UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO PROFISSIONALIZANTE EM PATRIMÔNIO CULTURAL

COSETE NASCIMENTO DO NASCIMENTO

UM OLHAR SOBRE O PATRIMÔNIO CULTURAL DE BOSSOROCA-RS

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

Santa Maria, RS, Brasil 2012

COSETE NASCIMENTO DO NASCIMENTO

UM OLHAR SOBRE O PATRIMÔNIO CULTURAL DE BOSSOROCA-RS

ção apresentada ao Curso de Disserta ós ção Mestrado do Programa de P -Gradua ônio Área Profissionalizante em Patrim Cultural, ção em História e Patrimônio de Concentra Cultural, da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM, RS), como requisito parcial para ção do grau de Mestre em Patrimônio obten Cultural .

Orientador: Prof. Dr. Júlio Ricardo Quevedo dos Santos

Santa Maria, RS, Brasil 2012

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO PROFISSIONALIZANTE EM PATRIMÔNIO CULTURAL

ão Examinadora, abaixo assinada, A Comiss ção de Mestrado aprova a Disserta

UM OLHAR SOBRE O PATRIMÔNIO CULTURAL DE BOSSOROCA-RS

elaborada por

COSETE NASCIMENTO DO NASCIMENTO

ção do grau de como requisito parcial para obten Mestre em Patrimônio Cultural

COMISSÃO EXAMINADORA:

Júlio Ricardo Quevedo dos Santos, Dr. (Presidente/Orientador)

Elisabete da Costa Leal, Drª. (UFPel)

Roselene Gomes Pommer, Drª. (UFSM)

Denise Saad, Drª. (UFSM) Suplente

Santa Maria, 24 de agosto de 2012.

RESUMO

ção de Mestrado Disserta ós ção Profissionalizante em Patrimônio Programa de P -Gradua Cultural Universidade Federal de Santa Maria

UM OLHAR SOBRE O PATRIMÔNIO CULTURAL DE BOSSOROCA-RS

AUTORA: Cosete Nascimento do Nascimento úlio Ricardo Quevedo dos Santos ORIENTADOR: J

ônio C Este trabalho tem como objetivo perceber e interpretar o Patrim ultural és das representações do passado e dos existente em Bossoroca (RS), atrav ímbolos e elementos que se firmaram com o tempo, compreendendo e avaliando o s ônio para se apresentar frente ao outro modo como se faz uso desse patrim . ão reconhecidos como guardiões Buscamos conhecer e interpretar os lugares que s ória no município. álise acerca do que é de mem Diante disso, se faz uma an ônio cultural hoje, e são traçadas c ções sobre as considerado patrim onsidera ções de rela poder que se estabeleceram no decorrer do tempo, reproduzindo ímbolos e repr ções capazes de articular as órias de determinados s esenta mem ção de uma identidade grupos e manter a invisibilidade de outros, como a afirma ípio. ão apontadas as percepções sobre a relevância missioneira para o munic S e ções patrimoniais exercem ou pod potencialidade que as a em exercer sobre uma comunidade, contribuindo para rupturas ou continuidades dos modelos sociais ção patrimonial fator importante para estabelecidos, sendo, portanto a educa a ção da cidad ís que sempre sobrepôs uma elite constru ania dentro de um pa ômica e social frente aos processos culturais. ção contribui para a econ Essa Disserta ão da dinâmica cultural local e regional. O estudo feito se operacionaliza compreens ção Patrimonia numa cartilha de Educa l que tem como pressuposto servir como ória nas escolas do município. recurso para o ensino de Hist

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Palavras-chave: Patrimônio cultural, relações de poder, identidade, educação patrimonial.

ABSTRACT

Master Course Dissertation Professional Graduation Program in Cultural Heritage Universidade Federal de Santa Maria

AUTHOR: Cosete Nascimento do Nascimento úlio Ricardo Quevedo dos Santos ADVISER: J Defense Place and Date: Santa Maria, 24 de agosto de 2012.

This study aims to understand and interpret the existing Heritage in Bossoroca (RS), through the representations of the past and symbols and elements which have entered into the time, understanding and assessing how one uses this equity to be presented before the other, we seek to understand and interpret the places that are recognized as guardians of memory in the city. Given this, an analysis is made of what is considered cultural heritage today, considerations are drawn on the power relations that are established over time, reproducing symbols and representations able to articulate memories of certain groups and maintain the invisibility of others, as “missioneira”. This study shows the the affirmation of an identity for the city perceptions of the relevance and potential equity shares that are or may have on a community, contributing to breaks or continuities of established social models, therefore important heritage education for the construction of citizenship in a country that always overcame economic and social elite in the face of cultural processes. The study is operationalized in a primer Heritage Education which is assumed to serve as a resource for teaching history in schools in the city.

Keywords Cultural Heritage, power relations, identity, heritage education. :

“Canta tua aldeia e serás universal” a .

Leon Tolstoi

AGRADECIMENTOS

ço ao meu orientador, Agrade o professor Dr. Julio Quevedo, pelo incentivo, pelo entusiasmo e pelo exemplo que sempre foram balizas para mim. ço a todos os professores do Mestrado em Patrimônio Cultural Agrade , pois ários acerca das questões patrimoniais. me trouxeram os conhecimentos necess A todas as outras pessoas que me ajudaram e torceram por mim, o meu sincero agradecimento. ço a minha família, que esteve a ória, Agrade o meu lado durante esta trajet ências, suprindo necessidades e anseios, encorajando e suportando aus acompanhando, pois fomos companheiros nesta busca. é nossa. Esta conquista

LISTA DE FIGURAS

ção ípio Figura1: Mapa de localiza do munic ...... 42

Figura 2: Mapa dos trinta Povos Missioneiros...... 46

Figura 3: Mapa de Bossoroca...... 52 ância do Sobrado (Jan./2010). Figura 4: Imagem da Santa em madeira da Est ...... 59 ância do Sobrado (jan./2010) Figura 5: Vista da Est ...... 60 ão conhecido como senzala. (jan./2010) Figura 6: Vista do galp ...... 61 ância Velha (jan./2009) Figura 7: Vista de frente da Est ...... 65 ância Velha (antiga) Figura 8: Vista de frente da Est ...... 66 ísticos da arquitetura da Estância Velha. Figuras 9 e 10: Elementos caracter ...... 67 ério dos Cativos. Figura 11: Mapa localizando o Cemit ...... 69 ério dos Cativos (Nov./2011). Figura 12: Vista do Cemit ...... 70 ério Municipal de Bossoroca Figura 13: Memorial a Noel Guarany, Cemit -RS ...... 71 Figura 14: Noel Guarany...... 71 ótula de acesso a Bossoroca Figura 15: Cruz Missioneira na r -RS (Outubro/2011). ...94 ão dos Antunes( set./2009) Figura 16: Casa de pedras no Rinc ...... 98 ância do Sobrado (jan./2010). Figura 17: Est ...... 99 ça ( jan./2010). Figura 18: Fazenda Boa Esperan ...... 99 ê o Centro e o Bairro Gaúcha. Figura 19: Imagem onde se v ...... 101 çado das ruas e respectivos nomes, Figura 20: Mapa da cidade com o tra úcha. evidenciando o Centro e o Bairro Ga ...... 102

SUMÁRIO

ÇÃO INTRODU ...... 11 ÇÕES CONCEITUAIS E HISTÓRICAS 1 DEFINI ...... 27 ônio Cultural e Cultura 1.1 Patrim ...... 27 ônio e Relações de Poder 1.2 Patrim ...... 33 ância do Patrimônio para a Com 1.3 A Relev unidade...... 38 ção Histórica de Bossoroca 1.4 A Forma ...... 41 ÓRIA 2 OS LUGARES DE MEM ...... 54 ória do Município de Bossoroca/RS 2.1 Alguns lugares de mem ...... 55 ância 2.2.1 A Est do Sobrado...... 57 2.2.2 A Senzala...... 60 ância Velha 2.2.3 Sede da Est ...... 62 ério 2.2.4 Cemit dos Cativos ...... 68 2.2.5 Monumento a Noel Guarany ...... 71 ÔNIO NOS PROCESSOS IDENTITÁRIOS E AS 3 USO DO PATRIM ÇÕES, SIGNOS E ELEMENTOS QUE SÂO ASPECTOS DA REPRESENTA CULTURA LOCAL...... 78 é 3.1 Bossoroca Missioneira!!! ...... 83 Buena Terra Missioneira 3.1.1 O Nome ...... 87 ônio de Boss 3.1.2 Noel Guarany: Patrim oroca ...... 88 3.1.3 Jayme Caetano Braun: Tronco Missioneiro e Cria da Bossoroca ...... 92 ância do Sobrado como Pressuposto Arqueológico 3.1.4 A Est - A Materialidade ... 93 3.1.5 A Cruz Missioneira no trevo de acesso a Bossoroca ...... 94 ção 3.1.6 O Manancial Missioneiro da Can ...... 95 áticas 3.2 A Cultura Estancieira Em Bossoroca, aspecto preponderante nas pr ípio sociais e na cultura do Munic ...... 96 ância 3.2.1 As Est s (Sede das Sesmarias, Fazendas) ...... 97 – ção espacial r 3.2.2 A Geografia da Cidade A organiza eproduz e revela as ções de Poder Rela ...... 100 ória de Bossoroca 3.2.3 O Senhor de terras e o papel do Gringo na Hist ...... 104 3.2.4 O Negro na sociedade bossoroquense...... 106 ÇÃO 4 EDUCA PATRIMONIAL NA SALA DE AULA ...... 109 ção do p 4.1 Apresenta roduto...... 109 4.2 Metodologia...... 111 4.3 Uso do material na Sala de Aula...... 112 çâo Patrimonial 4.4 O Produto: Cartilha de Educa ...... 114

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ÇÕES FINAI CONSIDERA S ...... 1274 ÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS REFER ...... 13330

INTRODUÇÃO

ônio Cultural existente Este trabalho pretende perceber e interpretar o Patrim ções do passado e dos símbolos e em Bossoroca (RS), por meio das representa elementos que se firmaram com o tempo, compreendendo e avaliando o modo como ônio. se faz uso desse patrim álise do patrimônio histórico Para an -cultural de Bossoroca buscamos ampliar conhecimentos, por meio do estudo de campo, sobre os lugares reconhecidos como ões da memória do município. guardi ípio de Bossoroca está situado ão das Missões e inserido O munic na regi , ório que abrigou n órico a experiência social dos portando, no territ o passado hist ítas óis e índios guaranis a partir do século XVII e que se reflete nos dias jesu espanh ções e interpretações. Após a derrocada da atuais numa diversidade de utiliza ência indígena e jesuítica, convencionalmente conhecida por período das experi ões Orientais, éricas, Miss quando as Cortes Ib em sua fase de Estado Absolutista, ão colonial assinaram o Tratado de Madri de 1750 acarretando a decorrente rebeli ígena ítica ind - a Guerra Guaran - de 1754 a 1756 e os luso-brasileiros intensificaram ça éc sua presen . Desde meados do s ulo XVIII, estavam envolvidos na conquista do oeste do atual . À medida que se expandiam, por suas iniciativas particulares, apropriavam -se ão – âncias missioneiras – do principal bem da regi o gado das est e expropriavam as ígen õe terras ind as e das Miss s Orientais. Na medida em que ocupavam as terras na í à Coroa de banda ocidental dos rios Pardo e Jacu , requeriam a posse das terras época: a doação de sesmarias. Portugal por meio do principal instrumento legal da Essa conquista do oeste sul-rio-grandense foi legalizada pelas autoridades portuguesas coloniais, instaladas na Capitania do Rio de Janeiro e contou com o

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ção conjunta de iniciativas apoio da Corte de Portugal. Tornava-se, portanto, uma a ê particulares e do Estado Absolutista Portugu s. O instrumento internacional que uti possidetis legalizou essas posses em forma de (quem possui de fato, deve ório ocupado possuir de direito), foi o Tratado de Madri, garantindo posse do territ ões Orientais e suas estâncias de ervais. Essa ção luso pelas Miss ocupa -brasileira ocorre, em grande parte, pelo instituto das sesmarias. éculo XIX Em meados do s , ocorreu outra leva de conquista do oeste sul-rio- íodo do Estado monárquico e e grandense, no per scravista brasileiro a partir dos çõe âneas empreendidas principalmente por processos de imigra s europeias espont ães e italianos com o apoio da Corte do Rio de Janeiro e do Presidente da alem íncia do Rio Grande de São Pedro, constituída a partir da Constituição de 1824. Prov ães e Assim, Bossoroca recebe outras levas de pessoas (descendentes de alem ípio, hoje intitulado Buena italianos), que passam a integrar o munic Terra Missioneira. ção, compreendemos que se trata de uma Quanto a essa denomina ção do passado histórico, em sua fase missioneira, de denominação apropria ças missioneiras na cultura de institucional e popular, que alcunha as heran ância e a presença indígena naquele Bossoroca sem reconhecer o papel, a import ência à Buena exemplo de passado. Qualquer habitante de Bossoroca faz refer Terra ência Missioneira e a sua hospitalidade sem referir profundamente o que foi a experi órico missioneiro alguns aspectos missioneira. Assim, retira e recorta do passado hist ório bem ção e como o processo civilizat -sucedido, o triunfo da cristianiza ção empreendidas pe ítas no seu projeto apostólico ítico, evangeliza los jesu -pol ças de seus vínculos com os povoados missioneiros de São Luiz Gonzaga e lembran ão Lourenço, suas atividades socioeconômicas comunitárias e sua arte e S êntico processo de ocidentalização. D linguagens, num aut essa forma, ocorre uma ção do passado para compreender alguns aspectos do tempo presente, apropria ção Buena é construída socialmente em meio quando a denomina Terra Missioneira às invisibilidades da presença indígena, africana aos diferentes esquecimentos e e afro-brasileira e das mulheres. é o problema que se impõe: Como se constrói e se constitui uma “Buena Este ” que prioriza algumas lembranças e esquece outras tantas Terra Missioneira ém importantes na sua formulação? Assim, no itinerário da construçã tamb o de ígios do nosso enunciado, nos propomos a compreender e analisar os vest

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ônio cultural de Bossoroca vivenciados e valorizados na comunidade local e patrim ções que se fazem do passado histórico em suas diferentes fases, as representa ções que se fazem dessa parte – Buena bem como as representa a Terra – todo é, a região das Missões. Missioneira pela comunidade no seu , isto álise etnográfica de Bossoroca, apenas observando o Ao fazermos uma an ão visíveis nas pessoas e ário modo de ser e agir dos bossoroquenses, s no imagin “apenas” fortes marcas, sinais, algumas coletivo e popular que os constitui, ências das frentes de ocupação de origem ibérica: a missioneira em sua fase evid ítico ção e nas suas representações, a jesu -guarani, enaltecida pela popula ítas e a ação civilizatória. Essas marcas creditam, portanto, aos supremacia dos jesu “autênticos” sujeitos padres da Companhia de Jesus o protagonismo enquanto óricos. Nessa imagem, coube aos indígenas apenas o papel de coadjuvantes, hist óricos. As referências que se fazem a raramente mencionados como sujeitos hist ótipos pejorativos: selvagens, bárbaros, dóceis, incapazes, cuja eles trazem estere única capacidade foi a de serem “bons reprodutores” da cultura ocidental trazida ítas, resultando daí o enaltecime às virtudes dos padres missionários pelos jesu nto da Companhia de Jesus. é o órico e A outra face do enaltecimento ao passado hist stancieiro, na origem ílias que fundaram a cidade. A imagem subverte o passado e, de repente, das fam ções sobre o proc órico, os jesuítas e seus indígenas sem grandes explica esso hist ória, sem maiores explicações, apenas numa formulação missionados somem da hist íduos do Tratado de Madri, da simplista de lugares-comuns que relembra os res ítica e da Expulsão dos Jesuítas [uma expe ência que some do palco Guerra Guaran ri dos acontecimentos em apenas 18 anos, entre 1750-1768, no amplo contexto dos ção daquela experiência]. Esses clichês acabam por 150 anos da longa dura ígenas nas Missões banalizar os acontecimentos, como se o cotidiano dos ind ão dos jesuítas. Essa é Orientais tivesse seu fim e derrocada apenas com a expuls ígena, como se as uma forma de alcunhar indelevelmente a incapacidade ind ências históricas comprovas ígenas não tivera evid sem que os ind m capacidade de ós a exp ão e à vida errante, recolhidos no difamado sobreviver ap uls voltaram pensamento selvagem. Como contraponto a essa imagem negativa, os atos e os feitos dos primeiros ão evidenciados e enaltecidos. Ao observar as falas, estancieiros luso-brasileiros s ão da os sinais, os emblemas do povo, percebe-se um sentimento de gratid

14 comunidade aos estancieiros, interpretados como desbravadores, pioneiros, aqueles ípios civilizatórios e a integração política e econômica para que trouxeram os princ ção cultural dos bossoroque garantir a emancipa nses. Essa forma de é profundamente seletiva. Ao escolherem alguns elementos do reconhecimento órico éculo XVIII e ao longo do século XIX passado hist -estancieiro do final do s , a ção e as instituições o fazem em meio aos esquecimentos e às invisibilid popula ades. Assim, silenciam sobre os processos expropriativos da terra iniciados com a ção das estâncias missioneiras e percorridos pela ação dos estancieiros rio ocupa - ório em 1801, quando foram grandenses que conquistaram o territ organizadas à região das pequenas tropas de milicianos que realizaram os primeiros ataques ões e não pouparam seus habitantes e propriedades. Nesse evento, destacou Miss - ícias e estancieiro Manuel dos Santos Pedroso [Maneco se o militar, major de mil Pedroso] com sua tropa de 30 homens armados, e o comerciante e contrabandista é Francisco Borges do Canto Jos e seus 15 homens armados. Dessa conquista do ório, decorreu a ção de sesmarias pelo governo português nos territ progressiva doa órdios do sé ções ígenas, africanos prim culo XIX. Esse processo contou com a de ind ção do e afro-brasileiros, pequenos lavradores, acompanhados pela destrui ônio de cultura material existente, transformado em ruínas – ínas das patrim as ru ões Orientais do Uruguai. Miss ções ibéricas As marcas, sinais e emblemas dessas duas frentes de ocupa ão residuais e áticas culturais de Bossoroca e no saber s repercutem muito nas pr ções, pesquis ências pessoais, local. Ao longo de nossas observa as e viv ências históricas e culturais que precisam ser percebemos que se constituem refer interpretadas e avaliadas para que cumpram seu papel na sociedade atual. ípio de Bossoroca, apresenta “Buena Oficialmente, o munic -se como Terra ”, numa ência a seu passado missioneiro. No imaginário da Missioneira refer ção, essa expressão contém carga ântica que a define como terra e popula sem sociedade hospitaleiras, enfim como uma terra boa para nela viver e cujos nexos de ças culturais ibéricas, naquilo que foi prosperidade foram apropriados das heran ítica de que Bossoroca seja re ção selecionado. A vontade pol conhecida por sua rela ória das Missões e faça uso dela fica evidenciada na Lei Orgânica com a hist º dispõe “São símbolos do município de Bossoroca o brasão, Municipal, cujo Artigo 4 “Buena ” e outros estabelecidos ” (Lei a bandeira, o slogan - Terra Missioneira em Lei

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ânica Municipal 1 úblico, como ente de direito, está imbuído de Org - 2000). O poder p capacidade legal para representar a vontade do todo. Nesse sentido, o percebemos ção patrimonial e na como um importante condutor no processo de valoriza ção das identidades, pois é pela ênfase ao patrimônio histórico e cultural que afirma ção que baseiam os processos identitários se imprimem as formas de apresenta regionais. ções e símbolos que permanecem vivos na Apesar disso, muitas representa ão faci sociedade s lmente identificados com o passado estancieiro do lugar. Nesse ão existe uma identidade cultural em Bossoroca, mas prisma, torna-se claro que n órico e das negociações e/ou identidades que resultam do processo hist ções do passado histórico que foram apropria se estabelecendo. Isso ocorre porque ção de identidades é negociado e configura um hibridismo todo processo de constru cultural, que se imprime pelas mesclas interculturais, ou seja, mistura de aspectos de uma cultura com outra(s), fazendo surgir o que Cancline (1997), Stuart Hall íbrido2 (1998) e Peter Burke (2006) referem como elemento h . Ao analisarmos as buscas empreendidas pelos bossoroquenses ao passado órico, nem sempre el ções ou apropriações, hist as se traduzem como negocia mas ções. Buscam ão das formas como imposi os em Burke a compreens pelas quais uma ígios e fragmentos do passado, tomando comunidade se apropria de vest -os de éstimos para interpretar o tempo presente, pois coube aos historiadores o papel empr crucial e relevante para assimilar e transferir de alguns momentos do passado órico determinados signos, sinais, emblemas, códigos, os quais são hist ressignificados ao sabor do tempo presente3. Neste ponto, torna-se imperativo vislumbrar e compreender os movimentos ípio a dire ção, ou que levaram o munic cionar-se para uma possibilidade de apresenta seja, uma forma de apresentar-se, em detrimento de outra ou outras no momento de constituir uma identidade para se apresentar.

1 “História e Teoria Social” [São Paulo: Ed O historiador Peter Burke em . UNESP, 2002] analisa a ância d ção de símbolos, bandeiras, brasões, hinos, decretos nas identidades import a incorpora “O poder da memória, da imaginação e dos locais, regionais e nacionais, os quais evidenciam ímbolos – – ção de comunidades” (BURKE, 2002, p. 85 s sobretudo a linguagem na constru ). 2 íbrido significa a relação de trocas entre as culturas que se Para Clancline (1997), elemento h âmica dos processos culturais, entre o tradicional e o moderno, num movimento estabelecem na din ências constante. HALL, Stuart. A identidade cultural na Pós-Modernidade de rupturas e perman . ção Tomaz Tadeu da Silva e Guacira Lopes Louro. 6 ed. Rio de Janeiro Tradu : DP&A editora, 1998, pp. 91-97. 3 Hibridismo Cultural ção Leila Souza Mandes. São Leopoldo, Ed.unisinos, BURKE, Peter. . Tradu 2006, pp. 41-44.

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ão agregadas de acordo com as necessidades e As identidades s ção e poder conseguem possibilidades com que os grupos dotados de disposi ções, imprimindo aspectos de determinada cultura negociar/afirmar suas interpreta ão a um grupo que se liga pela ideia de pertencime para dar coes nto. Sobre esta ão, Zygmund “a “identidade” nasceu da crise do quest Bauman comenta que ideia de ço que esta desencadeou no sentido de transpor a brecha pertencimento e do esfor “deve” e o “é” e erguer a realidade ao nível dos padrões estabelecidos pela entre o – à semelhança da ideia” ideia recriar a realidade (BAUMAN, 2005, p. 26). ê a questão do pertencimento e Nesse sentido, esse autor rev a forma como ção foi construída na gestação do Estad éculo essa interpreta o Moderno, a partir do s ão, que as identidades na atualidade são fluídas e que o XVIII. Defende, ent mais é estar incluído, sentir ído e ter a opção de estar significativo e importante -se inclu ído em grupos e redes sociais. inclu Assim, o debate sobre a identidade ocupa cada vez mais a centralidade nas ências humanas e sociais, que têm, na argumentação ci de Stuart Hall (1998), a identidade como um problema ainda mais relevante num contexto em que as ão mais se referem a grupos fechados ou apenas a identidades identidades n étnicas. Num mundo instável - numa sociedade de risco (BECK, 2003), numa íquida (BAUMAN, 2001) – ém se tornam instáveis. modernidade l as identidades tamb íficos e também deixam de ser o foco Deixam de ser determinadas por grupos espec íbridas e deslocadas de de estabilidade do mundo social. As identidades tornam-se h ínculo local. E isso ém que são transformadas em um v significa tamb tarefa ção incessante, e não mais de atribuição individual, em um processo de constru ção às normas sociais. coletiva que implicava apenas certa conforma Por fim, Bauman assevera que identidade:

ça, singular – significa parecer ser diferente e, por essa diferen e assim a ão pode deixar de dividir e separar, no entanto a procura da identidade n ária vulnerabilidade das identidades individuais e a precariedade da solit ção da identidade levam os construto constru res da identidade a procurar cabides em que possam, em conjunto, pendurar seus medos e ansiedades individualmente experimentados e depois disso, realizar ritos de íduos também assustados e exorcismo em companhia de outros indiv ansiosos (BAUMAN, 2003, p.21).

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órico de Bossoroca e a construção do Desse modo, conhecer o passado hist ônio cultural requer pensar como se construíram na comunidade as seu patrim ários. identidades e as disputas entre os diferentes grupos e projetos identit Trata-se, pois, de uma tarefa complexa perceber os diferentes momentos e íveis de pensamento em que as identidades locais e regionais foram construídas e n articuladas, vinculadas ao todo. Trata-se de descobrir como as identidades em – – Bossoroca pensam o todo no caso o missioneirismo e como esse todo inclui e pensa as identidades locais, revelando as continuidades, descontinuidades, ências, rupturas e circularidades. Enfim, na questão da identidade, o perman ônio cultural é de fundamental importância para que a comunidade s patrim e sinta ou ão incluída nas identidades missioneiras e/ou estancieiras da região. Nessas n ção, foram priorizados o missioneirismo disputas pelo passado e por sua hegemoniza e o estancieirismo em detrimento do imigrantismo, do indigenismo e do afro- ônio cultural de Bossoroca traduz o quanto as brasileirismo. Todavia, o patrim ão híbridas e deslocadas de um vínculo local, pois revelam nexos com identidades s a cultura regional, nacional e global. órico de Bossoroca, contemplar Desse modo, conhecer o contexto hist as ípio, o “cemitério dos cativos”, cercas e mangueiras de pedra espalhadas pelo munic as velhas casas que foram sede das primeiras fazendas com seus lugares ões, os signos e representações presentes na cultura de reservados a negros ou pe Bossoroca nos instiga a buscar compreender esses lugares, seus significados e ções na comunidade e nas relações sociais estabelecidas, interpretando suas proje os significados que podem resultar disso e as formas como as identidades em ão híbridas e como ultrapass ínculos meramente locais e Bossoroca s am os v atingem o todo, o mundo que o circunda. ção de sistemas de convivência em grupo que repercutem na forma A constru ção espaço é inerente aos seres humanos. Assim, o e no modelo de ocupa -temporal é o resultado que se tem hoje da forma como os grupos presentes em determinado ção desses seres com os lugares e objetos do seu lugar se relacionaram e da intera ém da forma como os que recebem esse legado o tratam no entorno e tamb presente. Partindo dessa premissa, nos propomos a conhecer e interpretar a cultura ônio cultural do município de Bossoroca e a refletir sobre eles, com base e o patrim no pressuposto de que os grupos sociais estabelecem sistemas de trocas culturais ça de forma dinâmica. para que o processo cultural aconte

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ões que temos dos lugares nos são possibilitadas pelo poder da As impress ória, da imaginação e dos símbolos a partir de experiências próprias ou mem ão compartilhadas com o grupo social de que fazemos parte a partir do qual s ídas ções. constru as representa

ções que incorporamos ao nosso passado não são nossas, Muitas recorda ós [...]. nos foram relatadas por nossos parentes e depois lembradas por n ória dentro da gente, Com o correr do tempo, elas passam a ter uma hist ão enriquecidas por exp ências e embates. acompanham nossa vida e s eri [...] ças que relatamos como nossas, mergulham num [...] Muitas lembran passado anterior ao nosso nascimento e nos foram contadas tantas vezes que as incorporamos ao nosso cabedal (BOSI, 1983, p. 331-334).

