Perspectivas, São Paulo 7:127-147, 1984.

VINÍCIUS DE MORAES, CRITICO DE CINEMA*

Afrânio Mendes CATANI**

RESUMO: Este estudo procura destacar a importância da participação de Vinícius de Moraes na crítica cinematográfica do início dos anos 40 (1941-42), exercida no jornal carioca A Manhã. Foi nessa coluna que Vinícius manteve aceso, de maio a julho de 1942, um debate que mobilizou todo o Brasil e, em especial, o Rio de Janeiro: a polêmica "cinema mudo" X "cinema falado". Participam da polêmica, entre outros, Otávio de Faria, Manuel Bandeira, Afonso Arinos de Mello Franco, Humberto Mauro, Aníbal Machado. Nessa ocasião, ainda que timidamente, o cinema brasileiro começou a ser dis­ cutido, embora ainda não lhe fosse atribuída grande importância.

UNITERMOS: História do cinema brasileiro; história da crítica cinematográfica brasileira; "cinema mudo"X "cinema falado".

"Meus amigos se chamavam Mário Jornal 'A Manhã', recentemente funda­ e Quincas, eram humildes, não sa- do no Rio, sob a direção de Cassiano Ri­ [biam cardo" (4:122). Acrescentava ainda que o Com eles aprendi a rachar lenha e ir artigo intitulado "Credo e Alarme" (8/a- buscar conchas sonoras no mar fun- gosto/1941), em que Vinícius se apresenta [do aos leitores expondo suas idéias cinemato­ Comigo eles aprenderam a conquis­ gráficas fora recebido com grande interes­ tar as jovens praianas tímidas e riso- se, além de significar um verdadeiro acon­ [nhas. tecimento. Eu mostrava meus sonetos aos meus Destacar a importância da participa­ amigos — eles mostravam os grandes ção de Vinícius de Moraes na crítica cine­ [olhos abertos matográfica do início dos anos 40 com ba­ E gratos me traziam mangas madu- se em anotações obtidas principalmente [ras roubadas nos caminhos. no jornal "A Manhã", na revista "Cli­ Um dia eu li Alexandre Dumas e es- ma" e na tese de doutoramento de Maria [queci os meus amigos. Rita E. GALVÃO (7), eis o alvo deste ar­ Depois recebi um saco de mangas tigo. Toda a afeição da ausência...'' Vinícius de Moraes O CINEMA, BRIGANDO PARA SER "Ilha do Governador" RECONHECIDO COMO ARTE

"O Cinema foi a última coisa que INTRODUÇÃO me interessou. Inicialmente, meu in­ teresse era por literatura, política, Paulo Emílio Salles Gomes escrevia, depois artes plásticas, música. O ci­ em agosto de 1941, no terceiro número da nema era mais por causa das namo­ revista "Clima", que recebia "... com radas, era secundário..." grande interesse a notícia de que Vinícius Depoimento de Paulo Emílio Salles de Moraes ia fazer crítica de cinema no Gomes a Cláudio Kahns. (14)

* Versão consideravelmente reduzida deste trabalho foi publicada em Filme Cultura, Rio de Janeiro, 14 (38/9): 42-52, ago./nov. 1981. ** Departamento de Ciências da Educação — Instituto de Letras, Ciências Sociais e Educação — Unesp — 14.800 — Arara- quara — SP.

127 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, crítico de cinema. Perspectivas. São Paulo, 7:127-147, 1984.

Em sua tese de doutoramento, Gal- foi para mim uma descoberta completa e vão destaca o pouco interesse demonstra­ total, feita na Europa pouco antes da do pelo cinema nacional por parte da inte­ Guerra. Era algo de que eu nunca tinha lectualidade antes dos anos 50 (7). Afirma ouvido falar. Em 1935, Décio (de Almei­ que Guilherme de Almeida era a "flor da Prado) e eu fizemos uma revista cha­ exótica" da intelectualidade paulista espe­ mada Movimento; era uma revista que se cializada no assunto. "Mas nos anos 40 o pretendia avançada e em que se tratava de seu interesse já era mero resquício de um absolutamente tudo o que se possa imagi­ interesse real anterior, vindo dos anos 20, nar — poesia, folclore, teatro, arquitetu­ quando de fato o cinema era importante ra, pintura, música, economia, política — para alguns jovens intelectuais, como Ca- tudo, com exceção de cinema, a que não nuto Mendes de Almeida*, Plínio de Cas­ havia uma única referência. O cinema tro Ferraz ou Otávio Gabus Mendes, e no realmente não existia para nós. Quando campo da reflexão crítica, para Mário de fizemos a revista Clima — depois da mi­ Andrade" (7:32). No final desses anos 20, nha volta da Europa, já inteiramente con­ no Rio de Janeiro, foi criado o "Chaplim- quistado pelo cinema — havia então uma Club", cine-clube de Octávio de Faria, seção de crítica de filmes. Creio que foi a Plínio Süssekind Rocha, Almir de Castro primeira revista do gênero a ter uma seção e Cláudio Mello, que chegou a publicar especialmente dedicada a cinema. Na entre 13 de junho de 1928 (data de sua mesma época, Vinícius de Moraes come­ fundação) e dezembro de 1930, nove çou a fazer crítica cinematográfica num exemplares do FAN, seu órgão oficial, ar­ Jornal Carioca, "A Manhã", e o fato de doroso defendor do cinema mudo (34). um intelectual como ele preocupar-se com Todavia, segundo M. Rita Galvão, cinema foi muito comentado, era qual­ "com o correr do tempo, a especialização quer coisa de meio insólito que as pessoas de Guilherme de Almeida em cinema foi não compreendiam bem"**(7:32-3). se tornando de puramente O "Clube de Cinema da Faculdade mundano, de modo que acaba havendo de Filosofia", é importante frisar, nasceu muito pouca diferença entre os seus escri­ ligado à revista Clima, podendo ser consi­ tos sobre cinema e a crônica social que faz derado como a primeira manifestação concomitantemente. Depois dos anos 20, concreta do interesse intelectual por cine­ o interesse intelectual por cinema em São ma que começava a surgir em São Paulo. Paulo só ressurgiu com o "Clube de Cine­ Eram exibidas, basicamente, as películas ma da Faculdade de Filosofia", criado que Paulo Emílio havia visto na Europa, por Paulo Emílio Salles Gomes e um gru­ quais sejam, as de Fritz Lang, Ivan Mo- po de amigos no início da década de 40", jovskine, Raquel Meller, "O Gabinete do sendo que pertenciam a esse grupo, além Dr. Caligari" (Robert Wiene), Carl Th. de Paulo Emílio, Décio de Almeida Pra­ Dreyer e outros. Após as projeções, os fil­ do, Cícero Cristiano de Souza, Lourival mes eram discutidos pelo pessoal do pró­ Gomes Machado, Antônio Cândido e prio Clube e pelos professores da Univer­ Ruy Coelho. É o próprio Paulo Emílio sidade de São Paulo, sendo que, freqüen­ quem declarou que entre a sua geração e a temente, o debate se fazia em francês, "... de Canuto não houve ninguém que se in­ para facilitar as coisas para os professores teressasse por cinema em São Paulo, sen­ estrangeiros..." (7:34). Entretanto, res­ do ele o primeiro intelectual a começar a salva Maria Rita, o fato de haver um inte­ se preocupar com o estudo de tal arte no resse intelectual por cinema em São Paulo final dos anos 30. Afirmou que "a desco­ absolutamente não significa que houvesse berta do cinema como forma de cultura interesse por cinema brasileiro. Nos deba-

* Canuto Mendes de Almeida fez críticas de filmes cm jornais, vindo a ser o autor do primeiro importante sobre cine­ ma publicado no Brasil: Cinema Contra Cinema, São Paulo, Ed. Nacional, 1934. Ver (9:59). ** Grifos Meus. 128 CATANI, A.M.— Vinícius de Moraes, crítico de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7:127-147, 1984.

tes do Clube de Cinema não participavam para cá tornou-se extremamente irregular. os antigos cineastas paulistas (por ex. Me­ "Os cine-clubes que começa a se formar dina, Rossi, Tartari) que na década de 20 no início dos anos 40 só se preocupam e início da seguinte eram não apenas os com exibir e discutir cinema ." que faziam cinema, mas os que pensavam Dessa maneira, o cinema brasileiro destes sobre cinema. "O resultado, no período tempos é o cinema carioca, é a chanchada que antecede à Vera Cruz" — companhia — uma produção desprezada por todos cinematrográfica patrocinada pela elite fi­ aqueles que se diziam ou eram reconheci­ nanceira paulista, que produziu pouco dos como intelectuais. Era o cinema da mais de uma dezena e meia de filmes no Cinédia e Atlântida, de Vicente Celestino, período 1949/1954 — "é o divórcio total Oscarito, Violeta Ferraz, Grande Otelo, entre o pensamento e a prática cinemato­ Mesquitinha, Zé Trindade, Ankito, Derci gráfica brasileira. Durante muitos anos, Gonçalves. "Um cinema brasileiro que pensar cinema no Brasil significou pensar correspondesse à idéia que se tinha do que cinema estrangeiro. Os filmes projetados fosse o bom cinema não existia; o cinema e discutidos no Clube (...) eram os clássi­ que existia era totalmente ignorado pelas cos americanos e europeus" (7:34). pessoas que começavam a se preocupar Para tornar mais clara a participação com cinema" (7:8). de Vinícius de Moraes no campo da crítica Paulo Emílio comenta que ele mesmo cinematográfica, parece útil, no entanto, pouco se preocupou com o cinema brasi­ delinear um quadro do cinema nacional leiro durante a década de 40 e meados da tal como se apresentava na passagem dos seguinte, apesar de se interessar muito por anos 30 para os anos 40 — quadro este filmes. "Quando a gente fundava um clu­ sombrio, desolador. No início da década be ou uma revista", acrescentou, "é claro de 30, o cinema nacional tem uma produ­ que obedecia-se ao ritual de interesse por ção bastante reduzida. Passam-se, às ve­ produto nosso: pura retórica sem qual­ zes, anos inteiros sem que um único filme quer conseqüência" (10:137). No enten­ seja realizado. E durante todo esse tempo, der de Paulo Emílio, "...o melhor crítico se "... a atividade cinematográfica não de cinema que apareceu naqueles tempos desapareceu completamente, isto se deveu foi Ruy Coelho, que publicou muito em à produção de documentários e cine- revista e jornal". Em um artigo publicado atualidades, sustentada pela lei da obriga­ no Diário de São Paulo (5), Ruy Coelho toriedade de exibição dos complementos escreveu que pretendia assistir a pelo me­ nacionais" (7:7). Com o advento do Esta­ nos um dos dois filmes nacionais que esta­ do Novo, o D.I.P. (Departamento de Im­ vam sendo exibidos em São Paulo, a sa­ prensa e Propaganda) e os D.E.I.P.s (De­ ber, "Corações sem Piloto" e "Romance partamentos Estaduais de Imprensa e Proibido" — este último dirigido por Ad- Propaganda) monopolizam a produção hemar Gonzaga. Aconteceu que o crítico dos jornais cinematográficos, absorvendo passou por acaso frente ao "Metro" e viu ou aniquilando os concorrentes — con­ as fotografias do filme: "Confesso que correntes esses que também se dedicavam, desanimei. Retrocedi e fui até o 'Bandei­ direta ou indiretamente, ao filme de pro­ rantes' para estabelecer uma comparação paganda, que era a base de sustentação do com 'Corações sem Piloto'. Recuei hor­ cinema nacional. Segundo Maria Rita, no rorizado". Nas palavras de Paulo cômputo geral, além dos jornais cinema­ Emílio, "seu tema naquele dia foi a não tográficos e de documentários, "...temos ida ao cinema: primeira e única vez que um filme em 1935, outro em 1939, mais em artigo seu o filme brasileiro, embora outro em 43 e outro ainda em 46, e dois não visto, foi assunto." em 49. Meia dúzia de filmes em 15 anos". E mais: em São Paulo, praticamente só se Num quadro como o que acabou de exibiam filmes americanos, pois durante a ser descrito não é de se estranhar que real­ Guerra a distribuição do produto europeu mente fosse visto como qualquer coisa 129 CATANI, AM — Vinícius de Moraes, critico de cinema Perspectivas, São Paulo, 7 127-147, 1984

