Trabalhos De Arqueologia 13

Trabalhos De Arqueologia 13

1. Sistema Monetário Tradicionalmente, na óptica numismática, o século IV d.C. inicia-se na época de Dio- cletianus porque é neste momento que têm lugar modificações importantes que restabe- lecem um sistema monetário, degradado no decurso do século III. Várias reformas mone- tárias marcam o decorrer do século, no qual, progressivamente, o papel da moeda de ouro e prata se vai afirmando, ao mesmo tempo que o da moedagem de bronze, sujeita a nume- rosas atribulações, diminui. A morte de Theodosius, no ano 395, e a divisão do Império entre os seus filhos Arcadius e Honorius terão repercussão na política monetária. Do ponto de vista numismático, o final do século IV d.C. é dominado por pequenas espécies de talhe Ae4. Um dos problemas que a moeda de bronze do século IV d.C. suscita e que ainda está por resolver é o da denominação atribuída na época às diferentes moedas que hoje conhe- cemos. Não existem fontes contemporâneas que testemunhem claramente tais nomes, e, quando estes aparecem naquelas, é muito difícil discernir com exactidão a que moeda fazem referência. A tradição instituiu o muito discutido termo follis para designar o “grande bronze” criado por Diocletianus em 294 e, consequentemente, também todos os sucessores daquela moeda. Hoje em dia, este termo está praticamente abandonado pelos investigado- res em favor de nummus; na altura, o follis designaria uma moeda de conta. Os únicos nomes conhecidos são o de maiorina e o de centenionalis, que surgem mencionados na lei do Codex Theodosianus, IX., 23. 1 de 354. Outra lei de 395, C. Th. IX., 23. 2, contém os nomes num- mus centenionalis e decargyrus nummus (ou maior pecunia). Os períodos considerados são estruturados em função das mudanças políticas e mone- tárias2. 1.1. 294-313 Diocletianus, no ano de 294, empreende uma grandiosa reforma que afecta essencial- mente a moeda de bronze, recriando um complexo sistema monetário que compreende os três metais – ouro, prata e bronze – e que recorda em alguns dos seus elementos o sistema de Augusto: • depois de uma cunhagem prévia de moeda de ouro com um talhe de 1/70 da libra, desde o ano 286, o aureus passa a ser cunhado a 1/60 da libra, quer dizer, com um peso de 5,45 g; • introdução de uma moeda de prata, o argenteus, de muito boa liga (aproximadamente de 90%), e com um peso teórico de 3,41 g, ou seja, um talhe de 1/96 (o peso do denário de Nero); • criação de uma grande peça de bronze com coroa de louros, o nummus, de aproxi- madamente 10 g, que permanecerá estável até às grandes reduções ponderais posteriores, com um talhe teórico de 1/32 e uma percentagem importante de prata que tem sido esta- belecida em torno de 3% até ao ano 300, para cair depois para 1,5%; esta liga manter-se-á mais ou menos constante durante as subsequentes reduções. Diocletianus cria também AS IMITAÇÕES DE MOEDAS DE BRONZE DO SÉCULO IV D. C. NA PENÍNSULA IBÉRICA. O CASO DO AE2 REPARATIO REIPUB 14 uma peça média com o anverso radiado, de cerca de 3 g e com escassos vestígios de prata, meramente acidentais, bem como uma pequena peça laureada, com aproximadamente 1,3 g, sem prata. Este grande nummus e os seus sucessores só em parte são fiduciários, uma vez que o seu conteúdo em prata determina o seu valor intrínseco. Dois famosos textos, o “Édito de Afrodísias” (1 de Setembro de 301), no qual se dupli- cava o valor liberatório das moedas em circulação e o “Édito de Preços” (entre 20 de Novem- bro e 9 de Dezembro de 301), onde se afixava o preço máximo de determinados produtos, incluindo o do ouro e o da prata, numa tentativa artificial de refrear a subida dos preços, expressam um panorama económico altamente inflacionista. As moedas são valorizadas, em termos de unidade de conta, em denários (o argenteus que aparece no Édito de Afrodísias valia 100 denários); porém, o valor exacto do aureus e do nummus estabelecido em denários, tal como a relação ouro/prata e prata/bronze, tem sido objecto de múltiplas interpretações com o intuito de recriar o quadro de valores e equiva- lências do sistema monetário criado por Diocletianus. Apesar de os resultados terem sido algo díspares, estes têm evoluído em simultâneo com as investigações dos especialistas. Hoje existe consenso em dar ao nummus introduzido por Diocletianus o valor nominal de 12,5 denários, que passa a valer 25 denários no ano 3012. Para Depeyrot (1992, p. 44), este valor de 25 denários manter-se-á sempre constante ao longo do período, mas Callu (1978b, p. 108-109) sugere, pelo contrário, uma descida do valor do nummus para 20 denários pouco depois da limitação dos preços. Mais recentemente, Callu e Barrandon (1986, p. 559-600), que têm baseado as suas pesquisas na cobertura metálica