órico são o resultado de nossas Os recortes que fazemos do passado hist ções de mundo, estabelecidas por nossas vivências e nossas experiências concep óricos, pois olhamos o mundo a partir do presente e selecionamos como sujeitos hist nossos objetos de acordo com nossa subjetividade. ão de respostas definitivas, mas da relativização dos Partimos em busca, n ínio, fatos, percebendo novas possibilidades de racioc o que traz muitas ções e coloca em questão o que já foi pensado e contado. Por meio de um interroga ístico, procuramos compreender as falas, as imagens, as representações e olhar hol áticas sociais. Procuramos, enfim, compreender a cultura do lugar, empreendendo pr álogo entre a história e as disciplinas relacionadas. um di ítulo desta dissertação, ções conceituais No primeiro cap apresentamos defini óricas de cultura e patrimônio, visando compreender a complexa trama de e hist ções de poder implicada na constituição da cultura e na definição do patrimônio rela ços para delimitar cultural de um povo. Empreendemos esfor nosso entendimento ônio, focando nossas convicções sobre conceitos complexos como cultura e patrim ões. em autores que representam referenciais para aportar nossas reflex ímos, também, um panorama local, a fim de situar o leitor quanto ao Constru órico e cultural de Bossoroca. universo hist ítulo, elaboramos uma análise contextual em que No segundo cap ços de memória do município de Bossoroca, pois estes evidenciamos os espa ória histórica e referem momentos específicos da história do traduzem muito da trajet ípio, que aparecem descritos no livro que apresentamos como produto e são munic

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ões postais, fazendo parte do site oficial do município focados oficialmente como cart (http://www.bossoroca.rs.gov.br). ços, no terceiro capítulo, investigamos t Descritos esses espa ais lugares de ória, bem como algumas representações, signos e elementos da c mem ultura local, ância entre a cultura missioneira e as quais revelam altern a estancieira identificando ência que o passado jesuítico a influ -guarani e o passado estancieiro exercem na ípio, a ponto de ofuscar as outras mesclas culturais ou torná cultura do munic -las menos evidentes. ário dos mesmos, Com base nos dados coletados, fazemos um invent classificando-os conforme se revelam: oriundos da cultura missioneira4 e ou da estancieira5. Assim, procuramos interpretar o papel desempenhado por esses ção da cultura e nos processos de construção de identidade local. fatores na constitui ônio histórico e cultural vem sendo usado Avaliamos a forma como o patrim para imprimir a identidade missioneira de Bossoroca por meio de determinados á elementos: a fazenda do sobrado, pressuposto material, na perspectiva de afirm -lo ítio arqueológico jesuítico “Buena ” como s -missioneiro; o nome de Terra Missioneira ípio; v ção de artistas ligados à como slogan que identifica e qualifica o munic aloriza úsica conhecida como missioneira6 úsicos dessa região e m por ser executada por m enfocando temas ligados ao passado e presente missioneiro, dentre outras, como

4 à herança cultural do período em que as terras que Cultura missioneira, neste contexto, refere-se ão Bossoroca faziam parte da experiência político ítas hoje s -social desenvolvida pelos padres jesu índios guaranis, entre o século 17 e 18. Na é em contato com os busca em reafirmar esse passado ência a essa cultura missioneira. que se faz refer 5 ções e práticas culturais que dizem Por cultura estancieira, entendemos o conjunto de manifesta íodo em que as terras que hoje são o município de Bossoroca respeito ao per foram ocupadas ção do processo de distribuição sesmarias pelo governo luso ês, a principalmente em fun -portugu ício do século á explicitado ao longo deste estudo. partir do in 19, o que ser 6 ú á, De acordo com a POMMER: A m sica feita pelos artistas ditos missioneiros, como Cenair Maic ça e Jorge Guedes, é composta para conter a ideia de um passado Noel Guarany, Pedro Orta ífico, que se torna referência para apresentação de um gaúcho também específ espec ico: o É ões á missioneiro. a musica que canta o passado das miss , procurando conect -la ao presente por ção missioneira meio dos festivais em que aquele tempo passa a ser vivido como tradi (POMMER, ão reconhecidos pelo grande público como músicos 2006. p.179). Esses autores se apresentam e s úsica missioneiros. De acordo com a autora, essa m nada tem a ver com a que se cantava nas ões Jesuíticas, ão de São Luiz foi imp ção de instrumentos Miss na qual a Miss ortante foco de produ musicais. “A música missioneira pode ser entendida como Ceres Brum (BRUM, 2006, p. 367) diz que: um ênero musical relacionado ás Missões.” g Ainda de acordo com o Artigo Científico de Tainá Valenzuela (2012): “Hei de morrer cantando”: A Etnomusicalidade Missioneira e a música Nativista Rio-Grandense sobre as Missões. De acordo com a autora: “A Etnomusicalidade Missioneira do RS é a produção musical atual que trata de assuntos relativos à história dos 7 Povos das Missões e sua herança cultural. Esta produção é realizada por compositores com ligação direta com a Região Missioneira, seja por nascimento, parentesco, vivências e afins”.

20 parte de um movimento regional voltado a construir uma identidade regional ção do passado jesuítico baseada na afirma -guarani. No entanto, nossa premissa á consubstanciada na questão das apropriações do passado histórico, quando est determinados grupos retiram dele elementos considerados pertinentes e explicativos ão do grupo que está no poder. Nesse para o tempo presente, expressando a vis ções faz parte das disputas do pod sentido, o uso de algumas apropria er, pelo poder, ímbolos, sinais e emblemas. de s ços Salientamos alguns aspectos da cultura local reveladores de tra ção estancieira em Bossoroca. Dentre esses traços, se destaca a marcantes da tradi ção espacial da cidade que retrata a projeção das relações da vida rural com disposi ço urbano e tantas representações e símbolos latentes nas vivênci a vida no espa as áxis social reveladores da cultura bossoroquense. cotidianas e na pr ões, constatamos o hibridismo cultural7 Com base nestas reflex que se ár ância de aspectos da configura neste cen io, visto que, mesmo com a preponder cultura estancieira e da grande vontade de afirmar Bossoroca como missioneira, ípio. Embora influenciados existem outros elementos presentes na cultura do munic ância dos primeiros, também eles devem ser levados em pela grande preponder âmica social e cultural. conta, pois fazem parte da din ários aspectos do patrimônio cultural deste Para identificar e compreender os v ípio, além de análise documen munic tal e pesquisas de campo, registramos as falas ídios para compreender a de alguns antigos moradores, a fim de buscar nelas subs ção histórico forma -cultural daquela comuna. ço, seja uma pequena comunidade ou uma Acreditamos que cada espa ópole, tem suas características retratadas nos seus prédios ou construções, nos metr saberes e fazeres dos moradores, nas comidas, nas roupas, em cada canto da cidade ou vilarejo, nas festas tradicionais, nos ritos religiosos, nos costumes óprios do cotidianos, nos seus lugares preservados, enfim, no jeito e no ritmo, pr ções de poder estabelecidas com o tempo, resultando lugar e decorrente das rela ções soci ências comuns àquele grupo. Configura nas representa ais e nas experi -se, ória coletiva, que dá suporte ao que compreendemos e reconhecemos assim, a mem como cultura.

7 á pela mescla de culturas que Compreendemos hibridismo cultural como processo que se d interagem e se complementam.

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ípio de aspectos peculiares, a relação do ser humano Em Bossoroca, munic é ainda um fator muito ções sociais e práticas com a terra forte, marcando as rela ômio proprietário ou não proprietário de terras. Essa é culturais que se pautam no bin ística que mostra Bossoroca ainda muito ligada uma caracter a seu passado ão da terra define as ções sociais dos grupos que a estancieiro, quando a quest condi õem é e ípio comp , ou seja, a terra lemento definidor de poder. A economia do munic á calcada no setor primário. As práticas econômicas do município estão est ário, com criação de gado e agricultura priorizadas no setor prim extensiva. Embora a ão, sem grandes perspectivas de agricultura familiar, as lavoura esteja em expans ão hegemon atividades pecuaristas s izantes e o modo de ser pecuarista repercute status ímbolo de valorização social, numa aproximação com o passado em e s órico estancieiro do século 19, quando as famílias estancieiras procuravam hist íodo, com seus peões e agregados. manter a atmosfera daquele per óricas sobre o lugar Geralmente as narrativas hist reconstroem as narrativas e ória marcada ções dos grandes fazendeiros, os os feitos de uma trajet por a estancieiros que ali se estabeleceram e passaram a ser donos de extensas êm em evidência a cultura material em propriedades, algumas das quais ainda mant ções diversas. Essa cultura material se poten suas sedes e instala cializa nas ções sociais que ainda refletem aspectos da relação de senhorio e clientelismo rela çais. entre os estancieiros e seus servi é terra de coronéis, conhecida por muitos como “terra do coronel Bossoroca João Dutra”, interventor federal local, épo ção do município. Esse na ca de instala ão Presidente da República, Humberto de dirigente municipal foi nomeado pelo ent Alencar Castelo Branco. Antes, em 1941, ocupara o cargo de subdelegado. Depois ítico ocupou mais dois mandato disso, alternadamente, esse pol s de prefeito, devido ência sobre a população. Nos intervalos entre suas gestões, era a sua influ ído no poder por correligionários, o que confirmava sua influência. Acerca substitu órias dessa postura, assim se expressa Valeriano Cruz, que escreve suas mem ípio que ele sobre Bossoroca e encerra seu livro com o seguinte desejo para o munic “É salutar que aconteçam, doravante, os revezamentos entre diz estimar tanto: partidos, pois nestes aproximadamente 20 anos, dois homens, oriundos da mesma sigla, se alternaram no poder e por mais bem intencionados que fossem, esse ítico é indesejável” (CRUZ, posfácio, 1993). comportamento pol

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ística forte desse município: o Desse modo, evidencia-se outra caracter ítico. Estes, muitas vezes, se ma mandonismo e o autoritarismo pol terializam no clientelismo, pelo qual prestar favores e manter pessoas subordinadas ao governo ática social vantajosa para manter o status quo constitui uma pr vigente. é também lugar de muitas lendas sobre escravos negros que, em Bossoroca geral, aparecem como figuras estimadas por seus donos, quase idealizadas, ão. Outras narrativas históricas, no entanto, afastando o lado tenebroso da escravid ção e violência a que eram submetidos. Nestas, no entanto, as revelam a domina personagens negras aparecem de forma velada, escondidas em conversas ão podem ser publicadas devido à busca do anonimato por parte reservadas que n “constrangimentos e comprometimentos de quem as conhece, pois podem causar ários” 8 óricas sobre in ígenas, desnecess . De maneira geral, as narrativas hist d ões, aventureiros, pequen escravos afro-brasileiros, pe os lavradores, ão silenciadas. Isso ocorre por serem contrabandistas, mulheres e assentados, s muitas as invisibilidades culturais evidenciando o poder das elites locais em contar e ças em detrimento às camadas socialmente menos reproduzir suas lembran êm as órias recalcadas favorecidas que t suas mem , reprimidas. ção, procuramos enfocar e interpretar o cemitério dos cativ Nesta disserta os, ória do município um dos lugares da mem . O silenciamento cultural exemplifica as ção à memória e às formas como a comunidade reprime, recalca disputas em rela ças. Boa parte da ção ção do cotidiano dos suas lembran popula cultiva a representa estancieiros, em suas festas, seus mitos, lendas, mas esquece de dizer que, no passado, os estancieiros eram escravistas e se valiam do trabalho escravo para ômico. Quando se lembram dos escravos – auferir suas riquezas e crescimento econ é que lembram – ílias estancieiras para seus se ressaltam a benignidade das fam ão destes com seus senhores. Não mencionam, escravos e o sentimento de gratid árduo e injusto da no entanto, as crueldades, as perversidades do trabalho ão. De maneira geral não reconhecem nem as dificuldades, os conflitos, as escravid ções entre escravos e estanciei ência à negocia ros e, muito menos, a resist ão. A organização do cemitério de cativos não ocorreu ência, escravid sem resist ção e luta social. Por isso, consideramos este lugar da memória como um negocia

8 ão múltiplas as histórias de maus tratos a Nas entrevistas que fizemos ou em conversas informais s ão querem se c escravos ou descendentes, mas as pessoas n omprometer ou se indispor com os ão veladas e/ou incompletas. parentes desses escravistas. Por isso, as narrativas s

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ços emblemáticos de lembranças do passado histó dos tantos espa rico bossoroquense. é também terra de Olívio Dutra9 10 Bossoroca e de Noel Guarany que, por suas úsica, representam símbolos da ideologias, respectivamente no discurso e na m ão e o autoritarismo. ruptura com a exclus órias é que permi Os personagens destas hist tem que a cultura material, ou ônios, tenham significado e relevância para a dinâmica cultural do seja, os patrim ípio. Revisitamos nosso passado na medida em que nos oportunizamos ou munic ão sobre o passado, sempre de acordo com nos nos oportunizam a reflex sas necessidades. ísticas comuns, esse universo de símbolos, esses Portanto, essas caracter ções, os lugares que suscitam viveres partilhados e repassados ao longo de gera órias coletivas são o que percebemos como patrimônio cultural. O ser humano mem é, sob ção, eis que é dele que toda ação de esse prisma, o centro dessa rela ção e valorização patrimonial deverá partir. É ele o ser privilegiado que preserva á no centro do processo histórico e da dinâmica cultural de produz cultura, que est ências e colaborador para que as mudanças um povo, sujeito de rupturas ou perman ocorram ou impedindo-as de acontecer. ória deste município, buscamos avaliar e A fim de conhecer a hist ém os monumentos) compreender alguns documentos (entendendo como tal tamb ção a nossa análise que podem dar sustenta , partindo de pressupostos da Nova ória. Nesse sentido, lembramos Le Goff quando afirma que “o documento não é Hist é um produto da sociedade que o qualquer coisa que fica por conta do passado, ções de forças q í detinham o poder” (LE GOFF, 2003, fabricou segundo as rela ue a p. 536). ínio com a interpretação de Podemos ainda complementar nosso racioc “[...] tomar Roselene Pommer acerca dos monumentos quando esta assevera que: é abordá ótica de sua repre ção, monumentos por documentos -los sob a senta ções do ontem libertando-os do dever de replicar o passado, buscando neles as rela ” (POMMER, 2009, p. 36). Iss é compreender o contexto em que com o hoje [...] o ídos, por quem o foram e os significados que carregam. foram constru

9 ão 1999 Ex-governador do Estado do Rio Grande do Sul pelo PT- Partido dos Trabalhadores (gest - 2003). 10 úsica Poeta e Payador, considerado um dos troncos do que muitos reconhecem como m missioneira.

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ão como testemunho fiel do Assim, buscamos interpretar o monumento n passado, mas como algo que pode nos mostrar relatividades desse passado e ções daqueles que o produziram, compreendendo que os monumentos ou interpreta ão indiscutivelmente interpretações de um g documentos s rupo acerca de um fato. á Este trabalho est , portanto, respaldado na pesquisa qualitativa, entendida ão do significado e da intencionalidade como aquela capaz de incorporar a quest às relações e às estruturas sociais, es últimas tomadas, como inerentes aos atos, sas ção, como construções humanas tanto no seu advento quanto na sua transforma significativas (MINAYO, 2006, p. 23). ção desta pesquisa foi coletar dados que O passo inicial para a realiza ções possibilitassem conhecer, compreender, comparar e correlacionar informa ônio cultural e do uso que se faz dele. acerca do patrim É a partir dessa perspectiva que buscamos entender e relacionar o que se ção cultural, já que os seres humanos pode perceber como produto e produ é ão influenciados pelos aparatos culturais produzem cultura, mas tamb m s ão, existentes, produzindo novos elementos ou reproduzindo os anteriores que s ão, incorporados ou adaptados. Nesse sentido, além dos lugares de memória, ent ários materiais como livros, folders, álogos nos servimos de v panfletos, cat , falas de ão antigos moradores, fotografias, e outros materiais, oficiais ou n que possam ser úteis para entendermos a cultura de Bossoroca e o que se afirma dessa cultura a fim ípio. de imprimir a identidade ou as identidades do munic ídio para conhecimento de muitos aspectos sobre a história local, Como subs nos servimos de dois livros produzidos por autores locais e que trazem narrativas ípio. interessantes e curiosas acerca do munic Pioneiros de Bossoroca Í, em O livro, intitulado , editado pela editora UNIJU é o resultado de uma interessante 1992, de autoria de Ilvo Jorge Berthen Fialho ça um organograma com as pesquisa cartorial realizada pelo autor, na qual tra ílias que ípio principais fam ocuparam as terras que hoje fazem parte do munic , a ões pelo governo português. Retrata, ainda, alguns partir da tomada das miss época da ocupação luso costumes e curiosidades da -portuguesa relacionando-os a ílias ou genericamente. algumas fam ência para o estudo da história é História Outra obra utilizada como refer local e Memórias de Bossoroca – Retrato de uma época, de Valeriano Cruz, reconhecido órias do local. Mesmo sem t como contador de hist er sido historiador, pretendeu

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órias do município. Dizia que Bossoroca guardava muitos vestígios do reunir as mem ítas habitavam o território regional. Seu livro tempo em que os guaranis e os jesu ças diversas sobre pessoas e fatos que fazem parte do apresenta ainda lembran passado mais recente dessa municipalidade. ônio cultu ípio de Para que se possa refletir acerca do patrim ral do munic é necessário compreender as dimensões e imbricações inseridas nas Bossoroca, ões patrimoniais, visto que lidar com elas é ainda hoje pisar em terreno de quest ões e disputas pelo poder de nomear, ou seja, pelo poder de dizer, de discuss ção básica para legitimar e evidenciar o que deve ou não ser imprimir valores, condi valorizado. ções de Patrimônio Cultural, também se torna coerente Analisando as defini ções de poder que, ao longo do processo histórico, foram racionalizar acerca das rela ções e símbolos presentes na se estabelecendo bem como sobre as representa sociedade, forjando a identidade ou identidades do lugar e capazes de manter as estruturas sociais existentes. ção patrimonial tem um caráter importante em cada comunidade, A educa ções sobre visto que pode ser o pressuposto para novos entendimentos e considera o papel que cada pessoa ocupa na sociedade onde vive. Abre, assim, novas ção do patrimônio, material ou imaterial perspectivas de interpreta existente e de õe a elaboração de um relacionamento com ele. A pesquisa ora apresentada prop ógico dirigido às novas gerações, material impresso para subsidiar o trabalho pedag údo programático prevê o especialmente do Ensino Fundamental, quando o conte ória do município. estudo da hist ção acerca Desse modo, o produto que apresentamos surge de nossa percep ência de material didático específico sobre a história de Bossoroca. da car ção desse material surgiu das muitas vezes que, em A ideia da confec ões de professores, constatamos a necessidade d reuni e um acervo que ória do município e oportunizasse a superação do uso de contemplasse a hist áveis para relatar os episódios materiais diversos e nem sempre de fontes confi óricos, lugares de memória e as personalidades marcantes, aspectos que hist ário cultural de Bossoroca. Trabalhar a história e a cultura do configuram o cen ípio de forma lúdica e numa linguagem facilitada poderá aproximar o aluno do munic ê ões que repercutem em sua prática de futuros conhecimento e envolv -lo nas quest ãos, sujeitos de sua ópria história. cidad pr

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é possibilitar a Assim, um dos principais objetivos do referido livro ção, pelas crianças e jovens, do patrimônio histórico e cultural de apropria álogo com Bossoroca, ao proporcionar, por meio do conhecimento e do di ção de suas próprias interpretações acerca desse professores e colegas, a constru ônio ória. Assim, poderão patrim e dessa hist buscar novas formas de pensar a cultura existente e compreender suas estruturas materiais e seus sistemas ólicos, a parti ção de que tam ém são órico e simb r da constata b sujeito hist ção da história e da cultura local, capaz, participante do processo de constitui portanto, de interferir no contexto.

1 DEFINIÇÕES CONCEITUAIS E HISTÓRICAS

ítulo, procuramos estabelecer os vínculos que perp Neste primeiro cap assam ções estabelecidas entre as questões patrimoniais e os processos que estas as rela ção da cultura. empreendem na constitui ônio Cultural de determinada sociedade requer, em Pensar acerca do Patrim ância, a definição clara dos conceitos imbr ão. Torna primeira inst icados nessa quest - ável primeiramente esclarecer o que se reconhece por Patrimônio se indispens Cultural. Isso implica, necessariamente, elucidar os significados de cultura com que ônio cultural é falar em cultura. Po operamos, pois falar em patrim rtanto, os termos ônio cultural e cultura são essenciais ao desenvolvimento de nossa pesquisa patrim ção teórica que permita guiar nosso raciocínio. e, como tal, precisam de uma defini Trata-se aqui de termos complexos e que suscitam diversidade de entendimentos, motivo pelo qual buscamos conceitos coerentes com o enfoque ítico que p álise. cr retendemos utilizar ao longo da an

1.1 Patrimônio Cultural e Cultura

ções e conceitos, pretendemos situar nosso Ao buscarmos tais defini ônio cultural e cultura entendimento a fim de localizar o que consideramos patrim ões. focando-o nos aspectos considerados elementares para nossas reflex ções em autores que dão sustentação ao Apoiamos nossas considera ões patrimoniais e culturais. entendimento acerca das quest ícil, uma vez que o termo é polissêmico e Definir cultura constitui-se tarefa dif árias acepções. No senso comum, cultura pode indicar conhecimento, possui v ças, arte, moral, lei, desenvolvimento, educação, bons costumes, etiqueta e cren ém d ção entre cultura comportamentos de elite. Al isso, cabe considerar a distin ção da cultura, colocando em erudita e popular o que demonstra a hierarquiza ções da elite, em detrimento das produções populares, marcas destaque as produ deixadas pelos valores ocidentais. Em busca dos significados originais de cultura, Hannah Arendt (1972) lembra é de origem romana e origina “colere” que designa a ação de que o termo -se de cultivar, habitar, tomar conta, criar e preservar; relacionando-se diretamente ao trato

28 do homem com a natureza, a fim de que se possa integrar a ela adequando-a com cuidado, preservando-a. Pode significar o culto aos deuses e o cuidado com o que pertence a eles. De acordo com Arendt (ARENDT, 1972, p. 236), foram os romanos, povo ão o liga basicamente agricultor, que fizeram primeiramente uso do termo o que n primitivamente a ideia das grandes artes, que faziam parte do cotidiano grego. Segundo essa autora:

ão há nenhum equivalente grego para o conceito romano O motivo por que n ência das artes de f ção na civilização de cultura repousa na preval abrica grega. Ao passo que os romanos tendiam a enxergar mesmo na arte uma écie de agricultura, de cultivo da natureza, os gregos tendiam a esp ção, considerar mesmo a agricultura como parte integrante da fabrica ída entre os artifício écnicos ardilosos e hábeis com que o homem, inclu s t mais imponente do que tudo que existe, doma e regra a natureza (ARENDT, 1972, p. 236)

áveis pelo sentido de cultura Arendt esclarece que os gregos foram respons à conotação de arte, de apreciação e de exercício do gosto e do julgamento. ligado ão feitas para o fim único do aparecimento. O critério Para Arendt, as obras de arte s ências é a beleza. Para julgar se algo é belo, o homem precisa estar para julgar apar ções, interesses e ansei ão usurpar o que admira, livre de preocupa os, para n é em sua aparência. Tal atitude de alegria desinteressada só deixando-o ser como pode ser vivida quando, liberados das necessidades de vida, os homens possam “ ão estar livres para o mundo. Essa mesma intelectual pontua que cultura e arte n ão a mesma coisa” ( s ARENDT, 1972, p. 268). Dessa forma, podemos considerar a cultura como o conjunto de arranjos, que o ser humano faz para se abrigar e sobreviver, engendrando um mundo, transformando a paisagem natural em paisagem cultural. Assim, temos cultura íduos têm durabilidade suficiente para quando as coisas fabricadas pelos indiv ço de pertencimento, existindo independentemente de todas as constituir um espa ências utilitárias e funcionais e cuja qualidade continua sempre a m refer esma (ARENDT, 1972, p. 263). ões sobre cultura, Sandra Jatahy Pesavento Complementando essas reflex ão e tradução da (2005) nos orienta a perceber a cultura como uma forma de express ólica. Assim, admite realidade que se faz de forma simb -se que os sentidos às palavras, às coisas, às ações e aos atores sociais se apresentam de conferidos

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á com um significado e uma apreciação valorativa, o que forma cifrada, portanto, j ível um novo olhar sobre a forma de trabalhar e conceber a história, torna poss “viés que conduz”. voltada a perceber cultura como ão cultural, não podemos partir de uma visão linear e Ao abordar a quest É preciso conceber que os seres humanos, produtos e produtores de simplista. ão inseridos em modos complexos de vida, trabalho e lingua cultura, est gem. ão podemos isolar o sujeito Foucault (FOUCAULT, 1981, p. 365) alerta que n ção, mas, ao contrário, analisá de seu contexto de inser -lo desde sua realidade e ém dos aspectos meramente biológicos ou da economia. Como preconiza para al ção às ciências humanas, é necessário analisar o ser humano Foucault, em rela “ser vivo que, do interior da vida à qual pertence inteiramente e pela qual é enquanto ções graças às quais ele vive e a atravessado em todo o seu ser, constitui representa ém esta partir das quais det estranha capacidade de poder se representar justamente ” (FOUCAULT, 1981, p. 369 álise do homem, a vida -372). Trata-se, pois, de uma an ão daquilo que ele é por natureza, mas do homem em sua complexidade (ser que n vive, trabalha, fala) e o que permite a esse mesmo ser saber (ou buscar saber) o é a vida. O ser humano é tomado como “objeto no campo da finitude, da que – ão indefinida do tempo” relatividade, da perspectiva no campo da eros (FOUCAULT, 1981, p. 369-372). ém uma grande part A cultura de um grupo cont e de processos inconscientes, ão inculcando significados aos fazeres e que se estabelecem de forma rotineira e v ções. Tais aspectos referem saberes, sendo repassados pelas gera -se a processos ógicos e subjetivos que constituem o universo simbólico do psicol grupo. ão há como falar em cultura num sentido único, mas em culturas Assim, n íbridas, conceito explicado por Cancline (1997) como o processo de interação entre h culturas. Reconhecemos e afirmamos o entendimento da pluralidade dos processos ência de que, mesmo entre pequenos grupos, as individualidades culturais, pela evid ão conexos, ora não. É evidenciam a diversidade de aspectos que ora est ória mostra que somos híbridos por importante, neste ponto, perceber como a hist natureza, pois sempre houve trocas entre os grupos humanos. Evidencia-se, desse modo, a mescla de culturas em Bossoroca, pois ém do índio Guarani, elemento nativo do processo de ocupação, vislumbramos, al ém o espanhol, o luso ês e seus seguidores, e o elemento que se tamb -portugu “gringos”, ou seja, descendentes de alemães, reconhece em Bossoroca como

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á na segunda metade do século dezenove. italianos, poloneses e outros que vieram j Alguns aspectos, no entanto, revelam-se preponderantes sobre outros, como os gringos ão ex à pecuária, ao se chamados que, mesmo n ercendo atividade ligada ários de terras, assumem a postura dos estancieiros de outrora. verem propriet ática de organização espaço é um A sistem -temporal de um grupo humano dos aspectos reveladores de sua cultura. Ao se repetirem, ao longo do processo existencial, deixam seus significados nos outros membros do grupo e inculcam-lhes ção de práticas, crenças e a reprodu modos de relacionamentos. Enfim, formas é mesmo na definição de práticas que dizem respeito às necessidades importantes at ógicas são influenciadas pelo aspecto cultural do grupo refletindo biol -se nos ões ligadas à sexualidade, no comportamentos sociais, no gosto musical, nas quest ão alimentar e em muitos outros aspectos ligados à subjetividade e afetividade padr ém disso, essas formas interferem no (geralmente processos inconscientes). Al à medida que se relaciona com outros indivíduos e grupos, cotidiano do grupo, que, ções. realiza trocas e negocia O modo como se estabelecem essas trocas culturais e o produto das mesmas é defini “circularidade entre as culturas”, quando analisa em O do por Ginzburg como Queijo e os Vermes a forma como o moleiro Menocchio, oriundo da classe ínculos culturais com a cultura dominante. Muitas vezes, em subalterna, estabelece v ções em que as trocas se configuram de tal Bossoroca ficam evidentes inter-rela ógica social de um grupo é alcançada, incorporada e reproduzida por modo que a l ão, a assumir determinadas posturas (poses, diferentes grupos, que passam, ent ão são ligados a esse passado gestos e discursos, inclusive por grupos que n órico), num autêntico exercício de circularidade de culturas. hist ões sobre cultura nos conduzem a problematizar como é constituído As reflex ônio cultural de uma sociedade, o que nos remete às discussões e disputas o patrim é e da forma como são direcionadas as questões que se travam em torno do que às ações patrimoniais, ou seja, o que se relacionadas aos encaminhamentos dados ônio. compreende como patrim ônio foi formulado pelos greco Etimologicamente, o termo patrim -romanos ça que passava de pai para filho, de geração em geração, para referir a heran ção de entregar um bem para outra geração. No demonstrando claramente a inten ônio estava diretamente ligado à propriedade de bens Direito romano, o patrim materiais.

