A Geração De Energia Elétrica – Represas E Usinas - E Redes Técnicas De Energia E Abastecimento De Água Dela Decorrentes No Rio De Janeiro – 1940 a 1960

A Geração De Energia Elétrica – Represas E Usinas - E Redes Técnicas De Energia E Abastecimento De Água Dela Decorrentes No Rio De Janeiro – 1940 a 1960

V Simposio Internacional de la Historia de la Electrificación La electricidad y la transformación de la vida urbana y social Évora, 6-11 de mayo de 2019 A GERAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA – REPRESAS E USINAS - E REDES TÉCNICAS DE ENERGIA E ABASTECIMENTO DE ÁGUA DELA DECORRENTES NO RIO DE JANEIRO – 1940 A 1960 Floriano José Godinho de Oliveira Universidade do Estado do Rio de Janeiro - Projeto CAPES PrInt [email protected] O objetivo deste artigo é tratar da associação entre o processo de produção de energia elétrica e o de desenvolvimento urbano na cidade do Rio de Janeiro, com ênfase no período compreendido pelas décadas de 1940 e 1950, quando a Light and Power – empresa canadense instalada no Brasil em 1899, na cidade de São Paulo, e que chega também ao Rio de Janeiro a partir de 1904 – além da produção e distribuição de energia, passa também a atuar na dinamização dos serviços públicos, por meio da associação de seu sistema de geração de energia com o de abastecimento de água na cidade. A referida companhia, ao se instalar no Rio de Janeiro, recebeu concessão para a realização de geração, transmissão e distribuição de energia – geração que foi intensamente potencializada pela aquisição da concessão para a construção da Represa de Ribeirão da Lages, no planalto da Serra do Mar, no sul do estado, distante 76 km do centro da cidade. Pouco a pouco, foi também conquistando o monopólio de serviços de transportes urbanos sobre trilhos (bondes) e ônibus eletrificados, o de distribuição de gás fabricado a partir do carvão e o de serviços de telégrafos. Nessa primeira fase, “ficaram de fora de seu escopo apenas os serviços de água e de saneamento básico”1. Evidencia-se nesta primeira fase de atuação da companhia de energia, a contribuição na modernização de alguns dos principais sistemas que compõem as redes técnicas em ambiente urbano, como as de energia, transportes sobre trilho, gás e telégrafos, que, juntamente com as de distribuição de água e saneament 2 , formam as bases para a urbanização e o desenvolvimento urbano. Para Horácio Capel 3 várias são as redes técnicas necessárias à 1 Leite, 2008. 2 Redes identificadas por Capel como estruturantes do espaço urbano que formam as bases para a organização social (Capel, 2011). 3 Capel, 2011. La electricidad y la transformación de la vida urbana y social, 2019, p. 175-192 A geração de energia elétrica -represas e usinas- e redes técnicas de energia... 176 formação do espaço urbano, de forma a consolidar as condições básicas de deslocamento, por meio dos sistemas de transportes, saneamento e comunicação. Neste mesmo sentido, acrescentamos, também dos serviços e equipamentos públicos que devem ser providos ou concedidos pelo poder público para viabilização das bases produtivas, econômicas e sociais. O desenvolvimento dessas redes, no início do século XX, é um indício importante de que o Brasil incorpora as bases para a estruturação de sua inclusão nos marcos do capitalismo monopolista industrial e da evolução da urbanização, que marcou os primeiros anos daquele século em todo o mundo. Para vários autores, estávamos diante do que poderia ser considerada uma segunda revolução industrial, que foi apresentada como uma revolução técnico-científica4, produzindo mudanças significativas nas formas de se organizar a produção industrial e o comércio em geral e, consequentemente, influindo no território, que cada vez mais firmava-se como espaço produtivo, o espaço urbano. A incorporação das ciências, como a química, a física e a biologia, como fator de aprimoramento e desenvolvimento de novos produtos e aperfeiçoamento das forças produtivas, não só cria novas possibilidades no campo produtivo, como altera as bases para o desenvolvimento econômico e social. A incorporação do petróleo como matriz energética e como insumo na indústria petroquímica e a disseminação do uso da eletricidade foram dois aspectos fundamentais desse período, que levou a avanços significativos no campo das engenharias e produziu um espetacular movimento de espraiamento urbano. A energia elétrica foi fator decisivo nos países da economia periférica nesse período, pois permitiu uma primeira aproximação com essas novas tecnologias e induziu o crescimento econômico já ancorado nessa matriz. Não é por outro motivo que, no Brasil, as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro conheceram um grande impulso em seu desenvolvimento a partir da chegada da Light, que passou a produzir energia elétrica em grande escala por meio das hidrelétricas construídas naquele início de século. Até os primeiros anos da década de 1900, as experiências de uso da energia elétrica no Rio de Janeiro eram esparsas e de pequena capacidade. Data de 1879 a inauguração da iluminação elétrica da estação ferroviária D. Pedro II, e de 1881 a iluminação da Praça da República, com apenas 16 lâmpadas5. A partir desse período, algumas poucas