meio insólita o fato de um poeta já pre­ dos de água. Era indizivelmente bom. miado e de certo nome, como Vinícius de Com um simples olhar podia vigiar a ca­ Moraes, preocupar-se com cinema. sa, cuja janela deixava apenas encostada; mas por mero escrúpulo. Ninguém nos vi­ Vinícius: breve trajetória ria nunca fazer mal. Éramos gente queri­ "Nós éramos todos 'de direita'. da na Ilha, e a afeição daquela comunida­ Torcíamos pela vitória do fascimo e de pobre manifestava-se constantemente líamos Nietzsche como quem vai em peixe fresco, cestas de caju, sacos de morrer. 'Escreve com teu sangue e manga-espada. E em breve perdia-me na­ verás que teu sangue é espírito!' quela doce confusão de ruídos... O sus­ Ah, como amávamos essa palavra surro da maré montante, uma folha seca sangue Ah, que conteúdo tinha de amendoeira arrastada pelo vento, o para nós essa palavra espírito... De­ gorgulho de um peixe saltando, a clarine­ pois eu cresci e vi que não era nada ta de meu amigo Augusto, tuberculoso e disso..." insone, solando valsas ofegantes na dis­ Vinícius de Moraes tância (...) E logo voltava o mar com o "Schimdt — Na sua morte" seu marulhar ilhéu, e um peixe pulava perto, e um cão latia, e uma folha seca Marcus Vinícius da Cruz de Mello amendoeira era arrastada pelo vento, e se Moraes, ou simplesmente Vinícius de Mo­ ouvia a tosse de Augusto longe, longe. Eu raes nasceu no Rio de Janeiro, na Gávea, olhava a casa, não havia ninguém, meus em 19 de outubro de 1913, filho do casal pais dormiam, minhas irmãs dormiam, Clodoaldo e Lídia*. Clodoaldo Pereira da meu irmão pequeno dormia mais que to­ Silva Moraes era funcionário da Prefeitu­ dos. Era indizivelmente bom." (18:6-7, ra, tendo sido secretário do Prefeito Pe­ 29:110-11). reira Passos. Acabou metendo-se em vá­ rios negócios azarados, o dinheiro aca­ Clodoaldo Pereira da Silva Moraes bou, a saúde de dona Lídia Cruz de Mo­ era, nas palavras de Vinícius, um homem raes abalou-se e, em conseqüência, generoso. "Fosse ele um homem rico, e mudaram-se todos para a Ilha do Gover­ nunca filhos teriam tido mais. Sempre me nador. A partir de 1922, Vinícius perma­ lembra os Natais passados na pequena ca­ neceu no Rio, sob cuidados dos avós, pa­ sa da Ilha do Governador, e a maratona ra prosseguir nos estudos. Isso lhe permite que fazíamos, meus irmãos e eu, quando passar férias e fins de semana na ilha, on­ o bondinho que o trazia do Galeão,onde de aprende a nadar sozinho, em convívio atracavam as barcas, rangia na curva e se com os filhos de pescadores, de quem lo­ aproximava bamboleante e cheio de luzes, go se torna o líder, arteiro e inventador de do ponto de parada junto à grande amen­ modas — uma delas, as competições de doeira da Praia de Cocotá. Eram pencas "plantar bananeiras", de que foi cam­ de presentes, por vezes presentes de pai peão inconteste (17:7). Segundo o próprio abastado como o jogo de peças de armar, Vinícius, "às vezes, no calor mais forte, certamente de procedência americana, eu pulava de noite a janela com pés de ga­ com que me regalou e com que construí, to e ia deitar-me junto ao mar. anos a fio, pontes, moinhos, edifícios, Acomodava-me na areia como numa ca­ guindastes e tudo o mais. E os fabulosos ma fofa e abria as pernas aos alíseos e ao Almanaques do Tico-Tico, lidos e relidos, luar, e em breve as frescas mãos da maré e de onde, uma vez exaurida a matéria, re­ cheia vinham cocar meus pés com seus de­ cortávamos as figuras queridas de Gibi,

* As principais informações sobre Vinícius aqui utilizadas foram obtidas nas seguintes fontes Bosi (1), Pasquim {3D, arti gos de Ferreira Gullar, Sergio Cabral, Tank de Souza, David Neves e Ferdy Carneiro, Isto £(13), artigos de Benicio Medei ros e Franklin de Oliveira, Folha de S Pauto{6), artigos de Isa Cambara, Dirceu Soares, Walter Silva, Nogueira Moutinho e Miguel de Almeida, Resende (32), Moisés (16), Moraes (17, 18, 24, 25, 27, 28 e 29) 130 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, critico de cinema Perspectivas, São Paulo, 7 127-147. 1984

Chiquinho, Lili e Zé Macaco"*. Seu pai ou Morena", com Haroldo, que seria gra­ foi um poeta inédito, pós-parnasiano, vado em 1932. "com um pé no simbolismo". Era conto 1933: Vinícius de Moraes, bacharel familiar que Olavo Bilac, seu amigo, em Direito. Interesse em fazer carreira aconselhou-o a publicar seus versos. Além nesta área? Nenhum. Ao que consta, en­ disso, o velho Clodoaldo era, também, to­ trou na Faculdade de Direito do Catete cador de violão e cantador de modinhas; mais para acompanhar seus amigos Rena­ dona Lídia tirava tangos do piano; idem to Pompéia e Moacyr Velloso e para fazer quanto ao seu avô. E seu tio mais moço, um curso superior do que por qualquer Henrique de Mello Moraes, boêmio e se- outro motivo. Tanto foi assim que só resteiro, vira e mexe baixava na Ilha com agüentou um mês de Fórum. Entretanto, o grande amigo, o compositor Bororó e os anos de Faculdade lhe valeram pelas mais dois violões. Quando não havia sa- amizades (Octávio de Faria, o romancista rau de música o jovem Vinícius abria o da Tragédia Burguesa, San Thiago Dan­ Thesouro da Juventude e ia copiando ou tas, Thiers Martins Moreira, Antônio imitando as poesias que encontrava** Galloti, Gilson Amado, Hélio Viana, (25:3). Assim, os concorridos saraus mu­ Américo Jacobina Lacombe, Chermont sicais em família, bem como a intensa lei­ de Miranda, Almir de Andrade, Plínio tura e cópia de poemas desde a infância, Doyle e tantos outros), pela iniciação nas marcaram-no por toda a vida. rodas boêmias e literárias, pelas perspecti­ vas de vida que então se lhe abriram Em 1924 Vinícius passou a freqüen­ (17:49,63-4). Por tudo, menos pelo inde- tar o Colégio Santo Inácio, dos jesuítas, sejado saber jurídico. Octávio de Faria, que seria bastante importante em sua for­ líder intelectual católico, se tornaria gran­ mação cultural, pois foi lá que suas habili­ de amigo de Vinícius e iria influenciar o dades se desenvolveram e onde conheceu começo de sua carreira literária, pois gra­ dois grandes amigos: Moacyr Velloso ças a ele publicou em outubro de 1932 seu Cardoso de Oliveira e Renato Pompéia da primeiro poema — "A transfiguração da Fonseca Guimarães. "De início, ouvido montanha" —, na revista "A Ordem", afinado, o coro da igreja; depois, o fute­ editada por Tristão de Athayde (cunhado bol (...jogava na linha...) e várias modali­ de Octávio). Foi também graças a Octávio dades de atletismo, em que se distinguiu. que publicou seu primeiro livro de poe­ E também ganhou muitas medalhas e sias, "O Caminho para a Distância". É o menções honrosas em Português, Histó­ próprio Vinícius quem conta: "Eu tinha ria, Ciências... mas nunca em Matemáti­ 19 anos quando, em 1933, pela mão de ca! (...) O que mais o atraía eram os espe­ Octávio de Faria, fui pedir-lhe (a Augusto táculos teatrais do colégio... participava Frederico Schmidt) para distribuir meu de todos, fazendo um pouco de tudo: can­ primeiro livro de versos. Encontrei-o à tar, tocar, representar, apresentar, dirigir, porta de sua livraria, na antiga Rua Sa­ e por aí vai..." (16:7). Além disso, refina chet, e seu volume físico oprimiu o meni­ seu gosto pela poesia e liga-se mais à mú­ no magro que eu era. Olhou-me com in­ sica popular. Já aos 15 anos forma com os tensidade e disse: Mas é uma criança... irmãos Paulo e Haroldo Tapajós um con­ Aquilo me deu raiva. Deu-me, sim, por­ junto que tocava em festinhas familiares, que eu me achava um gênio e meus ami­ e em seguida compõe o fox-trote "Loura gos mais próximos também não faziam

* Ver a crônica "O Dia do Meu Pai", escrita originalmente em 30 de julho de 1959, ocasião do nono aniversário que Cio doaldo, " homem pobre mas de ilustre estirpe, desincompatibilizou-se com este mundo" Tal crônica encontra-se em Mo raes(29 31-3) Ha, também, "O Aprendiz de Poesia", em Moraes (28 79-84), onde são fornecidas outras informações sobre seu pai ** O futuro poeta também plagiaria — "primeiro timidamente, depois como um possesso" — Castro Alves ("companheiro de meu tio-avô Mello Moraes Filho"), Olavo Bilac, Guilherme de Almeida, Menotti dei Picchia, Antero de Quental, luho Dantas e Casimiro de Abreu, entre outros Ver a respeito a ja citada crônica "O Aprendiz de Poesia" 131 CATAN1, A.M. — Vinícius de Moraes, crítico de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7:127-147, 1984.

