.1, ESPAÇO DE REFLEXÃO SOBRE TEMAS ALTERNATIVOS _____......._��----'\· ; Centro ·�o pular de cultura da: 1 Página 2 ' A antiga sede da UNE na praia do Hamengofoi um símbolo de resistência cultural • g 11:ii;li'Jfi. Paulo Coelho fala de literatura e política · Página 6 MULHER As prostitutas se organizam ' . Manobras britânicas adiam a paz 2 CULTURA Glauber Rocha Cacá Diegues João das Neves Os Centros Populares de Cultura da União Nacional dos Estudantes, que buscavam a "arte popular revolucionária", foram um marco nos anos 60. Se por um lado não conseguiram fazer da cultura o fermento transformador da sociedade, por outro ajudaram a construir uma face mais crítica e verdadeira do país Juliana lootty 178-terceiro mundo/ suplemento CULTURA 3 que têm em co­ mum o poeta Fer­ [O]reira Gullar, o ci­ neasta Cacá Die­ gues, o músico Carlos Lyra, o autor teatral Oduvaldo Vianna Filho, o ator Gian­ francesco Guarnieri e o re­ cém-eleito senador José Ser­ ra? Além da nacionalidade, de pertencerem à mesma fai­ xa etária e do fato de serem personalidades de destaque no cenário nacional, os brasi­ leiros citados acima são to­ dos ex-cepecistas, O termo, para quem não viveu a dé­ cada de 60, significa mem­ bro do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes, o conheci­ Eles não usam black-tie (aqui em versão cinematográfica) do CPC da UNE. foi um marco na dramaturgia do país Espécie de carrefour cul- emoção e razão (daí o subtítulo uma reiterado em um manifesto definiti­ tural da década de 60 no Brasil, prin­ história de paixão e consciência.) foi a vo divulgado em agosto do mesmo cipalmente no Rio de Janeiro, o CPC alquimia que resultou em uma mili­ ano ao qual aderiram artistas e inte­ da UNE é uma referência de época no tância dedicada e de legado cultural lectuais como Ferreira Gullar, Fran­ que diz respeito a cultura e política. tão prolífico para a história do país. cisco de Assis, Armando Costa e Por ele passaram, além dessas perso­ João das Neves. nagens, dezenas de outros nomes das O que foi o CPC?- O período de O objetivo era criar e divulgar uma artes, da política e, por que não dizer, fundação do CPC (leia-se os anos que "arte popularrevolucion ária", e -con­ da história recente do país, como os ci­ antecederam o golpe militar de 1964) forme dita seu documento fundador, o neastas Glauber Rocha e Leon Hirz­ foi de intensas mudanças políticas.No Relatório do CPC da UNE - impulsio­ man e o sociólogo Herbert de Souza, cenário internacional, a revolução cu­ nar a "tomada de consciência por par­ entre outros. bana, recém-vitoriosa, enfrentava a te de artistas e intelectuais" em um Com o objetivo de resgatar o traje­ crise dos mísseis; o mundo ainda so­ projeto capaz de levar a arte e a cultu­ to do CPC, e com ele parte da história fria com a bipolarização entre Leste e ra ao povo. de um período de ebulição social e cul­ Oeste, entre socialismo e capitalismo. O movimento que desembocou na tural, a jornalista carioca Jalusa Bar­ O Brasil, com a renúncia em 1961 do fundação do CPC poderia ser definido cellos passou sete anos pesquisando e presidente eleito Jânio Quadros, vivia como uma maneira de tratar a cultura recolhendo o depoimento de 32 parti­ a promessa de reformas estruturais popular como forma de consciência po­ cipantes da entidade, além de editar e do governo João Goulart. Ajuventude lítica,e que, como tal, deveria ser com­ publicar pela editora Nova Fronteira intelectualizada (que freqüentava as preendida "à luz de suas relações com o livro CPC da UNE: uma. história de universidades) via-se no meio de in­ a base material". Os cepecistas acredi­ paixão e consciência. A empreitada tenso debate sobre os destinos do tavam que a arte era revolucionária, começou a convite da antiga Funda­ mundo. A palavra de ordem era enga­ capaz de fazer o homem perceber o ção Nacional de Artes Cênicas (Fun­ jar-se na luta por uma sociedade mais mundo em que vivia e, assim, romper dacen) em agosto de 1987, foi inter­ justa. Acreditava-se que o Brasil ti­ com os limites opressores, sejam polí­ rompida com o Plano Collor e final­ nha futuro promissor e que o papel de ticos ou de estética e linguagem artís­ mente retomada e publicada em intelectuais e artistas era decisivo. ticas. Os cepecistas eram membros da agosto desse ano. Foi em meio a este caldeirão polí­ militância da esquerda, notadamente Para J al usa, o mais im pressionan­ tico que um grupo de estudantes, em do Partido Comunista e da Ação Po­ te foi descobrircomo a quase unanimi­ associação com a UNE, decidiufundar pular. Para eles a verdadeira arte dade dos ex-cepecistas conserva até o Centro Popular de Cultura. O núcleo popular era política e rompia com a hoje o vigor e a crença em um país me­ fundador era composto pelo drama­ "cultura alienada das classes domi­ lhor. "São todos meninos e meninas turgo Oduvaldo Viana Filho, pelo ci­ nantes", onde se incluíam o cinema ainda hoje, independente da idade. neasta Leon Hirzman e pelo sociólogo hollyuioodiano e o teatro das compa­ Continuam se emocionando com os Carlos Estevam Martins. Seu ante­ nhias tradicionais. problemas do Brasil", exulta Jalusa, projeto de manifesto data de março de Por um lado, em nome destes acrescentando que a combinação de 1962 no então estado da Guanabara, ideais, muitos equívocos foram come- suplemento/ terceiro mundo -178 4 CULTURA tidos, entre eles o de negar validade a culdade de Arquitetura do Rio e ence­ Volante, unidade móvel que percorre­ qualquer manifestação artística que nou sua peçaA mais-valiavai acabar, ria diversos estados para discutir a não se enquadrasse dentro desta con­ seu Edgar, dirigida por Francisco de unidade do movimento e tentar criar cepção. O entusiasmo dos jovens era Assise com música de Carlos Lyra, ou­ uma corrente nacional de cultura po­ levado a um ponto que poderia se tro cepecista que mais tarde se desta­ pular. Em 1962, já depois da criação aproximar do patrulhamento ideoló­ caria com a bossa-nova. do CPC e, através da unidade volan­ gico. Mas por outro lado eles fizeram, A iniciativa de Vianinha foi uma te, a UNE estimulou a criação de ou­ sem dúvida, avançar a consciência e a das primeiras tentativas de aglutinar tros centros p,opulares de cultura reflexão crítica sobre o país. estudantes, artistas e intelectuais em como o da Bahia, ao qual se uniu um espetáculopopular. Entre as prin­ Gláuber Rocha. Papel do teatro - O teatro foi en­ cipais peças teatrais encenadas pelo carado pelos jovens como fórmula CPC estão a montagem de A vez da re­ Arte e financiamento - O CPC ideal de levar a arte ao povo, pela sua cusa, de Carlos Estevam Martins, em também fez incursões na literatura, "comprovada acessibilidade à grande julho de 1961, com direção de Francis­ cinema e música. Suas atividades no massa". A atividade cultural era uma co de Assis. O Auto dos 99%, de Odu­ mercado editorialforam iniciadascom forma de "atuação com os grupos so­ valdo Viana Filho - que se referia à o lançamento do cordel: João Boa ciais", definida como a transformação necessidade de reformulação da uni- Morte, cabra marcado para morrer. dos espetáculos em debates populares Com tiragem de 10 mil exemplares, o que tinham como palco caminhões, es- cordel foi escrito depois que, em uma cadarias e portas de fábricas. Leva- unidade volante, os membros do CPC vam-se ao povo as teses nacionalistas presenciaram o assassinato de um lí­ � 1· formuladas durante os congressos da der rural no N ardeste.Foram também ' 1 Os estudantes j UNE, em forma de autos escritos pelo lançadas coletâneas de poesias sob o 1 seminário de dramaturgia da entida­ nome de Cadernos doPovo Brasileiro, de. Os jovens diziam que o povo "mo­ romperam com textos de Affonso Romano de ' bilizava suas vanguardas, criando seu Sant'Anna, Ferreira Gullar, Moacyr 1 1 radicalmente núcleo, aprendendo e ensinando ator­ Félix e Vinicius de Moraes. nar social a ação, a tornar concretos com as idéias Em julho de 1962, o CPC lançou o seus conhecimentos do mundo pela disco O Povo Canta, um compacto de prática transformadora". e a estética 33 1/2 rotações com as faixas Canção Para tal, havia o Grupo de Reper­ alienada que do Subdesenvolvido, de Carlos Lyra e tório, encarregado da produção das . Francisco de Assis, Grileiro Vem Pe­ peças e de escrever argumentos, e o imperavam dra Vai, de Rafael de Carvalho, e Can­ Grupo de Espetáculos Populares, res­ ção do Trilhôozinho, também de Car­ ponsável pelasencena ções nas entida­ nas artes los Lyra e Francisco de Assis. No cine­ des de massa (sindicatos, favelas, fa­ ma, o CPC realizou o longa Cinco Ve­ culdades, praças públicas e clubes de I zes Favela, composto de cinco episó­ bairro).''Nossa arte só irá onde o povo r.... ��---------­ dios com diferentes versões sobre o consiga acompanhá-la, entendê-la, e - tema dirigidosentre outros pelos futu­ servir-se dela", afirmavam. versidade, à qual "99%" dos brasilei­ ros papas do Cinema Novo Leon Hirz­ O teatro popular não surgiu com o ros não tinham acesso- foi dirigida man, com o episódio A Pedreira deSão CPC daUNE. Antes da fundação dele, por Armando Costa e encenada nas fa­ Diogo, e Joaquim Pedro, com Couro de já no final da década de 50, o Teatro de culdades da Guanabara, em concen­ Gato. O filme foi realizado com a pri­ Arena encenava peças de fundo social, trações populares e praças públicas, meira verba conseguida pelo CPC e o como Eles não usam black-tie, de assim como O Auto do Tutu está no restante foi coberto por cotas distri­ Gianfrancesco Guarnieri, e Chapetu­ Fim e o Auto dos Cassetetes.
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