companhias de eletricidades geravam e forneciam pequenas quantidades de energia elétrica, por meio de usinas termoelétricas, alimentadas a carvão. Com a chegada da Lighr and Power no Rio, em 1904, a produção e distribuição de energia deram um significativo salto, em função da produção de energia em usina hidrelétrica. Com efeito, a expansão e a consolidação do tecido urbano no Rio de Janeiro tiveram forte influência das redes técnicas instaladas pela Light, com destaque para a modernização e eletrificação dos bondes que circulavam na cidade. O desenvolvimento urbano decorrente das ações da companhia foi tratado por mim em outro artigo6, no qual destaco a influência que a Light and Power exerceu, por meio da eletrificação do sistema de transportes coletivos de bondes, na urbanização da cidade do Rio de Janeiro na primeira metade do século XX, 4 Radovan Richta, 1972; Theotônio dos Santos, 1983 e 1987; Milton Santos, 1996; Roberto Santos, 2018. 5 Müller, 2008, p.535. 6 Oliveira, 2013. Trabalho apresentado no Simpósio Internacional Globalización, innovación y construcción de redes técnicas urbanas em América y Europa – 1900-1930, realizado em Barcelona, em janeiro de 2012, e posteriormente publicado em coletânea organizada por Horacio Capel e Vicent Casals. La electricidad y la transformación de la vida urbana y social, 2019, p. 175-192 A geração de energia elétrica -represas e usinas- e redes técnicas de energia... 177 envolvendo a formação de novos bairros em decorrência da expansão imobiliária e a mobilidade para áreas que foram incorporadas ao tecido urbano da cidade. Com essa expansão do tecido urbano, agudizou-se o problema de abastecimento de água e de saneamento. Em face da inexistência de redes estruturadas na maior parte da cidade, intensificou-se o processo de periferização e suburbanização das novas áreas que iam sendo integradas. Mananciais locais e poços, simples e artesianos, eram as formas encontradas para o abastecimento de água, mas as águas servidas não eram tratadas. Nas áreas centrais da cidade, o abastecimento era feito a partir do reservatório do Pedregulho, inaugurado em 1877, próximo ao Centro, com águas captadas no Contraforte da Serra do Mar. Coube ao Presidente Vargas, no decorrer dos anos 1930, definir estratégia de controle das águas e da geração de energia para atender aos novos propósitos do projeto de desenvolvimento, dando consequência ao projeto de industrialização que intensificou a urbanização no Brasil e em particular na cidade do Rio de Janeiro e sua hinterlândia. Não por outro motivo foi instituído o Código de Águas, pelo Decreto nº 24.643, em 10 de julho de 1934, que foi o instrumento inicial para tentar regular e estabelecer parâmetros para a utilização das águas, sendo um de seus objetivos anunciado já nos preâmbulos: “a energia hidráulica exige medidas que facilitem e garantam seu aproveitamento racional” 7 . A regulamentação do uso das águas para fins de geração de energia ocupou todo o Livro III do Decreto, intitulado Forças hidráulicas - Regulamentação da indústria hidroelétrica, do artigo 139 ao 200, de um total de 208 artigos. Importante ressaltar a perspectiva político-estratégica desse decreto, pois ele delineia o controle do poder público sobre as quedas d’água e fontes hídricas, bem como estabelece controle sobre as tarifas das concessionárias. Nesse código havia também uma determinação de que as concessionárias existentes deveriam solicitar uma revisão dos contratos de concessão, e enquanto isso não ocorresse ficava impedida qualquer ampliação dos reservatórios. Contudo, essa restrição foi suspensa em 1940, pelo Decreto-lei nº 2.059 8 , que permitiu que a Light promovesse o aumento da capacidade de armazenamento e, por determinação do Estado, contribuísse com o abastecimento de água na cidade do Rio de Janeiro. A rigor, a suspensão da medida deveu-se ao aumento exponencial da demanda de energia para o setor industrial, que, em São Paulo, aumentou a partir de 1933. No Rio de Janeiro, três empreendimentos alarmavam o Estado sobre a capacidade de abastecimento por parte da concessionária: a eletrificação das ferrovias da capital; a construção da histórica estatal brasileira Fábrica Nacional de Motores (FNM, popularmente conhecida como FêNêMê), inaugurada em 1942, no município de Duque da Caxias, para fabricar motores para aviões, caminhões e automóveis, em parceria com a Alfa Romeo Italiana; e, sobretudo, o maior empreendimento industrial brasileiro na década de 1940, a Companhia Siderúrgica Nacional – CSN. Diante desse eminente crescimento da demanda, a Light iniciou a expansão da represa de Ribeirão das Lajes, aumentando em mais 28 metros a barreira de contenção, ampliando em 250% a capacidade de armazenamento de água9. Assim, consideramos que se inicia uma segunda fase de intervenção da Companhia nas redes técnicas do processo de urbanização do Rio de Janeiro, que é a de ampliação de seu sistema para atender às novas demandas de energia e, ao mesmo tempo, sua associação ao sistema de 7 Brasil, 1934. 8 Duncan L. McDowall, 1988, p. 434. 9 McDowall, D., 1988, p. 442. La electricidad y la transformación de la vida urbana y social, 2019, p.

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