1

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

DIVERSIDADE E DISTRIBUIÇÃO DE LARVAS DE EM MÚLTIPLAS ESCALAS ESPACIAIS: INFLUÊNCIAS REGIONAIS E LOCAIS

VERA UHDE

CUIABÁ – MT 2012 i

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ECOLOGIA E CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE

DIVERSIDADE E DISTRIBUIÇÃO DE LARVAS DE ODONATA EM MÚLTIPLAS ESCALAS ESPACIAIS: INFLUÊNCIAS REGIONAIS E LOCAIS

VERA UHDE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação, do Instituto de Biociências, para obtenção do título de Mestre em Ecologia e Conservação da Biodiversidade.

CUIABÁ – MT 2012

ii

ORIENTADORA: Profª. Drª CLAUDIA TASSO CALLIL

iii

U29d Uhde, Vera. Diversidade e Distribuição de Larvas de Odonata em Múltiplas Escalas Espaciais: Influências Regionais e Locais./ Vera Uhde. Cuiabá: UFMT, 2012. 25 fls.

Dissertação – Mestrado em Ecologia e Conservação da Biodiversidade - UFMT. Orientadora: Profa. Dra. Cláudia Tasso Callil

1.Odonata. 2.Escalas Espaciais. 3.Diversidade. I.Título.

CDU 573 : 574

iv

Defesa: 02/05/2012

v

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha familia

vi

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a minha família, minha mãe Dona Maria, meu pai Seu Ivo, meus irmãos Marines e Marcio e a minha sobrinha linda Poliana por acreditarem em mim e me apoiarem em todos os momentos. Agradeço especialmente a minha orientadora Profª. Drª. Claudia Tasso Callil pela orientação desde a graduação e valiosos ensinamentos, aprendizados e a amizade que tive trabalhando ao seu lado. Agradeço também a toda equipe do Laboratório de Ecologia Aquática com quem trabalhei todo esse tempo e com quem aprendi muito, a Sandra, Maitê, Edson Massoli, Ana Lucia, Ana Cecilia, Michele, Erick, por todo o trabalho e companheirismo. Ao Programa de Pós Graduação em Ecologia e Conservação da Biodiversidade por proporcionar a oportunidade da realização deste curso assim como à todos os professores pelo ensinamento que passaram. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior –CAPES – pela bolsa de mestrado. A Profª. Drª. Janira Martins Costa e ao César Carriço da Silva do Museu Nacional do Rio de Janeiro pelo auxílio na identificação das espécies. Ao meu grande amigo e colega Rodrigo Jacob, uma pessoa que sempre esteve ao meu lado dando força e apoiando em todos os momentos, agradeço também ao novos amigos que fiz ao longo do curso, Katiuscia, Taina, Andrea, Patricia, Fernando, Rafael, assim como a todos os colegas, pelo tempo que passamos juntos. Agradeço aos grandes amigos Gabriela e Régis por tudo que passamos e principalmente pela amizade. Agradeço também ao André pelo amor e companheirismo em todos os momentos. Agradeço a todos que de alguma forma contribuíram para essa conquista. Obrigada

vii

SUMÁRIO

RESUMO ...... 1

ABSTRACT ...... 2

1. INTRODUÇÃO ...... 3

2. ÁREA DE ESTUDO ...... 4

3. MATERIAL E MÉTODOS: ...... 5

3.1. Delineamento Amostral ...... 5

3.2. Variáveis Ambientais ...... 7

3.3. Análise dos Dados ...... 8

4. RESULTADOS ...... 10

4.1. Descrição Geral da Comunidade ...... 10

4.2. Particionamento da Diversidade ...... 12

4.3. Padrão da distribuição da comunidade de Odonata na escala local e regional...... 13

4.4. Relação da distribuição das espécies com as variáveis ambientais...... 15

5. DISCUSSÃO ...... 17

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...... 19

1

RESUMO

Diversidade e distribuição de larvas de Odonata em múltiplas escalas espaciais: Influências regionais e locais

Sistemas de córregos incorporam em niveis sucessivos diferentes escalas espaciais Essa hierarquia permite planejamentos mais eficazes de medidas de manejo e conservação. Como muitos fatores são correlacionados no espaço e agem simultaneamente sobre a fauna aquática, poucos estudos têm demonstrado a importância dos fatores que determinam a riqueza local e regional nas comunidades aquáticas. Dessa forma, nosso primeiro objetivo foi identificar a escala espacial que mais contribui para a diversidade total de larvas de Odonata. O segundo objetivo foi determinar como os fatores ambientais na escala regional (uso do solo e vegatação) e local (substratos, velocidade da água e mata ciliar) influenciam na distribuição das espécies. As coletas foram realizadas no planalto da bacia do Alto Paraguai e o delineamento amostral abrangeu quatro escalas espaciais hierárquicas: sub bacias, micro-bacias, córregos e micro-hábitats. Foram coletados um total de 920 larvas de Odonata, distribuídos em 9 famílias e 29 gêneros. O resultado demonstrou que a escala espacial das micro-bacias apresenta a maior diversidade e tem papel fundamental para estruturar a composição de espécies nesta região. Quanto aos fatores ambientais, na escala regional o uso do solo com pastagens e as regiões com floresta estacional são os principais determinantes da distribuição das larvas de Odonata, enquanto que localmente as larvas dependem dos diferentes tipos de substratos. Nossos resultados enfatizam a necessidade de estudos que reconheçam o nivel espacial das micro-bacias para melhor compreender a variação geográfica da biodiversidade da água doce. Futuros planejamentos precisam relacionar a riqueza de espécies a fatores locais, mas principalmente a fatores em grande escala,reconhecendo a presença de uma variação ambiental epacialmente estruturada.

Palavras Chave: Odonata, Escalas Espaciais, Diversidade

2

ABSTRACT

Diversity and Distribution of Odonata larvae in Multiple Spatial Scales: Regional and Local Influences

Stream systems incorporate different spatial scales in successive levels. The comprehension of this hierarchy allows more effective management and conservation measures. Many factors are correlated in space and act simultaneously over the aquatic fauna. Because of this complexity, few studies have demonstrated the importance of factors that regulate local and regional richness of aquatic communities. On this manner, our first objective is to identify the main spatial scale which contributes to the total diversity of Odonata larvae. The second objective is to determine how environmental factors on both regional (soil use and vegetation) and local (substracts, water speed and riparian forest) scales influence the species distribution. The collecting took place in the Alto Paraguai basin plateau and the sampling delineation included four hierarchical scales: sub-basins, micro-basins; streams and micro-habitats. A total of 920 larvae of Odonata were collected, distributed in 9 families and 29 genera. The result revealed that the micro- basins spatial scale presented the highest diversity and plays a fundamental role in structuring the species composition of this region. Soil use with pastures and regions with forest were the main environmental factors of regional scale which determined odonate larvae distribution, while locally, the larvae depend on the different kinds of substrate. Our results emphasize the need of studies that recognize the spatial level of micro-basins to better comprehend the geographical variation of freshwater biodiversity. Future planning need to associate species richness to local scale, but specially, large scale factors, in order to recognize the presence of a spatially structured environmental variance.