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ém a Com o passar do tempo, o termo foi sendo ressignificado e passou tamb ível de ser deixado para as futuras gerações. designar o legado cultural pass ção das Nações Unidas – és da A Organiza atrav UNESCO (1972), organismo ós a Segunda Guerra Mundial internacional criado ap , criou mecanismos para eleger ão referências para a humanidade no campo cultural e e salvaguardar bens que s ção patrimonial. De ambiental, influenciando movimentos internos de preserva ônio é acordo com ela, Patrim :

o legado que recebemos do passado, vivemos no presente e transmitimos às futuras gerações. Nosso patrimônio é fonte insubstituível de vida e ção, nossa pedra de toque, nosso ponto de referência, nossa inspira ância para a ória identidade, sendo de fundamental import mem , a ção da UNESCO criatividade dos povos e a riqueza das culturas. ( Declara 1972)

Ficam evidenciados, assim, alguns aspectos que se relacionam diretamente ção com a ideia de herança que passa de uma geração com nosso trabalho: a rela ção do patrimônio como formador da para outra; a fun identidade de um povo e sua ção com a articulação da memória social. liga ção Federal de 1988 define como patrimônio os bens de No Brasil, a Constitui natureza material e imaterial, tomados individualmente, ou em conjunto, portadores ência à identid à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da de refer ade, ê que o poder público, com a colaboração da sociedade brasileira. E prev á e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de comunidade, promover ários, registros, vigilância, tombament ção e outras formas de invent o, desapropria ção, sendo enfático ao declarar tal abrangência, o que se acautelamento e preserva pode perceber no artigo 216:

ônio cultural brasileiro os bens de natureza material e Constituem patrim ência imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de refer à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: ão; I- as formas de express II- os modos de criar, fazer e viver; ções científicas, artísticas e tecnológicas; III- as cria ções e demais espaços IV- as obras, objetos, documentos, edifica às manifestações artístico destinados -culturais; ítios de valor histórico, ístico, artístico, V- conjuntos urbanos e s paisag ógico, paleontológico, ecológico e científico. arqueol § 1º O poder público, com a colaboração da comunidade, promoverá e

á o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, proteger ância, tombamento e des ção e de outras formas de vigil apropria ção. acautelamento e preserva

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ônio no Brasil é resultado do movimento O que a lei estabelece como patrim écada de 30, cujo expoente maior é o poeta Mário de Andrade, e o surgido na d anteprojeto de Lei que deu origem ao SPHAN11, redigido por ele. Apesar de o áveis alterações, no sentido de que se buscava projeto original ter sofrido consider ção de uma identidade nacional pautada na naquele momento a constru homogeneidade (Estado Novo), e essa ideia afastava a pluralidade percebida por ário de Andrade, os fundamentos básicos foram mantidos e servem de fomento M ões que pautam as discussões atuais em torno do patrimônio cultural. para reflex ário de Andrade e suas ideias como referência para Esse estudo aponta o poeta M ões as quest patrimoniais.

ítico, preocupou ção à vida cultural Como ator pol -se sempre em dar sustenta ís, em analisar cuidadosamente a diversidade nacional, em do pa instrumentalizar os jovens intelectuais e finalmente em incorporar o Brasil ção con ânea (CHAGAS, 2002, p. 211). no fluxo da civiliza tempor

ções de Mário De acordo com Chagas (CHAGAS, 2002, p. 211), as considera à baila discussões que de Andrade acerca da pluralidade cultural do Brasil trazem ão atuais e assumem caráter cada vez mais palpável faz ainda hoje s endo pensar ções culturais produzidas ou referidas pela massa social e não sobre as manifesta ória apenas por uma elite, o que foi imperativo ao longo da hist no Brasil. Ainda de ções de Mário de Andrade tornam acordo com o autor, as percep -se atuais e ônio. recorrentes quando se analisam assuntos referentes a patrim álises e considerações acerca do patrimônio cultural, elaboradas por As an Chagas (CHAGAS, 2002, p. 17) exaltam transitoriedade e relatividade notadamente quando este afirma:

ônio cultural ção de valores, funções e O patrim se constitui a partir da atribui õem... Construção que resulta de um significados aos elementos que o comp ção de significados e sentidos permite avançar em sua processo de atribui ão política, econômica e social, permite comp ê ço dimens reend -lo como espa de disputas e luta, como campo discursivo sujeito aos mais diferentes usos e submetido aos mais diferentes interesses (CHAGAS, 2002, p. 17).

11 ço do P ônio Histórico e Artístico Nacional ço Público dedicado à preservação do Servi atrim - Servi ônio histórico brasileiro patrim e que mais tarde passa a ser denominado IPHAN. O SPHAN foi a ção de proteção e de preservação do patrimônio criada no con primeira institui tinente (GIOVANAZ, p. 209).

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De acordo com os registros de Cancline (CANCLINE,1994, p. 99), o ônio cultural é aquil ópria, que patrim o que um grupo social considera como cultura pr é sustenta sua identidade e o diferencia de outros grupos. No caso de Bossoroca, ípio se apresenta como missioneiro, pertinente ressaltar o fato de que esse munic ções sociais estejam buscando muitos elementos do seu passado, embora as rela calcadas em elementos da cultura estancieira. á que se registrar, para tanto, que o conceito de patrimônio é ainda terreno H ção, palco de discussões e disputas, visto que as ações patrimoniais em constru é partindo dessa premissa que encerram um leque muito grande de possibilidades e ônio e as relações de poder diretamente relacionadas às analisamos o patrim ões patrimoniais. quest

1.2 Patrimônio e Relações de Poder

ões relacionada ônio Consideramos que todas as quest s ao patrim cultural de ão ções de poder que uma sociedade s permeadas pelas rela influenciam o ão que estas ocupam na sociedade em questão. direcionamento e a dimens ônio cultural pelo viés das relações de poder exige que Discutir o patrim ção de tais relações. Foucault ( pensemos na configura FOUCAULT, 2005, p. 148) ção de uma “mecânica do poder”, contribui nesse sentido, ao apresentar a concep segundo a qual um poder [...] que correria ao longo de toda a rede social, agiria em ão sendo mais percebido como poder de cada um de seus pontos, e terminaria n ção imediata de todos em relação a cada um alguns sobre alguns, mas como rea (FOUCAULT, 2005, p. 107). âmica de fazer com que as pessoas cumpram seus Trata-se de uma din éis dentro de uma estrutura socia pap l, como se esta fosse uma engrenagem e cada um estivesse condicionado a fazer o determinado, sem questionar ou se contrapor, ão é coagido. Acontece como se fosse natural, no entanto, não o é. visto que n é múltiplo, automático e anôni ão pode ser Para Foucault, o poder mo. Logo, n “coisa”. Seu funcionamento articula considerado como uma propriedade, como uma - “uma rede de relações de alto a baixo, mas também até certo ponto de se como ‘sustenta’ o conjunto, e o perpassa baixo para cima e lateralmente; essa rede de efeitos de poder que se apoiam uns sobre os outros: fiscais perpetuamente ” (FOUCAULT, 2005, p. 107). fiscalizados

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ão, ser percebido O poder deve, ent como uma rede, como uma trama de ções que se estabelecem socialmente e acabam por naturalizar deter rela minadas ções e formas de ação. Silva ( ão as diversas posi SILVA, 2007, p. 21) lembra que s âncias cotidianas, com suas surpresas e eventualidades, que contribuem circunst áticas, não menos variáveis, de relações de poder. para o desencadeamento de pr ão é O cotidiano social, de acordo com Fonseca (FONSECA, 1995, p. 131), n íduos ou grupos dominantes que concebido a partir de direcionamentos de indiv ções de existência de modo a fazer valer perturbam, obscurecem e velam as condi ções de dominação do poder. T ções de as rela rata-se, pois, de enfatizar as condi ógica circunstancial que o caracteriza possibilidade, a transitoriedade do poder, a l ância cortada por redes que interferem, ininterruptamente, na como uma inst ção da identidade que cada “indivíduo” entend ópria. constru e como pr “indivíduos” tornaram Para Silva (SILVA, 2007, p. 21-22), os -se sujeitos írem total consciência de seus atos, sociais, e, consequentemente, longe de possu ógica de poder e de saber que tanto os obriga a encontram-se contidos por uma l ância, estimula obedecer quanto, em concomit -os a que participem sob a forma de ão processos subjetiv vigilantes. Em grande parte, s os e inconscientes que regem ções. essas rela ção, os indivíduos farão diferentes escolhas Pelos distintos modos de sujei ção que a sociedade lhes impõe de agir de determinada forma, em diante da obriga ção de preceitos definidos. Dito de outro modo, pelas tramas das relações de fun ção, os indivíduos passarão a agir em conformidade poder, pelos modos de sujei ões que lhe são impost com padr os, de forma clara ou velada, pelos sistemas de poder vigentes nessa sociedade. à questão do patrimônio cultural, posto que há, Isso se aplica ção política em cada ação de prese ão um indiscutivelmente, uma inten rvar ou n ônio, de ção ou manifestação patrim reconhecer como tal uma ou outra edifica ão existe neutralidade nas ações preservacionistas. Guarda ão de cultural. N -se ou n acordo com o interesse que se tem. Chagas alerta para o fato de que:

ão Preservar e destruir, musealizar e n -musealizar, memorizar e esquecer ço uma formam pares bailarinos desenhando no tempo e no espa úsica que soa, ora muito familiar, coreografia esquisita, ao som de uma m ão é fácil identificar quem puxa a dança. Os bailarinos ora muito estranha. N

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ém áfora, interessa frequentemente se confundem. Para al da met ão compreender que preservar e destruir, musealizar e n -musealizar, ão memorizar não constituem fins em si mesmos [...] todas as memorizar e n ções de preservação, musealização e memorização estão a serviço de a determinados sujeitos, o que equivale a dizer que elas ocorrem como um ato de vontade, como um ato de poder (CHAGAS, 2002, p. 18).

ão as relações de poder estabelecidas na sociedade que Seguramente s definem o que se guarda ou se deixa de lado ou encoberto, caracterizando o ato de ão como um ato político, uma escolha, que repercute na manutenção guardar ou n ão de determinados aspectos dessa sociedade. É, em grande parte, a partir daí ou n que se estabelecem os modelos sociais e a necessidade de conformar todos os entes sociais em um arranjo que parece ser concebido naturalmente, mas que, na é articulado pelas classes que detêm o poder na estrutura social. O poder verdade, ímbolos e representações que per ções e estrutura-se por meio de s passam gera podem ser traduzidas em aspectos culturais. ímbolos tornam possível o Segundo Bourdieu (BORDIEU, 1998, p.10), os s consensus ção acerca do mundo social que contribui fundamentalmente para a produ ímbolos e representações servem como sustentáculo da ordem social. Tais s ão pilastras que preconizam os sentimentos subjetivo para a vida em sociedade e s áveis ou não alguns de pertencimento a determinado modelo social, tornando vi comportamentos, de acordo com a estrutura social vigente. Em Bossoroca, existe uma busca permanente por legitimar determinados signos da cultura local, o que, necessariamente, se faz em detrimento de outros, ímbolos que, por sua vez, servem para evidenciando a disputa em torno dos s álise de Bourdieu quando avalia os estabelecer o poder. Isso vem ao encontro da an ólicos presentes na sociedade: sistemas simb

ção e de Enquanto instrumentos estruturados e estruturantes de comunica é que os sistemas simbólicos cumprem a sua função política conhecimento ção ou de legitimação da dominação, que de instrumentos de imposi ção de uma classe sobre a outra contribuem para assegurar a domina ência simbólica) dando o reforço da sua própria força às relações de (viol ça que as fundamentam e contribuindo assim, para a domesticação dos for dominados (BORDIEU, 1998, p. 11).

ão á em ação de O simples ato de preservar n garante que isso se reverter ção de determinado grupo, visto que o mesmo objeto pode ser usado para valoriza ção ou desconstrução de valores e imagens, como aponta Chagas, ao constru ção de preservar ou não determinado ônio e se comentar acerca da a patrim

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“... é como se esquecer e perder posiciona a respeito disso dizendo que íssem males absolutos, e os seus opostos, supremos bens; como se os constitu ão pude ” esquecimentos e as perdas n ssem abrir portas e janelas... (CHAGAS, 2002, p. 18) É m ção das ideias na uito interessante perceber que a forma de circula ência das mentalidades que servem para sociedade operacionaliza a perman ógica social estabelecida. reproduzir a l ência não traz necessariamente o O fato de que muitas vezes a aus ça é esquecimento e, em contraponto, nem sempre torna significativa a presen “como se a elucidado nas palavras de Chagas, quando ele argumenta dizendo: ção e a memória não pudessem ser manipuladas e como se os indivíduos e preserva ão pudessem também ser const ídos tanto pela presença como pela grupos n ru ência” aus (CHAGAS, 2002, p. 18). Muitos aspectos culturais, deixados de lado, ou ão colocados em evidência, passam despercebidos. Não sendo discutidos, n ão contemplam todos os continuam produzindo falas e discursos que n sujeitos óricos e criam situações em que muitos não se reconhecem dentro do processo hist órico, o que implica um sentimento de exclusão social. hist á que se atentar para o fato de que nem sempre a ação de No entanto, h é prejudicial para todos. Depende deixar desaparecer, de apagar, de esquecer ê se quer apagar e a quem isso interessa. Neste ponto, convém sempre do qu lembrar que o desaparecimento ou esquecimento de um aspecto pode ser revelador ência de um de outro que estava despercebido, ofuscado ou encoberto pela efervesc sobre o outro. ão está, então, no que fazer com o bem preservado, no olhar que se A quest çar sobre ele, nas leituras possíveis, principalmente, em interpretar a pode lan ão que esse bem preservado ou as memórias sociais ativadas repercuss e afirmadas ção ou ação nos processos de identidade local podem ter no presente. Uma interven patrimonial tem em si um leque muito grande de possibilidades. Nessas possibilidades repousa o grande potencial que os projetos ções de construção de patrimoniais apresentam como forma de contribuir para a ção social. Por isso, é importante perceber o que é referido ou cidadania e reconstru aquilo que se deixa de lado no momento de afirmar a identidade ou as identidades ões de um lugar. O comprometimento com as quest sociais torna-se revelador, visto ônio cultural é potencialmente um instrumento capaz de interferir na que o patrim

37 estrutura social, pois permite que, a partir desses processos, se possam afirmar ítimos, desenvolvendo novos determinados elementos como leg sensos de valores ção social subjetivos, interferindo nas estruturas de poder, que possibilitam participa efetiva. É essa engrenagem subjetiva, que, às vezes, se reveste de materialidade e ão há intencionalidade nas ações patrimoni transmite a ideia de que n ais, como se elas acontecessem por acaso, o que relacionamos com a abordagem de Bordieu ólico: acerca do poder simb

ólico como poder de constituir o dado pela enunciação, de O poder simb ão do mund fazer ver e fazer crer, de confirmar ou de transformar a vis o e, ção sobre o mundo, portanto mundo; poder quase mágico deste modo, a a é obtido pela força (física ou que permite obter o equivalente daquilo que ômica), só se exerce se for reconhecido, quer dizer, ignorado co econ mo ário (BORDIEU, 1998 p. arbitr 14).

ção, o ato de preservar é uma ação política. Assim, torna Nessa percep -se á relevante o fato de se perceber a ideologia do agente ou grupo que preserva. H ítulo de que se perceber quem faz (agente social) e para quem se faz e, ainda, a t ência das ações que se faz, a fim de que se possa compreender a coer ém lembrar o que nos diz Cancline “Como espaço desenvolvidas. Neste ponto, conv ômica, política e simbólica, o patrimônio está atravessado pela ação de disputa econ ês tipos de agentes: o setor privado, o E de tr stado e os movimentos sociais. As ções no uso do patrimônio têm a forma que assume a interação entre estes contradi íodo” setores em cada per (CANCLINI, 1994, p.100). Temos em vista que o modo como se faz uso do passado, ou seja, o que se ão sobre es ção de operacionalização de diz ou n se passado faz parte dessa rela ções que se estabelecem por meio do universo simbólico, o que Bordieu rela “ ém os agentes que reconhece como poder de nomear, ou seja, aquele que det ção simbólica, tendo a s ça do coletivo realizam o ato de imposi eu favor toda a for ” ém lembrar a maneira como os grupos, [...] (BORDIEU, 1998, p. 146). Conv ídos da possibilidade de contar a história, de dizer as coisas e afirmar ícones imbu ência no sentido de determina culturais, apresentam poder de influ r valores e ões de comportamento à sociedade, sem, no entanto, usarem de coação ou padr ção física. Esses são aspectos que podem ser evidenciados, exemplificados, imposi ão estão oficializados, nem são registrados. percebidos, mas que n

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êm uma sociedade funcionando de uma Compreender as estruturas que mant ções podem forma ou de outra significa interpretar os efeitos que as representa ão de produzir ou produzem, o que constitui a nossa busca quando temos a pretens ônio entender e avaliar como se constitui o patrim cultural de Bossoroca e como se ônio. faz uso desse patrim

1.3 A Relevância do Patrimônio para a Comunidade

ógica da Era da globalização, que tende a homogeneizar as sociedades A l modernas desconsiderando-as enquanto grupos distintos faz surgir entre elas a necessidade de algo que as torne diferentes das outras. Assim, esses grupos colocam a parte diante do todo, e fazem com que as comunidades (imaginadas ou ão) tenham como base de apoio um ências, que a n conjunto de refer s coloque em ção a esse todo ônio cultural, por oposi homogeneizante. Neste ponto, o seu patrim meio de seu passado vivido ou inventado, surge como grande potencial para afirmar ção diante do outro em relação a sua marca de diferencia o todo, constituindo sua ã ça identidade coletiva e dando coes o ao grupo por meio do sentimento de perten aos valores negociados ou incorporados pelo grupo. ônio histórico e cultural da Nesse sentido, procuramos interpretar o patrim ências em que se formaram as questõ Bossoroca, recuperando as conflu 6es mais ça evidentes dessa heran . Assim, dialogamos com Tania Navarro Swain quando fazemos uma releitura desse tema:

óricas bem como a crítica A releitura das fontes utilizadas nas narrativas hist à historiografia são imprescindíveis para que surjam as múltiplas realidades , órico os agenciamentos sociais plurais, que ficaram ocultos no fazer hist ória não diz não existiu, pois o sistema de tradicional. O que a hist ções que decide sobre aquilo que é relevante para a análise interpreta órica fica oculto nas dobras das narra hist tivas (SWAIN, 2008, p. 28).

órico de Bossoroca à Sob este prisma, buscamos a releitura do passado hist ônio cultural, enquanto herança dinâmica da sociedade do luz do seu patrim É necessário rever não só as narrativas que se produziram sobre a passado. ção desse patrimônio, mas suas concepções e leituras possíveis de mundo constru ídas e para quais fins ções no momento em que foram constru e sob quais inten os ônios foram recuperados. eventos e os patrim

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é possível constatar uma busca permanente po Em Bossoroca, r legitimar óricos, afirmando símbolos e elementos que revelam a determinados aspectos hist busca de uma identidade missioneira. Podemos perceber, no entanto, que algumas ções sociais estabelecidas ou representações latentes do passado não são rela ção de identidades. Isso constitui um fato peculiar reveladas nos processos de afirma ípio, se busca afirmar a no momento em que percebemos que, nesse munic ções com um passado que está morto, já identidade missioneira, revelando as liga ções soc ão os legados da cultura estancieira, que o latente nas rela iais s ções com configurados em um modelo social excludente, patriarcal e com fortes liga o passado escravocrata. ção como missioneira e deixar de lado O que faz Bossoroca buscar sua afirma ão nítidos da cult os aspectos t ura estancieira, intensamente presentes no seu cotidiano? ônio cultural que um município ou uma cidade abriga é Perceber o patrim ízes. É exatamente isso que abre caminhos para compreender as perceber suas ra óprias que determinada sociedade enc estruturas pr ontrou ao longo do tempo para “acomodar” seus entes sociais, servindo ímbolos e representações invisíveis -se de s ão sustentação para o estabelecimento do modelo social num primeiro olhar e que d ções sociais geralmente fazem part instaurado. Essas representa e do cotidiano das ão presentes que são imperceptíveis ao grupo nos seus pessoas e se tornam t movimentos rotineiros, mas altamente reveladores, quando avaliados com o ário. distanciamento necess é o entendimento das relações O reconhecimento de suas origens que se estabeleceram no decorrer do tempo e significam a possibilidade de desenvolvimento da cidadania por meio do sentimento de pertencimento ao lugar e a ção de que se faz parte daquela história. É, portanto, o sujeito partir da percep órico que pode hist contribuir para manter ou transformar realidades, inserindo-se ou ão como partícipe no processo histórico. n ções que acompanham um patrimônio precisam ser As representa identificadas, resguardadas e respeitadas, pois as comunidades que se reconhecem ônio vêm nele o vínculo com o passado delas. Daí a em determinado patrim ância de interpretar o que os grupos envolvidos trocam com os seus ícones relev óricos, para que esse conhecimento e essas trocas possam gerar qualidade de hist ção para suprir n ão. vida e disposi ecessidades oriundas de um passado de exclus

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ônio no qual a comunidade se reconhece pode contribuir para a Um patrim ção de grupos que, por um passado histórico elitista e autoritário, foram dela legitima ídos. Nessa relação dos historiadores com as exclu narrativas que legitimam as órias das elites e constroem formas patriarcais de compreender, perceber e hist ânia Swain observa as diferentes formas de exclusões, entre interpretar o mundo, T êneros. Ela esclarece que a compreensão do passado órico as quais a dos g hist ção sobre o patriarcado. Segundo essa autora, esse sempre reflete uma interpreta “sistema de dominação que cria e confere aos homens poderes sobre as mulheres, é também dotado de uma historicidade incontornável e considerá -lo permanente ao é aderir a um sistema interpretativo de crenças e valores, cuja força longo do tempo ópria repetição” (SWAIN, 2008, p. 31). reside em sua pr ímbolos e as representações que carregam, trazendo novos Afirmar esses s elementos, para que tais grupos possam se colocar como sujeitos, fortalecidos pela ência comum evoca, posicionando ideia que essa refer -se frente a frente com outros ão mais como submissos, mas sob a premissa da diversidade, talvez seja a grupos n ônios culturais. mais significativa possibilidade dos patrim ção patrimonial é a ferramenta para instalar e incrementar essa A educa É, afinal, a partir do conhecimento do processo histórico que se pode possibilidade. é a partir desse pressuposto que raciocinar e questionar acerca do presente. E ção do nosso produto, voltado para a prática da educação direcionamos a elabora úblico infantil pode resultar em patrimonial, acreditando que um livro direcionado ao p grande potencial de desenvolvimento para os que fizerem uso do material, ções e en suscitando novas interpreta tendimentos. ízo, é possível se romperem as amarras existentes, pois o A partir desse ju ção da identidade podem conhecimento e o entendimento dos processos de forma ões acerca da realidade existente. Configuram servir como base para reflex -se, ão do passado e de relacionamento com assim, novas perspectivas de compreens órico. Isso ocorre por ele e com as estruturas resultantes do processo hist ções do compreender a necessidade de interpretar o passado a partir das condi presente. ático de Educação O material did Patrimonial direcionado aos alunos e alunas ção Básica constitui excelente possibilidade de dos anos iniciais da Educa ção entre a comunidade e o patrimônio histórico e cultural do município. aproxima álogo entre a comunidade ória do município, Institui-se, assim, importante di e a hist

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ço para novas interpretações relativizando alguns aspectos e visto que abre espa ídios que registrem dados sobre os patrimônios locais são entendimentos. Subs íveis para o uso de práticas pedagógicas sobre a história loc imprescind al e para que ções se posicionem diante dela e se percebam como integrantes as novas gera ço e dessa história. desse espa

1.4 A Formação Histórica de Bossoroca

ípio de Bossoroca (RS) está inserido no espaço das Antigas O munic ções Jesuíticas. Localizad ão de Redu o no noroeste do Rio Grande do Sul, microrregi Ângelo, na região que atualme 12 Santo nte se apresenta como Missioneira , situa-se ípios de São Luiz Gonzaga, São Miguel das Missões, Santo Antônio entre os munic ões e Santiago, fazendo agora divisa ém com os municípios recém das Miss tamb - ão do Cipó e . emancipados de Cap

12 ção ão existe oficialmente, mas de fato ela está estabelecida, visto que tais Essa denomina n ípios á um vasto ão missioneira munic a utilizam em documentos e h reconhecimento de que a regi é aquela onde estão os municípios que ítico se dizem herdeiros do passado jesu -missioneiro. ípios tê ção em sites e materiais diversos o indicativo: Esses munic m escrito na sua apresenta ão das missões. De acordo com POMMER: “Por mais que esses municípios busquem hoje se regi ção histórica reducional ão é apresentar como herdeiros da tradi -missioneira, esse elemento n ério válido para regionalização” utilizado pelo IBGE como crit (POMMER. 2006, p. 70). Essa autora “A região classificada como Missioneira é tipicamente o produto registra o fato de que que se és do reconhecimento do outro como diferente, e de si efetiva atrav mesma como diferente do ” “... uma das principais características da reg ão outro (POMMER, 2006, p. 74). E ainda diz que: i á ções produzidas a partir chamada de Missioneira est nas tradi de determinado sentido dado ao ção hispânica dos séculos XVII e passado colonial no contexto de domina XVIII, a leste do rio ” Uruguai (POMMER, 2006, p. 74).