por menos. Para Octávio, que orientava na) e para uma valsa ("Canção para Al­ meus primeiros passos literários, eu era — guém", música de Haroldo Tapajós), am­ embora sem nenhuma influência direta, bos gravados pela RCA Victor. "A partir pois mal me iniciara na leitura dos poetas daí, embora a música fosse anterior em modernos — o continuador de Schmidt, o suas predileções, o jovem bacharel contra jovem acólito de sua missa poética. Aque­ a vontade dedicar-se-á inteiramente à poe­ la missão secundária feria-me os brios sia, só voltando à canção (...) 19 anos de­ porque me parecia que eu partira de mim pois (1952), com 'Quando tu passas por mesmo, de minhas próprias fontes, e não mim', em parceria com Antônio Maria, devia nada a ninguém. Mas, depois de lê- gravação de Dóris Monteiro. O fato é que lo, eu me pusera a admirá-lo também... nos anos 30 e 40 Vinícius conhece a glória (28:135-6). literária" (16:6). Nas linhas que se seguem Afirma o poeta que, logo depois, al­ tentarei esboçar, ainda que brevemente, guns poucos anos, viria a guerra, e "nós sua trajetória poética até o início dos anos éramos todos de 'direita' . Torcíamos pe­ 40. la vitória do fascismo e líamos Nietzsche De acordo com Alfredo Bosi, a reno­ como quem vai morrer (...) Depois eu vação da literatura cristã, "... que nos cresci e vi que não era nada disso. Vi que anos 30 contou com os nomes de Ismael nem eu era gênio, nem queria destruir coi­ Nery, Jorge de Lima, Augusto Frederico sa alguma. Queria era namorar, conversar Schimidt, Octávio de Faria, Vinícius de com os amigos, tomar sol na praia, empi­ Moraes, Trisão de Ataíde e outros, teve lhar fichas de chope e escrever palavras (...) raízes neo-simbolistas francesas. Um simples. E fui me afastando... Mas, vira e Péguy, um Bloy, um Bernanos, um Clau- mexe, encontrava Schimdt. Em São Pau­ del dariam temas e formas ao novo catoli­ lo, num cais em Montevidéu, em Mont- cismo latino-americano que neles e nos martre, na Rua Cupertino Durão. Então ensaios de Maritain viu uma ponte segura ele me pegava, dava-me o braço e me di­ entre a ortodoxia e algumas formas mo­ zia: —Vem comigo. Estou precisando dernas de pensamento (Bergson), de pra­ muito conversar com você... E eu ia. Uma xis (democracia, socialismo) e de arte" vez foi para poder atribuir-me a culpa da (1:499). Quanto a Vinícius de Moraes, es­ ingestão de meia lata de goiabada que co­ pecificamente, Bosi afirma que seus pri­ meu em casa, pobrezinho, alucinado que meiros livros** também foram escritos sob estava por uma dieta de fome a que o sub­ o signo da religiosidade neo-simbolista metia a sua Musa, que o queria esbelto e que marcou o roteiro de Schmidt. Contu­ elegante. Foi também em sua casa que co­ do, ... a urgência biográfica logo deslocou nheci Jayme Ovalle, o grande, o eterno o eixo dos temas deste poeta lírico por ex­ amigo"*(28:136-7). celência para a intimidade dos afetos e pa­ Na época do lançamento de "O Ca­ ra a vivência erótica. Vinícius será talvez, minho para a Distância" (Schmidt Edito­ depois de Bandeira, o mais intenso poeta ra, 1933) — obra que continha 40 poemas erótico da poesia brasileira moderna. em que predomina a preocupação mística Tratando-se, porém, de um sensualismo e de fundo religioso — Vinícius vivia da contratado ab initio pelas reservas de uma mesada dos pais e aproveitando o tempo educação jesuítica, o poeta oscila entre as livre escreveu letra para um fox ("Dor de angústias do pecador e o desejo do liberti­ uma Saudade", com música de S. Medi­ no. O fato é interessante porque inter-

* Sobre Octávio de Faria ver, "O Aprendiz de Poesia", especialmente a p.82: "Uma noite — eu tinha 17 anos — Octávio de Faria e eu fomos tocando a pé da Galeria Cruzeiro até a Gávea, onde ficava minha casa, na rua Lopes Quintas. Não era in- frequente fazermos isso, ã base da conversa. Era um hábito da amizade entre o calouro c o veterano da Faculdade de Direito do Catete, aquele passeio noturno povoado das sombras de Nietzsche e da pantomima de Chaplin". ** Os primeiros livros de Vinícius são justamente aqueles onde se percebe, de forma mais pronunciada, sua preocupação mística e religiosa. São os seguintes: O Caminho para a Distância (20); Forma e Exegese (23); Ariana, a Mulher(19) e Novos Poemas(2(t). 132 CATAM, A.M — Vinícius de Moraes, critico de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7 127-147, 1984.

vém no modo de escrever de Vinícius, que ças e, no seu caso, de uma ênfase muito passou do verbalismo túrgido de Forma e mais adolescente, do que poética (...) Des­ Exegese (1935) para a linguagem direta e cendo ao concreto, o poeta faz as pazes ardente das Cinco Elegias (1943) e dos com a vida. Caminha para assumir a sua Poemas, Sonetos e Baladas (1946); de naturalidade. Livra-sedas penas de pavão uma e de outra obra pode dizer-se que tra­ e de águia que se tinha acrescentado. Já duzem, às vezes superiormente, as vicissi­ não é uma ave do paraíso. Não mais ne­ tudes do amor na sua condição carnal" cessita de exacerbar, por vangloria de (1:510-11). super-homem, as razões de sua angústia. Otto Lara Resende, em "O Caminho Ao contrário, procura apaziguá-las. Des­ para o Soneto" (32) comenta que O Ca­ cobre o chão em que pisa, encara o coti­ minho para a Distância é um livro, "... a diano e não se envergonha (...) de falar começar pelo título, embriagado pela ver­ como todo mundo, tão coloquial quan­ tigem das grandes abstrações e das gran­ to... Manuel Bandeira (que de resto lhe des alturas, com invocações ao Espírito e fornece a epígrafe para aquele livro: 'To­ à Verdade. Em 1935 aparece Forma e dos os ritmos, sobretudo os inumerá­ Exegese, que "respira o mesmo estro que veis' ). A poesia já não é desdenhosa; não O Caminho para a Distância, mas é ainda é contra, mas a favor; não se derrama em mais ambicioso, mais altissonante, mais apóstrofes nem se despenha em cascatas pomposo. O poeta espraia-se num ritmo espumejantes para inglês ver; nasce do en­ solene, é um sacerdote que, do alto de sua contro e não do conflito, da aliança e não sapiência, fala à turbamulta, sem com ela do atrito. Poeta e cidadão se encontram, confundir-se". Foi com este seu segundo entendem-se, falam a mesma língua " livro, Forma e Exegese, que Vinícius ga- (32:7-9). E a mulher também começa a se nho" o prêmio Felippe de Oliveira, uma encarnar, a tornar-se gente, companheira espé '~ concurso nacional de literatura. e amiga ("não é mais uma transfiguração Venc disputando palmo a palmo com perturbadora e etérea — espécie de fan­ Jorge imado, sendo seu livro muito co­ tasma inexistente de um castelo que tam­ menta Jo. bém não existe"). Vinícius "volta-se para Em 1936 surge Ariana, a Mulher que, o tempo presente, esquece as profecias de segundo o próprio autor, encerra "a sua timbre apocalíptico (...) Os poetas intelec­ fase transcendental, freqüentemente tuais franceses e os poetas medievais in­ mística", ao que Otto Lara Resende gleses fazem parte de uma aventura espiri­ acrescenta: "transcendental, sim: mística, tual encerrada. Pablo Neruda, sensual e nem tanto, a menos que se tome a palavra social, e Garcia Lorca, valorizado pelo no sentido vulgar, de 'alegórico' , ou 'e- martírio, tornam-se familiares. Vinícius sotérico' , e que estará mais próxima de veste-se sob medida, põe-se à vontade um juvenil mistifório do que de um misti­ dentro de um lirismo que, sobretudo a cismo contemplativo. A"verdade, porém, partir de Cinco Elegias (1943), está mais é que Ariana, mais do que o sotaque anti­ solto, mais desenvolto. Os largos versos go, guarda ainda a opulenta retórica da de largo fôlego despem a sua adjetiva pur­ primeira fase e nela assenta como a luva à pura de nobreza perfunctória — e duvido­ mão" (32:6-7). Otto afirma que a data da sa. O poeta multiplica os seus ritmos, e mudança que se operou não pode ser fixa­ persegue a sua substância, desvenda os da com precisão mas seguramente, já a próprios temas " (32:9). Bem distante, partir de Novos Poemas (1938). "O poeta portanto, do ritmo largo, claudeliano, ou, deixa de fazer pose: cedo enjoa de orgu­ nas palavras de Otto, "brasileiramente lhosas inquietações mais ou menos posti­ schmidtiano", dos trabalhos iniciais."

* Acredito não ser demais enfauzar que Vinícius foi bastante influenciado pelo debate literario-ideologico que se tratava, a partir de 1928, no Centro Dom Vital (Rio de Janeiro) Vinícius, desde sua eslreia, vai estar ligado ao grupo que participava das discussões grupo de ideais neo-simbohstas, de atitude conservadora, com fone impregnação religiosa 133 CATANI, AM — Vinícius de Moraes, critico de cinema Perspectivas, São Paulo, 7 127-147. 1984

1936, outro ano importante para Casado e com uma filha para criar, Vinícius de Moraes. Às vésperas do Esta­ Vinícius começou a se virar, tentando em­ do Novo o poeta conhece dois grandes pregos em jornais, escrevendo para revis­ poetas, que se tornarão seus grandes ami­ tas, até conseguir o lugar de redator do gos: Manuel Bandeira e Carlos Drum- Suplemento Literário de A Manhã, escre­ mond de Andrade. E mais: foi em 1936 vendo também a crítica cinematográfica que conseguiu seu primeiro emprego, ao do mesmo jornal. Colaboravam no substituir Prudente de Morais Neto, como Suplemento, Ribeiro Couto, Manuel Ban­ representante do Ministério da Educação deira, Cecília Meireles e Afonso Arinos de junto à Censura Cinematográfica. Verda­ Mello Franco, sob a orientação de Múcio de ou não, sempre jurou que nunca censu­ Leão e Cassiano Ricardo — isso em 1941. rou nada. Estava Vinícius com 23 anos e Mas tal emprego não lhe dava dinheiro o permaneceria como funcionário do Esta­ suficiente para o sustento da família, do, na função de censor, até 1938. E Lae- levando-o a arrumar um outro emprego: titia, sua irmã, quem conta que ainda em um cargo burocrático no Instituto dos 1938, "... e à base de seus livros O Cami­ Bancários. E, a conselho de Oswaldo Ara­ nho para a Distância e Forma e Exegese, nha, começou a se preparar para prestar este último contemplado com o prêmio concurso para o Itamarati, cujo ingresso Felippe d'Oliveira, Vinícius pleiteou e ob­ se deu apenas em 1943, após uma anterior teve do British Council uma bolsa de estu­ tentativa frustrada.* dos, de dois anos, em Oxford..." entran­ Dessa maneira, para o objetivo do do em contato mais íntimo com os poetas presente artigo — destacar a importância ingleses (Shelley, Keats, Yeats, Coleridge da participação de Vinícius na crítica cine­ e, logicamente, Shakespeare) que, segun­ matográfica do início dos anos 40 —, a do ele, o ajudaram a se tornar mais conci­ breve trajetória do poeta aqui delineada, so e mais enxuto em seus próprios poe­ apesar de não exaustiva, parece-me sufi­ mas. "Com a explosão da Guerra em ciente. Entretanto, apenas mais dois ou 1939, foi forçado a desistir da metade da três destaques precisam ser feitos. O pri­ bolsa, principalmente por já estar casado meiro diz respeito às relações que Vinícius e sua mulher à espera da criança que seria manteve com os aparelhos de Estado, ini­ Susana (...) Casara-se Vinícius por procu­ cialmente como censor e, posteriormente, ração, com Beatriz Azevedo de Mello, de como diplomata. A exemplo de outros co­ uma (...) família de São Paulo, moça a legas escritores tais como Carlos Drum- quem viemos conhecer pouco antes de seu mond de Andrade, Guimarães Rosa, casamento realizado aqui no Rio, em uma Cecília Meireles, João Cabral de Melo simples cerimônia civil. Chegando ao Bra­ Neto, Manuel Bandeira e Murilo Mendes, sil, sem emprego, pois tiveram de abando­ entre outros, essa vinculação com o Esta­ nar, com sua ida à Inglaterra, o lugar de do através de empregos burocráticos pos­ Censor Cinematográfico que ocupava en­ sibilitou uma continuidade em sua produ­ tão, foi morar — depois de breves está­ ção literária e no caso específico de gios na casa de uma cunhada e em nossa Vinícius, literário-musical**. Um outro casa — num pequeno apartamento da destaque deve, necessariamente, chamar a Rua das Acácias, onde nasceu Susana" atenção para o fato de que a formação ca­ (17:55-6). tólica e burguesa de Vinícius, ainda sólida

