Ariano Suassuna, O Palhaço-Professor E Sua Pedra Do Reino

Ariano Suassuna, O Palhaço-Professor E Sua Pedra Do Reino

Ariano Suassuna, o palhaço-professor e sua Pedra do Reino por Anna Paula Soares Lemos Departamento de Ciência da Literatura Rio de Janeiro/ UFRJ 2007 Ariano Suassuna, o palhaço-professor e sua Pedra do Reino. por Anna Paula Soares Lemos Departamento de Ciência da Literatura Dissertação de Mestrado em Literatura Comparada apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciência da Literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Mestre em Ciência da Literatura Orientador: Professor Doutor André Luiz de Lima Bueno Rio de Janeiro/ UFRJ 2007 2 LEMOS, Anna Paula Soares. Ariano Suassuna, o palhaço-professor e sua Pedra do Reino . Rio de Janeiro, UFRJ, Faculdade de Letras, 2006.132 fl. mimeo. Dissertação de Mestrado em Literatura Comparada. BANCA EXAMINADORA ______________________________________________ Professor Doutor André Luiz de Lima Bueno Orientador ______________________________________________ Professor Doutor Frederico Augusto Liberalli de Góes UFRJ – Depto. de Ciência da Literatura ______________________________________________ Professor Doutor Latuf Isaias Mucci UFF – Instituto de Artes e Comunicação Social SUPLENTES: ______________________________________________ Professor Doutor Luiz Edmundo Bouças Coutinho UFRJ – Depto. de Ciência da Literatura ______________________________________________ Professor Doutor Nonato Gurgel UFRJ – Depto. de Literatura Brasileira Defendida a Dissertação: Conceito: Em 15 de março de 2007. 3 Este trabalho é dedicado ao meu avô José Maria Franco Soares. Um sertanejo, “antes de tudo um forte”. Ele inventava e recontava histórias que sempre começavam com “Diz que era uma vez...”. Um mentiroso lírico! 4 Agradecimentos: A todos os que fizeram parte desta caminhada, o meu muito obrigado, o meu sonho, o meu riso, a minha festa! Ao meu orientador André Bueno, por toda a paciência, pela amizade, pela confiança e pelas inúmeras sessões de terapia. Ao Coordenador do Depto. de Ciência da Literatura da UFRJ, Alberto Pucheu, por reger a banda com toda a maestria e sempre acreditar na celebração da “festa do pensamento”. Aos meus pais, José Alberto e Henriqueta Lemos, porque sem eles o meu espetáculo da vida jamais teria começado. Ao amigo Nerval Mendes Gonçalves, que fez a revisão deste trabalho e que nunca me abandona mesmo com todos os meus sumiços. Todo carinho àqueles que colaboraram de forma direta e rica com a minha pesquisa. São eles: Antonio Luiz Mendes, Antonio Sanseverino, Bete Rabetti, Cristina Câmara, Fred Góes, Eleonora Ziller, Grupo de Pesquisa CNPq Formação do Brasil Moderno: literatura, cultura e sociedade, Guga Monteiro, Iziane Mascarenhas, José Almino de Alencar, Júlio Dalóes, Luis Alberto Nogueira Alves, Nonato Gurgel e Vera Lins. E a todos os que, mesmo não citados, sabem que passaram pelo picadeiro e que fizeram parte deste espetáculo. A vocês o meu agradecimento pelo trágico e pelo cômico que formam o circo da vida. Aplausos, muitos aplausos antes que as cortinas se fechem e o sonho acabe! 5 “[...] Escrever é estar no extremo De si mesmo, e quem está Assim se exercendo nessa Nudez, a mais nua que há, Tem pudor de que outros vejam O que deve haver de esgar, De tiques, de gestos falhos, De pouco espetacular Na torta visão de uma alma No pleno estertor de criar [...]” João Cabral de Melo Neto 6 “[...] o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas estão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida me ensinou.” Guimarães Rosa 7 “O homem, dizem, é um animal racional. Não sei por que não se disse que é um animal afetivo ou sentimental. Talvez, o que o diferencie dos outros animais seja muito mais o sentimento do que a razão. Vi mais vezes um gato raciocinar do que rir ou chorar. Talvez chore ou ria por dentro, mas por dentro talvez também o caranguejo resolva equações de segundo grau.” Miguel de Unamuno 8 Resumo: A presente dissertação de Mestrado trata do Romance da Pedra do Reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta do escritor paraibano Ariano Suassuna. O fio condutor é o narrador Dom Pedro Dinis Ferreira Quaderna, que, do centro de uma narrativa meio palco, meio picadeiro, na posição de um palhaço-poeta , lida com as diversas tensões de pensamento que seu discurso provoca. Em última análise, a pesquisa aponta como, no romance, o autor Ariano Suassuna faz a mediação entre a cultura popular e a erudita, o arcaico e o moderno, o rural e o urbano, a cultura oral e a letrada, o Brasil Real e o Brasil Oficial . Abstract: The present Master´s thesis intends to discuss the Romance da Pedra do Reino e o príncipe do sangue do vai-e-volta by Ariano Suassuna, author from Paraíba, which is a state in the northeast of Brazil. The focus is on the narrator Dom Pedro Dinis Ferreira Quaderna who tells his story from the center of a half-stage narrative - half circus ring, enacting as a clown - poet, deals with the many thought provoking tensions which his speech instigates. Hereafter, the research indicates how, in the romance, the author Ariano Suassuna, makes the mediation between popular culture and the highbrow, the ancient and the current, the rural and the urban, the oral culture and the lettered, the real Brazil and the official Brazil. 