro, 4 Os três sócios fundaram o Centro de Produção e Comunicação no final dos anos 70 para viabilizar a realização do primeiro longa metragem de Tizuka Yamasaki, Gaijin (1979); o segundo projeto da produtora foi Parayba Mulher Macho (1982), igualmente dirigido por Yamasaki. O terceiro trabalho do CPC foi destinado à estréia de Lael Rodrigues no cinema ficcional de longa metragem, o que se deu com a realização de Bete Balanço (1984). 5 Nome dado às dançarinas do programa televisivo Discoteca do Chacrinha, bastante popular na época. 3 Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação Bete Balanço permaneceu em cartaz por cinco semanas no estado carioca antes de ingressar em circuito nacional. Conforme os relatos da época, na estréia do filme a avenida Nossa Senhora de Copacabana ficou tomada pelos jovens que formavam uma fila imensa em frente aos cinemas Os realizadores de Bete atribuíam tal sucesso ao fato de oferecerem ao público juvenil “o produto que eles estavam querendo”: um filme capaz de despertar empatia e familiaridade com o público jovem por meio de uma temática contemporânea, alta qualidade técnica e linguagem visual moderna. Conforme declarava Diniz, o “padrão de qualidade” de Bete Balanço era decorrente da maturação do trabalho diário conduzido no CPC por ele, Yamasaki e Rodrigues, além do fotógrafo Edgar Moura e da diretora de arte Yurika Yamasaki, as principais pessoas responsáveis pela “atualização da linguagem do cinema brasileiro” promovida pelo filme. Realizado “dentro de uma linha de produção independente e (...) um conceito novo de trabalho” Bete Balanço, apresentava uma coerência entre suas formas audiovisuais modernizadas e suas práticas produtivas “de última geração” (Material de divulgação, p. 14) O CPC era uma pequena empresa que visava a racionalidade e a integração de seus diversos aspectos técnicos, artísticos e comerciais, tipo de organização que foi chamada pelos seus sócios-produtores de “independente”. As práticas de produção defendidas por Diniz, Rodrigues e Yamasaki orientavam-se por uma lógica gerencial - apesar das condições quase artesanais de realização e defendiam o investimento privado na elaboração de produtos de entretenimento para consumo num grande mercado. Tal organização, defendiam, garantiria uma produção veloz e flexível, menos vulnerável às crises econômicas que atingiam o cinema patrocinado pelo Estado – leia-se, Embrafilme.6 6 Empresa de economia mista, tendo a União como principal acionista, a Embrafilme foi inicialmente criada como um apêndice do Instituto Nacional de Cinema, o INC, e deveria desempenhar o papel de distribuidora de filmes brasileiros no exterior, função esta que logo se mostrou

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