Keywords: Odonata, Spatial scales, Diversity

3

1. INTRODUÇÃO

Escalas espaciais tem recebido atenção cada vez maior no estudo dos padrões de populações e comunidades em sistemas aquáticos (Boyero e Bailey, 2001; Stendera e Johnson, 2005;; Dolédec et al, 2011; Dolph et al, 2011. Ambientes lóticos são considerados hierarquicamente organizados e incorporam em niveis sucessivos, diferentes escalas espacias (Frissell et al, 1986; Ward et al, 2002). Essa hierarquia permite capturar os padrões e processos que influenciam a biodiversidade da água doce e possibilitam planejar medidas de manejo e conservação dos sistemas naturais (Wiens 1989, 2002; Higgins, et al 2005; Heino, 2011). O particionamento da diversidade surge assim como uma ferramenta metodológica para entender estes padrões da diversidade nas diferentes escalas e para identificar a mais importante fonte de diversidade em desenhos amostrais hierárquicos (Lande 1996; Jost 2007; Veech e Crist 2010a; Jost et al 2010). Esta abordagem consiste no particionamento total da diversidade de espécies (gama) em dois componentes. O primeiro componente é a diversidade alfa, e estima a diversidade de espécies dentro do local. O segundo componente, diversidade beta, esta relacionado com a diferenciação na composição da comunidade ao longo de gradientes ambientais (Crist e Veech, 2006; Ligeiro et al, 2010; Avila et al, 2011). Beta diversidade pode ser medida como dissimilaridade entre ambientes (Costa e Melo, 2008). A limitação da dispersão e diferenças no ambiente físico podem causar essas dissimilaridades (Crist e Veech, 2006). Tais fatores são determinantes na distribuição das comunidades aquáticas. A distribuição da fauna aquática é influenciada pela ação de fatores ambientais em escala regional e local (Poff, 1997; Belmarker et al, 2008). Nas escalas mais amplas, diferenças na composição das espécies podem resultar de fatores históricos, climáticos e geológicos (Ricklefs & Schluter, 1993; Heino et al, 2003), além da heterogeneidade dos habitats, geralmente medido como o relevo topográfico e a estrutura da vegetação (Mykra et al, 2007; Astorga et al, 2011). Já em escalas locais as comunidades podem diferir devido a diferenças na composição dos substratos (Kikuchi e Uieda, 1998), disponibilidade de recursos alimentares (Bucker et al, 2008) e velocidade da água (Crisci- Bispo et al, 2007). Avaliar a relação entre estrutura da comunidade e fatores ambientais não é uma questão fácil. Muitos fatores são correlacionados no espaço e agem simultaneamente sobre os invertebrados aquáticos 4

Comunidades de larvas de Odonata são importantes componentes dos ecossistemas aquáticos (Hofmann e Mason, 2005). Devido a sua sensibilidade às alterações físicas do habitat, são amplamente utilizadas no monitoramento da degradação, restauração e conservação de sistemas de córregos (Dijkstra e Lempert, 2003). Muitos estudos sobre distribuição das espécies de Odonata são avaliadas em duas escalas extremas – local (Smith et al, 2007; Simaika e Samways, 2011) e regional (Stevens e Bailowitz, 2009; Keil et al, 2008), enquanto que as múltiplas escalas hierárquicas entre esses extremos tem recebido menos atenção. Poucos estudos tem demonstrado a importância relativa dos fatores que determinam a riqueza local e regional nas comunidades aquáticas (Harrison & Cornell 2008). Um maior conhecimento sobre estas questões se faz necessário para fornecer uma visão integrada da variação da riqueza de espécies em córregos. Dessa forma, nosso primeiro objetivo é identificar a escala espacial que mais contribui para a diversidade total de larvas de Odonata. Nossa hipótese é a de que maiores diferenças na composição da comunidade ocorram na escala regional, devido a uma combinação da limitação da dispersão e a variação ambiental. O nosso segundo objetivo é determinar como os fatores ambientais na escala regional e local afetam a distribuição das espécies. A hipotese é que a estrutura da vegetação e uso do solo influenciam na distribuição das larvas regionalmente enquanto que localmente a distribuição das larvas dependará dos diferentes tipos de substratos disponíveis.

2. ÁREA DE ESTUDO

A bacia do Alto rio Paraguai (BAP) na região Centro Oeste do Brasil, ocupa uma área de aproximadamente 363.442 Km².Destes, 48% estão localizados no estado de Mato Grosso, e divide-se em duas grandes regiões fisiográficas: Planalto e Pantanal (Calheiros e Oliveira, 2010). A área de estudo localiza-se na região de Planalto, que corresponde às terras elevadas, com altitude acima de 200 m, situadas na região norte da bacia, que não sofre inundações (Fiori et al. 2001) (Figura 1). Apresenta clima tropical de savana (AW), e precipitações pluviométricas anuais que variam entre 1.137 mm a 2.200 mm, com sazonalidade marcada por dois períodos bem distintos: estiagem (maio a outubro) e chuvas (novembro a abril) (Silva 2008), alcançando temperaturas médias de 22 a 25ºC com mínima média anual entre 17 e 20°C e temperatura máxima média anual entre 29 e 32°C (Lima 2001). 5

Figura 1 – Mapa da área de estudo que compreende a região de Planalto da bacia do Alto Paraguai, localizada na porção sul do Estado de Mato Grosso, região Centro Oeste do Brasil. Em destaque dentro da área de estudo, estão representadas as 10 micro- bacias estudadas.

3. MATERIAL E MÉTODOS:

3.1. Delineamento Amostral Para testar a primeira hipótese o delineamento amostral abrangeu quatro escalas espaciais hierárquicas na região do planalto da bacia do Alto Paraguai. Escala 4: Sub bacias do rio Cuiabá e Paraguai. Escala 3: Dez micro-bacias, sendo cinco micro-bacias dentro de cada sub-bacia; Escala 2: Trinta córregos, de forma que, cada micro-bacia continha três córregos; Escala 1: Micro-hábitats formados por diferentes substratos dentro de cada córrego (Figura 2). 6

Figura 02 – Esquema ilustrativo das escalas espaciais hierarquicamente delimitadas neste estudo. O maior nível espacial é a escala que compreende a região do planalto da bacia do Alto Paraguai, enquanto o menor nível espacial é formado pelos micro-habitats dentro dos córregos na escala 1.