9 SUMÁRIO: O professor , REI e PROFETA... 1. Pequeno cantar acadêmico a modo de introdução 12 1.1 O professor em tensões armoriais 15 1.2 O palhaço-professor ... 17 1.3 ...da cultura popular 22 1.4 O “emparedado” e a “antena parabólica” 25 1.5 O intelectual mediador gramsciano 28 2. Regionalismo e cosmopolitismo: da utopia ideológica à modernidade capitalista 34 2.1 José de Alencar e Ariano Suassuna: o encontro de românticos 36 2.2 A “catequese às avessas” 43 2.3 Da Oralidade Popular à Oralidade “Transfigurada” 45 O POETA, O palhaço. .. 3. Ariano Suassuna e suas dualidades 50 3.1 O popular e o erudito Quaderna 54 3.2 A morte Caetana e a religiosidade popular 57 3.3 O narrador e romancista-homenagem 62 3.4. O castelo poético – um aspecto da transfiguração 66 3.5. O Brasil Real versus o Brasil Oficial : Quaderna, Corregedor, Dona Margarida 69 4 A Pedra do Reino no debate cultural do país 77 4.1 D. Pedro Dinis Ferreira-Quaderna: letrado, trovador, cangaceiro, palhaço 82 5 O memorialista Quaderna: Rei do Quinto Naipe do Baralho 88 5.1 O romanceiro popular do Nordeste 92 5.2 A literatura de cordel: um parêntesis histórico 93 5.3 O jogo da onça 96 6. Tia Filipa, o cantador João Melchíades e a velha Maria Galdina, a Louca 102 7. A Diana do Pastoril. 105 8. O palhaço , mestre de pista... 110 9. ...e o espetáculo não pode parar 119 10. Referências Bibliográficas 127 10 O Professor, Rei e Profeta... “[...] quem disser que escreve, pinta, esculpe ou canta para recreação própria, se der ao público o que faz, mente; mente se assinar seu escrito, sua pintura, sua estátua ou sua canção. Quer, quando menos, deixar uma sombra de seu espírito, algo que sobreviva a ele.” Miguel de Unamuno 11 1. Pequeno cantar acadêmico a modo de introdução “Os palhaços estão presentes em todos os circos. No entanto, suas funções e inserções alteram-se de acordo com o tipo de espetáculo.” 1 Os circos médios e pequenos colocam o palhaço no centro da trama e, de acordo com o enredo, o palhaço adapta-se à personagem. Eram esses pequenos circos que, na década de 1930, passavam pela também pequena cidade de Taperoá, no sertão da Paraíba, onde o escritor paraibano Ariano Suassuna passou a infância e começou a construir todo o imaginário dual – popular-erudito – que retrata e transfigura em sua obra. O mundo é um circo e o mundo de meu teatro procura se aproximar dele: um mundo de sol e de poeira, como o que conheci em minha infância, com atores representando gente comum e, às vezes, representando atores, com cangaceiros, santos, poderosos, assassinos, ladrões, prostitutas, juízes, avarentos, luxuriosos, medíocres – enfim, um mundo de que não estejam ausentes nem mesmo os seres de vida mais humilde, as pastagens, o gado, as pedras, todo este conjunto de que o sertão, como qualquer terra do mundo, está povoado. (SUASSUNA, 2000. In O PERCEVEJO, p. 110 e 111) Ao se referir à sua produção literária, Suassuna diz “o meu teatro”. Define-se ator e circense frustrado. “Eu tenho voz baixa, feia e rouca [...] é por isso que eu escrevo para teatro, para botar os outros para falar por mim.”2 E escreveu mesmo a maioria de seus textos para teatro: em 1947, o então estudante de direito escreve o primeiro deles, Uma mulher vestida de sol , e daí por diante são mais 16 peças escritas.3 Mas não só por isso ele se resume teatral. A estrutura de seu romanceiro não foge à regra. Seus romances transbordam em teatro circense, que engloba inclusive o mundo do teatro grego e da commedia dell’arte , que por sua vez influenciam o Romanceiro popular do Nordeste (literatura de cordel), fio condutor de toda a obra do autor. 1 BOLOGNESI, Mário Fernando. Palhaços . In: O PERCEVEJO. Número 8, 2000. p. 65 a 73. 2 In SUASSUNA, Ariano. Aula Magna à Universidade Federal da Paraíba. 1994. p.20. 3 O desertor de princesa (1948), Os homens de barro (1949), Auto de João da Cruz (1950), Torturas de um coração ou em boca fechada não entra mosquito (1951), O arco desolado (1952), O castigo da soberba (1953), O rico avarento (1954), Auto da Compadecida (1955), O casamento suspeitoso e O santo e a porca (1957), O homem da vaca e o poder da fortuna (1958), A pena e a lei (1959), Farsa da boa preguiça (1960), A caseira e a Catarina (1962), além dos espetáculos de dança A demanda do Graal dançado e Pernambuco do barroco ao armorial (1998).

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