* Sua irmã Laetitia afirmou que "depois de longos meses de estudos intensos (Vinícius) submeteu se, em 1941, a concurso para o Itamarati O habito, como censor, de assinar toda a papelada dos filmes, levou o a fazer o mesmo em uma das provas eliminatórias, desclassificando-o Não desanimou No ano seguinte, apresentou-se novamente a concurso, sendo classifica­ do e nomeado em 1943" (17 57) Sobre esse período de muito trabalho e estudo e pouco dinheiro Vinícius escreveu que ' ali a esquerda ficava um antigo apartamento onde eu morei Naquele tempo eu ganhava 900 mil-reis por mês e estudava para o concurso do Itamarati Dava apertado, mas dava" (28 97-8) **Ver, sobre a vinculação que os intelectuais mantêm com os aparelhos de Estado, a cuidadosa pesquisa de Sergio Miceli (15), bem como outros dois bons ensaios o de Antônio Cândido (3) e o de Walnice Nogueira Galvão (8)

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naquela época, lhe dava a convicção de pois ela marcou a sua "encarnação" na que "... não havia nada de errado nisso realidade, saindo de um universo mental (no Estado Novo — 1937/1945). Se não em que predominavam as idéias abstratas, chegava a ser a favor da ditadura, era-lhe desvinculadas de qualquer chão social. pelo menos, indiferente" (16:6). Assim, Em suma, no início dos anos 40 — além de seus citados "amigos de direita", mais especificamente a partir de 1941, alguns dos quais ex-integralistas* conhe­ quando Vinícius de Moraes começa a fa­ ce entre outros, o poeta Pablo Neruda, zer crítica de cinema — vai-se encontrar com quem mantém generosas relações de um Vinícius ainda "de direita", com for­ amizade, o qual, de direitista e integralista mação católica arraigada e, esteticamen­ nada tinha — até que muito pelo contrá­ te, comungando as idéias cinematográfi­ rio. Finalmente, segundo suas próprias cas defendidas há pouco mais de uma dé­ declarações, em 1942 ocorreu um fato que cada antes por seus amigos do "Chaplin- muito contribuiu para a evolução de suas Club". idéias políticas e também para um maior contato com a realidade brasileira. Sua primeira esposa, Beatriz, brigava muito Cinema, arte da imagem ... muda com ele na tentativa de modificar sua vi­ são de mundo. "Foi aí que apareceu o es­ "Você ama o cinema mudo como se critor americano Waldo Frank na vida de ama uma mulher... muda. E isto é Vinícius. O homem estava no Brasil em lindo, Vinícius, é positivamente lin­ missão oficiosa (ia escrever um livro que do!" interessava ao Departamento de Estado) e os dois se conheceram num coquetel ofe­ Manuel Bandeira recido por José Olympio, do qual saíram meio bêbados, indo visitar a zona do me­ Conforme salientei na primeira parte retrício. O americano ficou entusiasmado deste trabalho, o cinema discutido pela in­ com a oportunidade de fazer um turismo telectualidade paulista ligada ao "Clube menos convencional e depois de outros de Cinema da Faculdade de Filosofia" e à encontros — de morro e batucada — com revista Clima**, no início dos anos 40, era Vinícius quis sair pelo Brasil afora" o cinema estrangeiro. Por outro lado, no (25:3). E saíram. Realizaram uma longa Rio de Janeiro, com exceção dos debates viagem pelo Nordeste, cujo roteiro in­ realizados no Chaplin-Club na última me­ cluiu, principalmente, as zonas portuá­ tade dos anos 20, não se tem registro de rias, favelas, rodas de samba, alagados, e discussões semelhantes, até que no final por aí afora. Após um mês de andanças do primeiro semestre de 1942 se inicia, chegaram ao Amazonas. "Tenho a im­ graças a Vinícius de Moraes, a polêmica pressão de que, de repente, descobri que "Cinema Mudo" versus "Cinema Fala­ tudo era besteira. Tomei conhecimento da do". Maria Rita Galvão coloca com pre­ realidade brasileira. E quando terminei a cisão o "atraso" estético em que se vivia, viagem, tinha mudado completamente a ao destacar que o cinema debatido na minha visão política " (16:6). De acordo época, no Clube de Cinema, não era o ci­ com a "Cronologia da Vida e da Obra", nema atual, mas aquele dos anos 20. "O inserida em sua Obra Poética, a partir que nos dá concretamente a idéia da lenti­ dessa viagem com Waldo Frank, torna-se dão com que se desenvolvia o pensamento "... um antifascista convicto" (16:66) cinematográfico no Brasil é o fato de que

* Outro grande amigo de Vinícius, também ex-integralista e que seguiu a carreira diplomática foi Lauro Escorei " meu mui caro, leal e valoroso amigo ' ), Secretario de Embaixada em B A (Buenos Aires), ( ) o ensaísta de O Pensamento Político de Maquiavel "(28 36) ** Para se obter maiores informações acerca da revista, ver (2) Apenas a titulo de esclarecimento, os 16 números de Clima circularam no período compreendido entre abril de 1941 e novembro de 1944, sendo de I 000 exemplares a tiragem da revis-

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a grande polêmica 'Cinema Mudo' ver­ se confunde, identificação real do homem sus 'Cinema Falado' se deu aqui precisa­ e do cineasta, grande exemplo de sinceri­ mente nesta época: início dos anos 40, pe­ dade humana e lealdade artística. Chaplin lo menos uma década depois de o resto do e o Cinema: cenário, direção, ação, mon­ mundo ter resolvido a questão" (7:35). tagem. Não há dilemas" (21). Entretanto, antes de se falar da referida E o crítico confessa-se "... um apai­ polêmica é indispensável acompanhar as xonado do Cinema" e que viu "Luzes da idéias centrais de Vinícius relativas ao ci­ Cidade" mais de vinte vezes — "aliás não nema. seja por isso, porque Octávio de Faria viu mais de trinta". Em seguida pondera que o Cinema (sempre maiúsculo!) sofre "o A herança do Chaplin-Club* mal das pequenas elites, ai de nós, encer­ radas na torre de marfim da sua sapiên­ Vinícius de Moraes apresenta-se aos cia. É preciso que cada um dê um pouco leitores de "A Manhã" em 8/agosto/1941 do que sente, do que crê sinceramente ori­ com um artigo intitulado "Credo e Alar­ ginal em si, em benefício do grande públi­ me", onde expõe suas idéias cinematográ­ co viciado em não se preocupar. Em ma­ ficas. Afirma: "Creio no Cinema, arte téria de Cinema, o público brasileiro — e muda, filha da Imagem, elemento original que me perdoe ele a rudeza, pouco do de poesia e plástica infinitas, célula sim­ meu hábito — é de uma ignorância a toda ples de duração efêmera e livremente mul- prova. A necessidade vital é ir ao cinema, tiplicável (...). Creio no Cinema puro, esquecer por duas horas as coisas da vida branco e preto, linguagem universal de al­ no curso suave de imagens que sugerem. to valor sugestivo, rica na liberdade e po­ Se o público — uma parte que seja — (...) der de evocação. Creio nesse cinema. Em aprender a aclamar e protestar, e se recu­ qualquer outro, o que transige com o sar a um certo gênero de explorações que som, a palavra, a cor, não posso e não são um escárnio à sua inteligência quem quero crer. Aos que me chamarem de sabe os produtores e distribuidores, por atrasado ou intransigente direi que prefiro prudência e por decência, achassem me­ o meu atraso e intransigência à facilidade lhor não lutar contra força tão poderosa com que se acomodam às formas corrup­ como o público e (...) dessem uma peque­ tas da vida e da arte. Aos que me acusa­ na ajuda e fizessem o Cinema voltar àque­ rem de deslealdade para comigo mesmo le bom tempo em que se podia ir de olhos por aceitar a responsabilidade de uma fechados, 'sans blague', a três ou quatro crítica do cinema como hoje é feito — de­ filmes por semana, na certeza de que se turpado do seu melhor sentido pela mer- iria ver senão arte, pelo menos esforço cantilização crescente — direi que ainda artístico". me resta uma esperança cega de vê-lo vol­ Em suas considerações finais comen­ tar à origem, à Imagem em simples conti­ ta a nossa incultura — "pois deixe ela de nuidade, ao jogo pródigo de sombras e existir". Em Londres ou em Paris qual­ claridades, ao ritmo interior, à Poesia que quer cinema de vanguarda, qualquer clu­ o fecunda, à Música que o envolve, à Pin­ be de cinema, onde quer que haja um ve­ tura que o delimita, à Arquitetura que o lho clássico dós tempos mudos ou não im­ constrói, à Palavra que o comanda, e que porta que bom filme, ali está gente de to­ milagrosamente se ausentaram para dei­ da ordem apreciando, discutindo, dando xar vivo o que de exato se chama Cinema'.' de comer à arte. Por que nos considerar­ "Nesse Cinema creio, só ele me satis­ mos pior? E se o somos agora, mais uma faz e só ele me parece conter em si de que razão para deixar de sê-lo." E conclui acrescentar ao Conhecimento. E creio em afirmando: "eis o que proponho: uma Chaplin, seu criador máximo, que com ele reação. Já temos bons críticos e sinceros.

* Boa parte das idéias contidas neste tópico foram extraídas de Xavier (28).