Em cada córrego amostrado, cinco transectos foram demarcados de uma margem a outra, com espaço de 10 m entre eles. Em cada transecto foi amostrado toda a extensão de cada um dos diferentes micro-habitats. Foram definidos como: 1) areia - substrato de granulação fina, formada por elementos de 1 a 2mm; 2) argila - substrato de granulação muito fina, formada por elementos menores que 1mm; 3) folhiço - formado pelo depósito de folhas no fundo do riacho, de origem geralmente alóctone; 4) seixos - substrato de granulação muito grossa, variando entre 10 a 60mm; 5) rochas - substrato de tamanho superior a 60mm, fixo no leito do riacho, geralmente com acentuada correnteza; 6) vegetação marginal - raízes e outras partes de plantas terrestres aderidas na margem do riacho. A amostragem nos córregos ocorreu uma única vez ao longo do período de estiagem dos anos de 2007 e 2008. Um coletor tipo Surber de malha 0,125mm, com área de 900 cm², foi utilizado para as coletas. O material amostrado em cada micro-habitat foi armazenado separadamente em potes plásticos, fixado em álcool 70% e devidamente etiquetado. No laboratório as amostras foram lavadas em um conjunto de peneiras com abertura de malhas de 2mm; 1mm; 0,5mm e 0,25mm . Os organismos visualizados a olho 7 nú nas duas primeiras malhas foram fixados em álcool 70% e acondicionados em eppendorfs, o material retido nas duas últimas peneiras foi fixado em álcool 70%. Os indivíduos foram triados e identificados com a utilização de microscópio estereoscópico. Para este estudo foram selecionados apenas os indivíduos da ordem Odonata, identificados com auxílio das chaves propostas por Merritt & Cummins (1996), Carvalho & Calil (2000), Costa et al. (2004) e Souza et al. (2007). Posteriormente, a identificação foi confirmada junto ao laboratório de insetos aquáticos no Departamento de Entomologia do Museu Nacional do Rio de Janeiro (UFRJ), possibilitando a morfotipagem dos gêneros.

3.2. Variáveis Ambientais Para determinar os fatores ambientais que determinam a distribuição das espéciesmensuramos as variáveis locais e regionais. Localmente, junto à coleta dos organismos, registramos em cada córrego a velocidade da água e a área de cada micro- habitat dos cinco transcetos. A área foi calculada a partir da extensão amostrada do micro- habitat pela área do surber (900 cm²), desta forma, obtivemos a área média de cada micro- hábitat entre os cinco transectos no córrego. Calculamos a área de mata ciliar de cada córrego com auxilio do software ArcGis versão 9.2. (ESRI, 2007). Vetorizarmos um buffer de 500m de raio em torno de cada córrego, que sobreposto sobre imagens SPOT 5 (2008), permitiu extrairmos a área de mata ciliar dentro do circulo com raio de 500m. As variáveis regionais, área de uso do solo e fitofisionomias dentro das micro-bacias tambémforam obtidas com software ArcGis versão 9.2. (ESRI, 2007). Vetorizamos os limites das dez micro-bacias, que sobrepostas sobre o mapa gerado pela SEPLAN/MT permitiu extraírmos a área (Km²) das diferentes fitofisionomias e os tipos de uso do solo das micro-bacias. A classificação utilizada no nosso trabalho foi adaptada dos mapas do Diagnóstico Sócio Econômico Ecológico do Estado, que subsidiou a elaboração do Zoneamento Sócio Econômico Ecológico do Estado de Mato Grosso pela Secretaria Estadual de Planejamento (SEPLAN/MT), como: Floresta Estacional: Formações florestais, com elementos botânicos estacionais e ombrófilos, predominando estes ou aqueles, de acordo com o domínio em que se insere; Savana Florestada: É a expressão florestal das formações savânica. As árvores que constituem o dossel apresentam troncos geralmente grossos, a estratificação é simples atingindo altura em torno de 15m. Não há um estrato arbustivo nítido e o estrato graminoso esparso é entremeado de espécies lenhosas de pequeno porte. É também denominada “Cerradão”; Savana Arborizada: Corresponde à formação savânica propriamente dita, caracterizando-se pelo aspecto 8 xeromorfo do componente arbustivo-arbóreo e pelo expressivo estrato herbáceo, onde predominam gramíneas cespitosas (que formam touceiras). Constitui uma fisionomia vegetal relativamente aberta, geralmente manejada com fogo. É denominada em sentido amplo de “Cerrado”. Savana Parque: Nesta formação, prevalece o componente herbáceo e arbustivo, com indivíduos arbóreos presentes de forma esparsa, compondo uma das expressões campestres das savanas, denominada também “Campo Cerrado”; Uso Agropecuário em médias e grandes propriedades com Predomínio de Culturas Anuais e Uso Agropecuário em médias e grandes propriedades com Predomínio de Pastagens.

