Em defesa da causa indígena Ano XXXVIII • N0 392 Brasília-DF • Janeiro/Fevereiro 2017 Dalmo Dallari: portaria do ministério da Justiça que altera demarcações é injusta e ilegal Páginas 4 e 5 Resistência Tapeba Há mais de três décadas na luta pela demarcação, os Tapeba, do Ceará, mostram resiliência e firmeza frente aos embates e às ameaças Páginas 8 e 9 Terror no Teles Pires: MPF pede indenização a vítimas da Operação Eldorado, que matou Adenilson Krixi Munduruku em 2012 Páginas 10 a 12 Povo Tapeba - Foto: Renato Santana/Cimi - Foto: Renato Tapeba Povo 2 Jan/Fev 2017 O ano mal começou Porantinadas CPI na gastança Egon Heck, Secretariado Nacional do Cimi da Funai na salvaguarda dos direitos dos povos indígenas. Denunciaram uma série de violências de que foram vítimas nos Os deputados e deputadas ruralistas da linha promete. Temer é temerário. Até prova em contrário, últimos anos. Colocaram-se à disposição da luta pelos direitos de frente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e do Incra 2 gastaram mais do Editorial o Estado brasileiro continuará se movimentando no dos povos indígenas no país, exigindo o cumprimento da Cons- que a Fundação dispendeu com demarcações E sentido de suprimir direitos e conquistas indígenas e tituição e, principalmente, da demarcação das terras indígenas. de terras indígenas em 2016. Os dados oficiais de outros segmentos sociais, como os povos e comunidades Se, nos últimos anos, a presença de delegações indígenas comprovam: R$ 3 milhões liquidados pela Funai tradicionais. Já ficou manifesta a intenção do governo e do em Brasília foi intensa, é possível se vislumbrar não apenas contra R$ 3,5 milhões recebidos pelos “nobres” presidente da República de limpar do caminho os possíveis a continuidade dessa prática, mas até uma presença quase deputados em cotas parlamentares no mesmo obstáculos, como os povos indígenas, para a implementação permanente e continuada nos espaços do poder. Além disso, período. Somente um deputado ruralista, Alceu de grandes projetos. A nomeação do trigésimo quinto pre- é possível prever a continuidade e ampliação dos mecanismos Moreira (PMDB/RS) custou R$ 476.373,00 aos sidente da Funai vem nessa direção. A mineração em terras de pressão, como as retomadas dos territórios tradicionais e cofres públicos. Quase meio milhão de reais foram gastos pelo presidente da arquivada e da atual CPI indígenas será outro flanco de luta. A Proposta de Emenda autodemarcação das terras, bem como as denúncias e pedidos da Funai e Incra 2 com manutenção de escritório, Constitucional (PEC) 215 e o Projeto de Lei (PL) 1610 conti- de socorro em nível nacional e internacional. viagens aéreas, veículos, alimentação, divulgação nuarão sendo o “cavalo de Troia” que segue tentando avançar Lideranças de alguns acampamentos Kaiowá Guarani da atividade parlamentar, telefonia e contratação em outros espaços, como a tentativa de implementar o “marco denunciam que as comunidades estão passando fome, pois de um escritório de advocacia. temporal” e a segunda edição da Comissão Parlamentar de dependem de doações e de cestas básicas, que se encontram Inquérito (CPI) da Funai e do Incra. atrasadas. É lamentável o estado de dependência e vulne- Sem retribuição No jogo de xadrez dos interesses anti-indígenas, colocaram rabilidade em que se encontram, principalmente pela não Em dezembro os Kaingang da Aldeia Condá um general na frente. Não como presidente do órgão indigenista, demarcação de suas terras. fizeram um ritual para homenagear os jogadores mas numa área estratégica para avançar na direção do saque Além disso, estão anunciadas reintegrações de posse de da Chapecoense mortos em acidente de avião na dos recursos naturais nas terras indígenas, principalmente a pequenas áreas retomadas, no entorno da terra indígena de Colômbia. O símbolo do time é o índio Condá, madeira e os minérios. O general Franklimberg foi nomeado Dourados. Áreas essas que, conforme a Funai e Ministério antigo cacique Kaingang do município. Mas como diretor de Promoção ao Desenvolvimento Sustentável Público, são parte desse território indígena e foram tomadas ninguém prestou atenção ao símbolo, para que da Fundação Nacional do Índio (Funai). Ou seja, coerente com dos índios com o decorrer do tempo. não se esqueçam da própria origem. Assim como o pensamento de que o índio não pode ser um ônus para a Os Kaiowá Guarani estão submetidos a um processo de não deram importância a uma vida da aldeia Condá perdida por causa da falta de atenção nação e muito menos obstáculo ao avanço do progresso do genocídio e violência, denunciado nas últimas décadas em de um motorista de ônibus O menino Kaingang país. Será uma reedição do general Demócrito na direção do vários organismos nacionais e internacionais, como a Organi- Naman da Rosa, de nove anos, foi