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Comecemo-la ajudados pela confiança do Sússekind Rocha, lutando durante anos público que apoia as boas iniciativas." no importante trabalho de recuperação do As idéias de Vinícius contidas na lon­ único filme brasileiro afinado com os ve­ ga transcrição de "Credo e Alarme" lhos ideais — Limite, de Mário Peixoto (principalmente no início do artigo) se as­ (1930)."* (34:201) semelham em muito àquelas propagadas Afirma-se, no órgão oficial do no final dos anos 20 pelos então rapazes Chaplin-Club, que os filmes falados não do Chaplin-Club através do FAN, seu ór­ são dignos de serem discutidos. Assim, o gão oficial. De acordo com Ismail Xavier, jornal protesta contra a "imbecilidade do o Chaplin-Club foi fundado no Rio de Ja­ público" que os aceita e dá uma breve de­ neiro em 13 de junho de 1928 e tinha um finição dos talkies: cinema falado = tea­ objetivo bastante claro: "o estudo do ci­ tro. Ismail destaca que Almir Castro man­ nema como uma arte". (Art. 3.° dos seus tém uma confiança inabalável na "ima­ estatutos). Em agosto de 1928 saiu o pri­ gem toda poderosa" e o jornal "não faz meiro número do FAN, onde se afirma senão repetir sua fé na expressividade ex­ que existe um único caminho válido a se­ clusiva da imagem, numa atitude que se guir e "nesse caminho nós sempre estare­ manifesta até na sua figura mais teórica, mos... como ele (Chaplin) sempre está..." Octávio de Faria..." (34:202). (alusão ao cinema mudo). I. Xavier co­ Chaplin é invocado o tempo todo e menta que "estamos em 1928 e a sombra definido no n.° 6 (setembro/1929) como do falado mobiliza em todo o mundo a "... o maior criador que a humanidade campanha de idealistas em defesa da arte produziu até hoje". E "a convicção da do silêncio. Na América, um cineasta lide­ superioridade de Chaplin em relação a rava a heróica resistência, proclamando a qualquer outro artista de todos os tem­ sua fidelidade teórica e prática ao filme pos, alia-se à convicção do cinema mudo mudo: Charles Chaplin. No Brasil, justa­ como forma superior de expressão dos mente quando as discussões tomam cor­ sentimentos humanos. A confiança na po, é criado o cineclube de Octávio de Fa­ derrota do falado tem seu maior sustentá- ria, Plínio Sússekind Rocha, Almir Cas­ culo no próprio mito: 'Se Carlitos falar, tro e Cláudio Mello. O nome de Chaplin eu me calarei!" (Cláudio Mello). batiza uma "instituição brasileira" que Além disso, Octávio de Faria e Almir comprometeu sua existência na batalha Castro já se haviam pronunciado contra contra o filme falado, publicando o últi­ qualquer som nos filmes, e até reclamado mo número do FAN em dezembro de contra a orquestra. "Para eles, esta foi 1930, abandonando a arena depois de sempre um grande mal, criador do pre­ dois anos de intensa pregação em nome da conceito da não autonomia da imagem na arte do preto e branco e do silêncio. Os produção da emoção. Som e imagem são talkies ganham a guerra, o cinema fala e o irreconciliáveis. "** FAN silencia." (34:200) Para Octávio de Faria, invocando os Foram publicados apenas nove nú­ teóricos do cinema do momento — por meros do FAN, e que depois de 30, os jo­ exemplo René Schwob e Murnau —, o vens do Chaplin-Club raramente se pro­ maior pecado dos filmes de sua época era nunciaram publicamente sobre cinema, a presença de letreiros. ("Confissão de in­ "... embora não deixassem de capacidade do scenarista"). Segundo Is­ acompanhá-lo, escrevendo ou ensinando, mail, para Octávio, os letreiros "... esta­ pesquisando e exibindo clássicas obras- vam incondicionalmente entre os recursos primas. Ou, como foi o caso de Plínio proibidos, anticinematográficos. Sob pre-

* Vinícius de Moraes considera Limüeo "ponto culminante" do cinema brasileiro (22) ** Cumpre destacar, para se ter uma referência sobre idade, que Octávio de Faria tinha 20 anos em 1928, e Plínio Sússekind Rocha, por exemplo, era pelo menos 2 anos mais moço do que Octávio. (34.203, 220, 225). Grifos meus. 137 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, crítico de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7:127-147, 1984.

texto algum deveriam ser usados...". Para zer meio caminho andado. Este grande o principal teórico do Chaplin-Club, o físico brasileiro, um dos fundadores do fundamental era excomungar os letreiros Chaplin-Club, e que é também um dos a todo custo. "Dentro desta visão, Mur- homens mais inteligentes com que tratei, nau é o grande modelo. A confecção do conhece Cinema que não é brinquedo, e o roteiro deve obedecer à regra: 'A estória conhece naquilo que ele tem de mais deve ser contada pela câmara'. E Octávio difícil e sutil — o seu sentido, por assim acrescenta: exclusivamente pela câmara, dizer, matemático de construção. O Sr. sem cortes, dentro da teoria da 'continui­ Paulo Emílio, sente-se, não quer desmere­ dade absoluta' . A produção cinemato­ cer de tão boa direção. Trabalha com gráfica fica reduzida ao binômio roteiro afinco, com amor, sequioso de decifrar (visualização)/filmagem (materialização tudo o que há de fundamental e legítimo do roteiro). A câmara é o único elemento na grande arte da imagem (...). A vontade técnico que lhe desperta atenção. Esta de ver é tão grande que às vezes o Sr. Pau­ concepção da prática, reduzida ao visuali­ lo Emílio vê demais, como no caso de zar (imagens interiores-subjetivas) e fil­ John Ford, que é indiscutivelmente um di­ mar (imagens captadas objetivamente pe­ retor de talento, mas que está longe de ser lo olho da câmara), aliada a um princípio um cineasta, e da 'Longa Viagem de Vol­ estético defensor da penetração total do ta', um grande filme fracassado por culpa espectador no universo das imagens, con­ de John Ford, que não soube montar-lhe, duz à formulação do seu ideal: a continui­ cinematograficamente, os elementos de dade absoluta." (34:248-9) continuidade " * * *. (4:13 3 -4). As influências dos teóricos do Cha­ Segundo Vinícius, isto é, em Paulo plin-Club se fazem sentir em Vinícius de Emílio, "... uma falha que o trabalho vi­ Moraes, entre outras oportunidades, por sual e o cultivo do bom Cinema — esse ci­ ocasião de seu comentário sobre o lança­ nema que é o mudo — num instante hão mento da revista Clima, tendo a seção de de ajustar". Ele não concorda com Paulo Cinema sob a responsabilidade de Paulo Emílio quanto à possível influência de Emílio.* Comentando os escritos de John Ford no filme "O Criminoso", de Paulo Emílio no segundo número da re­ Brian Desmond Hurst. "Sinto no 'Crimi­ vista — onde é realizado um balanço do noso' muito mais viva a influência dos primeiro semestre do cinema em 1941, mestres alemães, de um Fritz Lang, por ocasião (primeira e única) em que Paulo exemplo, onde me parece o próprio John Emílio comenta um filme nacional: "A- Ford deve ter aprendido muita coisa"*** ves sem Ninho", de Raul Roulien. O ou­ (4:134). tro artigo de Clima sobre cinema nacional O número 5 (outubro/1941) de Clima será de Vinícius, em agosto de 1944, no é dedicado quase que inteiramente ao fil­ qual pondera que o jovem paulista se de­ me "Fantasia", de Disney. Há artigos de dica a tarefa de crítico cinematográfico Oswald de Andrade, Sérgio Milliet, Ruy com o mesmo ardor com que havia anali­ Coelho, Almeida Salles, Flávio de Carva­ sado o filme de John Ford, "A Longa lho, Plínio Süssekind Rocha e Paulo Viagem de Volta" (Clima, n.° 1, Emílio, além de uma seção especial intitu­ maio/1941). As influências recebidas por lada "Fantasia' vista pela Imprensa", on­ Vinícius de seus amigos redatores do FAN de são transcritas as críticas realizadas por começam a aparecer quando afirma que Mário de Andrade ("Diário de São Pau­ teve uma boa surpresa ao saber o crítico lo"), Guilherme de Almeida ("O Estado paulista ter sido iniciado em cinema por de S. Paulo"), Cruz Cordeiro ("Diretri­ Plínio Süssekind Rocha*. "O que quer di­ zes") e Vinícius de Moraes ("A Manhã"

* O artigo de Vinícius, publicado em A Manhã, 6 set. 1941, foi transcrito por Clima, (4), set. 1941. ** Sobre as influências de Paulo Emílio, consultar (10 e 12). *** Grifos meus. 138 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, crítico de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7:127-147, 1984.

— 27/agosto/1941). Resumidamente, cor como nesse excelerite bailado de bi­ Vinícius não desgosta da produção de chos". O crítico não gosta da seqüência Disney. Após revê-la, segundo afirma, final, "Noite no Monte Calvo", de Mous- confirmou-se sua primeira impressão: sorgski e conclui: "Stokovski rege com a "Sempre que falta o movimento, falta tu­ perfeição e a liberdade de sempre. E tal é do ao desenho de Walt Disney (...). Falei, D desenho. Muito bom, muito ruim. Mui­ em crônica anterior, que 'Fantasia' her­ to bom, sempre que Disney volta à 'Silly dou os melhores e os piores motivos de Symphony': muito ruim, sempre que se Walt Disney. Realmente: às vezes o dese­ esforça, além da medida, na procura do nho ê tão evidentemente ruim que se torna seu novo caminho. De qualquer modo, a incompreensível a maravilha que se segue experiência é interessante. Vale para pro­ depois. O erro em si não me parece ser do var que as artes se bastam a si mesmas, e desenho: "o desenho de (...) Disney não que a arte de Walt Disney é o 'cartoon". tem pretensões artísticas. A arte nele de­ corre da movimentação: dessa harmonia A polêmica do Rio: "cinema mudo" x de valores novos que só o grande anima­ "cinema falado'' dor soube concertar, em sua peregrina­ Paulo Emílio destaca que, na realida­ ção, para o maravilhoso. O que eu acho é de, o debate cinema silencioso-cinema fa­ que Disney pecou por ambição. Sempre lado nunca se encerrou. "Perdeu apenas o que o ataca o ímpeto de descrever a músi­ brilho de 1928, 29 e 30 (...) Diante da vitó­ ca, de vê-la, em valores de 'cartoon', ele ria real dos 'talkies', os silenciosos, que fracassa. Sempre que a música lhe arranca eram cineastas profissionais, ou mudaram aquela espontaneidade de movimento, ele de tática ou capitularam, ou então foram é inexcedível. Ninguém o supera nisso. É afastados das imagens." (11) E, para ilus­ uma invenção sua, o melhor da sua cria­ trar sua afirmação, cita os casos de René ção". Vinícius vai tecendo seus comentá­ Clair, King Vidor, Murnau e Chaplin. rios e passando pela "Tocata e Fuga em René Clair "continuou sua obra em fil­ Ré Menor", de Bach; pela "antipática" mes em que o melhor de sua energia era (em sua opinião) "Suite", de Tchaikovs- usado para escamotear a voz humana im­ ki, chamada "Quebra-Nozes"; considera posta pelos financiadores do seu traba­ "esplêndida" a "Valsa das Flores" e não lho", enquanto King Vidor, depois de ter gosta do aparecimento de Mickey no tido "... esperança de que o filme silen­ "Apprenti Sorcier". "Terminando a pri­ cioso seguisse um caminho e o falado um meira parte, Disney faz, a meu ver, a ten­ outro, e a certeza de que os filmes panto- tativa mais séria do filme, embora nem mimas seriam sempre os maiores, poden­ sempre a tenha mantido igual. Do 'Rito do, além do mais, aprender com os fala­ da Primavera' de Stravinski, tira a criação dos uma boa coisa: dispensar os letreiros, do mundo, tema que sempre achei da capitulou...". Murnau, ao terminar "A mais alta poesia...". Não gostou da ma­ Turba", declarou que, "... apesar de sua neira como foi utilizada a "Pastoral" de perfeição mecânica, o cinema falado faria Beethoven, "... que transforma-se numa da tela uma edição barata do palco. Em verdadeira monstruosidade no desenho seguida, fez 'Tabu' e morreu, não tendo que Disney lhe fez. Aqui não há desculpa.- tido tempo de ou capitular completamen­ É urna total droga. Essa 'feérie' grega, te ou, quem sabe, continuar a luta duran­ com seus centauros e 'centaurettes' (...) é te mais alguns anos". Charles Chaplin, uma garrafada na cabeça no meio de uma este sim: lutou às claras e resistiu mais boa festa de carnaval. Disney não poderia tempo. "No apogeu do cinema musicado, ter sido pior (...). Na 'Dança das Horas' falado, cantado, produziu uma das obras- ele supera tudo o que já fez anteriormente primas do cinema silencioso: 'City em matéria de movimento e cômico. É as­ Lights". Finalmente, Paulo Emílio desta­ sombroso. Nunca houve tanta felicidade, ca que uma cidadela dos silenciosos foi, tanta naturalidade, tanta precisão, tanta até a derrota militar da França, o "Cercle

