O lançamento deste relatório sobre os impactos da safra 2008 da cana-de-açúcar marca a conclusão do primeiro CANA-DE-AÇÚCAR ciclo de atividades do Centro de Monitoramento de Agrocombustíveis (CMA) da ONG Repórter Brasil. Esta pesquisa sobre a cana, uma lavoura em expansão diante do boom do etanol no mundo, traz um alerta sobre o contraste entre riqueza e pobreza que caracteriza o setor sucroalcooleiro: por um lado, altos investimentos de grupos nacionais e internacionais garantem o desenvolvimento de tecnolologia de ponta; por outro, o avanço da monocultura gera danos ambientais e milhares de trabalhadores continuam submetidos à superexploração laboral. Ao longo de 2008, produzimos também um relatório sobre os impactos da soja e da mamona, e outro sobre dendê, babaçu, algodão, milho e pinhão- manso, sempre com o objetivo de subsidiar, com informações e análises qualificadas, movimentos sociais, organizações não governamentais, autoridades, empresários e especialistas em geral. Em 2009, novos relatórios serão lançados, a fim de verificar a evolução dos problemas causados pelas culturas que servem de matéria-prima aos agrocombustíveis. Todo esse trabalho pode ser acompanhado em nossa página na internet: www.agrocombustiveis.org.br. Índice Apresentação 5 Centro-Sul | 7 grocombustíveis Impactos Trabalhistas 9 A Caso | Greve e Repressão ao Trabalhador 10 Caso | Migração e vulnerabilidade 16 Impactos Ambientais 18 Caso | População breca desmate em Colômbia (SP) 20 Caso | O cerco ao Pantanal 22 Impactos Fundiários 24 Caso | Projeto com cana fracassa em assentamento 26 O Brasil dos Impactos sobre Índigenas e Populações Tradicionais 26 Caso | Os Xakriabás em Pontal 29 Nordeste | 30 Impactos Trabalhistas 31 Caso | Em Alagoas, 14 usinas autuadas por trabalho degradante e escravo 33 Caso | Trabalho escravo na Usina Laginha, do Grupo João Lyra 34 Impactos Ambientais 35 Caso | Usina Trapiche: crimes ambientais e conflitos sociais e fundiários 37 Impactos Fundiários 38 Caso | Usina Estreliana, símbolo da disputa de terra em Pernambuco 40 Caso | Usina Salgado, expulsão de sitiantes de área da União 40 Impactos Hidro-Fundiários 42 Caso | Canal do Salitre servirá à cana 44 Caso | A ameaça aos sertanejos no Baixio do Irecê 45 Amazônia | 47 Frentes de Expansão 48 Caso | Mil escravos na usina Pagrisa 50 Caso | Gameleira, uma usina no centro do poder 50 Recomendações | 52 O Poder Público 53 O Poder Empresarial 54 notas 55 Apoio Colaboraram para a realização deste relatório Comissão Pastoral da Terra (CPT) Alagoas CPT Bahia CPT Maranhão CPT Pernambuco CPT Araguaína ECOA - Ecologia e Ação Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo (Feraesp) Instituto Centro de Vida (ICV) Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) Pernambuco 4 Cantos do Mundo Terra de Direitos Expediente O Brasil dos Agrocombustíveis: Impactos das Lavouras sobre a Terra, o Meio e a Sociedade - Cana-de-açúcar ONG REPÓRTER BRASIL Coordenação geral Leonardo Sakamoto CANA-DE-AÇÚCAR Centro de Monitoramento dos Agrocombustíveis Coordenador Marcel Gomes Autores Antonio Biondi Mauricio Monteiro Verena Glass Produção dos Mapas Roberta Roxi Instituto Centro de Vida (ICV) - Alta Floresta (MT) Projeto gráfico e Diagramação Gustavo Monteiro Fotos Equipe Repórter Brasil Altino Machado (pág. 48) Aminemona (pág.19) João Zinclair (págs. 31 e 44) João Roberto Ripper (pág. 15) MPT-Alagoas (págs. 32, 33 e 34) Colaboração Milenka Quisbert Copyright ONG Repórter Brasil É permitida a reprodução total ou parcial da publicação, devendo citar fonte de referência. Impresso no Brasil. Distribuição gratuita Janeiro de 2009 ISBN 978-85-61252-07-6 Apresentação listas envolvendo desrespeito ao descanso semanal e falta A safra 2008 de cana-de-açúcar foi marcada pela corrosão das condições trabalhistas na lavoura e o avan- de equipamentos de proteção individual. E 2.553 foram li- grocombustíveis ço da monocultura sobre o Cerrado, a Amazônia, o entor- bertados, segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), A no do Pantanal e o trecho da Mata Atlântica localizado de empreendimentos sucroalcooleiros que se valiam da es- no Nordeste. É com este alerta que o Centro de Monito- cravidão contemporânea, a metade de todos os trabalhado- ramento de Agrocombustíveis (CMA) da ONG Repórter res escravos resgatados no país ao longo do ano. Brasil manifesta sua preocupação com o boom do etanol no país, neste terceiro relatório da série sobre os impactos Do ponto de vista ambiental, a expansão da cana causados pelas culturas agrícolas utilizadas na produção de atinge áreas de Cerrado, da Amazônia, da Mata Atlântica agrocombustíveis. É a primeira pesquisa abrangente a ser nordestina e até da Caatinga. Em 2008, 24 usinas de Per- O Brasil dos divulgada no Brasil sobre os impactos sociais e ambientais nambuco foram multadas por diversos crimes ambientais. da atual safra. O Pantanal, um dos principais patrimônios ambientais do mundo, está pressionado pelos projetos de instalação de Os bilionários investimentos