Figuras da Lusofonia Cleonice Berardinelli Figuras da Lusofonia Organizador Izabel Margato Edição Instituto Camões Design Gráfico atelier Nuno Vale Cardoso + Nina Barreiros Pré-impressão e impressão Text y pe Tiragem 1000 exemplares 1ª edição Lisboa, 2002 Depósito Legal 181 628/02 ISBN 972-566-231 Figuras da Lusofonia Cleonice Berardinelli organização Izabel Margato 2002 Índice 6 Jorge Couto Prefácio 9 Izabel Margato Introdução 15 Cleonice Berardinelli Gratidão 18 Aníbal Pinto Castro Cleonice, Mestra da Universidade Luso-Brasileira 27 Luciana Stegagno Picchio Uma Ilha para Cleonice 34 Liliana Bastos Cleonice Berardinelli 38 Jorge Fernandes da Silveira Adeus às Armas 54 Eduardo Lourenço A Musa de Antero ou Antero e Eros 63 Maria Vitalina Leal de Matos O “Correlativo Objectivo” de T. S. Eliot e a sua Versão Pessoana (Digressões) 71 Tereza Cristina Cerdeira da Silva O Delfim ou “O Ano Passado na Gafeira” 78 Vilma Arêas “Honra e Paixão” versus “Passion et Vertu” 84 Helder Macedo Os Maias e a Veracidade da Inverosimilhança 90 Laura Padilha Sinos e Lembranças: Ecos de Dois Romances Angolanos Finisseculares 102 Lélia Parreira Duarte Alves & Cia, de Eça de Queirós, e Amor & Cia., de Helvécio Ratton 109 Maria Fernanda Abreu Mulata e Histérica: um Retrato Brasileiro de Carlos Malheiro Dias 118 Eneida Leal da Cunha Tornar-se Lusófono. História e Contemporaneidade 126 Renato Cordeiro Gomes Que Faremos com esta Tradição? Ou: Relíquias da Casa Velha 142 Ronaldo Menegaz Na Derrota de As Naus, de António Lobo Antunes, a Imagem de um Velho Portugal 150 Izabel Margato A Lisboa de José Cardoso Pires: o Percurso que Interroga os Relatos de Fundação 158 Benjamin Abdala Jr. De Vôos e Ilhas – Imagens Utópicas do Mito em Recortes Clássicos e Contemporâneos 172 Eneida Monteiro Bomfim Termos Relativos a Vestuário: Sua Função nos Autos de Gil Vicente 189 Maria Idalina Resina Rodrigues Viajar Hoje na Barca do Inferno 205 Eduardo do Prado Coelho Tríades 212 Gilda Santos Um Cristalino Pó de Amantes Enlaçados: Alguma Poesia Erótica de Jorge de Sena 223 Helena Carvalhão Buescu Da Poesia como Coisa Mental e Figuração em Fernando Pessoa 230 Ivo Castro A Língua de Cleonice Prefácio m 1998, quando assumi a presidência do Instituto Camões, considerei que E umadas missões da Instituição que passava a dirigir, vocacionada para apromoção e difusão da Língua e Cultura Portuguesa no estrangeiro, seria a de estreitar os laços com intelectuais, académicos e investigadores de todo o mundo que dedicavam o melhor do seu labor precisamente aos referidos objectivos. Iniciativas diversas foram desenvolvidas no sentido de aprofundar o diálo- go com as suas Instituições representativas, desde a Associação Internacional de Lusitanistas às várias associações nacionais existentes ou em fase de criação. Havia ainda que, com carácter regular, testemunhar publicamente o reco- nhecimento para com aqueles que, através de uma longa e brilhante carreira académica, tivessem contribuído significativamente para tornar melhor conhecidas a Língua Portuguesa e as Culturas Lusófonas no mundo. A consecução deste objectivo concretizou-se através de iniciativas comple- mentares. Em primeiro lugar, a criação do Diploma de Mérito do Instituto Camões, em segundo lugar, a realização de um Colóquio que contasse com a participação de estudiosos com afinidades científicas e pessoais com o Homenageado e, finalmente, a edição das respectivas actas. A escolha do primeiro lusitanista a homenagear recaiu na professora Cleonice Serôa da Motta Berardinelli. Trata-se de uma figura ímpar dos Estudos Portugueses, que, ao longo de uma brilhante carreira de mais de cin- quenta anos de docência e investigação, publicou centenas de títulos e formou dezenas de prestigiados discípulos no Brasil, em Portugal e em outros países. A inestimável contribuição de Dona Cleo – como carinhosamente é tratada pelos seus íntimos – para o progresso de muitos aspectos da Literatura Portuguesa, de Gil Vicente e Camões a Fernando Pessoa, encontra-se bem patente nos ensaios publicados no presente volume, da autoria de muitos dos mais reputados intelectuais e académicos luso-brasileiros, sendo que algumas das intervenções já enquadram uma realidade relativamente recente, sobretudo na área cultural: a da Lusofonia. 6 Por todas estas razões, e porque Cleonice Berardinelli foi uma verdadeira Mestra da Universidade Luso-Brasileira, reforçando a aproximação entre Portugal e o Brasil, o Instituto Camões tem todo o gosto em inaugurar a colec- ção Figuras da Lusofonia com a edição de uma obra que constitui um impor- tante contributo para a divulgação dos mais recentes estudos sobre as Literaturas Lusófonas. Jorge Couto Presidente do Instituto Camões 7 8 Apresentação Colóquio “Figuras da Lusofonia”,realizado em Lisboa em fevereiro de O1999, foi concebido pelo Instituto Camões para homenagear Cleonice Berardinelli. A longa experiência de vida, a postura intelectual e o trabalho dessa figura paradigmática da comunidade lusófona mereceram manifesta- ções de reconhecimento e apreço por parte do mundo acadêmico e de insti- tuições portuguesas, nomeadamente o Instituto Camões e a Fundação Calouste