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de Cinema du Trocadero", onde a nova nema..." (7:36). Segundo Paulo Emílio, geração de cineastas franceses fechava um "graças à presença do agente provocador festival Charles Chaplin aos gritos de Vinícius de Moraes", discutiu-se o que se "Vive le Muet" (4:105-6). devia discutir. Vinícius, "lutando contra A polêmica também continuava a a própria timidez e dificuldade de expres­ existir "no espírito das pessoas responsá­ são verbal, conseguiu fazer com que o ei­ veis, e se manifestava no embaraço evi­ xo da polêmica fosse o problema da vali­ dente dos grandes críticos de cinema, de dade do cinema falado como arte autênti­ um Moussinac, por exemplo. Mesmo no ca. O advogado dos 'talkies' foi Ribeiro rodapé de Guilherme de Almeida (em "O Couto, e meus espiões me telefonaram do Estado de S. Paulo") aparecia às vezes Rio dizendo que, no momento e para a um certo remorso, aliás quase sempre des­ média do público presente, saiu-se com cabido, como nas saudades daquele vul­ brilhantismo." (Paulo Emílio, p. gar 'Beau Geste' silencioso..." (4:106). 106/107). Todavia, "o perverso Vinícius O crítico paulista conta que em fins não desitiu (...). Resolveu levar a coisa de maio de 1942 foi organizado na Escola para sua coluninha da "A Manhã" e, de Belas Artes do Rio um debate sobre ci­ afirmando que não sabia fazer discursos, nema, que contou com a participação de mas que quem tinha razão era ele, convi­ Orson Welles, que estava realizando fil­ dou toda gente para uma tomada de posi­ magens no Brasil — oportunidade em que ções por escrito..."* a Associação de Artistas Brasileiros con­ A polêmica do Rio reuniu dois gran­ feriu a "Cidadão Kane" o prêmio de me­ des contendores — Vinícius de Moraes e lhor filme do ano de 1941. Após a sauda­ Ribeiro Couto — além de contar com a ção ao homenageado, os seus agradeci­ participação (por escrito) nos debates de, mentos e a "apreciação artística" do fil­ entre outros, Plínio Süssekind Rocha, me premiado, têm início os debates. "En­ Manuel Bandeira, Octávio de Faria, tre os vários temas discutidos, levanta-se a Aníbal Machado, Humberto Mauro, questão de que o 'Cidadão Kane' é um Afonso Arinos de Mello Franco, Orson grande filme precisamente porque se Welles, Otto Maria Carpeaux, Mme. Fal- aproxima da estética do cinema silencio­ conetti e Álvaro Moreira. Procurarei, na so. Os protestos que se seguem dão início seqüência, apresentar uma síntese dos de­ à questão fundamental que alimentaria o bates, que se alongaram de maio a julho prosseguimento do debate: o verdadeiro de 1942, e que não contou com a partici­ cinema é o cinema mudo ou o cinema fa­ pação dos paulistas. Mas em compensa­ lado? Passa-se a discutir a essência do ci­ ção, recebeu a colaboração de mineiros,

* Ver p 107 do artigo de Paulo Emílio Nesta mesma pagina ele afirma sua intenção de preparar-se para a polêmica, pois havia sido convocado nominalmente por Vinícius O responsável pela seção de cinema de Clima acreditava, em 1942, que a questão fundamental cm cinema e o problema silencioso-falado "Acho mesmo impossível uma pessoa estudar cinema sem meditar, de inicio, sobre este ponto E, pessoalmente, penso nele ha vários anos Alem disso, estou agora em ferias, e tenho bastante tempo disponível De maneira que me sinto cheio de responsabilidade Vou retomar meu arsenal de razões e senti­ mentos" Afirma que vai reler Schwob, Moussinac, Poudovkin, Poulaille e outros Vai lembrar-se de Paris, de Plínio Süsse­ kind Rocha, da primeira vez que viu "Outubro", de Eisenstein, bem como de "Joana D'Arc", de Dreyer, visto pela primei­ ra vez no "Cercle", em Paris, ocasião em que conheceu Octávio de Faria Vai lembrar-se ainda de muitas outras coisas, se­ gundo afirma Todavia, por motivos desconhecidos, Paulo Emílio não participou da ruidosa polêmica Breves noticias sobre o conflito cinema falado x cinema mudo podem ser encontradas em Xavier (34 267) e, também, numa crônica de autoria do próprio Vinícius, "Suave Amiga", publicada originalmente em novembro de 1964, por ocasião da morte de Cecília Meire les, quando afirma, em pequeno trecho " era Ribeiro Couto, que nunca mais vai voltar de Belgrado e era eu nos meus vinte e oito anos, investindo com a lança do Silêncio contra os cavaleiros do Som, em combate cinematográfico desigual " (28 109)

** Utilizar-me-ei também da tese da Galvão (7 36-40), que reproduz a essência das discussões travadas ao longo dos dois meses da coluna de cinema de Vinícius em "A Manhã" 140 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, crítico de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7:127-147. 1984.

cariocas e catarinenses, além de várias seu forte não é explicar coisas. Ele não sa­ cartas de leitores, pronunciamentos de be pôr um argumento depois do outro, personalidades oficiais, bem como a ligá-los, tirar uma conclusão. Vinícius é transcrição dos manifestos de grandes ci­ um homem eternamente grávido e que es­ neastas sobre o advento do som.** tá eternamente dando à luz, Vinícius nas­ ceu grávido e dando à luz. Vinícius está Na já citada cerimônia realizada na sempre sendo fecundado desordenada­ Escola de Belas Artes do Rio, apenas mente pelas coisas do mundo, pelas crian­ Vinícius falou em defesa do cinema mu­ ças, pelo cinema, pela guerra,pelos passa­ do, ao passo que todos os outros partici­ rinhos. No começo, ainda tenta ensinar pantes — com exceção de Celso Kelly, que coisas, mas logo se perde, e é bom, por­ considerava a questão irrelevante, pois que só aí aprendemos coisas . . .". É acreditava que o futuro da "arte dramáti­ Vinícius quem afirma que "o cinema co­ ca" se concentrava no desenho animado mo a música exige o silêncio. Apenas na — eram pelo cinema falado (7:36). Orson música o silêncio é um clima (. . .). Mas Welles, por exemplo, defende o "falado na música o silêncio não é a própria natu­ total", isto é, aquele em que "o silêncio é reza da coisa em si, como no cinema. Mú­ função negativa do próprio som" ("A sica é som. A natureza do cinema é a ima­ Manhã", 21-5-42). Segundo Maria Rita, gem. Ora, a imagem é fundamentalmente "alguns dos participantes debatem a sé­ silenciosa, como meio de expressão. Não rio, outros com divertida ironia. Vinícius há música sem silêncio, é certo. O som só por vezes tem trechos admiráveis de leve­ se realiza perfeitamente num espaço silen­ za e poesia, plenos de fervoroso amor pe­ cioso, e se alguma aplicação lhe cabe ao lo cinema. Outras vezes, o tom ligeiro da cinema, o seu segredo está aqui. Mas no crônica desarma totalmente as suas infla­ cinema, onde o som tem cabimento, o si­ das investidas contra o falado, e com fre­ lêncio, por um paradoxo vital à arte, é a qüência tem-se a impressão de que, acima realidade fundamental, muito mais fun­ de qualquer outra razão, a questão pros­ damental que na música, pois abstrata­ segue porque ele se diverte. Mas há outro mente poderá alguém ouvir música em motivo mais sério, que não tarda a apare­ pleno fragor de uma batalha, mas não ve­ cer: o importante é que se continue a dis­ rá nunca cinema, se uma palavra que seja cutir cinema, mesmo que a discussão gire brotar da imagem para resolver, por solu­ em torno de um tal tema. 'Fui, sinto-o ção própria, o mistério que pertence ao bem' — diz Vinícius — 'o agente excita- seu conteúdo emocional íntimo. A ima­ dor de toda essa matéria de pensamento gem se sensibiliza, retrai-se e a palavra sobre cinema — que andava espiritual­ passa a dar imediatamente o tom. Porque mente morto desde o fechamento do o poder da palavra poderá não ser mais Chaplin-Club — e não tivesse a minha persuasivo que o da imagem, mas é certa­ crônica outra utilidade, essa já me deixa­ mente mais peremptório, e onde existir ria feliz (. . .). Recomeçou-se a pensar so­ uma palavra e uma imagem, aquela atin­ bre Cinema no Brasil — e por isso Deus girá mais nitidamente o seu fim, mais vio­ acrescente a Paulo Emílio Salles Gomes, lentamente. Eis por que o Cinema, arte da em 'Clima', a revista de São Paulo, e a imagem, deve ser silencioso. E quando eu mim, aqui na 'A Manhã"' (7:37). digo silencioso não abstraio de nenhum recurso da cinematografia: a música, o Na realidade, o debate foi aberto por som ou a palavra. Porque o Cinema é um Vinícius de Moraes em 27 de maio de 1942 instante, dificilmente uma continuidade " e Paulo Emílio, em "Notícia sobre a Polê­ ("A Manhã" — 27/5/1942). Todavia, mica do Rio", afirma que o poeta preten­ quando Vinícius deixa de falar sobre a no­ deu "... explicar-nos o que pensava so­ ção abstrata que tem de Cinema — de ci­ bre silêncio em cinema. Toda gente já sa­ nema antes da cinematografia, que é, em be que ele é pelo silencioso. Mas Vinícius última análise, o que se "vê" — e coloca de Moraes é um professor medíocre. O 141 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, crítica de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7:127-147, 1984.