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ção ípio Figura 1- Mapa de localiza do munic

ém do vocábulo guarani Iby-soroc Ibi O nome Bossoroca prov , no qual soroc significa terra e , fenda profunda na terra e hoje conhecida como barroca. ão constantes no relevo do município e, por isso, Essas fendas ou barrocas s ência. Muitos outros vocábulos provenientes do guarani fazem justificam a refer ípio, designando lugares, pessoas ou expressões: parte do cotidiano desse munic úva (distrito), (rio), Ximbocu (rio), Ivaí, Itacurubi, Carovy (distrito), Timba ínculo com o passado Inhacapetun (rio), dentre outros, o que demonstra um v guarani. ípio remetem ao passado guarani e, posteriormente, com As origens do munic ões à organização socioeconômica e política ítas a serviço inflex que os padres jesu ão do Tapes onde estavam os guaranis do rei da Espanha propuseram para a regi e ável experiência social. Existem várias que resultou numa complexa e not ências históricas que apontam para o ítico ípio de refer passado jesu -guarani no munic ígios de capelas e outras construções que Bossoroca: estradas, caminhos, vest ícios e reminiscências da primeira e da segunda fase dos jesuítas no constituem ind

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ório que hoje é Bossoroca. CRUZ afirma que “No ção territ primeiro ciclo da civiliza ítica foi levantada a capela Santiago, que era destinada a um posto de gado de jesu ção sendo destruída pelos bandeirantes em 1636” ( corte. Teve pouca dura CRUZ, 1993, p. 22). ígios recuperados pelas pesquisas arqueológic 13 Os vest as revelam que os ções primeiros grupos sociais a viverem no local foram comunidades de popula terra fendida14 guaranis. Deles nos vem o nome do lugar: Bossoroca, ou seja, , que õe os “territórios cógnitos”, amplamente conhecidos, reconhecidos e comp ça, coleta e horticultura. Esse manejados pelos grupos que ali viviam da pesca, ca ória histórica dos grupos que habitavam conjunto de conhecimentos constitui a mem árzeas do rio Piratini que corta o município. as v Guarani Tekohá Os , que viviam na Bossoroca, estavam organizados em , ça e coleta. O comunidades de horticultores que se alimentavam da colheita, da ca Tekohá çoroca] era o espaço geográfico, étnico, sagrado, guarani [denominado bo ício para viver e reproduzir. Era nesse espaço que a comunidade guarani viv prop ia o Ñande Reko ça seu modo de ser, o , ou seja, modo de ser guarani. Essa heran é evidenciada por vestígios arqueológicos como pontas de flechas, projéteis, guarani ícios de cerâmica, entre outros15 resqu . ém nos servimos do tronco linguístico Tamb como forma de ressignificar parte ção do lugar, do cotidiano guarani e referenciar as primeiras formas de ocupa í ância do nome do lugar. Em suma, essa terra fendida e suas residindo a a import ções com o rio Piratini possibilitaram aos integrantes da comunidade gua liga rani viverem, ocuparem o local e batizarem-no compartilhando os costumes e a cultura ívio entre si16 no conv . ígios arqueológicos da pesquisa apontada sinalizam a Todavia, os vest ça de vestígios do grupo étnico Charrua ígenas presen , evidenciando que esses ind

13 ório de Estudos e Pesquisas Arqueológicas (LEPA), da A equipe de estudiosos do Laborat ólogo pelo MAE/USP Universidade Federal de Santa Maria, coordenada pelo Prof. Dr. Arque , Saul ão no período de 2001/2003. Eduardo Seigner Milder, pesquisou a regi 14 ábulo guarani, Boçoroca = Barrocão, sangão fundo ou Bossoroca O nome origina-se do voc - de ão, chão rasgado, fenômeno que ocorre por efeito das águas Iby-Soroc. Iby = terra; Soroc = rasg em terrenos arenosos. 15 Guarani: organização social e arqueologia SOARES, A. L. R. . : EDIPUCRS, 1997 ção arqueologia; 4], pp. 115 Cultura Guarani ón [cole -172; TORRES, D.G. . Asunci : Editora Litocolor, 1997, pp 165-189. 16 À, B. El Guaraní Conquistado y Reducido ón MELI : ensayos de etnohistoria. Asunci : CEADUC, úne vá 1996. Nessa obra, o autor re rios ensaios de sua autoria nos quais discute e aprofunda ão linguística. aspectos da cultura guarani e, em particular, a quest

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ço com o Guarani ção não disputavam o espa , comprovando assim que essa ocupa ífica. Pelo contrário, incluiu guerras, alianças, laços de parentesco17 era pac . Nessas Guarani ôs sua dominação, tornando ônico no disputas, o imp -se o grupo hegem ígios da presença guarani no local servem para local. Dessa forma, os primeiros vest ças na constituição do patrimônio cultural bossoroquense. definir as suas heran éculo XVII ários da Companhia de A partir do s , ocorre a chegada dos mission érico. Jesus, o que permitiu o encontro dos mundos e dos modos de ser guarani e ib ões ibéricas, Esse encontro ocorreu em meio aos conflitos definidos pelas expans ólicos diferentes, estranhos, quase sempre expressas em universos simb ônicos, mas que propiciaram negociações, quando as comu antag nidades locais guaranis passaram a interferir na realidade apresentada. Desse modo, guaranis e ítas foram os atores sociais. Em meio aos estranhamentos e convívios, jesu íram uma realidade social com as suas inflexões cu ômicas e constru lturais, econ ítica Tekohá pol s e transformaram a antiga paisagem cultural do em comunidades íticas a partir da realidade da evangelização das guarani-missioneiras e jesu ções originárias da localidade. popula ípio de Bossoroca, encontramos a Dessa forma, na origem do atual munic ça guarani em processo de mudança para as sociedades ibero ânicas, presen -hisp ítas. Os guaranis preservaram valores e códigos pertinentes negociadas com os jesu ólico do Ñande Reko áfica ao universo simb , como se expressa a nomenclatura geogr do local. Assim, gradativamente, foram se construindo e se formando os povoados íticos, espalhad íncia jesuítica do Paraguai, criada em 1609, guarani-jesu os pela prov pela Companhia de Jesus. éculo XVII ções na Banda Oriental do No final do s , foram fundadas sete povoa ência social, de uma Rio Uruguai, o que resultou em complexa experi revisitada ção socioeconômica e política. Nela, os guarani ítas organiza -missioneiros e os jesu é católica, em nome da Companhia de Jesus, da Corte de Espanha e da Santa S ência. foram os atores sociais dessa experi ção de Bossoroca18 área de estâncias de Santo Tomé, A forma aparece na

17 O Guarani: o conquistador vencido Sobre essas disputas conferir os estudos: BROCHADO, J. P. . O Índio no Rio Grande do Sul In: RAMIREZ, H [organizador]. : perspectivas. Porto Alegre: El índio y la Governo do Estado do Rio Grande do Sul, 1975, PP. 71-81; BECKER, I. I. B. colonización: Charrúas y Minuanes Pesquisas ão Leopoldo, Instituto Anchietano de . Revista . S Pesquisas, 37:1-286, 1984. 18 Pioneiros de Bossoroca FIALHO, I.J. B. . Bossoroca: EDUNIJUI, 1992. O autor reconhece a ção de Bossoroca, sem aprofundar a análise. paisagem missioneira [p.11] na forma

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âncias de São Miguel, permanecendo na em suas proximidades com as est é o povoado de São Miguel. Por atualidade a estrada geral, que conduzia o local at ões, essa estrada ainda hoje utilizada, movimentavam-se guarani-missioneiros, pe é para os currais de São vaqueiros e tropeiros, os quais conduziam o gado em p ém ideias, norm ódigos culturais. Miguel. Com eles, iam tamb as e c ência é constante Na localidade, essa experi mente revisitada, ressignificada e á que a população busca seus nexos identitários com reatualizada no presente, j ítico às vezes se confundindo com os fatos fundantes esse passado jesu -guarani, ões jesuítico das Miss -guaranis e quase se perdem em narrativas de tempos imemoriais.

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Figura 2: Mapa dos trinta Povos Missioneiros Noel Guarany - Destino Missioneiro Fonte: SOSA, Chico. , p.25 ítico ém destacar a experiência fronteiriça, Desse passado jesu -guarani, conv ções humanas sempre constantes na re ão e que permitiram essas constru gi ções. Na estrada geral, diferentes grupos contatos, passagens e intercomunica sociais agiram e interagiram, em momentos diferenciados, fazendo circular as ão – é e a erva mate – principais riquezas da regi o gado em p mercadorias que ânicos e os luso transitavam com facilidade entre os hisp -brasileiros. érica na região não se restringiu apenas à presença de súditos da A frente ib ém à presença constante e eficiente dos súditos da Corte de Espanha, mas tamb Corte de Portugal, como tropeiros, conquistadores, aventureiros, 19 ços. Era, enfim, afrodescendentes , mesti um conjunto populacional que colocava a ônia por érica em movimento e a fronteira em mobilidade com col tuguesa na Am suas ções e oposições, e com ções de continua suas a érico e o mundo das ruptura/continuidade/descontinuidade entre o mundo ib ções indígenas. Nesse cotidiano fronteiriço, encontramos a dinâmica das popula ções sociais, ou seja, é na compreensão da vida cotidiana das trocas e das rela ção ções e organizações fronteiras platinas que percebemos a atua das institui éricas colonizadoras em contato com as populações originárias. ib úditos da Corte de Portugal se expandiam pela região do Rio da Prata Os s ônia do Santíssimo Sacramento. Da área de desde 1680, quando fundaram a Col ção as Missões Orientais, os luso Sacramento em dire -brasileiros foram se áreas, principalmente do litoral do atual Rio Grande do Sul, expandindo, ocupando à época como campos de Viamão ou o Continente de São Pedro. Nessa batizado ão, o governo português concedeu í, a regi sesmarias nos campos do Rio Tramanda “as primeiras sesmarias concedidas no Rio partir de 1732, pois, conforme Laytano, ” (LAYTANO, 1986, p. Grande, foram em 1732 e 1733 pelo conde de Sanzedas [...] 14). Gradativamente, os luso-brasileiros se expandiram de leste para oeste, ão Pedro e apossando-se do gado que se criava extensivamente no Continente de S ércio e as trocas ocupando essas terras. Nesse processo, rumo a oeste, o com ência de muitos e as relações econômicas, tanto do comérci garantiram a sobreviv o,

19 A sombra da Cruz ência servil no noroeste do Rio Grande do DARONCO, L. J. : trabalho e resist – ção Malungo; Sul segundo os processos crimes (1840-1888). : Ed.UPF, 2006 [cole ções escravistas na região das Missões ao longo do século 12]. Nessa obra, o autor aborda as rela álise da chegada dos africanos e descendentes em Bossoroca. XIX, podendo servir de fulcro a an

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ência, mas permeadas por quanto do contrabando, foram de reciprocidade e conviv ões políticas e conflitos. tens ão das cortes ibéricas em acordar Os acontecimentos culminaram com a decis ços de ocupação colonial: o Tratado de Madri de 1750. Esse Tratado definiu os espa ão da Amazônia ficava para a Corte de Portugal – érica Portuguesa – a regi a Am ão do Rio da Prata ficava para a Corte de Espanha – érica enquanto a regi a Am – ões jesuítico Espanhola na qual estavam as Miss -guaranis e Posto de Bossoroca, ân ão Miguel, que abastecia o povoado daquela estância. Nos na est cia de S ões e, com elas, Bossoroca, deveriam ser entregues a meandros do tratado, as Miss érica Portuguesa. Portugal, constituindo-se na parte meridional sul da Am érica ório Efetivado o acordo, as Cortes Ib s pretenderam desocupar o territ missioneiro, mesmo contrariando os interesses de parte dos guarani-missioneiros, às determinações. Com isso, provocaram a ira das forças luso os quais resistiram - índios na rebel ão colonial conhecida por espanholas que se uniram para derrotar os i ítica. Guerra Guaran éricas assinaram o Tratado El Pardo, em Algum tempo depois, as Cortes ib ções do Acordo de Madri foram anuladas, favorecendo 1761, pelo qual as disposi ânicos ocuparem o território da Capitania de São Pe aos hisp dro e de Santa Catarina. Nesse processo, o povoado de Rio Grande e as sesmarias foram é 1777, quando foi celebrado o Tratado de ocupados e se mantiveram em guerra at ínterim, a Companhia de Jesus foi expulsa da América Santo Ildefonso. Nesse “Dominus ac Redemptor” Espanhola, em 1768, e suprimida por meio da bula papal assinada por Clemente XIV em 21/07/1773. ções alteraram o sentido das Missões, que deixaram de ser jesuíticas. Essas a ários públicos, au Outras ordens religiosas e de leigos (militares e funcion xiliados por particulares) passaram a administrar os povoados missioneiros-guarani, às guerras. É desfalcados, tanto nos recursos humanos como materiais, devido “os administradores espanhóis, que substituíram os jesuítas após correto pensar que ã ão respeitavam os valores da cultura guarani” (FLORES, sua expuls o em 1768, n ência que havia se 1986, p. 107). Os administradores fizeram esboroar a experi ência jesuítico ída no solidificado. Se, antes, durante a experi -guarani ela estava inclu çã ós esses fatos, o guarani projeto de evangeliza o, ap -missioneiro gradativamente ídos. passou a ver seus interesses exclu

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écadas finais do século XVIII Nas d , os luso-brasileiros foram incorporando à América Portuguesa as terras do oeste da Capitania do Rio aos seus interesses e ão Pedro, ultrapassando o forte de São Martinho da Serra. As terras Grande de S ção de sesmarias, que traziam a consequente apropriação eram legalizadas pela doa âncias missioneiras. do gado existente nas est ço do século XIX érica êm envolvidas em No come , em 1801, as Cortes Ib s se v ódio que teve desdobramentos na campos opostos na Guerra das Laranjas, epis ão Pedro, quando súditos da Corte de Portugal saíram de Rio Grande Capitania de S é os rios e de no intento de expandir as fronteiras da Capitania at Uruguai ório missioneiro20 e da Prata, o que envolvia o territ . Pequenas tropas de milicianos, que realizaram os primeiros ataques foram ícias e estancieiro, Manuel dos Santos Pedroso organizadas. O militar, major de mil - à guarda do Passo Maneco Pedroso -, organizou uma tropa de 30 homens armados óximo à atual Santa Maria dos Ferreiros, de onde partiu, via Boca do Monte [pr -RS], Águas Negras e Passo do [rio] Ibicuí para conquistar o forte espanhol de São é Martinho da Serra. Pedroso tinha apoio do comerciante e contrabandista Jos Francisco Borges do Canto e de seus 15 homens armados. “Enquanto o rival Maneco Pedroso se dedicava à Segundo Tau Golin, rapinagem, no dia 3 de agosto, Borges do Canto tomou o caminho geral das ões, usado há décadas pelos guaranis Miss nas viagens entre os Povos e Santa ” (GOLIN, 2002, p. 214). O bando de Manuel Pedroso ocupou São Nicolau e, Tecla ência, São Borja. Borges do Canto foi além da meta e, com apoio de índios na sequ óis nos povoados de São Miguel, São João Batista e Guarani, combateu os espanh Ângelo. Santo ão Enquanto ocorriam os combates nesses povoados, os habitantes de S ço, São Luiz ão Nicolau fugiram em massa, facilitando o avanço Louren Gonzaga e S ão ão esperaram a chegada do grupo de Borges do Canto. Os guaranis s -borjenses n da tropa de Borges. Aprisionaram o administrador espanhol e o entregaram aos çou até Quaraí, luso-brasileiros. O bando armado de Maneco Pedroso avan Paysandú Curuzu-Quatiá óximos, e o líder invadindo as terras de , e povoados pr Sarandi passou a residir na Fazenda .

20 O Malón de 1801 ções na érica CAMARGO, F. : a Guerra das Laranjas e suas implica Am Meridional. Passo Fundo: Clio Livros, 2001. Nessa obra, o autor examina com profundidade as ções da Guerra das Laranjas no Rio Grande de São Pedro, sendo possível perceber as implica ções desses ódios em implica epis Bossoroca.

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ão de milícias ão Enquanto isso, ao sul, as tropas comandadas pelo capit Sim é Antunes da Porciúncula Soares da Silva e do tenente Jos invadiram o forte do í, na região do Taim. ício José Chu Quase simultaneamente, a tropa do coronel Patr âmara ônio Alves, invadiu o forte de Cerro Correia da C , liderada pelo tenente Ant ções espanholas foram Largo, derrotando as tropas espanholas. As demais fortifica óis e ocupadas por destacamentos portugueses, cujo abandonadas pelos espanh ólio mais importante é o forte de Santa Tecla, na atual cidade de Bagé. esp Sobre esse momento de 1801, escreve Sandra Jatahy Pesavento:

ões Orientais, em 1801, por Manuel dos Santos Com a conquista das Miss é Borges do Canto (desertor dos Pedroso (um estancieiro/soldado) e Jos ões e contrabandista), com o beneplácito das autoridades portuguesas, Drag ões, que se o Rio Grande do Sul conquistou sua fronteira oeste. As Miss ência sob a administração espanhola leiga, achavam em decad área para expansão das sesmarias transformaram-se em nova (PESAVENTO, 2002, p. 23).

ês passou a assumir o controle da região e do território das O governo portugu õe úditos luso ós o movimento de Miss s, concedendo sesmarias aos s -brasileiros. Ap ões orientais pelos portugueses, a região foi transformada em conquista das Miss área de expansão das sesmarias portuguesas, que trouxeram a propriedade nova privada da terra e, consequentemente, o modelo social assentado na grande ão o município de propriedade rural. Nesse contexto, se incluem as terras que hoje s Bossoroca. De acordo com Laytano, a origem da propriedade privada no Rio Grande do ão das M õe ós a conquista portuguesa em 1801, Sul e, mais tarde, na regi iss s, ap á na distribuição de sesmarias. est

ão devia ser vendida, era doada; exigia A terra tinha que ser usada, n -se a ção; era imposta uma carência do ocupante que posse dela como utiliza ção do governo, um número estava nas terras que ia requerer como doa ém que já ocupasse a terra que pedia, determinado de anos. Assim, algu ê ções conseguia obt -la gratuitamente do Estado, mas com base em obriga legais (LAYTANO, 1986, p. 13).

Nesse caso, o intuito maior era o de obrigar o requerente a permanecer na ório não fosse novamente ocupado pel terra, garantindo, portanto, que o territ os óis espanh ou, como eram tratados, pelos castelhanos. ão das propriedades que se estabeleceram pela Buscando entender a extens

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ão de sesmarias, enco ções: concess ntram-se em Laytano as seguintes anota

égia, a título, a quem se A sesmaria era concedida em carta r ções, especificadas na comprometesse a certas e determinadas condi ção da terra, em vigor na época (1986, p. 15). A Sesmaria é uma legisla ão de á ao sesmeiro o domínio sobre uma área concess terras pela qual se d ês léguas em uma dimensão por outra em largura e uma e variando entre tr é, uma superfície total que compreende entre 13 mil e meia em quadra, isto úmeros redondos. Uma sesmaria ém 150 quadras, 10 mil hectares em n cont égua de sesmaria, equivale a 50 quadras. Uma quadra de portanto, cada l é igual a 87 ha. 12, ou 132 m de frente por 6.600 m de fundo [...] sesmaria (LAYTANO, 1986, p. 15).

é 1801, Bossoroca fazia parte do território mi At ssioneiro conhecido como âncias de Santo é". A questão da ocupação das terras após a conquista "Est Tom ão de sesmarias já portuguesa, no entanto, tem novos entendimentos, e a concess ão é vista como a única forma de apropriação de terras no período oitocen n tista. ção luso Alguns autores apontam o fato de que a ocupa -brasileira ocorreu em óri íveis para distribuição territ o no qual todas as terras ficaram dispon em forma de sesmarias. As pesquisas mais recentes demonstram, no entanto, que houve muita ção e áreas, houve á diversidade na forma de ocupa que, em muitas conflitos, por j ão de área livre e desocupada, enfatizada estarem ocupadas, o que contraria a vers por alguns autores. ção das grandes propriedades no município Em seu estudo sobre a constitui ís Augusto de (RS), Lu Farinatti revela novos entendimentos apontando “Ao lado das doações de sesmarias, as posses por ocupação para o fato de que ções também marcaram presença naquele simples, as compras e as usurpa ” (FARINATTI, 2010, p. 163). contexto As palavras do referido autor indicam que tais ções também fazem parte do contexto histórico da região de Bossoroc situa a, conforme registros locais. Quando Fialho explica sobre a forma e o tempo em que se requeria a “o tempo de ocupação inf ía para o deferimento da autoridade sesmaria, narra que lu competente, quando acontecia do pretendente vender o direito de posse, o ” comprador requeria contando o tempo do vendedor como se fosse dele (FIALHO, 1992, p. 12). Isso demonstra que a venda era uma modalidade muito usada, e isso época. era um dos costumes da ão de terras pelo governo português, chegou àquele local um Com a concess é Fabrício de seus primeiros povoadores, Jos da Silva. Este acampou nas margens

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ão da estrada geral, em local que viria a ser chamado , justamente em raz à construção de um túmulo com formato de da morte de um de seus filhos no local e ério da Igrejinha. O nome Igrejinha capela, origem do Cemit generalizou-se e, por algum tempo, passou a designar toda a Bossoroca. A morte do filho, no entanto, ício a ocupar outras terras, onde construiu o que se reconhece hoje motivou Fabr ância Velha. como Est ão o município de Bossoroca foram As terras que hoje s divididas entre ão de sesmarias ou pela pessoas que chegam e se instalam, seja pela concess 21 ários de terras. Outros compra e venda de posses tornando-se grandes propriet índios não são levados em conta entes sociais como antigos posseiros, lavradores e ção, que tinha como pressuposto a ocupação das terras nesse processo de ocupa em nome da Coroa Portuguesa. ção que essas concessões de Para que se possa compreender a propor ça na questão fundiária de Bossoroca, é interessante avaliar a sesmarias alcan ão da sesmaria dos Fabrício extens s, tendo em vista que ainda existe o documento çõ ões dela dentro do território de suas confronta es. Isso permite perceber as dimens ípio. do munic Se repararmos no mapa de Bossoroca e nas terras que compunham a é Fabrício (grifada) e que hoje corr ão dos sesmaria de Jos espondem ao Rinc ício ão dessa propriedade alcança uma grande Fabr , podemos perceber que a extens área dentro do território que hoje é o município de Bossoroca, deixando clara a ão dessas propriedades privadas. dimens

21 ências mais atuais têm evidenciado que “Não houve unicamente a concessão de sesmarias Tend ço vazio ou uma terra de ninguém. Ocorreu, sim, um processo de concentração, sobre um espa ão uma monopolização absoluta da propriedade à sua mas n da terra, e muito menos do acesso ” “Em vez de um bem ordenado tabuleiro de xadrez de estâncias, posse (FARINATTI, 2010, p.170). assemelhava-se mais a um mosaico, em que posses de diversos tamanhos e sob diferentes ídicos estavam não ape estatutos jur nas imbricadas, mas podiam inclusive apresenta-se ção da terra, sobrepostas. Como podemos imaginar, essa variedade formas de apropria à imprecisão de dos limites de misturando sesmarias, compras, posse pura e simples, somada cada estabelecimento constituiu-se em uma fonte perene de conflitos que perdurariam e ça e variedade ao longo dos Oitocentos (GARCIA, 2005 ganhariam for - citado in: FARINATTI, ção pura e simples como uma 2010, p.171). Tais estudos evidenciam a posse da terra ou ocupa à ter ício do século 19, na expansão das fronteiras além de Rio Pardo. Os forma de acesso ra no in ém o fato de que: “a compra esteve presente na região estudos de FARINATTI apontam tamb órdios de sua ocupação estável pelos luso ”. desde os prim -brasileiros

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Figura 3: Mapa de Bossoroca. Fonte: Secretaria de Obras de Bossoroca ão o Rincão dos Fabrício Nota: As terras que compunham a sesmaria e que hoje s aparecem destacadas no mapa. Quatrocentas quadras de campo equivalem a aproximadamente 35.000 hectares.

Com o tempo, Bossoroca recebeu imigrantes e descendentes de imigrantes ães, fra italianos, alem nceses e de outras nacionalidades. De acordo com Fialho, “junto com os imigrantes veio a tecnologia tanto na pecuária como na agricultura”

(FIALHO ,1992, p.11). ípio, que foi distrito de São Luiz Gonzaga, obteve sua emancipação O munic ítica em 12 de ou ção ocorreu apenas em 04 de pol tubro de 1965, mas sua instala ço de 1967. Bossoroca foi gestada, portanto, durante o período da ditadura mar É um dos municípios que tiveram sua emancipação militar brasileira (1964-1985). égide dos governos militares, o q âncias sob a ue nos faz refletir acerca das circunst ítico ís era de autoritarismo em que ocorreu esse processo, pois o momento pol do pa extremo.

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É neste contexto histórico que se imprime a dinâmica cultural do município de

Bossoroca, carregada de peculiaridades e nuances que remetem ora a aspectos referentes ao passado missioneiro, ora ao passado estancieiro. Essas ísticas são impregnadas de heranças culturais calcadas no binômio caracter ção/submissão. domina Nessa municipalidade, existem marcas intensas dessas duas frentes de ção: a jesuítico ção luso ocupa -missioneira e a estancieira (de ocupa -brasileira), ências históricas e culturais que precisam ser interpretadas e avaliadas para refer que cumpram seu papel na sociedade atual. ípio de Bossoroca, no art. 4º ânica Municipal, apresenta O munic da Lei Org -se “Buena ”, suscitando claramente suas origens missioneiras, como Terra Missioneira á analisado mais detalhadamente no Capítulo 3 (item 3.1.1). Todavia, como ser ções e símbolos que permanecem vivos na ão muitas representa sociedade, s á facilmente identificados com o passado estancieiro do lugar (conforme ser ítulo 3 explicitado no Cap - item 3.2). álises, verificamos que não existe uma identidade cultural Com base nestas an órico e das negociações em Bossoroca, mas identidades, resultado do processo hist ção de que foram se estabelecendo, visto que todos os processos de constru ão negociados. identidades s óximo capítulo, investigaremos os lugares de memória, procurando No pr ória e as especificidades deles, identificar sua hist bem como seu papel no contexto órico e cultural do município. hist

2 OS LUGARES DE MEMÓRIA

ítulo, mostramos alguns Lugares de Memória do Município de Neste cap ões da sua história. Bossoroca evidenciados como guardi É fato que, em ência da aceleração da história, de que nos fala Pierre decorr órico que nos move no sentido de Nora (1993), vivenciamos hoje um momento hist é urgente e necessário guardar os cacos de memória, os fragmentos que que ções de um grupo para não se podem sustentar e ancorar as recorda perderem em ínculos com o passado. Diante das relações efêmeras cada vez mais definitivo os v presentes no cotidiano, quando tudo parece se perder no momento seguinte ao seu ências. Essa fluidez acontecimento, revela-se a necessidade de buscar refer ção que busca preservar o exacerbada acaba conduzindo a um movimento de rea ão se perder definitivamente o vínculo com o presente, como possibilidade de n É da percepção de que podem se perder as lembranças das vivências que passado. ça esses vínculos, que guarde a surge a necessidade de guardar algo que estabele ências quando necessário. possibilidade de recorrer a tais refer De acordo com as palavras de Nora,

ória se cristaliza e se refugia está A curiosidade pelos lugares onde a mem ória. Momento de articulação ligada a esse momento particular da nossa hist ência da ruptura com o passado se confunde com o onde a consci ória esfacelada, mas onde o esfacelamento sentimento de uma mem ória suficiente para que se possa colocar o problema de desperta ainda mem ção ( sua encarna NORA, 1993, p.7).