3.3. Análise dos Dados Para identificar qual escala espacial mais contribui para a diversidade total de larvas de Odonata na região, utilizamos o Particionamento da Diversidade (Veech e Crist, 2009). Nesta analise a diversidade total (gama) é particionada em componentes alpha (α) e beta (β). O componente alpha representa a diversidade média de espécies dentro das amostras em uma escala, o componente beta representa a variação de espécies entre as escalas e gama a diversidade total. Segundo Veech e Crist (2010b) a partição dos componentes pode ser realizada tanto aditivamente quanto multiplicativamente. Contudo, Jost (2007) e Ricotta (2007) salientam que a diversidade beta aditiva não é independente de alfa. Desta maneira, o valor de beta irá variar com o valor de alfa, tendendo a aumentar com escalas mais amplas, o que gera problemas com a interpretação dos resultados. Segundo Wilsey (2010), com valores de beta independentes de alfa, podemos comparar locais com diferentes níveis de diversidade alfa através de escalas e de forma mais eficaz comparar e contrastar diferentes estudos. Assim, particionamos a riqueza de espécies e a diversidade de Shannon pelo modelo multiplicativo, o qual é apropriado para estudos de conservação (Jost et al. 2010). Riqueza é sensível a espécies raras enquanto que a diversidade de Shannon pesa todas as espécies pela sua freqüência, refletindo tanto espécies comuns como raras (Jost, 2007; Veech & Crist, 2010a). O termo diversidade de Shannon que será usada ao longo deste trabalho representa a transformação adequada da entropia de Shannon (tradicional Índice de Shannon-Wiener), segundo Jost (2007). Como a riqueza taxonômica é uma medida direta da diversidade, não necessita de transformação (Jost, 2007; Jost et al. 2010; Clarke, 2010). Neste trabalho calculamos a contribuição da diversidade beta em quatro escalas espaciais hierarquizadas: microhabitat, córrego, microbacia e sub-bacia. A diversidade alpha na escala do microhabitat (α microhabitat) é a diversidade média de 9 espécies para todos os micro-habitats amostrados. Na escala de córregos, αcorrégo representa a diversidade média de espécies entre os trinta córregos amostrados. Na escala das micro-bacias, αmicro-bacia é a diversidade média de espécies dentro das dez micro- bacias analisadas. Na escala das sub-bacias αsub-bacia representa a diversidade média de espécies dentro das duas sub-bacias analisadas. Desta forma, βmicro-habitat é a razão entre αcorrégo e αmicro-habitat, βcorrégo é a razão entre αmicro-bacia e αcorrégo, βmicro-bacia é a razão entre αsub-bacia e αmicro-bacia, enquanto βsub-bacia é a razão entre γ e αsub- bacia. A diversidade γ é a diversidade total da região, representada por: γ = αmicro-habitat x βmicro-habitat x βcórrego x βmicro-bacia x βsub-bacia. O particionamento da diversidade foi realizado no programa PARTITION versão 3.0 (Veech & Crist, 2009). Este programa permitiu realizarmos também o teste de significância dos dados, para determinar se a diversidade observada é diferente da diversidade esperada ao acaso. Selecionamos a aleatorização baseada nos indivíduos porque conserva o número de indivíduos de todas as espécies, mas os indivíduos de cada espécie são aleatoriamente distribuídos entre as amostras de cada escala (Crist et al., 2003; Veech & Crist, 2009). A distribuição nula de cada valor de alpha e beta, na escala especifica, foi obtida através de 1000 aleatorizações. A significância de cada componente da diversidade foi avaliada pela proporção de valores nulos maiores (ou menores) do que o valor observado (Crist et al., 2003; Veech & Crist, 2009). Para identificar as variáveis ambientais locais e regionais que estão influenciando a distribuição das larvas de Odonata, organizamos os dados biológicos em duas escalas. Escala regional, representada pelas dez micro-bacias (escala 3), e escala local, formada pelos trinta córregos (escala 2). Os dados da composição da comunidade na escala regional e na local foram então ordenados através do Escalonamento Multidimensional Não Métrico (NMDS). O NMDS reduz a dimensionalidade das informações das múltiplas espécies, de modo que as distancias na ordenação reflitam as semelhanças entre as unidades amostrais, tanto quanto possível (Legendre & Legendre,1998). As ordenações da composição da comunidade, tanto da escala regional como da local, foram realizadas com base na abundância das espécies (quantitativa) e na presença e ausência (qualitativa). As ordenações quantitativas foram usadas para capturar os padrões apresentados pelas espécies mais abundantes e, desta forma, evidenciar a contribuição da abundância relativa das espécies para a diferença entre locais. Para esta análise, a matriz de associação foi construída utilizando o índice de Bray-Curtis como 10 medida de dissimilaridade. Quando as espécies mais abundantes são também as mais freqüentes, sua contribuição aos resultados detectados em análises do tipo presença/ausência é relativamente pequena. Assim, adicionalmente foram realizadas ordenações dos dados de presença e ausência com o índice de similaridade de Jaccard (Legendre & Legendre 1998) que, neste caso, evidenciam o padrão das espécies mais raras. As dimensões do NMDS quantitativo e qualitativo que descrevem a comunidade foram separadas e consideradas como variáveis dependentes nos testes inferenciais. As variáveis ambientais que foram consideradas de influencia regional compreendem a área das diferentes fitofisionomias e uso do solo. Já na escala local consideramos a mata ciliar, velocidade da água e a área dos micro-habitats dentro de cada córrego. As variáveis de influencia regional e local foram ordenadas separadamente através da Análise de Componentes Principais (PCA). Esta técnica de ordenação multivariada consiste em transformar um conjunto de variáveis originais em outro conjunto de variáveis de mesma dimensão denominadas de componentes principais, que retém, em ordem de estimativas, o máximo de informação, em termos da variação total contida nos dados (Legendre & Legendre, 1998). As variáveis utilizadas nestas análises foram todas previamente padronizadas como sugerido por Gotelli e Ellison (2010), onde o valor de cada amostra é subtraída da média total e dividida pelo desvio padrão, buscando reduzir a diferença das unidades de medidas. Os primeiros eixos da PCA regional e da PCA local foram extraídos e considerados como fatores preditores nas análises inferenciais. A relação entre os dados biológicos e as variáveis ambientais foi investigada através da Regressão Múltipla Multivariada. Foram empregados dois modelos na escala regional, o qual relacionou as dimensões do NMDS (abundância e presença/ausência) com os eixos da PCA regional. Outros dois modelos foram utilizados na escala local, de forma a relacionar as dimensões do NMDS (abundância e presença/ausência) com os eixos da PCA local. Todas estas análises foram realizadas utilizando o software SYSTAT versão 12.0.

4. RESULTADOS

4.1. Descrição Geral da Comunidade A fauna de larvas de Odonata registrada nos córregos da bacia do Alto Paraguai foi representada por um total de 914 indivíduos. Destes 566 foram identificados em 39 espécies, enquanto o restante permaneceu em nível de família, totalizando 42 espécies. A Subordem Anisoptera, representada pelas famílias Cordullidae, Gomphidae e 11

Libellulidae, abrigou a maior riqueza e maior abundância, enquanto Zigoptera foi representada por maior número de famílias mas com poucos indivíduos (Tabela II). As morfoespécies com maior abundância foram Progomphus sp2 e Desmogomphus sp1, com 72 e 51 indivíduos respectivamente, ambas da família Gomphidae. Elasmothemis sp2 da família também foi uma das mais abundantes, com 33 indivíduos. Tabela II – Abundância de morfoespécies da Ordem Odonata amostradas nos córregos de cabeceira dos rios Paraguai e Cuiabá. Indivíduos identificados em nível de família também estão quantificados. Morfoespécies Abundância Ordem Odonata Subordem Anisoptera Cordullidae Navicordulia sp1 5 Neocordulia sp1 2 Gomphidae 117 Acheogomphus sp1 4 Desmogomphus sp1 51 Desmogomphus sp2 7 Gomphoides sp1 25 Gomphoides sp2 20 Idiogomphoides sp1 2 Phyllocycla sp1 24 Phyllocycla sp2 1 Progomphus sp1 7 Progomphus sp2 72 Tibiogomphus sp1 26 Libellulidae 92 Brechmorhoga sp1 7 Brechmorhoga sp2 8 Elasmothemis sp1 27 Elasmothemis sp2 33 Elasmothemis sp3 24 Erythrodiplax sp1 1 Idiataphe sp1 8 Macrothemis sp1 4 Macrothemis sp2 7 Oligoclada sp1 1 Oligoclada sp2 23 Oligoclada sp3 1 Perithemis sp1 14 Perithemis sp2 7 Perithemis sp3 4 Tauriphila sp1 3 Subordem Zygoptera Calopterygidae Hetaerina sp1 24 Coenagrionidae 139 Acanthagrion sp1 14 Argia sp1 44 continua 12

continuação

Morfoespécies Abundância Enallagma sp1 24 Enallagma sp2 20 Enallagma sp3 6 Ischnura sp1 1 Dicteriadidae Heliocharis sp1 1 Perilestidae Perilestes sp1 13 Polythoridae Chalcopterix sp1 1

4.2. Particionamento da Diversidade O particionamento hierarquizado dos componentes alpha e beta mostrou um padrão similar para as duas métricas análises empregadas. No particionamento com riqueza de espécies a escala espacial que mais contribuiu para a diversidade total foi o das micro- bacias. Nesta escala o componente beta alcançou 2,35, contribuindo com aproximadamente 20% da diversidade total da região (γ) (Figura 3 A). Na análise com a diversidade de Shannon, que utiliza a riqueza e abundância relativa, a escala que mais contribuiu também foi a das micro-bacias, contribuindo com 20% para a diversidade total. A escala espacial dos micro-habitats (βmicrohabitat) apresentou a segunda maior contribuição, com 1,85 (p < 0,001) para a riqueza e 1,74 (p < 0,001) para a diversidade de Shannon (Tabela III).

