“Cidades Carcerárias”: Migração e Presídios em Regiões de São Paulo* Flávia Rodrigues Prates Cescon. Rosana Baeninger Palavras-chave: Dinâmica Migratória; Nova Alta Paulista; Unidades Prisionais Resumo Este trabalho visa discutir a dinâmica demográfica, e em particular a migratória, e seus desdobramentos sociais acerca do recente e específico fluxo populacional para uma região, até então, de tradicional emigração no Estado de São Paulo. A especificidade desse fluxo é delineada pela instalação de Unidades Prisionais no Oeste do estado. Busca-se, desta forma, destacar os aspectos gerais do fenômeno migratório que marcam uma nova dinâmica ligada à instalação de unidades prisionais espacialmente concentradas entre os municípios da Nova Alta Paulista. * Trabalho apresentado no XVII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Caxambu - MG – Brasil, de 20 a 24 de setembro de 2010. Bacharel em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Demografia IFCH/NEPO/UNICAMP. Professora do Departamento de Demografia IFCH e Pesquisadora NEPO/UNICAMP. 1 “Cidades Carcerárias”: Migração e Presídios em Regiões de São Paulo* Flávia Rodrigues Prates Cescon. Rosana Baeninger Introdução Este trabalho é parte de um estudo mais amplo, denominado “Observatório das Migrações em São Paulo: fases e faces do fenômeno migratório”, em desenvolvimento no Núcleo de Estudos de População da Universidade Estadual de Campinas, de 2009-2013, e cujo eixo teórico está pautado nos novos arranjos migratórios no Estado, marcados pela redefinição dos espaços da migração, tanto na metrópole como no interior do Estado (BAENINGER, 1999). O presente artigo, por sua vez, tem por objetivo apontar aspectos da dinâmica demográfica, e em particular, a migratória, e seus desdobramentos sociais acerca do recente e específico fluxo populacional para uma região, até então, de tradicional emigração no Estado de São Paulo. A especificidade desse fluxo é delineada pela instalação de Unidades Prisionais no Oeste do estado. De fato, essa região, e mais especificamente, a sub-região da Nova Alta Paulista, foi bastante afetada pela política pública do governo do Estado de descentralização prisional (GÓES; MAKINO, 2002). De 1997 a 2005 houve a construção de nove presídios e uma unidade da FEBEM (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor), alojando mais de dez mil “novos moradores” em um raio de aproximadamente noventa quilômetros nessa região (GIL, 2007). Em consonância com o estudo de maior envergadura, que busca apreender e analisar as novas faces da migração no Estado de São Paulo, centralizando suas reflexões nos diferentes fluxos e modalidades migratórias, este artigo apresenta as primeiras identificações e análises dos deslocamentos populacionais atuais relacionados ao estabelecimento de unidades prisionais nos pequenos municípios que compõem a sub-região da Nova Alta Paulista. Procura-se, também, identificar aspectos econômicos, políticos e sociais ligados à concentração de presídios em associação com a composição de fenômenos demográficos: imigração de detentos das mais diversas regiões do Estado de São Paulo, fluxo permanente de visitantes, fluxo de trabalhadores dos presídios, e todos esses elementos em dinâmica com os municípios e suas respectivas populações locais. * Trabalho apresentado no XVII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Caxambu - MG – Brasil, de 20 a 24 de setembro de 2010. Bacharel em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Demografia IFCH/NEPO/UNICAMP. Professora do Departamento de Demografia IFCH e Pesquisadora NEPO/UNICAMP. 2 1. Localização regional das unidades prisionais O processo de interiorização das migrações em São Paulo teve seu início nos anos 70 (Baeninger, 1992), onde a desconcentração industrial (Cano, 1977) teve papel delineador dos contornos dessas migrações. O crescimento urbano e econômico do interior paulista, a partir de então, incentivou políticas de caráter regional, por parte do Governo Estadual, como é o caso dos incentivos à instalação de unidades prisionais nos anos 2000. O caso do Oeste Paulista, em particular, da Nova Alta Paulista (Mapa 1) indica os novos elementos da dinâmica local estreitamente vinculada à instalação de presídios. Considerando, portanto, essa região de acordo com a Associação dos Municípios da Nova Alta Paulista (AMNAP), essa área é formada por trinta municípios; desse total, vinte e dois municípios pertencem a 10ª Região Administrativa, com sede em Presidente Prudente: Adamantina, Dracena, Flora Rica, Flórida Paulista, Inúbia Paulista, Irapuru, Junqueirópolis, Lucélia, Mariápolis, Monte Castelo, Nova Guataporanga, Osvaldo Cruz, Ouro Verde, Pacaembu, Panorama, Pracinha, Paulicéia, Sagre, Salmourão, Santa Mercedes, São João do Pau