atropelado em “Departamento Geral de Patrimônio Indígena”, o famigerado zação das Nações Unidas (ONU), a Organização dos Estados fevereiro, em Chapecó. Seus parentes apontaram DGPI da década de 1970. Americanos (OEA) e o Parlamento Europeu. Além disso, um a indiferença total em relação à vida perdida. Pior Se, por um lado, vemos com apreensão a retomada das relatório foi entregue ao Papa Francisco e várias delegações que a indiferença foi o comentário no facebook, iniciativas anti-indígenas do Estado, particularmente no que nacionais e internacionais de direitos humanos estiveram em postado após um vídeo que mostrava o momento tange aos intentos de retirada de direitos indígenas garantidos Mato Grosso do Sul. em que o pai e a mãe encontraram o corpo da pela Constituição, por outro, é visível e manifesta a disposição Apesar de tudo, estão com grande disposição de fazer criança ensanguentada e morta no asfalto: “Um do movimento indígena e seus aliados de lutar para que nenhum avançar os processos de reconhecimento e demarcação de bugre esmoleiro a menos”. Esse foi o “afago” de um morador local à família em choque com a perda do direito seja suprimido. A Articulação dos Povos Indígenas do suas terras. Contam com o apoio e solidariedade de todas filho. Os Kaingang denunciaram as manifestações Brasil (Apib) já manifestou sua preocupação com as primeiras as pessoas de boa vontade, lutadores pela justiça e pela paz. racistas ao Ministério Público Federal, que deve manobras do governo e da bancada ruralista nesse início de A não aprovação da PEC 215 e o inconcluso relatório da tomar providências. ano, através da sorrateira manobra para militarizar a Funai e CPI da Funai e Incra 2 deixaram um gosto amargo na boca do quebrar a resistência dos povos indígenas. agronegócio e setores anti-indígenas. Tudo indica, buscarão Lembrança suprema Nos primeiros dias deste ano já se fez presente, em Brasília, revanche nesse início de um novo ano. Os povos indígenas “O direito de posse das terras indígenas bra- uma delegação dos povos indígenas do Rio Grande do Norte, e seus aliados estão atentos e mobilizados para eventuais sileiras é anterior ao direito de propriedade de que, até pouco tempo, era considerado um estado sem popu- cenários adversos. Mas a primeira cutucada no agronegócio e qualquer latifundiário do agronegócio”. Com essas lação indígena. Vieram dizer que não apenas existem, mas que suas políticas destrutivas veio donde menos se esperava – da palavras, o indigenista Egydio Schwade, um dos somarão forças com os demais povos indígenas do país para a escola de Samba Imperatriz Leopoldinense. Parabéns e boa fundadores do Cimi, tentou avivar a memória de garantia dos direitos, exigindo o fortalecimento e ação efetiva sorte aos bravos sambistas. Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal. “Semelhantemente, as terras reivindicadas pelos quilombolas devem ser respeitadas por uma questão de justiça, já que se tratam de popula- ções trazidas para o país à força pelos governos dos latifundiários”, escreveu em carta destinada ao supremo juiz. Relembrando o caminho dos dois, cruzados muitas vezes, escreveu: “Cheguei ao seu município, Diamantino/MT, em 1963...” E vai descrevendo a transformação do menino que começou seus estudos em Diamantino em um ginásio criado para os pobres e excluídos. E aviva a memória do ministro que mudou o discurso até se transformar num dos maiores defensores do agronegócio, contra as demarcações e medidas que favoreçam os excluídos da nossa sociedade. Crente na humanidade, Egydio torce para que embaixo da pomposa toga ainda tenha resquícios da criança de Diamantino. Publicação do Conselho Indigenista EDIÇÃO ASSESSORIA de COMUNICAÇÃO Faça sua assinatura: APOIADORES Missionário (Cimi), organismo Tiago Miotto – RP: 16668/RS Renato Santana e Tiago Miotto [email protected] vinculado à Conferência Nacional dos Railda Herrero [email protected] ADMINISTRAÇÃO: Bispos do Brasil (CNBB). Marline Dassoler Buzatto Setor de Diversões Sul (SDS) Ed. Venâncio III, Salas 309 a 314 ISSN 0102-0625 www.cimi.org.br CONSELHO de REDAÇÃO Dom Roque Paloschi SELEÇÃO de FOTOS: CEP: 70.393-902 – Brasília-DF Antônio C. Queiroz, Benedito Presidente Aida Cruz u 55 61 2106-1650 Na língua da nação indígena Prezia, Egon D. Heck, Nello Sateré-Mawé, PORANTIM Emília Altini Ruffaldi, Paulo Guimarães, EDITORAÇÃO ELETRÔNICA: Licurgo S. Botelho 61 99962-3924 significa remo, arma, Vice-Presidente Paulo Suess, Marcy Picanço, É permitida a reprodução das memória. Cleber César Buzatto Saulo Feitosa, Roberto Liebgot, IMPRESSÃO: matérias e artigos, desde que citada Gráfica e Editora Qualyta 61 3012-9700 Secretário Executivo Elizabeth Amarante Rondon e a fonte. As matérias assinadas são de Lúcia Helena Rangel responsabilidade
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