A B 100 100

90 90

80 80 β bacia 70 70 β microbacia 60 60 β córrego 50 50 β microhabitat 40 40 α microhabitat

Riqueza(%) 30 30

20 20

10 10 Diversidadede Shannon (%)

0 0 Observada Esperada Observado Esperado

Figura 03 – Particionamento hierárquico da diversidade de larvas de Odonata na Bacia do Alto Paraguai, utilizando como métrica a riqueza de espécies (A) e a diversidade de Shannon (B).

13

Nas análises do particionamento, considerando a riqueza e diversidade de Shannon, a diversidade de larvas de Odonata observada foi diferente da esperada pela distribuição nula. Para todas as escalas espaciais, o valor do componente beta foi maior do que o esperado pelo acaso (Tabela III).

Tabela III – Particionamento hierárquico dos componentes α e β para a riqueza de espécies e diversidade de Shannon. Os valores de p foram obtidos a partir da comparação dos valores observados com os valores da distribuição nula gerada a partir de 1.000 aleatorizações do PARTITION V.3. Riqueza de espécies Diversidade de Shannon Observada Esperada p Observado Esperado p αmicrohabitat 4,7 13,11 > 0,999 3 8,78 > 0,999 βmicrohabitat 1,85 1,46 < 0,001 1,74 1,52 < 0,001 βcórrego 1,59 1,39 < 0,001 1,61 1,3 < 0,001 βmicrobacia 2,35 1,42 < 0,001 2,05 1,18 < 0,001 βbacia 1,29 1,11 < 0,001 1,22 1,03 < 0,001 γ 42 21,04

4.3. Padrão da distribuição da comunidade de Odonata na escala local e regional Através da análise de NMDS reduzimos o padrão de distribuição das larvas de Odonata em duas dimensões, tanto para os dados da escala regional quanto na local (Tabela IV).

Tabela IV – Resultados obtidos através do Escalonamento Multidimensional não-Métrico (NMDS) para a escala regional e local. Nº de Escala NMDS r² stress dimensões Abundância 2 0,89 0,12 Regional Presença/Ausência 2 0,83 0,15 Local Abundância 2 0,66 0,25 Presença/Ausência 2 0,75 0,27

A configuração final da ordenação das micro-bacias com dados de abundância formou dois grupos, um entre as micro-bacias Melgueira, Casca, Marzagão e Quebra Canela e outro entre Roncador, Aguapeí e Sangradouro (Figura 04 A). Já o NMDS 14 com dados de presença e ausência não demonstrou maior proximidade entre as micro- bacias (Figura 04 B). A partir da representação gráfica da distribuição dos córregos na escala local (Figura 04 C e D), fica evidente que não ocorreu formação de agrupamentos quanto à composição da comunidade. Foi possível identificar ainda que os córregos Ribeirão das Flechas, Cedrau e Cachoeirinha estão mais distantes do restante dos locais.

Escala regional - Abundância A Escala regional – Pres/Aus B

Escala local - Abundância C Escala local – Pres/Aus D

Figura 04 – Escalonamento multidimensional não-métrico (NMDS) dos dados de abundância (quantitativos) e presença/ausência (qualitativos) de larvas de Odonata, na escala regional (A, B) e escala local (C, D). Na escala local os símbolos iguais representam os córregos da mesma microbacia. Símbolos brancos representam a sub-bacia do rio Cuiabá e símbolos pretos a sub-bacia do rio Paraguai.

15

4.4. Relação da distribuição das espécies com as variáveis ambientais. Na escala regional, a PCA feita com as seis variáveis extraiu três eixos com autovalores maiores que um. Somados, os três primeiros eixos representaram 77% da variância total. O primeiro eixo explicou 37% e apresentou alta correlação com as variáveis Savana Parque e Uso do Solo com predomínio de Pastagens. O segundo eixo que explicou 23%, teve alta correlacão com Floresta Estacional (Figura 05). O terceiro eixo, o qual explicou 17%, foi correlacionado apenas com a Savana Florestada.

A B

1 PCA1 PCA2 0,5

0

-0,5

-1 SP AGA F SF SAV AGP Figura 05 – A – Representação gráfica da Análise dos Componentes Principais (PCA) usando matriz de correlação, das variáveis ambientais na escala regional. Símbolos brancos representam a sub-bacia do rio Cuiabá e símbolos pretos a sub-bacia do rio Paraguai. Os símbolos de cada micro- bacia correspondem com os símbolos dos seus córregos na figura 06. B - Proporção explicado por cada eixo (loadings). SP=Savana Parque; AGA=Uso do solo com predominio de culturas anuais; F: Floresta; SF=Savana Florestada; SAV=Savana arborizada; AGP=Uso do solo com predominío de pastagens.

A analise de regressão multipla multivariada entre os eixos da PCA regional e as dimensões do NMDS revelaram que regionalmente as diferentes formações vegetais e uso do solo influenciam a distribuição da abundância das larvas. A Savana Parque com o Uso do solo com Pastagens (Eixo 1 - Pillai Trace= 0,724, F= 6,566, p= 0,04) e Floresta Estacional (Eixo 2 - Pillai Trace= 0,735, F= 6,918, p= 0,03) demonstraram relação significativa com a distribuição da abundância. A análise entre os eixos da PCA e as dimensões do NMDS com dados de presença e ausência não apresentaram relação. Micro-bacias com grande proporção de uso do solo com pastagens, como Melgueira, Casca, Aguapei e Marzagão, apresentaram maior número do indivíduos da familia Coenagrionidae e do gênero Desmogomphus, Tibiogomphus e Progomphus. A 16 fitofisionomia Floresta Estacional é predominante na micro-bacia Sepotubinha e neste local foram registradas maiores abundâncias das espécies do gênero Gomphoides. Na escala local, a PCA realizada com as variáveis ambientais extraiu três eixos que explicaram 62% da variação total dos dados. O eixo 1 foi correlacionado com a velocidade da água e o substrato folhiço enquanto o eixo 2 pelos substratos areia e rocha (Figura 06). Ao relacionar os eixos da PCA com as dimensões do NMDS através da análise de regressão múltipla multivariada, observamos que os diferentes tipos de substratos influenciaram a distribuição das larvas de Odonata. Córregos com predominância dos substratos areia e rocha exposta (Eixo 2 - Pillai Trace= 0,242, F= 3,99, p= 0,03) foram relacionados significativamente com a presença e ausência de Odonata. Não houve relação entre os eixos da PCA e as dimensões do NMDS com dados de abundância de larvas local. A B

1 Eixo 1 Eixo 2 0,5 0 -0,5 -1

Figura 06 – A) Projeção dos scores resultantes da Analise de Componentes Principais (Eixo1 e Eixo2), usando matriz de correlação das variáveis ambientais na escala local. Símbolos brancos representam a sub-bacia do rio Cuiabá e símbolos pretos a sub-bacia do rio Paraguai. B) Loadings que explicam os eixos 2 e 3.