Gulbenkian. Criado para destacar e registrar publicamente a atuação de personalidades que se consagraram como promotoras e guardiãs de diferentes manifestações culturais em língua portuguesa, o Colóquio, e este livro que agora se estampa, acrescentam ao respeitável currículo de Cleonice o título de Figura da Lusofonia. No caso de Cleonice Berardinelli, ser Figura da Lusofonia é ter dedicado toda uma vida ao estudo e à divulgação da cultura portuguesa, tratando auto- res e obras com o cuidado e a atenção de quem recolhe antigas sementes para armazenar e multiplicar as suas forças germinativas. É ser, nomeadamente, uma professora brasileira de literatura portuguesa que soube construir um per- curso de intelectual marcado pela competência, dedicação e generosidade. É ter franqueado a alunos e colegas a singularidade de seu olhar (e particular- mente a de sua voz) em inúmeras aulas, conferências e ensaios que marcaram várias gerações de professores. É, ainda, ser parceira incansável de investiga- dores brasileiros e portugueses na realização de encontros e projetos de pes- quisa, e na fixação de textos de autores como Camões, Gil Vicente, Chiado, Bocage, João de Deus, José Régio, Mário de Sá-Carneiro, António Prestes e Fernando Pessoa. Mas não finda aqui a “biblioteca” que Cleonice tem habita- do ao longo desses anos. Se Camões, Fernando Pessoa e Gil Vicente aparecem 9 como os grandes pilares da extensa galeria formada pelos “estudos portugue- ses” de Cleonice, nela também ganham relevo as obras de Almeida Garrett, Camilo Castelo Branco, Alexandre Herculano, Eça de Queirós, Antero de Quental, Cesário Verde e Diogo Bernardes, destacando-se ainda os estudos sobre Almeida Faria, José Cardoso Pires e Jorge de Sena. É na companhia desses autores (mas não só deles) que Cleonice Berardinelli tece os seus dias de gran- de investigadora e professora modelar. A merecida homenagem expressa no Colóquio de 1999, e agora comple- mentada com a edição deste livro, foi a forma escolhida para resgatar a longa trajetória de Cleonice e pôr em relevo o viés emblemático da “biblioteca” em que ela circula. Seguindo este propósito, a homenagem só poderia concentrar- se na produção de textos que retomassem a obra de autores trabalhados, mui- tas vezes apresentados pela primeira vez no Brasil, por Cleonice Berardinelli. O conjunto de textos expressa o reconhecimento de velhos amigos e colegas (mui- tos deles antigos alunos) que retomam as aulas, as conferências ou o convívio profissional que Cleonice Berardinelli tem construído ao longo da vida. Em sua maioria, os textos apresentados são análises de obras dos seus auto- res eleitos. São recuperações de antigas leituras que se transformam em home- nagem pela aproximação e desdobramento. São sortilégios de escrita, perma- nências e circulações que marcam proximidade e convivência. São expressões de desejo ou de agradecimento que definem e delimitam com o afeto a comu- nidade de amigos de Cleonice Berardinelli. Jorge Fernandes da Silveira, Helena Carvalhão Buescu e Maria Vitalina Leal de Matos vão retomar os versos de Fernando Pessoa e criar a possibilida- de deste “novo encontro” com Cleonice. São textos que expressam desejos de aproximação mas que têm também a funcionalidade de releitura. São caminhos muitas vezes trilhados mas agora desdobrados e ressemantizados nas inova- doras abordagens dos três professores. Antero é convocado para a homenagem por Eduardo Lourenço. Com uma aguda reflexão sobre o erotismo na poesia amorosa do jovem Antero, o ensaís- ta e grande amigo de nossa homenageada constrói um discurso em diálogo estreito e fraterno com a leitura que Cleonice fez das Primaveras Românticas “num breve e precioso ensaio intitulado Eros e Antero”.Na sua delicada home- nagem há leitura e citação, mas não só. Há ainda a eleição de um tema e, prin- cipalmente, de um autor que também os aproxima. 10 Nessa incursão pela “biblioteca” de Cleonice não poderia faltar o encontro com Gil Vicente, autor que mereceu muitos estudos, mas também inesquecí- veis representações, por parte da nossa homenageada. Os textos de Eneida do Rego Monteiro Bomfim e de Maria Idalina Resina Rodrigues são os responsá- veis pela convocação de mestre Gil, através da recuperação do campo semân- tico do vestuário presente nos Autos e da análise dos cruzamentos, contami- nações e adaptações contemporâneas do Auto da Barca do Inferno. Seus textos são expressões claras que resultam de acurada investigação e do desejo comum de mais uma vez estar junto de Cleonice. A ponte (a Barca) desta vez foi cons- truída com textos vicentinos. Com o texto “Tornar-se Lusófono – História e Contemporaneidade”, Eneida Leal Cunha constrói a sua homenagem, demonstrando, em forma de testemunho, a presença marcante dos Estudos Camonianos de Cleonice na sua trajetória de investigadora preocupada em “compreender Portugal” , ou em “reinterpretar, a partir de Os Lusíadas, a fundação do imaginário brasileiro”,ou ainda, mais recentemente, em apreender “muitas das significações difusas e das vontades conflitantes” que se expõem na insistência da palavra Lusofonia.
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