as coisas em termos de cinematografia, espécie de espaço essencial onde todos os afirma: "O Falado; no final das contas, seus elementos componentes vão milagro­ uma substituição do letreiro incômodo samente se congregar, se dispor e se har­ que o bom diretor do silencioso procurava monizar em emoção e beleza. Coisa miste­ eliminar o mais possível"; ou seja, está riosa, essa de silêncio". bastante próximo das concepções de Oc­ Paulo Emílio procura traduzir as távio de Faria acerca do cinema falado. considerações realizadas por Vinícius co­ Paulo Emílio afirma em seu artigo mentando que "... esse silêncio, no qual (11) que Vinícius, no final do escrito de queremos mergulhar a imagem, é um ele­ 27/5/80, consegue dar integralmente o mento arrancado da vida palpitante e co­ sentimento do que seja a conquista do si­ tidiana para ser usado em arte . . ." e que lêncio para as artes humanas. Vinícius "... a posição silenciosa em cinema não pondera: ". . .já aconteceu a alguém de, é uma posição passiva de quem não quer passando por uma rua transversal de bair­ som, mas sim ativa de quem quer conquis­ ro, em plena luz, entregar-se de repente a tar o silêncio — o silêncio como um mate­ um acorde de piano ou a um estudo labo­ rial inédito em arte, um silêncio que é rioso de violino, inexplicavelmente, a ser muito mais do que a simples falta de reconduzido pelo silêncio que esses sons ruídos e palavras" (11). Entretanto, pare­ despertam à última solidão do mundo? ce que nada disso foi entendido por Ribei­ Ou ouvir um grito fazer o silêncio em tor­ ro Couto que, em 28/5/1942, escreveu em no, um silêncio pressago, cheio de misté­ "A Manhã": "Na sua plataforma de on­ rio dentro? Por certo todo mundo já sen­ tem, Vinícius faz, finalmente, o elogio de tiu essa sensação de silêncio que o trote de várias situações silenciosas de pungente um cavalo desperta no descampado, expressão (Cristo no horto, Beethoven quando se volta de algum lugar onde se surdo, etc.) mas conclui — sempre as con­ foi feliz; ou o silêncio da tarde que no ma­ dições arbitrárias — com o mais categóri­ to parece nascer dos ruídos dos bichinhos; co despotismo: Não é possível não ser pe­ esse silêncio dos trens apitando longe, dos lo silêncio. Que tem que ver tudo isso com roncos de navio no nevoeiro, das multi­ a questão que se discute?" Um pouco an­ dões em transe, das naves das igrejas, on­ tes Ribeiro Couto, após resumir o pensa­ de o menor ruído amplia o silêncio ao in­ mento de Vinícius na frase "O silêncio é a finito. É tão cotidiano! Nem chega a ofe­ própria natureza do Cinema em si", recer matéria para pensamento. A sensa­ acrescenta: "Porém isso, afinal de contas, ção está no papel, presente, as próprias se pode dizer de todas as outras artes, com palavras criam o silêncio. Ah! O silêncio exceção da música; todas elas têm como daquele verso de Keats, na 'Belle Dame natureza fundamental o silêncio; o pró­ Sans Merci' que diz assim: . . . and no prio teatro; não é só com as palavras, é bird sings". E Vinícius continua sua pre­ freqüentemente com o jogo da expressão gação na defesa do silencioso, ao tecer silenciosa que um ator atinge o máximo considerações, no mesmo artigo, sobre de comunicabilidade" (33). ". . . o silêncio dos grandes momentos da No artigo de Paulo Emílio em Clima vida, dos grandes momentos do amor; o é transcrito um pequeno trecho da carta silêncio do Cristo orando no horto, o si­ que Octávio de Faria enviou para "A Ma­ lêncio da música de Bach; o silêncio das nhã", participando também da famosa ruas de mulheres, onde tantos gritos, risos polêmica — carta essa em "tom desani­ e assuadas se contrapontam, criando um mado", segundo o crítico paulista. Octá­ indizível silêncio . . . e o silêncio de Bee­ vio escreveu que "os fatos em si, ninguém thoven surdo, criando na sua surdez . . . os desconhece, pelo menos as pessoas de e o silêncio da figura imortal de Carli- boa-fé e as que têm uma vaga noção do tos . . . É qualquer coisa assim o silêncio que estão dizendo (. . .). Portanto, discu­ em Cinema; o mais íntimo, o mais perma­ tir o quê? Fazer ato de saudosismo diante nente, o mais poderoso da imagem. Uma de pessoas que nem sequer sabem do que 142 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, critico de cinema Perspectivas, São Paulo, 7127-147, 1984.

se está falando?"* (11). Outro fundador que Mme. Falconetti disse, se bem que a do Chaplin-Club, Plínio Süssekind Rocha maior parte não esteja ligada com os pon­ também enviou uma carta e afirmou que tos precisos da polêmica, são o momento não quer discutir. Gostaria apenas de re­ mais importante da mesma. Porque pode­ ver os filmes silenciosos que tanto ama e, mos evocar o que era o trabalho de cria­ para isso, propõe uma política: atingir o ção artística de um diretor de cinema dos esnobismo da elite. "Se a nossa 'elite' sus­ bons tempos...". Paulo Emílio, no arti­ peitar que o cinema silencioso é mais 'fi­ go acima citado transcreve o depoimento no' que o atual, talvez se decida a querer concedido pela atriz a Vinícius, depoi­ ver os grandes filmes. Talvez, consiga até mento esse que reproduzo apenas em par­ uma sala com os nossos dirigentes, como te, na seqüência. Mme. Falconetti conta o 'Cercle' de Paris conseguiu a sala do que Dreyer queria realizar um verdadeiro Museu do Homem. Talvez mesmo apare­ filme: "o momento supremo de uma cria­ ça quem obtenha das nossas leis, uma res­ tura, o quadro monumental de uma vida salva que permita ao Clube de São Paulo de mulher. Não amava especialmente a trazer os filmes que estão em Buenos Ai­ Joana D'Arc. Queria sim revelar uma mu­ res sem pagar a mesma taxa que os filmes lher. Para isso precisava de toda a sua comerciais . . ." (11) Paulo Emílio, no atenção, de toda a sua dedicação, de sua artigo acima. renúncia absoluta. Fê-la chorar como ex­ Em pleno debate Vinícius de Moraes periência. E avisou-lhe que ela precisaria soube que Mme. Falconetti, a Joana viver chorando, que não veria ninguém, D'Arc de Dreyer, estava no Rio de Janei­ que só trataria com ele, que precisaria de ro e foi correndo entrevistá-la. "As coisas sua obediência absoluta . . .". Madame

* Neste mesmo n ° de Clima (junho 1942) são transcritos longos trechos do artigo de Octávio de Faria, "Eu Creio na Ima­ gem", originalmente publicado no FAN (6/setembro/1929), órgão oficial do Chaplin Club Afirmava Octávio que "não pode haver sincronização possível entre a palavra e a imagem. São coisas diferentes, opostas, que não podem ser utilizadas conjuntamente São dois caminhos Paralelas. Inimigas irreconciliaveis Coisas que se opõem E nem essa posição pode ser aproveitada por isso que são, por natureza intima, duas coisas totalmente diferentes A imagem e um gesto que se anima, que começa, que adquire vida A palavra (palavra, som etc ) e um gesto (se assim se pode dizer) que acabou, que se esterili­ zou, que morreu. A imagem e o cinema do gesto A palavra e a fotografia do gesto . . " (os dois primeiros grifos são de mi­ nha autoria, AMC, ao passo que os outros dois são do original) Octávio apresenta, também, um outro argumento contra o cinema falado, ao afirmar "a imagem e a realidade transposta numa arte Sem as dimensões Sem a cor Ora, o som, como se conseguiu reproduzi-lo (ou como se conseguira reproduzi-lo com o tempo) c a realidade tal e qual, sem transposição algu­ ma As pessoas, reduzidas a imagens falam como falariam no teatro e na vida real Dai essa noção de coisa falsa, de 'mons- trozinho'que o cinema falado nos da Uma pessoa pode falar E o teatro E a vida Uma imagem não pode falar E o ci­ nema falado Uma imagem falando — uma aberração estética, que so a curiosidade de uma descoberta cientifica justificaria ver, como se vai ver um anão, um corcunda, um 'monstrozinho' qualquer De todos os modos e preciso realizar bem que não ha utilização possível desses dois elementos palavra e imagem Forçosamente um parasitara o outro" (p 121/122) Se­ gundo o articulista do FAN, " o cinema definido como arte da imagem pode e tem que pretender ser uma arte pura E não precisara de mais nada senão da imagem A única dificuldade e saber maneja-la, e saber construir com ela" (p 122) E em defesa de suas teses a favor do cinema silencioso cita argumentos e idéias de Michel Gorei — "O cinema, para falar, não precisa da palavra; o que lhe falta e estilo ( ), em cinema, o estilo e o 'montage'" (p 122) — e de Rene Schowb — "o mais alto fim do cinema e talvez a expressão do silêncio e da imobilidade " (p 123) Procurando delimitar a participação que a musica deve ter na película cinematográfica, Octávio de Faria insiste num ponto " e preciso, em cinema, uma concen­ tração de atenção Alguma coisa que faça o espectador esquecer a sua propria personalidade e o lugar onde esta. Qualquer coisa que anule Que o transfira facilmente para dentro do complexo do herói do filme Outro não era o papel da musica em cinema Papel puramente subjetivo para cada espectador A musica, em principio, nada tem que ver com o filme E todo o erro foi no dia em que se começou com as partituras adaptadas ao filme Quando muito, podia-se permitir que a musica acompanhasse em linhas gerais o desenrolar da historia Alegre aqui, triste ali adiante, para aumentar a emotividade do es­ pectador e facilitar-lhe o absorvimento Foi a incompreensão disso, para mim, que levou ao descalabro do filme sincroniza do que deu no filme sonoro, que por sua vez levou ao do filme falado Devo declarar ( ) que eu so compreendo cinema sem musica, completamente puro O ritmo, a 'orquestração' de imagens devera bastar E nos so não concebemos o filme sem musica porque toda a nossa educação cinematográfica foi feita noutra base, e também porque não so a filmagem ( . .) era feita ao som da musica como também o 'montage' do filme era feito com desprezo absoluto dessa possibilidade Mas que o filme puro seja so imagem, não me resta a menor duvida Tudo o que se fez de util no cmema ate hoje foi nesse sentido e tudo o que se conseguira fazer sera somente nesse sentido" E concluindo seu artigo, Octávio faz uma profissão de fe no ci­ nema mudo "Eu creio na imagem Na imagem toda poderosa Que autentifica o gesto Que constrói o movimento Que cria o ritmo. Que revela a alma Que exprime o pensamento Que não admite o som e não pode conceber a palavra Na ima­ gem que e imagem e so pode ser imagem "

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Falconetti afirmou que sofreu bastante, sas, nem da maior ou menor clareza e fa­ que foram cinco meses de tortura, de bri­ cilidade com que a obra em si apresenta os gas com Dreyer. "Perguntava-lhe: mas fatos, as idéias, as coisas mas sim da capa­ M. Dreyer, se o sr. me deixasse um pouco cidade do gênio artístico de fazer resplan­ de liberdade para a ação eu poderia dar decer na matéria um princípio de inteligi- alguma coisa de mim mesma. Ele bilidade. O som em cinema veio trazer a recusava-se formalmente. Obrigava-me à subversão deste princípio fundamental em maior passividade (...). Acabada a cena arte. O aprimoramento material abafou e recolhia-me a uma casa de campo a que só suprimiu o elemento formal tomando-lhe ele tinha ingresso. Falava-me constante­ a fundação". Ainda de acordo com Pedro mente, incutindo-me a idéia da obra que Enout, "o som é um bem em si, mas bem queria realizar. Era-Ihe uma idéia fixa. muito relativo no cinema. Na arte da ima­ Não foi à toa que enlouqueceu. Está inter­ gem em movimento, o falado não pode nado. No dia em que acedi a que me ras­ ter eloqüência. Aí está o princípio geral passem a cabeça, coisa que ele pedia sem­ (...). Temos a impressão, seguindo pre, foi de uma extraordinária doçura co­ Vinícius de Moraes, que há sempre uma migo". A uma pergunta de Vinícius de solução silenciosa. Que dá trabalho, dá, Moraes, Madame Falconetti ainda disse: que exige gênio, exige, que não agradará "sou pelo silêncio. Meu pronunciamento de saída o grande público, viciado como não o creio de muito valor. Sou uma atriz está, também estamos certos. Mas é cine­ de teatro. Mas no que posso julgar, estou ma, é o que se quer. A solução equilibra­ de acordo com o seu ponto de vista. O si­ da não pode ter, porém, tabu pelo som. lêncio é o mais fundamental. Não é Trata-se de um recurso secundário como possível imaginar uma 'Joana D'Arc' so­ outro qualquer que pode ser usado, ape­ nora ou falada, nem fazê-la melhor. Es­ sar de muita gente ver grandes contradi­ tou certa que M. Dreyer diria o mesmo no ções nisto" (11). seu debate. Sabe de uma coisa, tudo o que Manuel Bandeira participou da polê­ é 'decór' é pouco importante. O artista mica, enviando um bilhete a Vinícius para que usa disso como meio de expressão, es­ chamar Octávio de Faria e Plínio Süsse- se, não vai longe, já transigiu". kind Rocha de "enfezadíssimos" e para Um leitor de Santa Catarina, Frederi­ dizer que "às vezes tem vontade de assina­ co Pohlman Primo, crê que ". . . nas ar­ lar nos escritos dos silenciosos, certos tes, e muito mais no cinema, a perfeição pontos fracos, certas brechas. Infelizmen­ está em aproximar-se o mais possível da te, não o fez..." (11). realidade, da vida que vivemos cotidiana- Quanto a Ribeiro Couto, este conti­ mente". Por isso e pelo falado e, de acor­ nua a ser o principal advogado do falado do com Paulo Emílio, a opinião do Sr. no debate escrito. Seus dois primeiros ar­ Pohlman é importante porque é bastante tigos e o bilhete enviado a Vinícius de Mo­ corrente." Um outro leitor, Pedro Enout, raes sobre o pronunciamento de Octávio de Belo Horizonte, polemiza com Ribeiro de Faria contribuíram para dar mais ani­ Couto, afirmando que "a arte, a literatu­ mação no debate. Todavia, dia 11 de ju­ ra têm justamente capacidade, cada uma nho de 1942, o principal defensor dos no seu próprio campo e com os seus pró­ "talkies" publicou um artigo chamado prios meios materiais aparentemente pre­ "Os estetas da tartaruga e a evolução da cários e insuficientes (. . .) para transmitir técnica", que começa assim, bem agressi­ 'representações da vida total' sem precisar vo: "Certamente, as pessoas que têm o recorrer 'a representações totais da vida '. costume de ir ao cinema nunca tomarão É necessário que haja na obra de arte, se­ muito interesse pela reabertura do debate gundo o leitor mineiro, "... o esplendor sobre o mudo e o falado. Para elas, o as­ de uma verdade. Entretanto, este esplen­ sunto já passou em julgado. O som e a dor da verdade não resulta da maior ou voz humana são agora indispensáveis à menor veracidade da reprodução das coi­ imagem. Ocorre, até, nas salas de espeta­ 144 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, crítico de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7:127-147, 1984.