ósito residual nessa Os locais transformam-se em possibilidade de dep “A ciranda pela busca de continuidade. Neste sentido, esse autor afirma que ória se enraíza no concreto, no espaço, no gesto, na imagem, no objeto.” mem (NORA, 1993, p. 9). ática dos lugares evidenciada por Nora (1993) nos leva a avaliar e A problem ços serem tentar compreender os processos que permitem a determinados espa ória e o potencial que representam como fonte de referidos como lugares de mem ções da interpreta sociedade. De acordo com Nora:

ória nascem e vivem do sentimento ão existe Os lugares de mem de que n ória espontânea, que é preciso criar arquivos, que é preciso manter os mem ários, organizar as celebrações, pronunciar as honras fúnebres anivers , ções não são naturais (...). Se estabelecer contratos, porque estas opera

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êssemos verdadeiramente as lembranças que eles envolvem, eles viv úteis. E se em compensação, a história não se apoderasse deles seriam in á á á á ão se para deform -los, transform -los, sov -los e petrific -los eles n ória. É este vai tornariam lugares de mem -e-vem que os constitui: momentos ória arrancados do movimento de história, mas que lhe são de hist devolvidos (...) (NORA, 1993, p. 13).

ósitos residuais revelam Esses dep -se como escoadouro para manter vivo o ínculo com um passado carregado de significados valorizados pelo grupo que se v õe a guardá disp -lo.

À medida que desaparece a história tradicional, nós nos sentimos obrigados ígios, testemunhos, documentos a acumular religiosamente vest , imagens, íveis do que foi, como se esse dossiê cada vez mais discursos, sinais vis ífero devesse se tornar prova em não se ória prol sabe qual tribunal da hist (NORA 1993, p. 15).

é que c Neste sentido ompreendemos as palavras de Nora, como indicadores ória: do que devemos perceber como lugares de mem

ória pertencem a dois domínios, que a tornam Os lugares de mem ém complexa: simples e ambíguos, naturais e interessantes, mas tamb à mais sensível experiência e, ao artificiais, imediatamente oferecidos ção.” São lugares, mesmo tempo, sobressaindo da mais abstrata elabora ês sentidos da palavra, material, simbólico e funcional, com efeito nos tr simultaneamente, somente em graus diversos (NORA, 1993, p. 21).

ência, alguns lugares ória do Dessa maneira, apresentamos, na sequ de mem ípio de Bossoroca, na perspectiva apontada por Nora (1993), compreendendo munic - ços estabelecidos, historicamente, como guardiões da memória local. os como espa íveis elementos usados Desse ponto de vista, avaliamos estes lugares como poss ção de identidade para o município. para efetivar processos de constru

2.1 Alguns Lugares de Memória do Município de Bossoroca/RS

órico, por serem Bossoroca possui lugares reconhecidos tanto pelo valor hist à história do município ão, quanto por estarem diretamente relacionados e da regi ções construídas a partir das relações de poder que se impregnados de representa ões da memória. Lugares que estabeleceram e os determinam como guardi ão capazes de suscitar interpretações acerca do pa despertam os sentidos e s ssado ípio e traduzir os valores e a cultura das pessoas do lugar. do munic

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ão depositadas as memórias coletivas podem ser Esses lugares onde est ções entre passado, presente e futuro percebidos como fonte para interpretar as rela ão encaminh ões patrimoniais e identitárias no e a forma como s adas as quest ípio. munic site O oficial da prefeitura municipal de Bossoroca evidencia alguns lugares óricos e turísticos do município. São esses lugares como indicadores hist ões de me ória e objeto de potencialização referenciados oficialmente como guardi m ória em Bossoroca. Tomados do turismo que analisamos como lugares de mem como documentos, tais lugares e monumentos nos trazem possibilidades de ções que se tornam deveras significativas para nosso estudo. interpreta ão ap site S ontados no : ância do sobrado (apresentada no site ítio arqueológico) com - a est como s ão de pedras; suas mangueiras e galp - a senzala; ância velha (recentemente elencada no referido site - a sede da est ); ério dos cativos; - o cemit - o monumento a Noel Guarany. ória histórica do Tais pontos representam momentos distintos na trajet ípio, o que evidenciaremos em cada oportunidade. munic ério dos cativos, carregam um misto de Alguns, como a senzala e o cemit ções e crenças acerca de sua existência. especula Integram, no entanto, o que a ória do município. O monumento a Noel comunidade reconhece como parte da hist ão tenha sido construído no passado histórico que evi Guarany, embora n denciamos, ção dos aspectos do passado, a partir d representa a busca de afirma e necessidades e anseios do presente. “muitas vezes há toda uma crítica à questão Diante isso, cabe considerar que ções inventadas, mas isso faz parte do imaginário desses grupos, e deve das tradi ”, conforme preconiza Brum (2011)22 ão nos cabe ser pensado . N julgar a veracidade ção destes elementos, mas o significado e o espaço que ocupam no da considera ário popular. imagin

22 Palestra proferida por Ceres Karan Brum no VIII Encontro de Estudos Missioneiros durante a XIV ão Luiz Gonzaga, maio de 2011. Mostra da Arte Missioneira, S

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ções inseridas nas referências aos lugares Consideramos que as representa citados devem ser evidenciadas, avaliadas e interpretadas para que possam produzir novos conhecimentos e entendimentos. ção de cada um desses ambientes enfocando sua história e suas A descri ções materiais potencializa a compreensão da dinâmica deles no cenário condi ão sustentação para cultural de Bossoroca, ou seja, nos d que possamos analisar ípio. Tais lugares estão, portanto, destinados seu papel no universo cultural do munic ão, conforme o que ensina Nora ões a fazer-nos lembrar de algo. S (1993), os guardi ória de Bossoroca. Eles estão investidos da prerrogativa d da mem e fazer com que a ória seja frequentemente acionada em relação àquilo que representam. mem

ância do Sobrado 2.2.1 A Est

ância do Sobrado é integrada por ções que A Est um complexo de constru ém re pertencem a uma propriedade rural situada na localidade e mant lativa ão Miguel das Missões, ligando proximidade com S -se a este por uma estrada vicinal. ígios da experiência jesuítico Alguns dos aspectos que apontam para os vest - ão situados na Estância do Sobrado. Ali aind guarani, existentes em Bossoroca est a á vestíg árias h ios de urnas funer , das mangueiras de pedras em formato redondo, e ão construído em pedra do galp -cupim e nomeado por alguns como senzala, porque ém a santa encontrada quando da teria sido usado com esse fim. Ali ainda se mant ília Furtado. A estância do chegada dos colonizadores brancos integrantes da fam ém é apontada como uma construção da época em que os jesuítas e sobrado tamb ígenas guaranis ocupavam aquelas paragens. ind ída no início do século XIX ília. A sede da fazenda foi constru pela referida fam édio do governo luso ão Esse grupo chegou ao local por interm -brasileiro, por ocasi ção do território sob o domínio dos portugueses e não mais dos espanhóis. da ocupa ído sobre os Segundo relatos e alguns estudos, o sobrado dos Furtados foi constru ígios d ções jesuítico ão de pedras, reconhecido por vest as constru -guaranis. O galp “senzala” e as mangueiras (em formato redondo) que existem no local muitos como íodo jesuítico ólogo provavelmente sejam do per -guarani, de acordo com o arque ípio (conforme decreto Claudio Batista Carli e Klaus Hilbert em visita oficial ao munic º1906/2006). n

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Pioneiros de Bossoroca Na obra, , escrita por Jorge Fialho, antigo morador de ções Bossoroca e autor de pesquisa cartorial, este registrou costumes e tradi ípio. Essa pesquisa permite daqueles que ele considera os pioneiros do munic ém encontrar subsídios sobre as primeiras famílias das terras que constituiriam tamb ção da família dos Furtados na história do município Bossoroca. Para contar a inser ância do Sobrado, o autor e, mais especificamente, no lugar hoje chamado Est “João da Costa Furtado adquiriu a propriedade na década de 1940. Mandou afirma: á era moradia muito antiga e construir o sobrado, nesse local que j dizem que pode ítico ou um aldeamento indígena, o é muito provável” ter sido um posto jesu que (FIALHO, 1992, p. 213). ém um galpão construído em pedra ça No local, existe tamb -cupim, que alcan êmica quanto ao fato de ser nome grande notoriedade, visto que desperta pol ado ém há ões em torno da época de sua ção, pois, como senzala. Tamb discuss constru ão havendo um estudo arqueológico conclusivo, aponta n -se para o fato de ser uma ência da civilização jesuítico ção que o galpão tem na reminisc -guarani. Pela proje ão patrimonial, inclusive já tendo sido objeto de estudo de trabalhos quest êmicos fora do município, o analisa acad remos separadamente a fim de discorrermos com mais profundidade acerca desse elemento que, embora localizado no interior do ância Velha, alcança projeção e notoriedade. Isso requer que seja complexo da Est ífica. O referido galpão constitui um dos lugares de ória avaliado de forma espec mem ípio de Bossoroca. de mais apelo e popularidade no munic ância do Sobrado, existe uma imagem que, de acordo com relatos de Na Est ília dos Furtados, já estava no local integrantes da fam quando eles ali chegaram. A é uma representação de Nossa Senhora da Conceição, entalhada referida imagem em madeira, medindo aproximadamente 70 cm de altura, com todas as ísticas das estátuas missioneiras. caracter

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ância do Sobrado Figura 4: Imagem da Santa em madeira da Est (Jan./2010) Fonte: Arquivo e foto da pesquisadora.

É fato que existem muitos exemplares de estátuas missioneiras recolhidas por êm em suas residências como relíquias de família e que, ao pessoas que as mant serem devidamente estudadas e catalogadas, poderiam fazer parte do acervo de átuas missioneiras. São exemplares que servem como vestígios materiais de uma est ência social do passado do município. experi ígios materiais existentes na Fazenda do Sobrado são Os diferentes vest ções e representações em sobremaneira instigantes e existem muitas interpreta ígi época dos jesuítas como a dos torno desses vest os materiais, tanto reportando a povoadores luso-brasileiros. ção (gestão 2001 ípio empreendeu Por meio de sua administra -2004), o munic ár ços no sentido de buscar a valorização e o reconhecimento da Estância v ios esfor

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ônio missioneiro de Bossoroca. Nesse sentido, foram do Sobrado como patrim ções como as que aparecem descritas no caderno turístico de efetivadas a ção 2001 “[...] depois de vários contatos com a Bossoroca (administra -2004): Secretaria de Turismo do Estado, uma consultora do SEBRAE, a senhora Daniela ” O caderno explica que: “A consultora ficou impressionada Kinas, veio a Bossoroca. à com os aspectos construtivos do local, onde (sic) os mesmos obedecem ítica, presente nos sete povos.” “Daniela Kinas solicitou contato com arquitetura jesu ônio Histórico e Artístico do Estado, a fim de trazer o IPHAE - Instituto do Patrim ólogos para visitar o local e fazer o reconhecimento.”. arque ção de negociar com o passado Dessa forma, torna-se clara a disposi ítico jesu -missioneiro para afirmar aspectos que podem ser objeto de reconhecimento ção de construir uma identidade no presente, ficando evidenciada a disposi missioneira para Bossoroca.

ância do Sobrado (jan./2010 Figura 5: Vista da Est ) Fonte: Arquivo e foto da pesquisadora

2.2.2 A Senzala

ão de pedra ões de atrativo turístico desde que O galp -cupim ganhou dimens passou a ser reconhecido publicamente como senzala e sendo citado com essa

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ção em alguns trabalhos acadêmicos. É fato que ípio e em denomina , no munic seu é bastante conhecido por ser um raro exemplar de um local bastante entorno, ário popular, ou seja, a senzala, lugar o curioso e marcante no imagin nde viviam os negros.

ão conhecido como senzala. (jan./2010) Figura 6: Vista do galp Fonte: Arquivo e foto da pesquisadora

órias são passadas de pais para filhos. Essas Em Bossoroca, muitas hist narrativas envolvem escravos e descendentes de escravos, descendentes africanos ícios como cozinheiras, parteiras, vaqueanos ou simplesmente com variados of ém que um dia chegou, não se sabe muito bem de onde, foi ficando e ajudando algu í, passa a ser parte da história das tantas fazendas esp aqui e ali. A partir da alhadas à vida urbana. São numerosas as pela Bossoroca ou, mais tarde, incorporados ória de Bossoroca e algumas delas figuras populares(negros) presentes na mem ção estreita que o município tem com os ainda vivem e revelam a liga ção a afrodescendentes, o que talvez explique o forte apelo popular em rela “senzala” 23 “Cemitério dos Cativos”. elementos como a e o

23 ção de senzala para o galpão de pedras pelo fato de ser referido assim Usaremos aqui a denomina ípio, o que determina os lugares de memória ora analisados por nós. no site oficial do munic

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ão ser chamado senzala De acordo com Fialho, o fato de o referido galp êmica trouxe alguma pol , e muitas pessoas mais antigas afirmavam que era apenas ão dos negros. Ele diz “a maioria das pessoas não entende que o galp que: é senzala e, para isso, bastava ter mais de um residente. João paradouro de negros Furtado tinha 4 ou 5 de sua propriedade, fora os que fugiam de outros donos e á ão era um escravagista propriamente dito, e tratava os vinham procur -lo, pois n ” negros com certa dignidade... (FIALHO, 1992 p. 213). “existe um marco, na parte interna, Esse mesmo autor registra ainda que à parede, instrumento de castigo. Pois isso, todos os qu íam postado junto e possu ém, mas o de João Furtado talvez nunca fosse ocupado, pelo escravos tinham tamb ão se tem notícias.” (FIALHO, menos n 1992 p. 213). O referido marco ainda é instrumento que se destinava a castigar os escravos. existente A tese de doutorado de CLARICE SANFELICE RAHMEIER, disponibilizada A Experiência da Paisagem no site www.dominiopublico.gov.br, intitulada Estancieira, 2007, ágina 142 orientada por Arno A. Kern, na p , cita como exemplo de çã senzala a constru o de pedras-cupim existente na Fazenda do Sobrado em ão, o que evidencia que o Bossoroca, apresentando uma foto do referido galp é algo que reconhecimento de que existe em Bossoroca o exemplar de uma senzala ípio. transcende o munic ão seja uma construção jesuítico é visto por O fato de que o galp -guarani á que essa seria uma pesquisadores como uma possibilidade muito interessante, j ções da época. Acerca disso são as palavras de Claudio Batista das poucas constru ção turística (p. 20) ao contemplar o galpão Carli, registradas no caderno de divulga “Estamos tentando imaginar como eram as construções da época e de pedra-cupim: ês têm esta construção intacta, com pequenas alterações, é simplesmente voc ástico”. O registro dessas palavras no caderno ção de turismo deu fant de divulga ênfase para o fato de que Bossoroca tinha um elemento material da cultura jesuítico - missioneira que a colocava em vantagem entre os demais. Havia uma atmosfera de ça ao ço ória passa ca tesouro e ali estava um deles. Dessa forma, esse espa de mem ção da identidade missioneira do município. a ter um peso importante na constru

ância Velha 2.2.3 Sede da Est

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ância Velha está construída dentro da área da sesmaria A casa-sede da Est é Fabrício ício do século concedida a Jos da Silva no in XIX. é um importante marco na história do município, visto que foi Essa casa a ício sede da sesmaria dos Fabr s, da qual existe o instrumento de requerimento de íodo de ocupação luso ão, após a tomada posse, marcando o per -brasileira na regi ões em 180 ída por volta de 1830, e é das Miss 1. A casa provavelmente foi constru ção da cultura estan ípio ainda um dos marcos da inser cieira presente no munic hoje, ômico e social calcado na grande propriedade rural. com um modelo econ “Co ônio Fabrício da Silva Fialho registrou em seus escritos que ntava Ant , um é, que seu pai chegou aqui com 20 contos de réis em dinheiro e dos filhos de Jos á viúvo de M ício, seus filhos eram ão, João, Domingo quatro filhos, e j aria Fabr Ram s ônio Fabrício da Silva” (FIALHO, e Ant 1992, p. 131). é Fabrício deve ter ocorrido presumidamente entre a A chegada de Jos écada de 1810 e 1820, visto que, paralelamente, nesse período, constata d -se a ão. Acerca disso, Fialho afirma que “a data chegada de muitos paulistas nessa regi écadas de sua chegada presume-se entre 1810 e 1820, pois, durante essas duas d , úmero de paulistanos que vieram com finali verifica-se grande n dade de adquirir ” (FIALHO, época da terras [...] 1992, p. 131). Outro pressuposto para pensar a é Fabrício é o requerimento para f chegada de Jos ornecimento de uma segunda via à concessão da sesmaria, do ano de 1830, no qual o dos documentos referentes á mais de seis anos (conforme requerente afirma que ocupa tais campos h documento anexo). época, ao chegar a dete Era costume, conforme literatura da rminado lugar, de écie de acampamento, de onde se pretendia requerer posse, organizar uma esp ção. Não se tem notícia de que José onde se iniciariam as lides para posterior instala ão Paul e os filhos tenham trazido escravos, no entanto, visto que vinham de S o, ércio de escravos era intenso, isso é bastante provável. Em referência a onde o com é conveniente lembrar que, de acordo com entrevista concedida por esse aspecto, ália Sofia Amaral Fabrí ílias de descendentes de Cor cio, em 08/02/2012, existem fam ância Velha e hoje vivem no bairro da Gaúcha. É o escravos que viveram na Est “Sia Balbina” e dos “ ” caso dos descendentes da Pachecos . ão foi o definitivo no qual a família O primeiro lugar onde se instalaram, n ízes. Esse local foi provisório por t estendeu suas ra er ocorrido ali a morte de um filho é Fabrício da Silva. Está localizado nas imediações do cemitério da Igrejinha. de Jos

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É importante lembrar que a estrada geral24 de hoje entre os dois lugares referidos, ório e definitivo, já existia na época, e é evidenciada em vários assentamento provis é Fabrício requer a concessão das terras. escritos, inclusive na carta em que Jos é a mesma que fazia a ligação com São Miguel. Essa estrada óricas afirmam que após a morte do filho mais jovem, José As narrativas hist íci óximo ao rio Piratini, no local onde Fabr o, os outros filhos foram assentar-se pr é a Estância Velha, requerendo aí sim a referida sesmaria. êncio hoje Cresc ício da Silva, um dos descendentes é Fabrício, Fabr do pioneiro Jos afirma que, “Segundo contavam os mais antigos... ali eles fizeram um caramanchão, primeiro o acampamento, (...) que era um galpão de capim até eles construírem a casa”. (NASCIMENTO, 2009, p.26) ções sobre as primeiras instalações dos antepassados relatadas Estas explica êncio fazem p órias remotas que o entrevistado carrega desde por Cresc arte de mem ância, quando ouvia os adultos contando os casos de seus os tempos de inf é que na bibliografia da época são relatadas situações antepassados. O fato às narrativas do entrevistado, o que semelhantes evidencia a proximidade de ências vividas pelos que chegavam. experi Podemos constatar isso nas palavras de Flores quando explica como eram as ções de caráter provisório existentes nas sedes das primeiras estâncias, constru “precárias, é e exemplificando-as como de paredes de pau a pique, cobertura de sap ês peças” com apenas tr (FLORES, 1997, p.164). ém referem o caráter provisório das construções que os Outros autores tamb íam para se instalar nos primeiros tempos, revelando que a chegantes constru ção d ências materiais. inser eles era carregada de car “O sistema usado pelos pretendentes à Quanto a isso, Fialho afirma que ão de terras era escolher o local da área, construir um rancho de capim, o concess acampar ou levantar posse” que chamavam de (FIALHO, 1992, p.12). “... obtido o despacho, então é que o Esse mesmo autor comenta ainda ário construía a casa definitiva e as de í propriet mais benfeitorias, o local reca a, ância de pedras e boa aguada, pois a pedra era quase sempre em lugar com abund

24 é referida aqui ligava esses lugares a São Miguel das Missões e é apresentada A estrada geral que ários entendimentos existem dizendo que na direção nort como caminho das origens, pois v e-sul ções da primeira fase dos jesuítas nestas terras, como a Capela San estavam localizadas redu é referida no documento de requerimento da sesmaria (ANEXO XX). A estrada Tiago, que inclusive é referida também como estrada real.

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ível época e serviu para casas, galpões, mangueiras e o material dispon na ” cercados... ções de Fialho, “obtida a confirmação de posse, construíram Conforme anota á lavrada em uma pedra da parede definitivamente a sede da fazenda, cuja data est – colocada acima da porta da frente principal da casa, 1835 hoje encoberta pelo ” reboco (FIALHO,1992, p. 133). Na foto, podemos perceber a marca na referida pedra em que constava a ção da sede da Estância. data de constru

ância Velha (jan./2009) Figura 7: Vista de frente da Est Fonte: Arquivo e foto da pesquisadora

ção da casa guarda o estilo característico da época: paredes que A constru chegam a medir 40-50 cm de espessura, aberturas feitas em madeira de lei, com ém de co vastas portas e as janelas com avantajadas soleiras, al bertas com telhas ística das construções do início do século 19 conforme de barro, outra caracter ções de Macedo (apud explica BERTUSSI [et al], 1983, p. 76- 77). “... linhas e travessas de louro ou Fialho explica que se usava madeira de lei úva...”. E ção conta que “A argamassa para o cabri ainda sobre o material de constru assento era barro amassado com cinza, as aberturas ou quadros de portas ou

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ém de madeira”... janelas, que chamavam portaladas, tamb (FIALHO, 1992, p. 12). ência ao mesmo local, Valer Em refer iano Cruz, reconhecido popularmente em ória do município “é toda Bossoroca como grande conhecedor da hist , escreve: ída em pedra e é dos primeiros povoadores brancos do lugar [...]” ([s/d], p. constru 86). ão Na foto a seguir, mais antiga do que a anterior, podemos ainda perceber n ó a casa dos proprietários, no caso já a construção definitiva, mas também as s ções destinadas à produção (trabalho), c ônico instala onforme modelo arquitet introduzido pelos luso-brasileiros nas grandes propriedades naquele contexto ço espa -temporal.

ância Velha (antiga) Figura 8: Vista de frente da Est Fonte: FIALHO, 1992, p. 147

Segundo Clarice Sanfelice Rahmeier:

ão ocupada tardiamente [...] no caso do Noroeste do Rio Grande do Sul, regi âncias es pelos portugueses, e onde as est truturaram-se somente a partir da ção do domínio luso (1801), a arquitetura das casas efetiva -sede acompanhou esse processo tardio, revelando em suas formas certo ões da Província. Na região conservadorismo se comparadas a outras regi que correspondia a Cruz Alta, mais especificamente, onde o povoamento mais efetivo deu-se por volta de 1830, a arquitetura das casas dos

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é bastante simples, característica estancieiros, mesmo das definitivas, é mesmo nas construções de fins do século, momento em que presente at áreas do Rio Grande do Sul já incorporavam elementos inovadores, outras é mesmo importados. Ainda que fossem simples, as industrializados e at íncia possuíam alguns casas dos estancieiros no Noroeste da Prov ásicos que as diferenciavam das demais ências da sede, elementos b resid ão só nos materiais empregados, mas também pela sendo superiores n ça de diferentes espaços funcionais. Era característica comum das presen ça de dormitórios (entre 3 e 5), corredor, sala da frente, casas-sede a presen ório de hóspedes, alcovas, capela, oratório ou varanda, cozinha, dormit nicho. Apesar da simplicidade, um relativo conforto e certa privacidade eram ão ocorria com as assegurados nessas moradias, o que n demais ções (RAHMEIER, constru 2007, p. 128).

ção da Estância V Na constru elha, podemos reconhecer muitos desses ística aspectos descritos por Clarice Rahmeier como caracter s da cultura material referente ao passado estancieiro luso-brasileiro no Rio Grande do Sul. Fotos das ências internas comprovam as semelhanças entre e depend lementos como ção dos espaços internos e materiais de construção, dentre outros. distribui

ísticos da arquitetura da Estância Velha Figuras 9 e 10: Elementos caracter Fonte: Arquivo e fotos da pesquisadora (dez.2009)

à sesmaria Segundo nossas pesquisas e pela data do documento referente ício ância Velha constitui uma das mais antigas construções dos Fabr s, a sede da Est íodo e, embora de forma precária, permanece em pé ao longo do tempo. do per â ão há Apesar da complexidade de fatores que envolvem a Est ncia Velha, n significativos empreendimentos administrativos nem particulares para sua ção, nem para sua valorização como testemunha material de uma época. preserva

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ídios para discutir aspectos sobre a cultura estancieira Isso permitiria reunir subs ário, se perderão com o tempo como, por exemplo, a vida dos que, caso contr escravos que ali viveram. ória “são os bastiões sobre o qual se De acordo com Nora, os lugares de mem ão estivesse ameaçado, não se teria, escora. Mas se o que eles defendem n í ” tampouco, a necessidade de constitu -los (NORA, 1993, p.13). í a explicação para o pouco entusiasmo em memorizar a Talvez esteja a ância Velha, assim como outras sedes espalhadas pelo município. Essa Est falta de ímulo em interpretá é co à manutenção das est -las, reproduz apenas o que nveniente ças sociais que comandam essas relações. De acordo com o autor antes referido, for ória surge quando a tradição está se esvaindo, o apelo pelos lugares de mem á iminência de vê ão é esse o caso da cultura quando h -la desaparecer, e n ções estão latentes, vivas e espalhadas estancieira em Bossoroca, pois essas rela ípio. é um jogo velado de se deixar esvaírem por todo o munic O que pode haver elementos acerca do processo escravista ou aspectos relativos a isso.

éri 2.2.4 Cemit o dos Cativos

ério dos cativos, como é conhecido, está localizado a sete quilômetros O cemit ípio. Situa á referida estrada geral que, segundo relatos, da sede do munic -se na j ão Miguel das Missões. ligava-se desde muito tempo a S ério foi c ído em função de uma Lei De acordo com Fialho, o cemit onstru “é proibido filhos de escravos frequentarem escolas junto Imperial de 1850 que dizia: é proibido sepultar escravos junto com brancos, estes deverão ser com brancos, érios separados.” ão da morte sepultados em cemit (FIALHO, 1992 p. 289). Por ocasi ês escravos durante a vigência da referida lei, teria surgido o Cemitério dos de tr 25 único do gênero no Rio Grande do Sul. Cativos , constando ser o

25 ência àquele q Em refer ue vive em cativeiro. No caso, cativo e escravo denotam o mesmo significado.