Nos córregos com predominância do substrato areia, como Onças, Seu Zé, Amolar, Cachoeirinha, Ferrugem e Cedrau, ocorreu a maior riqueza da familia Gomphidae, principalmente dos gêneros Progomphus, Gomphoides, Phyllocycla e Desmogomphus. Os córregos Monjolinho, Corixa, Aguapeizinho, Marzagão, Corixa, Cuiabá da Larga e Limoeiro são caracterizados por apresentarem muitos substratos rochosos, nestes locais registramos maior ocorrência dos gêneros Hetaerina, Argia, Brechmorhoga e Elasmothemis. 17

5. DISCUSSÃO

Para a região do planalto da bacia do Alto Paraguai, nossos resultados indicam que a escala espacial das micro-bacias contribui mais para diversidade de larvas de Odonata, indicando que esta escala, tem papel fundamental para estruturar a composição de espécies nesta região. A análise com a riqueza de espécies foi sensível às espécies raras, enquanto a diversidade de Shannon pesou todas as espécies pela sua freqüência e refletiu a uniformidade da comunidade. Assim, o alto valor de beta para a riqueza na escala das micro-bacias, represente a diferença na composição das espécies entre as micro-bacias, enquanto que o alto valor de beta para a diversidade de Shannon demonstra a mudança na composição e abundância das larvas entre as micro-bacias. Este resultado corrobora nossa primeira hipótese e aponta para a importância dos fatores em ampla escala para determinar a composição da comunidade na região. Entre as micro-bacias podem ser registradas distâncias superiores a 400 km. Essas distâncias geográficas muito elevadas geram uma menor capacidade de dispersão e consequentemente elevam o valor de beta. Dentro da ordem Odonata a habilidade de dispersão aumenta com o tamanho do corpo, mais intensa em Anisopteras do que em Zigopteras (May, 1981; Grabow & Ruppell, 1995; Conrad et al., 1999). Este padrão também foi observado neste trabalho, algumas espécies da subordem Zigoptera ficaram concentradas em micro-bacias distintas com altas abundâncias. Enquanto que espécies do gênero Progomphus, que apresentam tamanho do corpo maior e elevada capacidade de dispersão (Corbet, 1980), foram coletados em todas as micro-bacias, com abundâncias variadas. A diversidade beta entre os micro-habitats também foi elevada, indicando que pequenas escalas também contribuem significativamente para a diversidade total da região. Tanto a riqueza, como a diversidade de Shannon das larvas de Odonata, demonstraram diferença na composição e abundância entre os diferentes substratos. Esse resultado é recorrente na literatura, vários trabalhos demonstram o alto valor de diversidade beta e a importância dos diferentes substratos dentro dos córregos (Boyero, 2003; Clarke, 2010, Ligeiro et al, 2010). O particionamento da diversidade através das quatro escalas espaciais demonstrou que todos os valores de beta foram significativamente maiores que o esperado pela distribuição nula. Isto indica que a comunidade de larvas de Odonata não é distribuída aleatoriamente entre as escalas e que podem estar ocorrendo agregações intraespecíficas. 18

No estudo de Ribeiro et al. (2008), a agregação intraespecífica aumentou a diferença entre as comunidades de borboletas e elevou o valor de beta. Resultados similares foram encontrados por Paknia e Pfeiffer (2011) no estudo com formigas em diferentes escalas espaciais. Este padrão observado surge a partir de diferentes processos, como a capacidade de dispersão, adaptações das espécies e das diferenças nas condições ambientais entre as localizações geográficas das comunidades (Veech, 2005). No nosso trabalho, a distribuição das larvas de Odonata na escala regional foi influenciada principalmente pelo uso do solo com pastagem e as diferentes fitofisionomias, como predito pela segunda hipótese. Somente as espécies com maior abundância demonstraram relação com essas variáveis ambientais regionais. Para Foote e Hornung (2005) a estrutura da vegetação é um importante preditor da diversidade de Odonata. Por outro lado, a remoção das florestas e o aumento de paisagens dominadas por pastagens tende a diminuir o numero de espécies especialista e aumentar a abundância de poucas espécies com menos exigências de hábitats (Silva et al, 2010). Além disso, o maior uso do solo com pastagens revolve o solo e o torna suscetivel a erosão, contribuindo assim para o maior aporte de areia dentro dos córregos (Allan e Castillo, 2007). Nas micro-bacias com maior área de pastagens, registramos maior abundância dos gêneros Desmogomphus, Tibiogomphus e Progomphus, os quais, possuem adaptabilidade a substratos arenosos (Carvalho e Nessimian, 1998). Esperávamos que em micro-bacias com predominância de floresta, como na Sepotubinha, registraríamos maior numero de larvas adaptadas ao substrato folhiço. No entanto o gênero com maior freqüência foi Gomphoides, que vive em ambientes arenosos. A micro-bacia Sepotubinha esta circundada por grandes áreas de plantações anuais, o que pode ter contribuído para o maior aporte de areia a montante de alguns córregos, e contribuído para a maior abundância deste gênero. Comprovamos também que a riqueza de larvas de Odonata esta relacionada com os diferentes tipos de substratos dentro dos córregos, corroborando nossa hipótese de que esta relação é proporcionada pelo desenvolvimento de diferentes adaptações morfológicas nas larvas (Corbet, 1980). Córregos com maior área de substrato areia abrigaram principalmente indivíduos com hábito fossador, como Progomphus, Desmogomphus, Gomphoides e Phyllocycla (Corbet, 1980; Carvalho e Nessimian, 1998; Assis et al. 2004). Estes gêneros possuem espinhos modificados nas tíbias posteriores e medianas adaptados para cavar (Costa et al, 2004), além do último segmento do abdome alongado em forma de sifão que possibilita a respiração mesmo enterrados na areia (Carvalho e Nessimian, 1998). Nos córregos com predominância de substratos rochosos foi 19 possível identificar maior riqueza das espécies com hábito agarrador ou escalador como Hetaerina, Argia, Brechmorhoga e Elasmothemis. O corpo mais achatado dorso- ventralmente do que nas outras espécies, juntamente com os espinhos dorsais do abdome desenvolvidos em quilha, facilitam sua aderência e a conseqüente permanência nos substratos rochosos (Ramirez & Novelo-Gutiérrez, 1998; Carvalho e Nessimian, 1998; Assis et al, 2004). Neste estudo, a comunidade de larvas de Odonata foi afetada por multiplos fatores que variam da escala regional para a local. Nossos resultados corroboram o conceito hieraquico de Poff (1997) sobre "filtros de paisagens", que preve diferentes fatores ambientais agindo para determinar a ocorrência de espécies em diferentes escalas espaciais. Dentre os fatores analisados, identificamos que a distribuição das espécies mais abundantes das larvas de Odonata são afetadas em escalas mais amplas pela estrutura da vegetação e o uso do solo. Ao mesmo tempo, nas escalas locais, os diferentes tipos de substratos dentro do córrego estão controlando a distribuição da riqueza das larvas. Dessa forma, entendemos que o efeito combinado dos diferentes fatores ambientais nas escalas hierarquicas na região, juntamente com a limitação da dispersão, contribuem para os padrões de diversidade beta registrados pelo particionamento. O maior valor de diversidade beta entre as microbacias e micro-habitats revela que as escalas espaciais selecionadas neste trabalho conseguiram capturar os padrões mais importante na estrutura da comunidade de larvas de Odonata na região. Estes resultados tem importantes implicações para a conservação de ecossitemas aquáticos. Sugerimos que estratégias de manejo e conservação de córregos busquem abranger áreas que compreendam diferentes micro-bacias e principlamente que incorporem diferentes estruturas fitofisonomicas da região. Conjuntamente, mais atenção deve ser empregado na manutenção e restauração da hetereogenidade fisica dentro dos canais.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALLAN, J.D.; ERICKSON, D.L.; FAY, J. 1997. The influence of catchment land use on stream integrity across multiple spatial scales. Freshwater Biology 37:149–161. ALLAN, J.D.; CASTILLO, M.M. 2007. Stream ecology – structure and function of running waters. 2end Edition Springer, New York.