D’Alho e Tupi Paulista. Oito municípios, no entanto, integram a 11ª Região Administrativa, com sede em Marília: Arco-Íris, Bastos, Herculândia, Iacri, Parapuã, Queiroz, Rinópolis e Tupã. O município mais populoso é Tupã, com 67.151 habitantes e o menor é Pracinha com 2.744 habitantes (FUNDAÇÃO IBGE apud FUNDAÇÃO SEADE, 2010). Mapa 1 Localização da Região da Nova Alta Paulista Estado de São Paulo Fonte: Simielli (2005) apud Gil (2007). De acordo com Gil (2004), essa porção do território paulista é uma região pouco dinâmica e reflete as condições sociais, econômicas e políticas que atestam a sua origem mercantil e pouco comprometida com a socialização de infra-estruturas e oportunidades. Os municípios, a maioria com menos de 20 mil habitantes debatem-se por melhores oportunidades e incentivos governamentais. A formação econômica e social da Nova Alta Paulista está intimamente relacionada à expansão da cafeicultura para o Oeste do Estado de São Paulo e dos trilhos da Companhia Paulista de Estrada de Ferro, entre os finais das décadas de 1920 e de 1950 (CANO, 1988). 3 Algumas cidades que surgiram em decorrência da expansão do empreendimento ferroviário transformaram-se em sede de pólos regionais, atraindo, ao longo do tempo, investimentos em infra-estruturas como hospitais, campus universitário, educação, entretenimento, segurança e outros serviços em geral. Outras, no entanto, como é o caso de muitas das cidades da Nova Alta Paulista, ficaram, de certa forma, aquém do processo de determinação de uma vocação econômica consistente (Gil, 2004). Os municípios da Nova Alta Paulista são de pequeno porte e construíram uma economia assentada na agricultura, com baixa oferta de empregos e a estagnação das economias locais. No contexto estadual recente, essa região compreende, aproximadamente, 0,9% da população, 1,5% do total da arrecadação tributária e 0,83% da soma do PIB Municipal em relação ao PIB paulista; a economia regional está fundamentalmente assentada na policultura e pecuária leiteira praticadas, em sua maioria, em pequenas e médias propriedades rurais; nas grandes propriedades rurais, em substituição à cultura cafeeira, predominam as pastagens e as lavouras de cana-de-açúcar (GIL, 2004). Trata-se de uma região afastada do eixo econômico mais dinâmico do Estado de São Paulo, mas que tem revertido sua posição migratória de área expulsora de população; os indicadores divulgados por órgãos oficiais (IBGE, Fundação SEADE, Secretarias Estaduais, Prefeituras Municipais) demonstram resultados que a situam entre as melhores posições do país em índices de escolaridade, mortalidade infantil e longevidade; porém distantes em termos de PIB municipal, renda per capita, taxas de desemprego e taxas de crescimento demográfico em relação ao próprio Estado de São Paulo. Considerando a região da Nova Alta Paulista no Oeste Paulista, e as recentes instalações das unidades prisionais, nota-se um evidente corredor prisional (Mapa 2) entre nove municípios ao longo da SP-294 (Rodovia Comandante João Ribeiro de Barros), principal rodovia que cruza essa região. Em 1997, com a intenção de sanar o déficit do sistema prisional do país em meio à crise da segurança pública e do colapso do aparelho penitenciário, o Governo Federal anunciou a liberação de verbas destinadas à construção de novas penitenciárias. O Estado de São Paulo, portador da maior população carcerária do país, apresentava naquele momento uma grande carência de estabelecimentos penais; havia 35.847 presos para 24.222 vagas, o que representava, portanto, um déficit de 11.652 vagas (CENSO PENITENCIÁRIO, 1997 apud GÓES; MAKINO, 2002). Foi neste cenário que o Governo do Estado de São Paulo lançou o projeto de reestruturação prisional que objetivava prioritariamente a desativação da Casa de Detenção de São Paulo e o fim das superlotações dos Distritos Policiais (DPs) paulistanos (GÓES; MAKINO, 2002). No primeiro momento da descentralização carcerária foram construídas vinte e uma unidades prisionais fechadas e três semi-abertas, todas no interior de São Paulo, sendo treze delas especificamente localizadas nas cidades do Oeste paulista (GÓES; MAKINO, 2002). De acordo com Góes e Makino (2002) a opção pelos municípios interioranos deve-se, em grande medida, à crise fiscal e orçamentária do governo estadual, impelindo-o a buscar uniões com os municípios, principalmente os mais pobres e pouco dinâmicos. Entre 1997 e 2005, na Nova Alta Paulista, foram construídos nove presídios e uma unidade da FEBEM, alojando mais de dez mil “novos moradores” em um raio de aproximadamente noventa quilômetros (GIL, 2007). De acordo com a autora, no total, essas dez unidades prisionais disponibilizavam, naquele período, aproximadamente,
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