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ério dos Cativos Figura 11: Mapa Localizando o Cemit ís Fonte: Caderno Tur tico de Bossoroca (Adm. 2001-2004)

° de setembro de 1991, publicou reportagem de O Jornal Zero Hora no dia 1 áginas noticiando o Cemitério dos Cativos de Bossoroca. Essa reportagem duas p ário do que se pensava, o negro esteve presente n ção afirma que, ao contr a coloniza ão das missões. Segundo o jornal, “o sangue negro literalmente correu por lá. da regi ção de moradias e muralhas. Espirrou quando o Agitou-se nas veias na constru çoite correu solto nas fazendas e senzalas. Subiu e, de fato, derramou quando a -se por castigo feitores ças negras e pendurá mandaram cortar cabe -las em postes em às propri ” A reportagem guiou frente edades. -se pelas pesquisas de Jorge Fialho que ão reunia material que subsidiaria o seu livro, Pioneiros de Bossoroca ent , publicado em 1993. ência que o jornal Zero Hora, diário de grande Mesmo com toda a evid ção no Estado, deu à questão do negro e da escravidão em Bossoroca, circula ão histórica. Nenhum esforço foi nenhum setor da sociedade encampou essa discuss feito para buscar maior envolvimento ou fomentar questionamentos ou, enfim,

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ões. O tema, por isso, acabou novamente colocar o assunto na pauta de discuss caindo no esquecimento. úmulos que estão no De acordo com Fialho (FIALHO 1993, p.288 e 289), os t ério são os de três escravos, mor Cemit tos pelo fato de terem causado, acidentalmente, a morte de um menino, enteado de um vizinho que se encontrava árrios, escravista que estava na propriedade no viajando, visto que era carreteiro. B ós a morte do menino, mandou matar os momento do acidente, ap negros, e, ao ável seu escravo Ambrósio, mandou, além de identificar como principal respons á ça e colocá execut -lo decepar sua cabe -la exposta na ponta de postes na frente da ções, o casa, para dar exemplo aos outros negros. Ainda de acordo com suas anota úm ído com tijolos que existe no cemitério dos cativos é de José Fugante, t ulo constru padrasto do menino. Ele, que nunca se conformou pela brutalidade com que foram punidos os escravos, pediu para ser sepultado junto a eles.

ério do Figura 12: Vista do Cemit s Cativos (Nov./2011) Fonte: Arquivo e foto da pesquisadora

ério está rodeado por uma taipa 26 O Cemit de pedras, que faz conjunto com tantas outras que existem por ali.

26 ém conhecidas por cercas de pedras são construções muito encontradas na região As taipas tamb ípio de Bossoroca. Feitas com a sobreposição de pedras encontradas nos arr do munic edores ípio de Bossoroca. constituem um elemento importante na paisagem do munic

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ão presentes em vários pontos do município. De As cercarias de pedra est ão esquecidas pelo tempo nos lugares em que não têm serventia, certa forma, est mas, em alguns pontos ainda determinam divisas. Essas taipas de pedra separam campos (invernadas) ou servem como divisor com outras propriedades. ão se queira, quando se está dian ão Mesmo que n te das cercas de pedra s recorrentes os questionamentos: Quem as construiu? Quando? Quais os custos ção delas? humanos empreendidos na constru “As taipas de pedras que dividiam ou demarcavam tais De acordo com Fialho, ão produto do cativo” propriedades s (FIALHO, 1992, p.287). Muitos atribuem aos ção destas imensas cercarias de pedras por ser uma construção brancos a constru “ ” complexa para a pouca habilidade dos negros . Isso evidentemente demonstra um êntico exercício de racismo, e coloca também em paut aut a a tentativa de invisibilizar o negro nos discursos patrimoniais.

2.2.5 Monumento a Noel Guarany

ões é o monumento construído em Um dos atuais cart -postais de Bossoroca úsico e compositor Noel Guarany. homenagem ao m

ério Municipal de Bossoroca Figura 13: Memorial a Noel Guarany, Cemit -RS Fonte: Foto e Arquivo pessoal da pesquisadora

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ício da Silva, o Noel Guarany, nasceu em Noel Borges do Canto Fabr “cria da Bossoroca, em 26 de dezembro de 1941. Sempre se apresentou como Bossoroca” ão ao fato de haver nascido nessa localidade - uma alus - e descendente índios guarani, pela ascendência materna. Era descendente da família Fabrício de ódicas visitas a Bossoroca, mesmo pelo lado paterno, fato que o condicionava a peri depois de viver longe dali.

Figura 14: Noel Guarany Fonte: http://cifrantiga7.blogspot.com.br/2011/02/noel-guarany.html O cantor da Bossoroca, como ele mesmo se intitulava, mantinha uma estreita ção com o m ípio, conforme rela unic entrevista, realizada no dia 08-02-2012, de ício 27 “Noel vinha no Coralia Sofia Amaral Fabr . De acordo com Coralia, ília Fabrício e tocava nessas reuniões, trazia músicos acampamento da fam ”. Ele mantinha grande apreço pela Estância Velha, lugar com o qual importantes ção afetiva, tanto qu “Ele sempre tinha grande liga e, de acordo com a entrevistada, ério da Estância Velha”. Ela explica que pedia para ser enterrado no cemit , devido ícil acesso ao cemitério da Estância Velha á ao dif , decidiu-se por enterr -lo no ério Municipal de Bos Cemit soroca.

27 ício no dia 08 Entrevistamos a senhora Coralia Sofia Amaral Fabr -02-2012 buscando compreender ção de Noel Guarany com Bossoro um pouco mais da rela ca tendo em vista que mantinha estreita ção de amizade com ele. Ela também tem muitas lembranças sobre o passado histórico do rela ípio o que foi registrado na entrevista. munic

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O monumento edificado em homenagem a Noel Guarany, considerado hoje ço de 1999. um dos filhos ilustres de Bossoroca, foi inaugurado no dia 27 de mar ído sobre ério municipal de Bossoroca, Constru os restos mortais do artista, no cemit ção uma série localizado na entrada principal da cidade, apresenta em sua composi à vida e à ória do artista: tronqueiras e varejões na porteira, de elementos ligados hist ão, o pala velho, uma taipa de pedras, e uma escala a cruz missioneira, o viol ção do artista aos musical. Apresenta, ainda, uma corrente que significa a liga úsica. O monumento foi projetado pelo arquiteto Plínio Ivar da admiradores de sua m Rosa para homenagear o cantor e compositor. ção de Noel Existem dois aspectos elementares para que se entenda a rela ões Guarany com Bossoroca e para que, consequentemente, se avaliem as dimens ça a construção de um monumento em homenagem ao artista. que alcan úsicas que referiam e reverenciavam o passado jesuítico Noel cantava m - étnico guara guarani e, em especial, o grupo ni do qual sempre se declarou herdeiro étnico. Noel foi, no entanto, irreverente e contestador implacável do cultural e autoritarismo e da ditadura militar. A postura de artista contestador levou-o a tomar ções ideológicas e partidárias, e a posiciona ído. Isso, posi r-se contra o poder institu écadas de 1970/80, era “pisar em campo minado”. Essa em Bossoroca, nas d ítica e austera de “não ser homem de meias verdades” fez com que Noel postura cr çados fosse aclamado por muitos, mas repudiado por aqueles que se sentiam amea íticas. ou ultrajados por suas cr ências acerca do posicionamento de Noel Guarany e do que Algumas evid relatamos podem ser constatadas nos seguintes versos:

“É um dever do payador

zelar ao bem da verdade “Payador”) (versos 29 e 30-

“Não nasce u senhor no mundo ”. que compre minhas verdades “Total”) (versos 29 e 30 -

é onde vai a tomada de posição que Noel faz em suas E para elucidar at úsicas, citamos uma delas na íntegra para que se possa entender melhor o que m

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época à sombra do ele passa a representar numa sociedade que vivia naquela autoritarismo ditatorial. PRA QUE VOLTEM OS CONDORES é João Sampaio da Silva) (Noel Guarany - Jos

Quando os ventos redentores çam ninguém domina Se al érica Latina E esta Am á um vôo de condores Ser Os anseios multicores ão qual um vaqueano Pontear ção dos hermanos El cora É que será o epicentro

Pra resgatar tempo adentro ário bolivariano O ide

Nesse atavismo sem fim ão milenar quanto os Andes T É que são feitos os grandes

Iluminados enfim Kenedi, Marti, Ochimin, Estrela guia, Lavalleja, Benito Juarez, Balmaceda, Lutter King,Tiradentes Pariram sonhos pungentes Ornados de bronze e seda

Tupac, condor andino Sucre, Cienfuegos e Allende ória pende Pra o lado que a hist í está um paladino A Lincoln, Prestes ou Sandino á o nome que for Seja l á de existir um payador H

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écima de prata Com sua d Ressuscitando Zapatta E Artigas, el protetor

ão se matam ideais N Populares, precursores, í estão os gran senhores Mas a E os grotescos arsenais Os indigentes mentais ão ças E deles n te compade Em casamatas espessas Militarizam os ares Com espadas nucleares ças Pairando em nossas cabe

Crioulo archote de luz Nos confins do mundo inteiro é missioneiro Qual meu Sep Tua fama brilha e reluz ão da Cruz E o velho Rinc Do Rio Grande Tapejara ça de Vincha e lan árias Com legendas libert ânsias proletárias Guarda hermano Del Che Guevara.

De acordo com a narrativa de Guiomar Batu Terra dos Santos28, que reuniu grande material sobre a vida do artista, registrada no livro NOEL GUARANY, ças do cantor, “A DESTINO MISSIONEIRO, de Chico Sosa, reunindo lembran ítulo de Payador Maldito”. postura irreverente e combativa fez com que recebesse o t

28 é professora de Português e Literatura, admiradora da obra de Guiomar Terra Batu dos Santos ória artística, reunindo materiais sobre a vida e a obra dele. Noel Guarany, do qual estudou a trajet Prefaciou o livro de Chico Sosa NOEL GUARANY- DESTINO MISSIONEIRO, editado em 2003.

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ção do memorial para Noel Guarany, apesar da Entendemos que a constru ção que se tinha em negociar c ítico disposi om o passado jesu -missioneiro e o fato de ícones dessa identidade, deve ítico Noel ser um dos -se, em muito, ao momento pol época. que Bossoroca vivia na ítico da construção do Monumento em homenagem a esse O momento pol é peculiar n ória do município e da região. O monumento foi cantor e guitarrista a hist ído no ano de 1999, período em que se encerrava o mandato da então constru á tornava a prefeita Jacira Dutra Shimitz. O simples fato de ser uma mulher, j ção diferenciada, pois, em toda a região, a oc ência de uma mulher assumir o situa orr á era uma situação inédita. executivo municipal j Outro fator relevante diz respeito ao ção política, que sempre fato de que a prefeita representava, no momento, a oposi ípio se eman estivera alijada do poder desde que o munic cipara em 1967, auge do íodo da ditadura militar. Torna per -se instigante, portanto, imaginar se haveria a ção pública mesma intencionalidade em construir o monumento se a administra ínio do mesmo grupo que estivera desde sua ainda estivesse sob o dom ção política e administrativa. emancipa ção que encerrava seu mandato político na esfera Para a administra ção de um monumento em lugar estratégico significava a municipal, a constru ípio um marco histórico de que se encerrava uma possibilidade de instituir no munic ão fase e anunciava-se uma nova. Um marco do que se havia conquistado e n ência haveria de retroceder. Afinal, esse monumento colocava em evid e enaltecia ógicas definidas e audaciosas contra o uma figura que assumira posturas ideol 29 éi autoritarismo em terra de tantos coron s e de um passado e presente marcados ças sociais e mandonismos. por injusti ém de anunciar um Noel Guarany, símbolo do missioneirismo, Muito al o ão, ção monumento passa, ent a anunciar a perspectiva de uma nova concep ógica para o municíp ção de monumento em referência a uma ideol io. Adquire conota ítica e ideologicamente. Bossoroca que se reafirma pol ão produtos de um grupo que os ói Lembremos que os monumentos s constr ção com a inten de deixar suas marcas na sociedade que os produziu para que continue a articular sentimentos e entendimentos.

29 é em relação as letras de suas músicas, que faziam denúncias de A postura a que nos referimos aqui ças sociais e ao fato de ser filiado ao PT injusti - Partido dos Trabalhadores.

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ão esclarecedoras as palavras de P “Os monumentos, Neste sentido, s ommer: ória, ão elementos articuladores de enquanto exemplos de lugares de mem s ções humanas, encerram ções identidades, pois, sendo o resultado de a representa órias coletivas dos grupos humanos. Memórias socioculturais carregadas das mem ” (POMMER, 2009, p.38). Assim, com todos de significados temporais e espaciais. á hoje para os sabores ou dissabores que possa provocar, Noel Guarany est ém da sua identidade missioneira, pois é sinônimo de que houve Bossoroca muito al ância de poder na administração de Bossoroca. altern

3 USO DO PATRIMÔNIO NOS PROCESSOS IDENTITÁRIOS E AS REPRESENTAÇÕES, SIGNOS E ELEMENTOS QUE SÂO ASPECTOS DA CULTURA LOCAL

í ções Neste cap tulo, pretendemos apontar alguns lugares, representa , e í signos presentes em Bossoroca classificando-os como objeto da cultura jesu tico- ém disso, interpretar missioneira ou estancieira. Queremos, al os direcionamentos e ão sujei encaminhamentos a que est tos na perspectiva de se empreender a ção de processos de construção de uma identidade coletiva, ou seja, a afirma identidade missioneira de Bossoroca. Em muitos aspectos, podemos perceber um çamento dos mesmos, o q entrela ue se justifica quando lembramos que todo é dinâmico e fluído. processo cultural ências sociais Em Bossoroca, existem importantes marcas das experi ígios da experiência desenvolvidas ao longo do tempo. Quando analisamos os vest ítico ência estanceira, entendemos co jesu -missioneira e da experi erente e ções, signos e elementos presentes hoje, esclarecedor identificar as representa á ligado a cada uma destas culturas e evidencia, assim, a identificando aquilo que est ônio cultural é usado ípio forma como o patrim nesse munic . Por fim, tentamos equacionar aqui nossos entendimentos acerca da maneira ônio histórico e cultural, seja na que a municipalidade faz uso do seu patrim ção de construir uma identidade missioneira ção disposi , seja na conserva da ordem ção social estabelecida com a manuten de diversos aparatos culturais que se tornam ído, o que entendemos instrumentos para manter o social e culturalmente constitu ser o caso da cultura estancieira. ções calcadas em ário coletivo, ou Todo grupo social tem suas rela seu imagin seja, embora existam sempre as particularidades, existe um conjunto de ideias que á coesão ao ário ções sociais e repercute nas d grupo. Esse imagin se projeta nas rela áticas sociais, tornando aceitáveis ou não determinadas práticas e influencia pr ndo éticos e morais os valores e preceitos e a forma de ver e estar no mundo. Acerca ão desse ponto, s esclarecedoras as palavras de Sandra Jatahy Pesavento:

ções construídas sobre o mundo não só se colocam no lugar As representa deste mundo, como fazem com que os homens percebam a realidade e ência. São matizes de condutas e práticas sociais, pautem a sua exist ça integradora e coesiva, bem como explicativa do real. dotadas de for

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íduos e grupos dão sentido ao mundo por meio das representações Indiv que constroem sobre a realidade (PESAVENTO, 2005, p.39).

ão do grupo é alcançada conforme a necessidade/possibilidade de A coes ído no grupo. O sentimento de pertencimento é acionado por sist estar inclu emas às vezes, ão subjetivos que, fazem parte de processos inconscientes e s ólico do indivíduo e do grupo á inserido. determinados pelo universo simb no qual est É o imaginário coletivo que dá o aporte sobre o qual se firma a identidade.

à percepção que se tem dos elementos culturais acionados Diretamente relacionada á ão pertence É ário est o fato de que se queira ou n r ao grupo. necess , portanto, o sentimento de pertencimento. ção de identidades Isso explica o fato pelo qual os processos de afirma ções com o presente e o regionais estabelecem uma ciranda de trocas e negocia çam rel ções de pertencimento. passado, a fim de que se estabele a õe falar em cultura, já que é a partir do Falar em identidade de grupo pressup aparato cultural do grupo que se fomenta a forma como esse grupo vai se é construída a partir do apresentar diante do outro, lembrando que a identidade ção e sempr conflito e da negocia e para fazer frente ao outro, apresentar-se ao outro. Conflito, porque os elementos culturais levados em conta para constituir uma ão em detrimento de outros que ficarão ocultados, ou identidade obrigatoriamente vir ão do grupo, seja, se elegem aspectos para obter, por esse meio, a coes ção, intencionalidade maior quando se aciona uma identidade de grupo. Negocia ão negociadas, quer dizer, se negocia porque todas as identidades s m com o grupo ão afirmados como elementos de os elementos de sua cultura ou do passado que ser ção de sua identidade. sustenta ém le é fluí Neste ponto, conv mbrar que toda identidade da, visto que se pode árias identidades, fazendo uso de cada uma de acordo com o que compactuar de v âmica dos processos histórico se configura momentaneamente na din -sociais nos á inserido como indivíduo e como grupo, individual ou quais o ser humano est coletivamente. ão ão grupal, A comunidade passa, ent , a desfrutar dos efeitos dessa coes embora em tal grupo ou em tal comunidade muitas vezes alguns membros ou muitos çam elos de relac deles nunca estabele ionamento diretos ou indiretos.

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ção de signos e representações locais, a Por meio da afirma s identidades ão conta de ão, colocando regionais d caracterizar os membros de uma regi -os em ção de diferença às demais regiões, relacionando a parte ao todo. posi étnica, Ao afirmar seu pertencimento a uma identidade cultural, regional, íduo assume social ou sexual, o indiv posturas no mundo, mostrando seu às questões de seu tem posicionamento frente po. Isso importa comprometer-se com áticas e valores sociais, o que nos remete a perceber os processos determinadas pr ção de identidade regional como instrumentos capazes de interferir na de consolida ordem social. çando um olhar holístico sobre a cultur Lan a de Bossoroca somos levados a à çã constatar que houve um movimento direcionado afirma o da identidade ípio. M ções da cultura estancieira ão missioneira do munic uitas tradi , no entanto, est ções sociais e não são interpretadas ou debatidas. vivas nas rela Outras ções culturais recalcam manifesta -se na invisibilidade. Quando analisamos a forma como Bossoroca apresenta-se frente ao todo, ou á uma busca constante por legitimar seja, frente aos outros, podemos perceber que h óricos, afirman ímbolos e determinados aspectos hist do s elementos que revelam a ção de ém, busca da constru uma identidade missioneira. Podemos constatar, por ções sociais estabelecidas ou representações do passado não que algumas rela ção identitários. aparecem reveladas nos processos de afirma ção de uma identidade regional se caracteriza a partir de O processo de afirma uma busca, coletiva ou individual, de levar uma parte a enfrentar um todo. Essa ções existentes ou em idealizações e tradições busca pode se basear nas tradi ínculo com inventadas ou reinterpretadas a fim de justificar um pretendido v ônio histórico e cultural é articulado no sentido de determinado passado. O patrim sustentar a identidade pretendida. ção de uma identidade Entendemos que esse empreendimento na constru á mui missioneira est to ligado a um movimento regional em torno do que ocorreu a écada de é chamado “missioneirismo” partir da d 1980, o que por Roselene Pommer. ômeno iniciou ão Luiz De acordo com Pommer (2009), esse fen -se em S Gonzaga, ípio vizinho, ípios da ão. munic e se estendeu para outros munic regi Isso explica o fato de tamanha busca que se empreendeu em Bossoroca por suas origens missioneiras.

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É conveniente lembrar, no entanto, que, ao ser escolhido um ou outro ônio para valorizar e sobre o qual ção ão patrim empreender um processo de afirma , s ônios, o que nos leva a refletir acerca de algumas deixados de lado outros patrim ões: á morto? Em Bossoroca quest O que se quer ao afirmar um passado que est , o ítico ão incomoda, visto que a materialidade arqueológi passado jesu -guarani n ca ou ções do passado jesuítico ão abrem espaços para as representa -missioneiro n ções que impulsionem discussões sociais já que ão se reconhece manifesta ali n m ígenas descendentes ind . O Censo de 2010 apresenta uma estimativa de 0% de ígenas em Bossoroca ind (IBGE-2010-Prefeitura Municipal de Bossoroca). ém em sentido oposto Na mesma perspectiva, por , o passado estanceiro á vivo e ções sociais estabelecidas. ão incomoda, pois est latente nas rela A quest ária é muito forte, estabelece a forma de viver e de s ões e fundi er. Discuss ções acerca do passado estancieiro do município podem potencializar considera ções situa em que alguns valores sejam colocados em xeque. A identidade missioneira de Bossoroca sempre nos intrigou e foi o que nos instigou a investigar no sentido de compreender o motivo pelo qual, mesmo evidenciando no seu cotidiano tantos elementos da cultura estancieira, esse ípio ços para const munic empreende tantos esfor ruir uma identidade missioneira, ou missioneira seja, para se apresentar como . ção dos empreendimentos e dos elementos que Em busca da constata ínculo com o passado jesuítico evidenciam o v -missioneiro, buscamos compreender ão e o movimento ocorrido na regi que nos traz importantes perspectivas de entendimento. écada de De acordo com Roselene Pommer, a partir da d 1980, ão missioneira movimentos de valorização da experiência desenvolveram-se na regi ítico “... ício da década de 1980, alguns municípios da região jesu -missioneira: no in ões, noroeste do estado do Rio Grande do Sul, estabelecera ções das miss m negocia ências do passado reducional jesuítico éculos XVII e XVIII, com as refer -guarani dos s ” na tentativa de produzir para si uma identidade missioneira (POMMER, 2009, p.31). ção, Conforme sua afirma esse direcionamento surgiu como alternativa para o ícola da região. Assim, buscava momento de crise do setor agr um referencial de ítico ógico ória cunho pol -ideol e, servindo-se de alguns acontecimentos da hist reducional, pretendia direcionar a sociedade local a interpretar o passado reducional ência socialista ou como uma experi comunista da humanidade. Naquele momento, a

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ções que comunidade regional poderia ter proveito no sentido de subsidiar algumas a ão Luiz Gonzaga. érito se buscavam efetivar em S Sem analisar profundamente o m de que este tenha sido o principal ensejo do grupo que impulsionou o movimento de ção e afirmação de uma identidade missioneira para São fomenta Luiz Gonzaga e ão, pois ão é nosso foco ão acreditamos que esse ção regi esse n , n fosse a motiva “ser missioneir ” para Bossoroca querer a . Entendemos que, neste caso, a oportunidade de Bossoroca fazer parte de ía na região e alcançava apelo e reconhecimento uma identidade que se constitu ão nacional foi fator determinante para despertar tal interesse. Entendemos que n ção p ítica e ógica nesse município óg houve conota ol ideol com movimento ideol ico ípio vizinho, até por que se desenvolvia, segundo Pommer (2009), no munic que a ção de Bossoroca ness inser a busca ocorre num momento posterior, portanto em ão Luiz Gonzaga. contexto diferente daquele de S Isso nos leva a perceber que pode ter ocorrido um movimento no sentido ário, ou seja, a interpretação de que o fato de Bossoroca apostar em sua contr ão teria ítico identidade missioneira n inconveniente. Ali, o passado jesu -missioneiro ão potencializa efervescê n ncias sociais, diferentemente de que seria com o fato de ípio, ções se remexer no passado estancieiro do munic no qual as representa éritas ão latentes na sociedade pret est e revelam aspectos que, discutidos, poderiam levar ao rompimento de amarras, desde muito, consolidadas na sociedade. árias ações fo De acordo com Pommer (POMMER, 2009, p. 65), v ram ão no sentido de efetivadas na regi fundamentar o pretendido: fazer a coletividade ínculos com a história revis sentir-se inserida no processo, ou seja, criar v itada, ítico fazendo aflorar sentimentos de pertencimento ao passado jesu -missioneiro ômic como forma de superar um momento socioecon o de dificuldades voltando o áureos de fartura d ítico olhar para os tempos a sociedade jesu -guarani rememorada. é q Nesse sentido, ue muitas atividades foram realizadas: Primeira Mostra de Arte ão Luiz Gonzaga de 30 de abril a 03 de ção Missioneira, em S maio de 1980; constru órticos referentes às missões jesuíticas; cruzes missioneiras nos acessos de p ários; ção de cursos ários ções que buscavam rodovi realiza e semin , dentre outras a ítico evidenciar e memorizar o passado jesu -missioneiro com o uso do adjetivo “missioneiro” para designar , por exemplo, casas comerciais e outros locais. Quanto a isso, esclarece que:

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“A tentativa de produção ário de um tipo missioneiro enquanto elemento identit ível em dois níveis de produção simbólica: 1) da regional se fez percept paisagem missioneira original, culturalmente estruturada por monumentos órico representativos do passado hist -reducional; e 2) dos elementos ória local, que permitem ao grupo social reportar articuladores da mem -se ao édio da agregação intencional de elementos seu passado, por interm âneos, novos monumentos, sobrepostos aos originais.” contempor (POMMER , 2009, p. 65).

ção, percebemos ância que o p ônio A partir dessa afirma a import atrim órico alcança ness ção identitária hist es processos de afirma no sentido de dar às pretensões de dialogar c suporte om o passado, visto que, por meio do ônio patrim , afloram sentimentos de pertencimento. ão Luiz Gonzaga, O que aconteceu em S apresentado e nomeado por “Missioneirismo”, é a busca de negociação Pommer (2009) como com o passado ítico çar esse ção e jesu -guarani, como forma de alicer movimento na valoriza ção d ção do espaço ção de afirma os monumentos originais e na reorganiza e efetiva ção como referência, novos signos. Nesse sentido, tomando essa afirma percebemos ípios ça de ões ítico em outros munic a cren ser guardi da cultura jesu -guarani. Esses írem ê tiveram vontade e intento de se constitu herdeiros dessa experi ncia social que ários setores e podia, portanto despertava interesses de v , resultar em potenciais ípio, principalmente no que se refere ao turismo. ganhos para o munic ções se desenvolveram na região A partir desse movimento, muitas outras a ão foi buscando o reconhecimento de suas origens missioneiras. Em Bossoroca n diferente e muitos olhares voltaram-se para o passado missioneiro.

3.1 Bossoroca é Missioneira!!!

écada de ípio A d 1990 foi marcada nesse munic pela busca das suas origens ções pontuais que se multiplicam missioneiras, o que fica evidenciado com a . ção à afirmação da identidade Entendemos que o que aconteceu em rela Buena Terra á associado ao que aconteceu no seu entorno missioneira da est , ou á ligado ao movimento regional conhecid missioneirismo seja, est o como . Conforme ção de uma identidade missioneira Pommer, que pontua o desenvolvimento da produ ão Luiz Gonzaga a partir da década de 1980 para S ,

ão que se apresenta como Missioneira é composta por quatro A regi ípios que tiveram sua p ção ligada à ação política e munic rimeira ocupa

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ítas sobre populações de nativos guaranis, em missional dos padres jesu nome da coroa espanhola, em sua segunda fase a leste do rio Uruguai, a éculo XVII. São eles: São Luiz Gonzaga, São Miguel das Missõe partir do s s, Ângelo e São Nicolau; além dos dois distritos: São João Bati ão Santo sta e S ço das Missões Louren (POMMER, 2009, p. 64).