20

AVILA, A. C.; STENERT, C.; MALTCHIK, L. 2011. Partitioning Macroinvertebrate Diversity Across Different Spatial Scales in Southern Brazil Coastal Wetlands. Wetlands 31:459–469. ASSIS, J. C. F.; CARVALHO, A. L.; NESSIMIAN, J. L. 2004. Composição e preferência de por microhábitat de imaturos de Odonata (Insecta) em um trecho de baixada do Rio Ubatiba, Maricá-RJ, Brasil. Revista Brasileira de Entomologia, 48(2): 273-282. BELMAKER, J., ZIV, Y., SHASHAR, N. & CONNOLLY, S.R. 2008. Regional variation in the hierarchical partitioning of diversity in coral-dwelling fishes. Ecology 89:2829–2840. BOYERO, L.; BAILEY, R. C. 2001. Organization of macroinvertebrate communities at a hierarchy of spatial scales in a tropical stream. Hydrobiologia 464:219– 225. BOYERO, L. 2003. The quantification of local substrate heterogeneity in streams and its significance for macroinvertebrate assemblages. Hydrobiologia 499:161- 168. BUCKER, F.; GONCALVES, R.; BUCKUP. G. B.; MELO, A. S. 2008. Effect of environmental variables on the distribution of two fresh - water crabs (Annomura: Aeglidae). Journ. Crust. Biol. 28: 248 – 251 CALHEIROS, D.F.; OLIVEIRA, M.D. 2010. O Rio Paraguai e sua planície de inundação - O Pantanal Mato-Grossense. Ciência & Ambiente, v.41, p.113-130 CARVALHO, A.L.; CALIL, E.R. 2000. Chaves de identificação para as famílias de Odonata (Insecta) ocorrentes no Brasil, Adultos e Larvas. Papeis Avulsos de Zoologia, São Paulo, 41(15): 223-241. CARVALHO, A.L.; NESSIMIAN, J.L. 1998. Odonata do Estado do Rio de Janeiro, Brasil: Hábitats e hábitos das larvas Oecologia Brasiliensis (Esteves, F.A., org.) (ISBN 85-85828-01-X), PPGE, Rio de Janeiro, p. 3-28.. In: Jorge Luiz Nessimian; Alcimar do Lago Carvalho. (Org.). Ecologia de Insetos aquáticos (Oecologia Brasiliensis V). Rio de Janeiro: Programa de Pós-graduação em Ecologia da UFRJ, p. 3-28. CLARKE, A.; NALLY, R.M.; BOND, N.R.; LAKE,P.S. 2010. Conserving macroinvertebrate diversity in headwater streams: the importance of knowing the relative contributions of α and β diversity. Diversity and Distributions 16:725–736. 21

CONRAD, K.F.; WILSON, K.H.; HARVEY, I.V.; THOMAS, C.J.; SHERRATT, T.N. 1999. Dispersal characteristics of seven odonate species in an agricultural landscape. Ecography 22:524–531 CORBET, P. S. 1980. A biology of Odonata. Annual Review of Entomology, 25: 189-217. COSTA, S. S.; MELO, A. S. 2008. Beta diversity in stream macroinvertebrate assemblages: among-site and among-microhabitat components. Hydrobiologia 598:131–138. COSTA, J. M.; SOUZA, L.O.I.; OLDRINI, B.B. 2004. Chave para Identificação das Famílias e Gêneros das larvas de Odonata do Brasil: Comentários e Registros Bibliográficos (Insecta: Odonata). Publicações Avulsas do Museu Nacional, Rio de Janeiro, 99(s/n):1-44. CRISCI-BISPO, V. L.; BISPO, P.C.; FROEHLICH, C. G. 2007 Ephemeroptera, Plecoptera and Trichoptera assemblages in two Atlantic Rainforest streams, Southeastern Brazil. Revista Brasileira de Zoologia. 24:312-318. CRIST, T.O.; VEECH, J.A.; GERING, J.C.; SUMMERVILLE, K.S. 2003. Partitioning species diversity across landscapes and regions: a hierarchical analysis of α, β, and γ diversity. The American Naturalist, 162: 734‐743. CRIST, T. O.; VEECH, J. A. 2006. Additive partitioning of rarefaction curves and species–area relationships: unifying α-, β- and γ-diversity with sample size and habitat area. Ecology Letters 9: 923–932. DIJKSTRA, K.D.B.; LEMPERT, J. 2003. Odonate assemblages of running waters in the Upper Guinean forest. Arch. Hydrobiologia 157(3):397–412 DOLÉDEC, S.; PHILLIPS, N.; TOWNSEND, C. 2011. Invertebrate community responses to land use at a broad spatial scale: trait and taxonomic measures compared in New Zealand rivers. Freshwater Biology 56:1670–1688. DOLPH, C. L.;HUFF, D. D.; CHIZINSKI, C. J.; VONDRACEK, B. 2011. Implications of community concordance for assessing stream integrity at three nested spatial scales in Minnesota, U.S.A.. Freshwater Biology 56:1652–1669. ENVIRONMENTAL SYSTEMS RESEARCH INSTITUTE (ESRI). 2007. Inc. ArcGIS, Version 9.2. Redlands, CA. FIORI, A. P; FIORI, C. O.; DISPERATI, L.; CONCEIÇÃO, A.; KOZCIAK, S.; GUEDES, J. A.; CIALI, A. 2001. O processo erosivo na bacia do Alto Paraguai. Boletim Paranaense de Geociências, 49: 63-78. 22