recebidos pelo setor 5 sucroalcooleiro de empresas e instituições financeiras na- cionais e internacionais, têm incentivado o avanço dos ca- naviais em áreas já consolidadas, como São Paulo, e novas fronteiras no Centro-Oeste brasileiro. A crise financeira internacional, que eclodiu no segundo semestre, deve atra- sar uma série de novos projetos, mas não a ponto de rever- ter o ciclo de expansão. Tanto que a produção nacional de cana em 2008 avançou 13,9% em relação à safra passada e, no próximo ano, deve crescer mais 7,6%1. Apesar disso, a crise foi utilizada por empresas para justificar o aperto nas condições de remuneração no campo. Desde o final da década de 1990, a remuneração pelo trabalho vinha acumulando pequenos aumentos re- ais quando comparada à evolução dos preços dos alimen- tos, mas essa tendência se inverteu em 2008. Os reajustes salariais obtidos durante as negociações raramente chega- ram a dois dígitos, enquanto o preço da cesta básica avan- çou 16%2. No Estado de São Paulo, onde estão concentra- dos 59,5% da produção de cana do país, a perda do poder de compra entre os trabalhadores incentivou greves, muitas vezes reprimidas com violência pela polícia e com demis- sões pelas usinas. O ambiente nos canaviais tornou-se tão explosivo que sindicalistas lembraram os protestos ocorri- dos na região de Guariba (SP), na década de 1980. Como se pode observar, a insatisfação dos cana- vieiros não é recente. Tem origem em um modelo produti- vo baseado na superexploração do trabalho, em que parte dos seguidos aumentos de produtividade do trabalhador é apropriado pelo dono da fazenda ou da usina. Desde 2000, a produtividade do trabalhador cresceu 11,9% no Estado de São Paulo, mas o preço pago ao cortador de cana avançou apenas 9,8%3. A safra de 2008 registra também piora das condições de trabalho em diversas instâncias. Por exem- plo, aumentou, em termos relativos, a quantidade de au- tos de infração emitidos pelos fiscais a empregadores pau- usinas no Estado do Mato Grosso do Sul, nas proximida- rão seus empregos apenas nas lavouras de cana do Estado des de afluentes importantes para o bioma. O zoneamento de São Paulo. agroecológico, promessa do governo para organizar a ex- pansão do cultivo, foi criticado por vários setores e perma- Mais detalhes, análises e histórias dos impac- nece no papel. tos causados pelo avanço da cana no país poderão ser vis- tos nas páginas deste relatório, que está dividido em três Sem preservar o meio ambiente, é praticamente grandes partes, em função de suas peculiaridades produti- consenso que os agrocombustíveis perdem sua vantagem vas e históricas: Centro-Sul, Nordeste e Amazônia. Para comparativa em relação aos combustíveis fósseis; princi- realizar este trabalho, os pesquisadores do Centro de Mo- palmente no caso do etanol, quando considerada a quei- nitoramento de Agrocombustíveis percorreram oito Es- ma da palha da cana e a emissão de gases do efeito estufa. tados brasileiros - Acre, Alagoas, Bahia, Pernambuco, Ma- Nesse aspecto, o Estado de São Paulo assiste ao avanço da ranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e São Paulo CANA-DE-AÇÚCAR mecanização da colheita, o que, por um lado, traz conside- - e entrevistaram centenas de trabalhadores, sindicalistas, ráveis ganhos ambientais, mas, por outro, é visto pelos tra- pesquisadores, autoridades e empresários do setor. Este balhadores como um risco para seus empregos, já que são trabalho também não seria possível sem o apoio de Cor- tímidas as políticas compensatórias, como a reforma agrá- daid, Fundação Doen e Solidaridad, assim como do Insti- ria e a requalificação profissional. Estima-se que, por conta tuto Centro de Vida (ICV), que produziu mapas com exclu- 6 da mecanização, até 2014 cerca de 180 mil pessoas perde- sividade. A todos vocês, nosso sincero agradecimento. Centro-Sul O Centro-Sul do território brasileiro concentrou 87,8% da produção de cana-de-açúcar destinada ao setor grocombustíveis sucroalcooleiro em 2008. Fazem parte dessa região São A Paulo, o principal Estado canavieiro do país, com 59,5% da produção nacional, assim como os Estados onde o avan- ço da cultura é mais acelerado, como Goiás e Minas Ge- rais. Na safra 2008, a produção brasileira de cana cresceu 13,9%, de 501,5 milhões para 571,3 milhões de toneladas. São Paulo foi responsável por 58,9% desse aumento, Goiás por 12,3%, e Minas Gerais por 10,9%. Os dados foram di- O Brasil dos vulgados pela Companhia Nacional de Abastecimento (Co- nab) em dezembro de 2008. O Centro-Sul também é a região prioritária de ex- 7 pansão do parque industrial do etanol. De acordo com a União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), associação que reúne as maiores companhias do setor, 29 usinas entra- ram em operação ao longo de 2008, entre elas 13 em São Paulo, nove em Goiás, quatro em Minas Gerais, e três no Mato Grosso do Sul. Desde 2005, o número de companhias de etanol inauguradas na região chega a 81.
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