ões desse movimento regional, a administração A partir das repercuss à cultura e ao turism municipal e alguns setores ligados o de Bossoroca manifestam ção de á a disposi apresent -la como missioneira. ão Na esteira do movimento regional, inicia-se, ent , uma busca de ências com ígios d refer finalidade de identificar e registrar os vest o passado ípio reducional a fim de incluir esse munic no movimento regional e permitir-lhe apresentar-se como missioneiro. ém das várias referências históricas que ap ítico Al ontam para o passado jesu - ígios de capelas e guarani nessa municipalidade, como estradas, caminhos, vest ções que constituem in ícios de reminiscências da primeira e da outras constru d ítas no território que hoje é Bossoroca, houve segunda fase dos jesu a procura por á É isso constituir novos elementos, capazes de afirm -la como missioneira. que pretendemos pontuar a seguir. ções de Cruz s ígios As afirma obre a possibilidade de Bossoroca abrigar vest ítico da sociedade jesu -guarani, passaram a ser buscadas, revisitadas e afirmadas. “No primeiro ciclo da civilização jesuítica foi levantada a Segundo CRUZ (p.22), ção de ”. Esta, Capela de Santiago, que era destinada a um posto de cria gado ém, foi ída pela ação dos bandeirantes em 1636, e rearticulada na segunda por destru í ão. De acordo com ção, fase dos jesu tas na regi essa afirma na fazenda que à sucessão de Ramão Fagundes ígios da capela pertence , havia vest que outrora ali San-Tiago ções existiu. A capela (grafia antiga) era o cruzamento das redu ídas já na segunda fase da civilização jesuítica, como São Nicolau, São Luiz, constru ão Lourenço, e São Miguel Arcanjo, e as estâncias situadas entre o rio I í e S bicu a à ção turística Serra de San Xavier (CRUZ, 1993, p. 22). No livreto destinado divulga , ágina História e Memórias de citadas na p 8, aparecem as palavras do livro Bossoroca “Diversas razões levam (CRUZ, 1993 p.10): -me a dizer que nas campinas verdejantes e perfumadas do Distrito da Igrejinha, pois, topograficamente, âncias guaraníticas do sul” era a encruzilhada entre os Sete Povos e as Est . Isso ção de Bossoroca com a histó ões jesuíticas. evidencia a liga ria das miss

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óricos e ências sobre aspectos Com base em tais registros hist em outras evid ítico que ligavam Bossoroca com o passado jesu -missioneiro, a secretaria do turismo ício da década de 1990 e alguns segmentos da sociedade, a partir do in , passaram a ços a fim de reunir elementos para mos empreender esfor trar que Bossoroca era missioneira e, assim, despertar o sentimento de pertencimento das pessoas a seu passado missioneiro. Dentre os resultados encontrados ao longo dessa busca para apontar os ção missioneira de elementos que serviram para afirmar a condi Bossoroca, slogan ípio, a afirmação pontuamos: o de identidade do munic e reconhecimento de Noel Guarany como filho ilustre, por seu reconhecimento nacional e internacional úsico missioneiro ém como m , bem como de Jayme Caetano Braun, tamb ções de busca d reconhecido poeta e payador missioneiro; as a as origens ância do Sobrado; o festival musical Manancial Missioneiro da missioneiras na Est Canção ção da cruz missioneira no trevo de acesso à cidade, como e a constru Ângelo, São Miguel, São Luiz ão Nicolau ( acorre em Santo Gonzaga e S desde 1987, ção de alguns dos povoados). A ano em que se comemoravam 300 anos de funda ém do cenário bossoroquense. cruz missioneira passou a fazer parte tamb ções que pretendiam Cada um desses empreendimentos efetivou-se em a ípio como herdeiro legítimo da cultura jesuítico afirmar o munic -guarani, portanto, historicamente investido de legitimidade para barganhar sua parte nos ganhos de ção de ão Miguel da ões, ônio Histórico um futuro promissor. A declara S s Miss Patrim ção de Mundial pela UNESCO, constitui-se numa grande conquista, fato de agrega ável. ção valor incontest Fazer parte desse enredo tornou-se realmente uma situa ável à das ças a serem partilhadas. Habilita compar grandes heran r-se nesse ção da identidade processo de reconhecimento foi fator determinante na constru ípios no entorno e Buena Terra missioneira para muitos munic , nesse caso, para a . A écada de 1990 ão, d foi marcada, ent pela busca de elementos que mostrassem aos outros essa identidade. ção pública, em especial pela A perspectiva vislumbrada pela administra ípio ênfase na gestão 2000 secretaria do turismo do munic (com -2004) em fomentar missioneira o turismo local pelo uso da Identidade foi fundamental. Para isso, foi ção última aproveitado um processo de constru que havia se desenvolvido durante a écada d (1990), o que poderia resultar em significativos ganhos para a comunidade ção do município Caminho das Origens, local. Resultado disso foi a inser no roteiro e

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ção de um í a elabora trajeto tur stico para Bossoroca, apresentado no folheto Bossoroca: história e pontos turísticos.

Essa busca gera diferentes formas de entendimento e investimentos, que se ção ção ínculos com esse traduzem em diversos modos de interpreta e articula dos v passado para obter proveito cultural. ã Nesse sentido, s o muito esclarecedoras as palavras de Ceres Karan Brum quando afirma:

ógico [...] o passado missioneiro se constitui em um problema antropol ória do mesmo vem sendo acionada de presente, uma vez que a mem ários, pertencime diversas formas, produzindo imagin ntos e identidades que êm o missioneiro como referencial histórico construído cujos olhares t çõe importam em tomadas de posi s acerca do passado no presente. (BRUM, 2005, p.15)

ção do ser missioneiro é tentativa de Quando questionamos se a evoca ção d ítico ão afirma o passado jesu -missioneiro, percebemos que essa express ções diversas suscita interpreta . Quanto a isso, devemos refletir sobre o que diz Brum:

ória coletiva na construção de imagens acerca do O trabalho da mem passado missioneiro igualmente assim se expressa, sendo marcado pela pluralidade de elementos que colocam em disputa o poder de dizer o que ões para vivê foram as miss -lo no presente (BRUM, 2005, p.29).

É importante lembrar ão políticas, no sentido de que todas as identidades s ão acionadas de acordo com as necessidades do momento vivido, num que s movimento que busca alguma coisa do passado para explicar o presente com a é preciso, porém, usar perspectiva de melhorar o futuro. Para isso, o que se tem, ou ícios que possa se imagina ter, para interagir diante do concreto, conforme os benef ção, P “A oferecer. A respeito dessa concep esavento (2005, p. 91) esclarece que ói em torno de elementos de positividade, que agreguem as identidade se constr ísticas valorizadas, que rendam pessoas em torno de atributos e caracter ”. reconhecimento social a seus detentores ção da sua identidade missioneira, buscando Bossoroca investe na constru ência e potencialidade turística, fato que passaremos a descrever a partir da evid ória dos fenômenos q trajet ue se efetivam como afirmativos dela em Bossoroca.

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Elencamos a seguir os elementos usados para sustentar a identidade missioneira da Buena Terra .

buena 3.1.1 O Nome terra missioneira

ânica Municipal, º õe: A Lei Org de 04 de outubro de 2000, em seu Artigo 4 disp “São símbolos do município de Bossoroca ão, a bandeira, o slogan “Buena o bras ” e outros estabelecidos em Lei”. Terra Missioneira ípio de De acordo com os documentos oficiais e com o site oficial do munic “em 29 de novembro de 1993, o Bossoroca (www.bossoroca.rs.gov.br/), Poder úblico Municipal, por meio ípio, decorrente P da Lei 1.139, oficializou o lema do Munic ído pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura, de um concurso institu realizado no dia 17 de maio de 1990, durante as festividades dos 25 anos de ção político emancipa -administrativa, com o objetivo da escolha do lema que ípio. Participaram do concurso 475 pessoas que deram as mais identificaria o Munic ões.” variadas sugest . ípio ão A frase que mais se identificou com o munic , de acordo com a comiss í ério José Sehnm, avaliadora, formada por Telmo Fabr cio Dutra, Jairo Velloso, Aul Guiomar Batu dos Santos, Eliane M. Medeiros Batista e Mirian Nascimento Manzoni, Buena terra foi a de autoria de Diego Fernandes dos Santos, "Bossoroca - Missioneira ão da língua espanhola, buena ". O autor utilizou uma express , ão a ínio espanhol certamente numa alus o dom , e a palavra missioneira, numa ência à região das ões, onde o município encontra refer Miss -se localizado. ão, o município se a Desde ent presenta como BUENA TERRA MISSIONEIRA, ção com a história missioneira. numa tentativa de enfatizar sua liga ção da comissão Assim, fica evidenciada a inclina em decidir por um slogan ítico que ligasse Bossoroca a seu passado jesu -guarani. No momento, isso ção de va ípio, visto que potencializava uma substancial agrega lor para o munic ção. poderia trazer bons resultados em termos de divulga Parece-nos claro que í ão, quan subjazia a essa pretens do se instituiu um concurso em busca de ências para ção ípio. ão as refer a constru da identidade missioneira do munic S necessidades e possibilidades de melhorar o futuro que fazem com que os grupos busquem seu passado. Entendemos que foi exatamente isso que ocorreu naquele momento.

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ônio de 3.1.2 Noel Guarany: patrim Bossoroca

De acordo com Roselene Pommer (2009), que fundamenta sua tese acerca ção de uma identidade missioneira na região a partir de um grupo de da produ ão Luiz Gonzaga, as referências ao passado jesuítico á pessoas em S -guarani j ísticos de vinham subsidiando trabalhos art artistas como Noel Guarany e Jayme ão naturais de localiddes ório Caetano Braun. Os dois artistas s que integram o territ ípio de Bossoroca. Segundo “[...] as obras desses pertencente hoje ao munic ela, ção e na artistas podem ser consideradas um dos pontos de partida na estrutura ção do que se acreditava ser ” divulga a identidade missioneira [...] (POMMER, 2009, p. 163). íticos musicais, artistas e Isso vem ao encontro de muitos depoimentos de cr intelectuais que testemunharam a carreira de Noel Guarany. Anotamos aqui um á post úne, breve registro do que est o no livro de Chico Sosa (2003). Essa obra re ém da discografia e história de Noel, reportagens e depoimen al tos sobre a carreira ção abaixo: do artista, conforme rela “Ouvir esse - Depoimento de Barbosa Lessa sobre o LP Destino Missioneiro: íze ” disco significa mergulhar nas ra s da gente missioneira. (SOSA, 2003, p. 56). Érico Veríssimo, - Em 1973, o diretor do Museu Municipal e Casa de Cultura “NOEL de Cruz Alta usou as seguintes palavras quando se referiu a esse artista: ão encravado no GUARANY, um indiozinho valente, cria da Bossoroca, velho rinc ção das primitivas reduções jesuíticas, que também, mas como poucos cora , traz em ância de atavismos ba seu sangue e na sua alma, a mais perfeita conson guais... ço de vinte e poucos anos, carrega na garganta e no bojo de NOEL GUARANY, mo ão ável) a mais pura fisionomia de seus ancestrais seu viol (companheiro insepar ” (SOSA, 2003, p.57 e 58). guaranys... ítico musical, se refere àquele músi - Hugo Ramirez, cr co com as seguintes “Com sua estampa jovem e simpática de guitarrista e cantor missioneiro, palavras: índio sisudo que Noel Guarany lembra-nos de imediato a lenda do ANGOERA, o ão apenas alegre, depois de batizado se tornou n mas voltado de corpo e alma a ” alegrar todo mundo a seu redor. (SOSA, 2003, p.69). ção de - O produtor Marcus Pereira, com breves palavras, narra a apresenta “Em 1975, por ocasião da apresentação ao vivo da coleção Noel no Anhembi:

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úsica Popular do Sul, no Palácio das Convenções do Parq M ue Anhembi, Noel úblico presente. Inacreditável que Guarany, sozinho com sua guitarra arrebatou o p ágil, e que se utiliza de um só instrumento, arrebate e uma figura aparentemente fr írio, pelo fascínio épico de sua música ão (.. leve ao del , de sua voz e de seu viol .) o ” ( maior teatro brasileiro. SOSA, 2003, p.76). ão, de junho de 1982 à - Uma reportagem da Revista Som do Sert , refere-se úsica de Noel Guarany: “Natural de uma região tão importante histórica e m ões merecia culturalmente, ele percebeu que as Miss m ser cantadas, que deveria ” existir um canto missioneiro. (SOSA, 2003, p.77). ão apenas ção de Estes s exemplos para demonstrar a afirma Noel Guarany como precursor do movimento que pretendeu criar uma identidade missioneira para ão e que se reconhece ão como missioneirismo. a regi ent Diante disso, percebemos ância do referido músico ness ção do a fundamental import e processo de valoriza passado missioneiro. ção o fato de que, quando Bossoroca iniciou sua busca em se Chama aten Missioneira, á era artista reconhecido nacional e afirmar Noel Guarany j úsico missioneiro ão houve em Bossoroca grandes internacionalmente como m e n á ção da movimentos para lig -lo ao que vinha se desenvolvendo em termos de efetiva ípio. Teria se pretendido con identidade missioneira do munic struir uma identidade áter missioneira sem Noel Guarany? Mesmo que se objetivasse afastar o car êmico das “verdades” que Noel cantava, já não havia como fazê pol -lo, pois seu ções identitárias. nome transcende as negocia ém ém do m ído em Bossoroca mant hoje, al onumento a Noel Guarany, constru ção permanente da vida e da local de ampla visibilidade, uma exposi obra do artista ção reúne as memórias de Noel instalada no hall da Prefeitura. A exposi : objetos, órios, discos, partituras musicais, instrumen roupas, acess tos etc... É fato ído íodo de curioso que o referido monumento foi constru em per ção da oposição30 ão administra , e que, ainda durante essa gest , fosse realizado o evento denominado Tributo a Noel Guarany, quando Noel ainda vivia, mas se ça degenerativa que o impossi encontrava muito doente, debilitado pela doen bilitava ós sua morte, nos anos de exercer sua arte. Ap 2006 e 2007, realizou-se a segunda

30 ítico que sempre foi ção em O termo aqui serve para mostrar e referenciar o grupo pol oposi ção política Bossoroca desde sua emancipa , salvo nos mandatos de 1996-2000 e 2004-2008, quando partidos como PMDB-PT-PDT-PSDB e PTB ascenderam ao poder municipal.

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ções e terceira edi desse evento, reunindo muitos artistas, amigos e admiradores da ° mandato da oposição ém arte daquele guitarrista, durante o 2 (2004-2008). Tamb ão desse mesmo grupo ção durante a gest , foi instalada no hall da Prefeitura a exposi í ção clara de rev ência àquela figura ítido sobre Noel. Vemos a a inten er , num n ém da afirmação da movimento de reconhecimento e comprometimento que vai al É também curioso o identidade missioneira. fato de que, mesmo depois de ído o monumento e organizada a exposição, tenha havido um movimento constru de recuo a esse reconhecimento a Noel. ção ção foi retirada Encerrada a administra 1996/2000, a exposi da Prefeitura e à condição de simples túmulo no cemitério municipal, o monumento ficou relegado íodo ção do tempo e sofrendo, em determinado per , alguns estragos causados pela a ção. pelo crescimento desordenado de matagal em redor da constru O monumento a á tinha ém, çado dimensões que Noel j , por alcan faziam com que Bossoroca “Missioneira”, já ão pudesse “ ”. querendo ser n mais renegar sua cria Localizado em ég ério Municipal, à cidade ponto estrat ico no Cemit na avenida de acesso principal , quem entra ou sai dela necessariamente visualiza aquele marco. éu ído em homenagem a Noel Quando mencionamos o mausol constru é conveniente mencionar Guarany, o fato de o artista ter ideologia expressiva e ção consi êmica: tanto temperamento forte, que o colocava em posi derada pol conseguia agradar, quanto desagradar. Em Bossoroca, marcada pelo autoritarismo ítico e éis e senhores de terras, muitas vezes as pol pelo mandonismo dos coron úsicas de Noel traz à tona verdades que não letras das m iam deviam ser ditas. ória musical afirma Guiomar Terra (SOSA, 2003, p. 12) que estudou sua trajet que: “A postura irreverente e combativa fez com que recebesse o título de Payador ”. Maldito ção Entendemos que a constru de monumento em homenagem a Noel íticos e ideológicos, devido ao Guarany, em 1999, reveste-se de aspectos pol ítico em que foi construído, ou seja, quando o grupo de oposição momento pol é então édito na história do despedia-se do governo, encerrando seu mandato, at in ípio. ção munic Por esse prisma, pode-se interpretar que aquela constru representou ógica, ímbolo de afirmação para uma bandeira ideol um s o grupo que estava no á ligado à memória de poder. Desse modo, o monumento e tudo que est Guarany ção como a exposi no hall da prefeitura teve que ser aceito pelo grupo que

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á ideologicamente se opunha a reverenci -lo, em nome da Identidade missioneira de Bossoroca. ção de grand úsico nos anos 1970/80, Noel Guarany iniciou sua proje e m ção do passa ões e considerado um precursor no movimento de valoriza do das miss “Seu trabalho não do povo guarani. De acordo com TERRA (in: SOSA, 2003, p. 14): é mera inspiração poética. É o resultado de incessante pesquisa és de obtida atrav índios entrevistas com e velhos violinistas, onde coletou material sonoro para o ritmo ível de suas ções campeiras populares”. inconfund milongas, chamarritas e can ória de Noel ém afirma que ele “Participou de Acerca da trajet , Terra tamb úblico mais simples ao mais exigente em festivais e arrancou aplausos do p áculos folcloristas. Realizou ências, apres ários e espet confer entou-se para universit ” (SOSA, 2003, p.15). filosofou para intelectuais. úsica missioneira era aquela que cantava o De acordo com Noel Guarany, m “guarânias, polcas guarânias, galopas, passado e o ritmo dos guaranis, ou seja: ” (SOS úne as polcas galopas... A, 2003. p. 49). No livro de Chico Sosa, que re ças e declarações de Noel ópri lembran , podemos perceber que, de acordo com o pr o úsico ític m , seu contato com o cancioneiro guaran o ocorreu principalmente em ças e investigações in loco andan , em missiones no Paraguai, na Argentina e ões no Rio Grande do miss Sul (SOSA, 2003. p. 49). ção do pa ítico Esse movimento de valoriza ssado jesu -missioneiro que passou missioneirismo a fundamentar a identidade regional a que POMMER chama de úsica de N ópria figura serviu para que a m oel Guarany e sua pr se tornassem um ções com o passado em que elemento de barganha nessa ciranda de negocia Bossoroca se colocava. Noel Guarany torna-se figura de valor cultural que ção que transcende o universo regional. O reconhecimento da grande proje trazia ípio ável. As questões ideológicas para o munic passou a ser um fato incontest ão era interessante para a municipalidade tiveram que ser deixadas de lado, pois n ção de valor como o de Noel e sua musicalidade. desprezar um potencial de agrega ão Esse cantor tornou-se, ent , figura de peso para afirmar Bossoroca como missioneira ípio passa a negociar a . Com esse movimento de notoriedade, o munic ão bossoroquenses do pretendida identidade afirmando que s is dos considerados “quatro troncos da música ”, No missioneira el Guarany e Jayme Caetano Braun. écada de 1990 ção d Na d , quando Bossoroca iniciava sua busca por afirma e á era um artista uma identidade missioneira, Noel Guarany j renomado nacional e

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ão como internacionalmente, um dos grandes expoentes do que se reconhecia ent úsica missioneira. m Bossoroca, no entanto, nunca fizera efetivos movimentos para ção de ção pública e das valoriza sse guitarrista, nem havia por parte da administra ços na construção da entidades que empreendiam esfor Identidade missioneira movimentos no sentido de relacionar efetivamente a figura de Guarany com ó se efetiva com a administração de oposição í Bossoroca. Isso s (1996-2000). Da ípio em diante, torna-se fundamental para o munic barganhar seu lugar junto aos outros que se apresentavam como missioneiros o fato de reconhecer e afirmar seu filho-artista: Noel Guarany. é Hoje, a qualquer lugar que se leve o nome de Bossoroca, Noel Guarany ência certa árias refer , pois sua figura transcende as disputas identit . Mesmo que a úsico identidade missioneira seja superada por outro processo, o nome desse m á ligado aos aspectos culturais ça dele está aparecer , porque a presen consagrada no á muitas vezes a referência monumento em sua homenagem o que ensejar dele para ça social. é evocar seus ideais de liberdade e justi Com certeza, Bossoroca conhecida fora do Rio Grande do Sul por obra de Noel Guarany.

3.1.3 Jaime Caetano Braun: tronco missioneiro e cria da Bossoroca.

Assim como ocorreu com Noel Guarany, Bossoroca pretendeu mostrar que ém era Jayme Caetano Braun, reconhecido como um dos troncos missioneiros, tamb “ ” cria da Bossoroca . ículos éis Assim, alguns ve destinados ao transporte escolar receberam pain ítido nos quais estavam estampados fotos dos dois artistas, Noel e Jayme, num n ção e afirmação identitária, já que São Luiz Gonzaga movimento de reivindica ém apresenta o último tamb como um de seus filhos mais ilustres. ão Essa disputa entre s -luizenses e bossoroquenses ocorre porque o referido úva, payador nasceu na Timba hoje distrito de Bossoroca e que, antes de sua ção político ípio ãe ão Luiz emancipa -administrativa, pertencia ao munic -m , S Gonzaga. à Essa tentativa de atrelar-se culturalmente figura de Jayme Caetano Braun ém ção de Bossoroc constituiu-se tamb num dos elementos para que a liga a com a identidade missioneira fosse assimilada pelo grande grupo, visto que isso

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úblico que se identi representava importante elemento articulador de um grande p fica com a obra e o sucesso de Braun.

ância do Sobrado como pressuposto arqueológic 3.1.4 A Est o - a materialidade

ços foram empreendidos para ância do Sobrado Muitos esfor afirmar a Est ímbolo da cultura material da época em que índios guaranis e ítas como um s os jesu óis habitavam est âmica espanh as paragens. Acreditamos que essa din para tentar ítico ância do Sobrado é um dos reflexos afirmar as origens jesu -missioneiras da Est do missioneirismo em Bossoroca. ídios por parte dos governantes Assim, enfatizamos a busca de subs ória da constituição dess ço e sua vinculação municipais para explicar a hist e espa ítico ção de como o passado jesu -missioneiro no sentido de que revela a inten ícon ônio cultural do município, provavelmente demarcar o local como um e do patrim ção pela visibilidade que a cultura material enseja. Subjacente a esta inten , supomos ão só de preservação cultural, mas de expandir o conhecimento do o desejo n ípio a outras localidades, inserind ção e valorização munic o-o num projeto de divulga da cultura missioneira. ípio, que, O munic desde os anos 90, buscava construir sua identidade ção pública (gestão2000 missioneira, por meio de sua administra -2004), empreendeu ços no sentido de buscar a valorização e o reconhecimento da Estância do esfor ôni Sobrado como patrim o missioneiro de Bossoroca. Nesse sentido, foram ções ístico daquele município efetivadas a que aparecem descritas no caderno tur à página (MICHEL JUNIOR, 2001-2004, p.20), que referimos 59 deste texto. órico Nesse momento parece que se queria negociar com o passado hist , ção de ítico numa rela troca com o passado jesu -missioneiro elementos que podem ções do passado ser objeto de reconhecimento no presente. Buscam-se apropria , éstimo alguns vestígios é o como forma de tomar de empr materiais relevantes, como ância do Sobrado, ficando então evidente a vontade caso do que existe na Est de ípio construir uma identidade missioneira para Bossoroca, a fim de que o munic possa desfrutar dessas prerrogativas, principalmente no setor do turismo, que na écada de 1990 foi largamente fomentado pelos municípios da região d .

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3.1.5 A Cruz Missioneira no trevo de acesso a Bossoroca

ões de POMMER ( Partindo das reflex 2006), nos parece apropriado afirmar ípios que os munic , ao pretenderam investir em sua identidade missioneira, ção de passaram a constituir elementos de transforma sua paisagem, colocando em ência evid formas que referem o passado missioneiro. Foi o caso das cruzes ço nesta região que missioneiras que passaram a ocupar cada vez mais espa “... é um pretendia se apresentar como missioneira. De acordo com Pommer a cruz ímbolos mais respeitados da iden ” dos s tidade missioneira (POMMER, 2006, p.133- 134). ótula ém passou a abrigar A r de acesso a Bossoroca tamb uma cruz ípio missioneira. Esta passou a fazer parte da paisagem do munic , evidenciando para é quem chega ou mesmo para quem apenas passa por ali que aquela uma cidade missioneira.

ótula de acesso a Bossoroca Figura 15: Cruz Missioneira na r -RS (outubro/2011)

Fonte: Foto e Arquivo pessoal da pesquisadora

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A Cruz Missioneira, hoje um dos principais elementos usados para referenciar ão que se apresent ções inventadas a regi a como missioneira, constitui uma das tradi a fim de sustentar a identidade missioneira. A cruz, que deu origem a todas as ão reproduzidas e utilizadas com significado místico á outras que hoje s , est ção de São Miguel. Não s ícias de ímbolo desse localizada na Redu e tem not outro s íodo reducional em nenhum dos Trinta Povos Missioneiros, tipo que date do per ão cópias configurando, portanto, que todas as outras s produzidas ao longo do ção que se sustenta acerca da simbo tempo para respaldar a tradi logia da cruz de ços que tem aspectos dois bra similares a algumas cruzes europeias como a de Lorena e a de Caravaca.

ção 3.1.6 O Manancial Missioneiro da Can

écada de ário úsica Durante a d 1990, Bossoroca foi cen para o festival de m Manancial Missioneiro da Canção, ção intitulado cuja primeira edi realizada em 1990, úblico. O festival se é alca çar acolheu um grande p repetiu nos anos seguintes, at n ção em sua quarta edi 1996. O nome do festival traduziu a vontade de evidenciar as origens missioneiras ípio e, âmica serviu também ao do munic nessa perspectiva, essa din s intuitos de ítimos herdeiros do passado jesuítico fazer dele mais um dos leg -guarani, o que o ço natural da canção missioneira. consagraria como ber Sob esse ponto de vista, o festival foi um sucesso. De acordo com o ção de muitos artistas blogspot.com.br, que divulga seus resultados, houve participa ípio argentinos e uruguaios, o que levou o nome do munic para muitos lugares. ção Cultural de Bos – No blog da Associa soroca - blogspot.com.br (acesso ção ços para a em 22-05-2012), foi noticiado que essa associa envidava esfor ção ção do Manancial Mission ção. Essa mesma realiza da sexta edi eiro da Can ídia õe a intenção de ção se diferencie das demais no sentido da m exp que essa edi “ ência e ção da Comissão exig da preocupa Organizadora de permitir apenas a ção de temas e ritmos que tenham estreita ligação com a região e com a participa ática missioneira” tem . Isso mostra que a vontade de manter a Identidade é ainda uma constan missioneira te, para o grupo envolvido.