FOOTE, A.L.; HORNUNG, C.L.R. 2005. Odonates as biological indicators of grazing effects on Canadian prairie wetlands. Ecol. Entomol. 30:273–283. FRISSELL, C.A.; LISS, W.J.; WARREN, C.E.; HURLEY, M.D. 1986. A hierarchical framework for stream habitat classification: viewing streams in a watershed context. Environmental Management 10: 199-214. GOTELLI, N. J.; ELLISON, A. M. 2010. Princípios de Estatística em Ecologia. Artmed Editora. 683p. GRABOW, K.; RÜPPELL, G. 1995. Wing loading in relation to size and flight characteristics of European Odonata. Odonatologica, 24:175–186. HARRISON, S.; CORNELL, H. 2008. Toward a better understanding of the regional causes of local community richness. Ecology Letters 11:969–979. HEINO, J.; MUOTKAT, T.; PAAVOLA, R. 2003. Determinants of Macroinvertebrate Diversity in Headwater Streams: Regional and Local Influences. Journal of Ecology 72:425-434 HEINO, J. 2011. A macroecological perspective of diversity patterns in the freshwater realm. Freshwater Biology 56:1703–1722. HIGGINS, J. V.; BRYER, M. T.; KHOURY, M. L.; FITZHUGH, T. W. 2005. A freshwater Classification Approach for Biodiversity Conservation Planning. Conservation Biology 19 (2). HOFMANN, T.A.; MASON, C.F. 2005. Habitat characteristics and the distribution of Odonata in a lowland river catchment in eastern England. Hydrobiologia 539:137–147. JOST, L. 2007. Partitioning Diversity Into Independent Alpha And Beta Components. Ecology 88(10):2427-2439. JOST, L.; DEVRIES, P.; WALLA, T.; GREENEY, H.; CHAO, A.; RICOTTA, C. 2010. Partitioning diversity for conservation analyses. Diversity and Distributions 16:65–76. KEIL, P.; SIMOVA, I.; HAWKINS, B. A. 2008. Water-energy and the geographical species richness pattern of European and North African (Odonata). Conservation and Diversity 1:142–150. KIKUCHI, R.M.; UIEDA, V.S. 1998. Composição da comunidade de invertebrados de um ambiente lótico tropical e sua variação espacial e temporal. pp. 157- 173. In: J.L. Nessimian, & E. Carvalho (Eds). Ecologia de insetos aquáticos. Rio de Janeiro, PPGE-UFRJ, Series Oecologia Brasiliensis, vol. 5, 309p. 23

LANDE, R. 1996. Statistics and partitioning of species diversity, and similarity among multiple communities. Oikos 76: 5-13. LEGENDRE, P.; LEGENDRE, L. 1998. Numerical Ecology - Developments in environmental modelling 20. 2º ed. Elsevier science B.V. Amsterdam. LIGEIRO, R.; MELO, A.S.; CALLISTO, M. 2010. Spatial scale and the diversity of macroinvertebrates in a Neotropical catchment. Freshwater Biology 55:424– 435. LIMA, E. B. N. R. 2001. Modelação Integrada para Gestão da Qualidade da Água na Bacia do Rio Cuiabá. Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil, 184pp. MAY, M.L. 1981. Allometric analysis of body and wing dimensions of male Anisoptera. Odonatologica 10:279–292. MERRITT, R.W. & CUMMINS, K.W. 1996. Na introduction to the Aquatic of North America. 3th Edition. Kendall/Hunt Publishing Company. xiii + 862p MYKRÄ, H.; HEINO, J.; MUOTKA, T. 2007. Scale-related patterns in the spatial and environmental components of stream macroinvertebrate assemblage variation. Global Ecology and Biogeography, 16:149–159. PAKNIA, O.; PFEIFFER, M. 2011. Hierarchical partitioning of ant diversity: implications for conservation of biogeographical diversity in arid and semi-arid areas. Diversity and Distributions 17:122–131. POFF N.L. 1997. Landscape filters and species traits: towards mechanistic understanding and prediction in stream ecology. Journal of the North American Benthological Society, 16, 391–409. RIBEIRO, D. B.; PRADO, P. I.;BROWN, K. S.; FREITAS, A. V. L. 2008. Additive partitioning of butterfly diversity in a fragmented landscape: importance of scale and implications for conservation. Diversity and Distributions, 14, 961–968. RICOTTA, C. 2007. Computing additive b-diversity from presence and absence scores: a critique and alternative parameters. Theoretical Population Biology 73:244–249. RICKLEFS, R.E.; SCHLUTER, D. 1993. Species Diversity in Ecological Communities: Historical and Geographical Perspectives. University of Chicago Press, Chicago. 24

SILVA, D. P.; DE MARCO, P.; RESENDE, D. C. 2010. Adult Odonate abundance and community assemblage measures as indicators of stream ecological integrity: A case study. Ecological Indicators 10:744–752. SILVA, N. A.; LIMA, E. B. N. R.; SILVINO, A. N. O.; SANTOS, A. A.; SILVA, J. B.; LIMA, J. B. 2008. Caracterização espacial das pisciculturas na Bacia do Rio Cuiabá/MT. Engenharia Ambiental, 5(3): 47-62. SIMAIKA, J. P.; SAMWAYS, M. J. 2011. Comparative assessment of indices of freshwater habitat conditions using different invertebrate taxon sets. Ecological Indicators 11:370–378. SMITH, J.; SAMWAYS, M.J.; TAYLOR, S. 2007. Assessing riparian quality using two complementary sets of bioindicators. Biodiversity and Conservation 16:2695–2713 STENDERA, E. S. & JOHNSON, R. K. 2005. Additive partitioning of aquatic invertebrate species diversity across multiple spatial scales. Freshwater Biology 50, 1360–1375. STEVENS, L. E.; BAILOWITZ, R. A. 2009. Odonata Biogeography in the Grand Canyon Ecoregion, Southwestern USA. Entomological Society of America 102(2):261-274. SOUZA, L.O.I.; COSTA, J. M.; OLDRINI, B. B. 2007. Odonata. In: Guia on-line: Identificação de larvas de Insetos Aquáticos do Estado de São Paulo. Froehlich, C.G. (org.). Disponível na World Wide Web em: http://sites.ffclrp.usp.br/aguadoce/Guia_online 10/03/2011. VEECH, J. A. 2005. Analyzing patterns of species diversity as departures from random expectations. Oikos, 108:149-155. VEECH, J.A,; CRIST, T.O. 2009. PARTITION: software for hierarchical partitioning of species diversity, version 3.0. http://www.users.muohio.edu/cristto/partition.htm VEECH, J.A.; CRIST, T.O. 2010A. Toward a unified view of diversity partitioning. Ecology 91(7):1988–1992. VEECH, J.A.; CRIST, T.O. 2010B. Diversity partitioning without statistical independence of alpha and beta. Ecology 91:1964–1969. WARD, J.V.; TOCKNER, K.; ARSCOTT, D.B.; CLARET, C. 2002. Riverine landscape diversity. Freshwater Biology 47:517–539. 25

WIENS, J.A. 1989. Spatial Scaling in Ecology. Functional Ecology 3(4):385-397. WIENS, J.A. 2002. Riverine landscapes: taking landscape ecology into the water. Freshwater Biology 47:501–515. WILSEY, B. J. 2010. An empirical comparison of beta diversity indices in establishing prairies. Ecology, 91(7).