culo, que quando há um desarranjo na nua, sendo que os pressupostos teóricos projeção sonora e o filme é exibido silen­ da discussão são os dos clássicos dos anos cioso por uns instantes, explodem os pro­ 20: Canuto, Delluc, Dulac, Moussinac, testos impacientes. O mudo, já hoje, não Epstein. De acordo com Maria Rita Gal- é estimado se não por alguns 'estetas', as­ vão, entre os participantes do silencioso, sunto de granfinagem. Nem poderiam va­ exalta-se a "simplicidade original do cine­ ler, contra o falado, as obras-primas que ma, chapliniana, griffithiana, eisenteinia- nos deu outrora o silencioso. Obras- na"; discute-se a posição do cinema com primas houve sempre em todos os estágios relação às outras artes, à sua função so­ de uma técnica em evolução. Por exem­ cial; distingue-se "Cinema" (o verdadei­ plo, a pena de pato. Foi uma obra-prima ro, a arte do filme) de "Cinematografia" para os escritores, antes da invenção das (o cinema corrente); fala-se em cinemáti- penas de aço e, ultimamente, da máquina co, subentendimento, visualização, foto- de escrever. Nem por isso os estetas quere­ genia, no "específico cinematográfico", rão voltar à pena de pato ao escrever os na "linguagem pura das imagens". "Au­ seus poemas e os seus romances". Paulo rora", "O Gabinete do Dr. Caligari", "O Emílio irrita-se com as colocações realiza­ Lírio Partido", "A Linha Geral", "A das por Ribeiro Couto e resolve dirigir-lhe Paixão de Joana D'Arc" continuam sen­ a palavra das páginas de Clima, ponde­ do as grandes armas levantadas contra a rando o seguinte: "Compreendo muito execrada Hollywood. Ao que os "talkis- bem o que aconteceu. Quem de nós, no tas" respondem com argumentos não me­ entusiasmo duma discussão, ainda não nos clássicos: o cinema sonoro é "repre­ soltou asneiras incríveis? É uma coisa que sentação total da vida", é a "síntese de acontece, sobretudo quando a gente fala todas as artes", "arte total", democráti­ de assuntos sobre os quais se está pensan­ ca, popular; lutar contra o som é ato de do pela primeira vez. Seu artigo foi natu­ saudosismo, injustificado e retrógrado, é ralmente escrito às pressas. Provavelmen­ elitismo. E mais: afirma-se ser o falado te não foi nem relido. Eu lhe peço, Ribei­ "o início de uma nova idade na educação ro Couto, que escreva um novo artigo di­ das massas", é a possibilidade de criação zendo que você não pensa aquilo que es­ de uma "cultura das multidões". Segun­ creveu, que foi engano, que foi pressa, do Ribeiro Couto, "...somente a criação que evidentemente você sabe que tudo de um cinema falado brasileiro de produ­ aquilo é besteira. Porque do contrário è ção intensa poderá permitir que ganhe­ impossível continuar uma discussão séria. mos o tempo perdido em matéria de edu­ Seu artigo é surpreendente demais, é um cação popular" (7:37-8). quase irresistível convite à pândega". E, no término de seu artigo, Paulo Emílio É importante destacar, principalmen­ realiza uma última observação. Em seu te, que o cinema brasileiro começa, timi­ entender, nos escritos dos defensores do damente, a ser discutido. No entender de cinema falado nunca há citações de fil­ Maria Rita Galvão, fala-se dele como se mes, diferentemente do que acontece com nunca tivesse existido. "O cinema brasi­ os dos silenciosos. "Em seus três artigos leiro está em gestação", diz por exemplo Ribeiro Couto só cita um desenho anima­ um leitor partidário dos filmes mudos, do sem importância e os jornais cinemato­ "não seria nada mau que ele ao nascer gráficos em que aparece o presidente Roo­ soltasse um grito... silencioso". Ocasio­ sevelt fazendo discursos... Temos a im­ nalmente surgem referências elogiosas a pressão nítida de que os silenciosos, filmes determinados, como por exemplo a Vinícius de Moraes principalmente, escre­ "Barro Humano". Há um pronuncia­ ve sempre pensando em filmes, e que os mento do então ministro Mário de Vas­ falados, principalmente Ribeiro Couto, concelos, em que é discutida especifica­ escreve sempre sem pensar em nada'' (11). mente a produção nacional existente, atri­ Mas, adverte, a polêmica do Rio conti­ buindo à má qualidade técnica o insucesso dos filmes, pois "bons artistas não nos 145 CATANI, A.M.—Vinícius de Moraes, crítico de cinema. Perspectivas, São Paulo, 7:127-147, 1984.

faltam". Diferentemente do que acontece e de organizar um pequeno curso de cine­ em São Paulo, não demora muito tempo ma onde se pudesse aprofundar as discus­ até que comecem a aparecer pronuncia­ sões iniciadas (7:39-40). Entretanto, é im­ mentos de pessoas ligadas à produção, en­ portante destacar, o que não tem a menor tre as quais Humberto Mauro e Carmen repercussão é a discussão sobre o cinema Santos; José Sanz, 'jovem cinegrafista', brasileiro. "Moderno ou antigo, o cinema resume sua contribuição à polêmica numa que se vê, se discute e sobre o qual se es­ frase incisiva: 'Cinema não se discute, creve, é o cinema estrangeiro. Será preciso faz-se" (7:38-9). esperar os rodapés cinematográficos de Vinícius de Moraes luta até conseguir Benedito Duarte em 'O Estado de São uma sala do Serviço de Divulgação da Paulo' para que tais problemas, ainda Prefeitura para exibições culturais. São que vagamente, sejam recolocados '* projetados filmes seguidos de debates, (7:40). após as sessões. "Carmen Santos inter­ Dessa maneira acredito ter destacado rompe um deles — uma discussão sobre em linhas gerais, embora com não poucas 'Caligari' — para dizer que 'o problema lacunas, a participação de Vinícius de fundamental do cinema brasileiro é di­ Moraes na crítica cinematrográfica brasi­ nheiro'. 'Carmen Santos esquece que não leira no início dos anos 40, antecedida por se faz cinema só com dinheiro', responde breves considerações acerca do cinema da Vinícius, 'nem somente com dois ou três época bem como por um ligeiro esboço valores de direção, mas sobretudo com biográfico onde se procurou situá-lo no um público consciente, amigo da arte, e tempo e no espaço. David E. Neves escre­ que isso se consegue exatamente criando- veu que Alex Viany conseguiu reunir as se esse interesse cinematográfico que vive críticas de Vinícius publicadas em "A Ma­ à base do presente debate'. Esta idéia será nhã" e prepara-se para editar em livro freqüentemente retomada pelo movimen­ "essas pequeninas jóias do exercício poé­ to cineclubista que alguns anos depois to­ tico do espírito crítico" (30). Espero que maria corpo em São Paulo: a condição Alex Viany tenha êxito nessa empreitada, fundamental para que se possa existir um pois assim será possível conhecer melhor cinema brasileiro é o desenvolvimento da o pensamento de Vinícius, crítico de cine­ 'cultura cinematográfica'. Prossegue ma. Vinícius: "o cinema brasileiro não existe, Para terminar, gostaria de transcre­ ou pelo menos (...) está apenas latente em ver um pequeno trecho do depoimento de dois ou três filmes que alguns diretores de sua irmã, Laetitia, onde afirma que talento tiraram do nada. Ora, se ele não Vinícius foi forçado a parar com suas existe, é o caso de criá-lo (...), críticas de cinema: "honesto demais em movimentá-lo, dar-lhe sangue, vida (o suas críticas, antagonizara certos produ­ que é um dos fins principais deste debate), tores que ameaçavam retirar do jornal os traçar-lhe os fundamentos estéticos para o seus anúncios caso Vinícius não os elo­ futuro (...). O debate visa criar um cine­ giasse de quando em vez " (17:57). Casa­ ma, um futuro cinema, e não ressucitar do, com uma filha para criar, prestou um morto" (7:39). concurso para o Itamarati, onde ingres­ Ao se encerrar finalmente a polêmi­ sou apenas em 1943, após uma tentativa ca, em julho de 1942 — "que já deu o que frustrada. Bom, mas isso já é uma outra tinha que dar" —, Vinícius anuncia a sua história, bem mais conhecida pela maioria intenção de prosseguir com as projeções, dos leitores...

* São mencionados, a título de exemplo, dois rodapés escritos por Benedito Duarte as vésperas da fundação da Companhia Cinematográfica Vera Cruz, quais sejam: "Da Inexistência do Cinema Nacional" (24/05/1949) e "Da Existência do Cinema Nacional" (4/6/1949) — a Vera Cruz foi fundada em novembro/1949. 146 CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, crítico de cinema Perspectivas, São Paulo, 7 127-147, 1984

CATANI, A.M. — Vinícius de Moraes, a movie critic. Perspectivas, São Paulo, 7.127-147, 1984.

ABSTRACT: The aim of this study is to emphasize Vinícius de Moraes participation in the movie criticism presented in the "carioca" newspaper "A Manhã" in the early forties (1941-1942). It was in this column that Vinícius de Moraes kept alive, from May to June 1942, a debate which aroused Brazil's and specially Rio de Janeiro's deep interest: the debate "silent movies" X "sound movies" Octávio de Faria, Manuel Bandeira, Afonso Anno de Melo Franco, Humberto Mauro, Aníbal Machado, among others, participed in this debate It was on this occasion that the Brazilian movies started to be timidly discussed although not much importance was attachied to it at the terms.

KEY-WORDS: History of the Brazilian cinema; history of the Brazilian cinema criticism; "silent movies"X "soundmovies".

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