do nummus, ao valorizar os miligramas de prata nela con- tidos, estabeleceram as variações do seu valor intrínseco com base no preço da libra de prata conhecido para os diferentes períodos. O resultado entre 294 e 324 consiste numa certa esta- bilidade no controle do valor facial do nummus, com importantes variações no grau de fiduciaridade, desempenhando o recurso às refundições, dentro de uma linha deflacio- nista, um papel importante. Assim, o Ocidente tornaria a valorizar o seu nummus para 25 denários a partir de 308, enquanto, no Oriente, esta valorização só aconteceria entre 312 e 315 (Callu e Barrandon, 1986, p. 565). Outra proposta recente é a de Depeyrot (1992, p. 33-45) a respeito do follis. Este estaria integrado em duas unidades de conta, uma grande, de 12 500 denários, e outra pequena, de 1250 denários, como múltiplo da unidade de conta, cujo valor era baseado no da moeda de ouro, acompanhando a evolução do valor deste metal. Até 313, a emissão de moeda de ouro mantém-se regular, se bem que de forma redu- zida, devido à escassez de metal. Em 309, Constantinus I cria uma nova moeda de ouro, o solidus, emitido a 1/72 da libra, mas conserva também a cunhagem do antigo aureus a 1/60. O argenteus continua a ser cunhado com o mesmo peso estandardizado, mas a sua pro- dução é bastante limitada, desaparecendo depois dos primeiros anos do reinado de Cons- tantinus I, aproximadamente em 310. As dificuldades económicas e os distúrbios políticos obrigam a aumentar a produção de moeda, vendo-se Constantinus forçado a realizar sucessivas reduções do peso do nummus, que depois são seguidas nas restantes partes do Império: a partir de 307 desce para um talhe de 1/40 da libra (8,18 g), que passa, nos finais deste mesmo ano, para 1/48 (6,80 g). No fim de 309 o talhe é fixado a 1/72 (4,54 g). Em 294, o reverso do GENIO POPVLI ROMANI sobre o grande nummus laureado de Diocletianus marca a universalização dos tipos em todo o Império, o que, nas palavras de Sutherland (1973, p. 37), “emphasised Diocletian’s ecumenical view of Romanitas”. Mas esta uniformidade da amoedação acompanha os conflitos políticos que geram rápidas SISTEMA MONETÁRIO 15 assimetrias nos centros emissores do Império. Estes cunham nos reversos uma multipli- cidade de tipos descentralizados que marcam as lutas políticas entre os distintos impera- dores e césares. Em 310, o reverso do Génio é substituído por outro reverso que conhece de novo certa paridade tanto a Ocidente como a Oriente: o SOLI INVICTO COMITI. 1.2. 313-337 Em 313, Constantinus I e Licinius I restabelecem a unidade do Império e da amoedação3. Constantinus mantém a emissão de solidi de 1/72, com tipos muito variados, e aurei de 1/60, embora Licinius a Oriente só cunhe aurei de 1/72. Ambas as emissões contam com múltiplos e submúltiplos. A partir de 317, o solidus irá substituindo progressivamente o aureus a Oriente. As emissões de ouro adquirem especial importância no contexto da guerra contra Licinius e acentuar-se-ão sobretudo nos últimos anos de Constantinus. Depois de várias tentativas para tornar a emitir moeda de prata, esta só será propria- mente cunhada como tal com a criação do miliarense em 320 (1/60 da libra; valia 1/1000 da libra de ouro) mas, sobretudo, a partir de 324, com a introdução de um miliarense ligeiro (1/72) e um argenteus que retomará o 1/96 de Diocletianus. Emite-se também uma série de múltiplos-medalhões. Os tipos representados na moeda de prata são muito uniformes. No que respeita ao bronze: 1.2.1. 313-317 Constantinus não introduz nenhuma moeda nova. A sua moeda de bronze é o nummus de Diocletianus, que vê de novo reduzido o seu peso: no início de 313, o nummus passa de 1/72 da libra a 1/96 da libra (3,41 g), acompanhado de um aumento das emissões monetá- rias em todos os centros emissores do Império. Cunham-se também fracções de nummus. 1.2.2. 318-330 Em 318, Constantinus e Licinius decidem conjuntamente uma nova reforma da moeda de bronze, que assinala uma autêntica inflexão no sistema monetário, tal como demonstram os tesouros. No Ocidente a referida reforma caracteriza-se pela introdução do reverso VICTORIAE LAETAE PRINC PERP e numerosos tesouros encerram antes desta série ou começam com ela. A mesma circunstância tem também a sua réplica a Oriente, onde a barreira é definida entre os tesouros pelas séries PROVIDENTIAE AVGG/CAESS e IOVI CONSERVATORI AVGG//CAESS4. Caracterizam a reforma uma desmonetização das espécies anteriores, a refundição dos pesa- dos nummi tetrárquicos para cunhar as novas peças, um talhe de 1/96, um aumento do seu con- teúdo em prata, maior a Ocidente que a Oriente, e a manutenção do seu valor nominal, que con- tinua a 25 denários5.

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