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3.2 A cultura estancieira em Bossoroca, aspecto preponderante nas práticas sociais e na cultura do município

Considerando cultura como o conjunto de aspectos comuns a um grupo social ção de seus sistemas simbólicos e pela repeti modos de resolver a vida e de estar ão preponderantes nas práticas presente nela, compreendemos que em Bossoroca s sociais os aspectos relacionados ao que chamamos de cultura estancieira. Assim, a á relacionada ao passado estancieiro ípi cultura est do munic o, embora este se Buena ítida referência ao se apresente como Terra Missioneira, em n u passado ítico jesu -missioneiro. ão podemos Quando avaliamos os aspectos culturais de uma sociedade, n ão linear e simplista, pois precisamos conceber que o partir de uma vis s seres ão inseridos em modos complexos humanos, produtos e produtores de cultura, est de vida, trabalho e linguagem. á Dessa forma, se atentarmos para o modo como a sociedade local est ância dos organizada percebemos preponder aspectos ligados ao passado é ística, pela qual estancieiro de Bossoroca. Referimo-nos a uma tica social caracter ções ão suporte a um os valores, costumes e tradi mais valorizados localmente d arranjo social que acomoda os entes sociais. çam a sociedade e Entendemos que ali existe uma gama de fatores que alicer ão ligados ao passado estancieiro do lugar. que, de uma forma ou de outra, est Acreditamos que muitos aspectos da vida cotidiana dessa localidade conservam a ência da cultura estancieira que se rep influ roduz e se incorpora ao novo, revestindo- ção e se de novas nuances, mas refletindo o tradicional, como elemento de sustenta ão social e econômica. coes ço geográfico muito bem demarcado, a cultura estancieira revela Nesse espa - se em alguns elementos, dentre os quais podemos citar: ça de diversas sedes rurais que estão ali desde que se a) A presen íram as primeiras estâncias e que se encontram espalhada ípio constitu s pelo munic ção luso ão; como testemunhas materiais da ocupa -brasileira na regi ções socia áticas b) Os usos e costumes presentes nas rela is que refletem pr âncias como a reverência ao ário de terras; relativas ao tempo das est propriet ções de trabalho c) A forma como ocorrem as rela ;

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ção geográfica da cidade que remete à ção espacial d d) A disposi organiza as çais antigas propriedades rurais, separando senhores de terras de escravos e servi .

âncias (sede das sesmarias, fazendas) 3.2.1 As Est

ça das grandes propriedades rurais em A cultura material evidencia a presen Bossoroca, muitas das quais resultantes do instituto da sesmaria e outras por ção ou ocupações. vendas oriundas de processos de apropria ção do territó ós a tomada dos Ao narrar sobre a ocupa rio bossoroquense, ap Sete Povos em 1801, por aqueles que ele chama de pioneiros, FIALHO (1993) faz ências a propriedades ção refer adquiridas pelo instituto da doa de sesmarias e ções de compra e venda conforme outras, por meio de transa exemplos:

Manoel Elias Ferreira Antunes chegou em Bossoroca por volta de 1810 e ância comprando de um castelhano o direito de posse, adquiriu uma est área éguas de sesmarias sendo a total doze l , ou seja, doze sesmarias (600 ía a ão José del quadras), 52.200 hectares, o que constitu Fazenda S ário (FIALHO, 1993, p.20). Ros

ção da concessão de posse data de 1829. É do De acordo com Fialho, a obten é referida como a “ desmembramento desta que se origina a sede que hoje casa de ão dos Antunes”. pedras do Rinc

ão Luiz do Nascimento comprou em Bossoroca a Estância da Figueira, Jo ário até então era D. José de Castelo Branco, o Conde da cujo propriet º Governador G íncia de São Pedro e Figueira, que era o 3 eral da Prov ção de Militar da Província Comandante da Guarni (FIALHO, 1993, p.118). ônia Pereira Marques localizaram Jacinto Vieira de Borba e Ant -se neste ão 4º distrito de São Borja, hoje Bossoroca, on ent de compraram a Fazenda ão. área total era de mais ou menos d Uni [...] a uzentas e seis quadras de campo (FIALHO, 1993, p.160). ília Fabrício da Silva está entre as primeir A fam as que chegaram em Bossoroca. A data de sua chegada presume-se entre 1810 e 1820. Mais ou ões a menos em 1822/23, requereu ao Comandante Geral das Miss ão de posse de três léguas de sesmarias. O requerimento foi concess deferido, mas os documentos foram extraviados e o pretendente fez novo ção da posse requerimento pedindo confirma (FIALHO, 1993, p. 131).

âncias ência de um modelo social que se As est traduzem por si a impon ão firmava na grande propriedade, de onde se refletem nuances de poder e opress ípio á vários dess ções, social. Espalhados pelo munic , h es conjuntos de constru

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âncias ório, já sob égide do sedes das primeiras est instaladas em seu territ a governo luso-brasileiro. ções resistem ao tempo ão testemunhas de uma Algumas dessas constru e s época.

ão dos Antunes Figura 16: Casa de pedras no Rinc ( set./2009) Fonte: Arquivo e foto da pesquisadora

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ância do Sobrado (jan./2010) Figura 17: Est Fonte: Arquivo e foto da pesquisadora

ça ( Figura 18: Fazenda Boa Esperan jan./2010) Fonte: Arquivo e foto da pesquisadora

ão o exemplo material de uma experiê Elas s ncia social, de um modo de vida á impregnado nas relações sociais no do passado que se projetou para o futuro e est

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ípio, sob a tutela de tradições que perpassam gerações sem que sejam munic ólumes. discutidas, alteradas ou rompidas, mantendo-se inc Pelos aspectos ão nos ocupemos relevantes da cultura de Bossoroca entendemos que, embora n ônio material desse ípio. delas por ora, constituem um importante patrim munic ão há direcionamentos no sentido de se Apesar da complexidade disso, n ão, discussão e valorização dess ônio empreender estudos para compreens e patrim no contexto da sociedade atual, visto que muitos aspectos da sociedade poderiam, assim, ser compreendidos e reavaliados. Isso nos faz refletir sobre as palavras de Nora quando afirma que os lugares ória “são os bastiões sobre o qual se escora. Mas se de mem o que eles defendem ão estivesse ameaçado, não se teria, tampouco, a necessidade de constituí ” n -los (NORA, 1993, p.13). í ção para o pouco empenho Ora, nos parece que talvez esteja a uma explica ância velh ém muito antigas. T em memorizar a est a e outras tamb alvez assim se á explique a falta de interesse em preserv -la, visto que o apelo surge quando a ção está se esvaindo, quando existe o sentimento iminente de que as memórias tradi ão se perder e não é este o caso da c ir ultura estancieira em Bossoroca. Ali essas çõ ão latentes, vivos e espalhado ípio. As representa es e signos est s por todo o munic ções sociais calcadas nos valores da cultura estancieira permanecem rela ância Velha praticamente inalteradas pelo tempo. E, sob esse prisma, a Est , como é um ícones, dentre precursora, dos seus grandes tantas fazendas antigas ípio. existentes no munic á, significa, porém, não trazer à tona ão colocar na Deixar tudo como est , n ões um passado escrava pauta de discuss gista e excludente. Significa deixar que se ções que mantêm vivos apenas os aspectos perpetuassem as representa que ção da ordem social estabelecida, que se traduz na interessam para a manuten ção dos entes sociais de acordo com a ética social do estancieiro. acomoda

– ção espacia ções 3.2.2 A geografia da cidade a organiza l reproduz e revela as rela de poder

ção espacial da cidade Compreendemos a organiza como um dos mais relevantes aspectos da cultura estancieira em Bossoroca, que separa o centro da úcha. Essa separação é muito evidente, visto qu cidade do bairro da Ga e existe um

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ç ções ( úcha) que se ligam por espa o vazio entre as duas por Centro e Bairro da Ga uma avenida.

ê o Centro e o Bairro Gaúcha. Figura 19: Imagem onde se v Fonte: Google Earth, acesso em 25-03-2012.

ância entre o centro da cidade Observando o mapa, podemos perceber a dist úcha. São mundos diferentes, mas que se completam numa relação e o bairro da Ga ência. de interdepend

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çado das ruas e respectivos nomes, evidenciando o Figura 20: Mapa da cidade com o tra úcha Centro e o Bairro da Ga Fonte: Prefeitura Municipal de Bossoroca

é muito peculiar e chama a atenção dos visitantes. É Esse aspecto da cidade interessante registrar que muitos bossoroquenses afirmam com orgulho que a úcha é um bairro onde não existe miséria. Nessa fala, perceb Ga e-se, portanto, ção de afirmar que o povo do referido bairro está bem cuidado e, disposi ência de tratamento remetendo à analogicamente, intuir que exista uma infer -a resposta do estancieiro a quem ousasse afirmar que seus escravos ou empregados ão eram bem n tratados. ônico da cidade Percebemos o direcionamento espacial do modelo arquitet ética da cultura como um instrumento capaz de reproduzir na face urbana a ços. Esse padrão cultural está estancieira que passa a coexistir nos dois espa ômico que se baseia numa forte hierarquia social, e se calcado no modelo socioecon ém para o aspecto étnico, separando brancos e negros. projeta tamb êm a capacidade, em variadas possibilidades Tais instrumentos t , de sujeitar ção no mundo. ou influenciar subjetivamente os entes sociais na sua forma de atua ão o aporte As estruturas mentais que se formam com o desenvolvimento cultural s ções de cada ser no mundo social onde está inserido. para as a ção espacial da cidade como No momento em que tomamos a organiza ível de álise elemento pass an , percebemos um importante signo da cultura

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ípio, capaz de produzir e estancieira, estruturado sobre a forma de ser do munic intensificar significativos resultados na vida das pessoas. ções que decorrem disso podem ser resumidas no discurs As representa o “ser ou não ser da Gaúcha”, forma como muitas vezes se faz imperativo de ência às pessoas, demonstrando claramente que há aí um i refer ndicativo de ão ão da úcha e os que são do centro identidade de exclus social: os que s Ga . ç âmicas de O espa o direcionado a conformar a vida social reflete din ção e de acomodação âmica estrutura de comportamentos e modos de reagir na din da vida, capaz de produzir e reproduzir mentalidades. A forma encontrada para acomodar seus entes sociais fica evidenciada na geografia da cidade de Bossoroca, que reproduziu na zona urbana o mesmo modelo ção espacial da zona rural, mantendo separados os proprietários de de organiza terras e os seus trabalhadores (na sua maioria, afrodescendentes) e, no presente, ão esclarecedoras: Nesse sentido, as palavras de Milton Santos s

ó o presente é real, mas a atualidade do espaço [...] o passado passou, e s é formada de momentos que foram, estando agora tem isso de singular: ela áficos atuais; essas formas cristalizados como objetos geogr -objetos, tempo ão igualmente tempo presente enquanto formas que abrigam passado, s ência, dada pelo fracionamento da sociedade total. Por isso, o uma ess á morto como tempo, não ém ço; o momento passado est , por , como espa á não é, nem voltará a ser, mas su ção não momento passado j a objetiva á sempre aqui e participa equivale totalmente ao passado, uma vez que est ável de realização social da vida atual como forma indispens (SANTOS, 2004, p. 14).

ção espacial que existia nas estâncias na época em Se compararmos a rela ípio de Bossoroca estava ruralizada, que a sociedade que viria a constituir o munic ço destinado aos serviçais era ço podemos perceber que o espa muitas vezes o espa ém a diversão, o entretenimento e a paz espiritual. onde estava tamb ço de sofrimento e d ção Esse espa e segrega se transformava no lugar em que ocorria a festa, o aconchego, o conforto da reza ou o socorro oferecido pela parteira. ão ou a senzala assumiam, portanto, posições dicotômicas, envolvendo O galp ções de amparo e abandono, de sofrimento e a é situa legria. Nesse sentido, comum à s pessoas que moram no centro da cidade participarem de festas no Bairro da úcha, tal qual acontecia com os mo ão, sem Ga mentos festivos no galp , contudo, ão de classes de patrões romper-se a hierarquia representada pela divis e empregados.

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úcha e Se olharmos para o Bairro da Ga para o entro da cidade, podemos âmica âncias facilmente perceber a mesma din que existia entre a casa-sede das est ão ou a senzala. úcha (bairro) cumpre hoje é ou fazendas e o galp O papel que a Ga ão ou a senzala ocuparam o mesmo que o galp outrora. É pertinente registrar ainda um costume muito antigo que, em algumas ões é ão os benzimentos ocasi , usado. S , procedimentos herdados da cultura ão africana. A maioria das benzedeiras vive naquele bairro e s procuradas por ívio pessoas do centro em busca do al para males como, por exemplo, cobreiro, ça popular ( mau-olhado, rendiduras e tantos outros que, de acordo com a cren ainda ó muito presente), s podem ser curados pelas benzedeiras. é uma expressão viva da cult ências e na Essa ura, que se retrata nas viv ção dessas práticas para grupos de diferentes matizes sociais e culturais, propaga remetendo ao conceito da circularidade de culturas, explorado por Ginzburg, quando ção se refere ao fato de que as ideias perpassam grupos em movimentos de intersec é interessante destaca que resultam em trocas. Neste ponto, r o que ocorre quando algumas senhoras levam seus filhos (do centro da cidade) para serem benzidos pelas vovozinhas (como por exemplo, a Dona Carmelina, benzedeira do bairro). ão adianta a medicina. Essas senhoras acreditam que, para aqueles males, n ção estabelece tais crenças, que perp ções, Nesses casos, a tradi assam gera transcendendo o moderno e incorporando-se a ele. É imprescindível observar o lugar que cada um desses entes sociais ocupa ção. A á na Gaúcha ão nessa rela benzedeira, que hoje est , estava no galp , e a ção que outrora ocorria ão hoje ocorre movimenta da casa-sede para o galp do centro para o bairro.

ória de Bossoroca 3.2.3 O Senhor de terras e o papel do gringo na hist

ção luso Depois da ocupa -brasileira, os imigrantes ou descendentes de ípio ão comumente chamados gringos. imigrantes que chegaram a este munic s ães, poloneses e outros Esses descendentes de imigrantes de italianos, alem ômica: a que chegaram ao decorrer do tempo trouxeram uma nova perspectiva econ lavoura como alternativa para o uso da terra. ípio é meados de 1950 ômico O munic , que, at -60, tinha seu modelo econ ária exte ç calcado quase exclusivamente na pecu nsiva, come a a se incluir num

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ômico voltado também para movimento econ a agricultura, parte de um macro ário nacional e mundial, representado pela modelo que abrangia o cen cultura ção Verde do período posterior extensiva da soja e do trigo, fruto da chamada Revolu à Segunda Guerra Mundia ém, acreditam que “gringos” l. Muitos, por os trouxeram à lavoura. essa realidade para Bossoroca, pois sempre tiveram sua atividade ligada ção nisso é que esses novos O aspecto preponderante que chama a aten â entes sociais, quando passam a fazer parte da din mica cultural dessa ários de terras municipalidade, e se percebendo propriet , incorporam as posturas do passado exercendo na sociedade o papel antes ocupado pelo estancieiro. E isso ão é prerrogativa de grandes proprietários de terras. muitas vezes n ão Podemos perceber a dimens dessa cultura estancieira quando é forte esse ínculos que se consideramos o quanto ainda recorte do passado. Os v às estendem alimentam mentalidades apegadas estruturas sociais desse passado e reproduzem muitos aspectos da cultura estancieira, em que o senhor de terras ém o é mui ém á det poder. Isso to evidente ainda hoje. Muitos rec -chegados h écadas ao município, ção de ários de apenas poucas d e agora na condi propriet terras, assumem a postura de estancieiros, revelando em suas atitudes muitos ços da personalidade d à força das tra o grande estancieiro de outrora. Devido ções que mantêm vivas essas representações sociais, esses recém tradi -chegados ão era a sua. Ao incorporam, assim, uma cultura que n assumirem a postura de estancieiros, essas pessoas passam a reproduzir com os seus empregados e com ê ções de superioridade social e econômica a as pessoas com as quais mant m rela ção de senhorio que se via no passado. mesma rela Logo se tornam padrinhos dos çam a dis filhos de seus empregados e come tribuir-lhes pequenos favorecimentos e ções trabalhistas, repercutindo em favore a conceder ajudas que fogem das rela s ívidas de gratidão reconhecidos como eternas d que geralmente se revertem em ítico apoio pol . ças do passado estancieiro Se olharmos as heran sob o prisma das ções presentes representa na sociedade e que produzem e reproduzem a hierarquia ão á à ções e a exclus , podemos facilmente lig -la estrutura dos Centros de Tradi úchas – ás, é uma Ga CTGs. Essa, ali entidade que nitidamente reproduz a çã ância, com organiza o de uma est seu sistema de hierarquia, reverenciando alguns áticas sociais inalteradas, com aspectos do passado que servem para manter as pr ão contestam ência a mentalidades que n , por exemplo, a rever escravistas convictos,

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à categoria d óis elevados e her . Nesse sentido, entendemos o CTG como uma ém viva a lógica social da cul entidade que mant tura estancieira, pela qual os ão direcionados para a inclusão de novos sujeitos ou recortes do passado nunca s órico, mas ção novos olhares acerca do passado hist para a manuten de uma à estrutura social alheia s diversidades culturais. ª Região Tradicionalista e ção, O CTG de Bossoroca integra a 3 sua denomina ões ência a ítico Sinuelo das Miss , pode ser interpretada como refer o passado jesu - ígena missioneiro, sem que haja, no entanto, entendimento do papel ind no passado órico. R ão hist ecorta-se desse passado apenas o que se quer, ou seja, aquilo que n ção de um passado de forma cause desconfortos. Isso permite a apropria ão desarranjar fragmentada e direcionada apenas a explicar o presente de forma a n á posto o que est , mantendo invisibilidades e esquecimentos. Louva-se o passado ão se discute missioneiro, mas n m aspectos desse passado que possam causar ções ências âmica social existente. desacomoda e interfer na din ível para nós que a ideologia tradicionalista refor Fica vis ma o sentimento de ão ótica da apropriação gratid com o passado estancieiro, na parcial do passado. ão, ção e Isso ocorre nas rodas de chimarr nas festas de confraterniza nos rodeios, quando todos se colocam como entes que participam ativamente da nuance cultural ém, ão passa de um arranjo momentâneo éis enfocada. Isso, por n , visto que os pap , âmica social ê ão és da falsa ão nessa din , t m outras perspectivas que s , ao inv inclus ão e a ção de um sistema no que se oportuniza nesses momentos, a exclus manuten qual poucos efetivam suas vontades em detrimento do que seria direito da maioria. é um elemento de poder em Bossoroca. A propriedade da terra

3.2.4 O Negro na sociedade bossoroquense

ória á inserido na Conhecer e entender a hist e a forma como o negro est é ícil, pois as ções ão sociedade bossoroquense tarefa dif informa s esparsas, e a ção pesquisa se revela demasiadamente complicada. A comprova insuficiente faz ções oscilarem entre o sensacional, o lendário tais informa e o real. ão re Alguns relatos est gistrados na bibliografia local como, por exemplo, os à forma como alguns escravis que se referem tas bossoroquenses tratavam seus ário de terras “Mandava escravos. FIALHO (1993, p. 154) assegura que o propriet que um dos escravos levasse-lhe uma brasa para acender o palheiro [...] o negro

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ão, então aí é que ele começava a picar o fumo, esfarelar e trazia na palma da m enrolar na palha, tudo feito devagarinho, e em todo esse tempo o negro conservava- ão para outra...” se ali postado, passando a brasa de uma m . Essa narrativa traduz formas perversas e violentas do tratamento dispensado éculos aos negros no passado escravista de Bossoroca, ao longo dos s XVIII e XIX. ós a emancipação escrava de 1888, os afrodescendentes con Mesmo ap tinuaram ão havendo quase referências à sendo tratados com desprezo e perversidade, n ça de negros e escravos ção da comunidade, com exceção do presen na constru ótico n ário coletivo e popular. ex o imagin ódio que narra a morte ês escravos ério dos O epis dos tr enterrados no Cemit ítulo, quando mencionamos ério) também Cativos (no segundo cap o referido cemit demonstra a perversidade de alguns escravistas no trato de seus escravos. Neste ém de ter sido morto por um fato que caso, o escravo al ocorreu acidentalmente, ç teve sua cabe a decepada e exibida na frente da casa, conforme relata Fialho (FIALHO, 1993, p.289). ígios e elementos, Afora isso, os vest substanciais para compreender a ória do negro em Bossoroca órias hist , parecem se esvair nas hist contadas por órias sobre o t ão, e pessoas que carregam mem empo da escravid m narrativas nem ão se pode ão sempre comprovadas e registradas. N ndo afirmar, portanto, se s ções e representações sociais distorcidas verdadeiras ou resultam de interpreta . Por se tratar de cidade pequena, fica evidente a temeridade do confronto com áticas parentes ou descendentes diretos de pessoas muito ligadas a pr ém escravocratas. Ocorre tamb de os descendentes desses senhores de escravos ainda estarem vivos e as muitas pessoas que sabem de fatos que poderiam ser ão que comprovados n rerem se comprometer. ão narrativas que contam histórias de autoritarismo e abusos e parecem S évoa do ressentimento envoltas na n e do temor, demonstrando que o passado ário ainda õe é como ver autorit se imp e deixou sequelas. Perceber esse movimento ória de histórias de vida que talvez não se consiga reunir de esboroar uma trajet É muito forte ainda o processo de negar a presença do escravo forma eficiente. nessa localidade. Entendemos que isso traduz a necessidade de se afastar da perversidade representada pelo sistema escravista. é que a sociedade ão estabelece diálogos com o O que se pode afirmar n ão há interesse em relembrar passado escravista local, pois n as dores e

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ém disso, ão há interesse em c ços a perversidades do passado. Al n onceder espa É evidente que ão outros sujeitos sociais. esse esquecimento, esse movimento de n ão remexer nesse passado faz com que se reproduzam no presente discutir, n ção e autoritarismo qu aspectos de subordina e poderiam ser superados com novas ções sobre seu passado histórico. último C 31 percep No enso do IBGE em Bossoroca, ém se 5.179 pessoas declararam-se brancos, 1077, pardos, e pretos, 628. Ningu ígena. declarou ind ção o fato de que, por esses úmeros, podemos presumir que Desperta aten n muitas pessoas negras deixaram de declarar sua etnia, nos fazendo crer que o é bem maior do que o declarado oficialmente, ão é de se percentual e isso n ão tra ém até estranhar, visto que, ser negro em Bossoroca, n z vantagem para ningu ível é o melhor caminho. o momento. Nessa perspectiva, ser invis No mesmo sentido ígena, que sumiu pode-se apontar o ind de Bossoroca, confirmando o que referimos antes acerca de um passado morto. ção de uma identidade Isso nos faz assegurar novamente que a afirma à tona elementos missioneira em Bossoroca pode servir para impedir que venham da cultura estancieira. Estes podem colocar em xeque um arranjo social que ém essas pesso ção de invisibilidade. O ígena é algo mant as na condi passado ind ão tem potencial para fomentar gr ências, pois é um passado que n andes efervesc ão dos afrodescendentes, ligada diretamente ao passado morto, enquanto a quest ões sociais crescente estancieiro, pode efervescer e ganhar dimens s. É neste ponto que manifestamos mais uma vez nosso entendimento acerca ção patrimonial, como ferramenta capaz de proporcionar da educa novos olhares ém sobre o passado. Essa postura pode tamb permitir a cada um sentir-se sujeito órico e ão com direito a buscar hist cidad mais qualidade de vida, na perspectiva de ção da processos de afirma diversidade cultural.

31 ística. Censo realizado em 2010. Instituto Brasileiro de Geografia e Estat

4 EDUCAÇÃO PATRIMONIAL NA SALA DE AULA: CARTILHA DE EDUCAÇÂO PATRIMONIAL

ção Patrimonial é uma importante f A Educa erramenta, capaz de estabelecer ários diálogos com o passado histórico, a fim proporcionar a inclu ão de os necess s ídos É grupos que sempre foram exclu na sociedade. a partir do conhecimento do órico que se pode raciocinar processo hist e questionar o presente para romper amarras existentes. Assim, o conhecimento e o entendimento dos processos de ção da ident ões acerca da r forma idade podem servir como base para reflex ealidade existente, configurar novas perspectivas de entendimento do passado e órico. relacionamento com as estruturas resultantes do processo hist êm Compreendemos, assim, a necessidade que os grupos t de interpretar o passado ções a partir das condi do presente. ático de Educação Patrimonial direcionado aos alunos e alunas O material did ção Básica, que apresentamos como produto, constitui dos anos iniciais da Educa ção entre a com ônio histórico e cultural possibilidade de aproxima unidade e o patrim ípio. Esse subsídio representa um diálogo entre a comunidade e a história do munic ípio ço para novas interpretações de alguns aspectos do munic e pretende abrir espa e entendimentos. É, portanto, uma contribuição q ue pretende o registro de dados, bem como ções sobre os patrimônios locais suscitar interroga , muito valiosos para o áticas pedagógicas ória local desenvolvimento de pr no conhecimento da hist . A ções ções poderão se posicio partir dessas informa as novas gera nar diante da ão e injustiça social ocorridas no passado, exclus que se reproduzem e se é condição desdobram no presente. Nesse sentido, o desenvolvimento da cidadania elementar para que se alcance o esperado.

4.1 Apresentação do Produto

é O Produto que apresentamos como pr -requisito para o Mestrado em ônio Cultural é um livro que conta, a partir da percepção do patrimônio Patrim ória histórica de Bossoroca, bem como cultural, de forma ilustrada e interativa a trajet ória apresenta aspectos da sua cultura. Nele, enfocamos alguns dos lugares de mem

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ódios important ção do município. É, em resumo, e epis es na constitui um material ção patrimonial a partir do ambiente escola á para subsidiar a educa r, e ser à Secretaria Municipal de Educação do M ípio, a fim de que disponibilizado unic o reproduzam e o distribuam na rede municipal de ensino. á tempo íamos a necessidade de um material que H perceb desse suporte para órico ípio e de seu p ônio estudo do passado hist do munic atrim cultural na sala de à educação p aula com os alunos. O contato com o material destinado atrimonial desenvolvido pelo professor Saul Eduardo Seiguer Milder foi nosso ponto de partida ção. Ne ções de e objeto de inspira le, vimos efetivadas nossas idealiza material ão apenas úblico i ém úblicos. direcionado n ao p nfantil, mas tamb a outros p O livro de Saul Eduardo Seiguer Milder, intitulado O POVO DOS PINHEIRAIS, é um bom exemplo de material didático para ão patrimonial em sa estudo da quest la ão justamente os grandes de aula, com alunos pequenos. Estes s potenciais, visto ças são comprometidas com as ão, que as crian causas com as quais se envolvem. S por isso, potencialmente, importantes agentes patrimoniais. ção pelas paisagens apresentadas, que O material, todo ilustrado, chama aten ção facilmente reconheci revelam aspectos do relevo e da vegeta dos pelos leitores, integrantes das comunidades envolvidas. éria, Apesar da simplicidade, esse material, resultado de pesquisa s resulta ídio em interessante subs para determinado grupo de leitores que, assim, á posto. conseguem compreender o que est áticas simples Como educadores, acreditamos que, a partir de pr , podemos ça ção à ão patri alcan r grandes objetivos em rela quest monial quando trabalhamos de údico tem ância forma motivadora. O l grande import nos processos educativos em ática pedagógica, pois a ludicidade po nossa pr ssibilita o envolvimento do aluno no processo de ensino-aprendizagem, tornando prazeroso o ato de aprender. Nele, a ção com o m curiosidade e a intera aterial se tornam uma constante e possibilitam atingir os objetivos. Quando nos propusemos a produzir um material que pudesse servir de ídio para o estudo do município, pretendíamos e subs nfocar a complexidade de ória fatores que permeiam essa hist , assim como a maneira como os grupos investidos de poder se manifestam na sociedade. ção patrimonial Acreditamos que, por meio da educa , podem-se romper ção de amarras existentes, e o conhecimento acerca dos processos de forma

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ões sobre a realidade identidades pode servir como base para reflex , configurando novas perspectivas de entendimento e relacionamento com o passado e com as ções resultantes órico, para determinar estruturas e representa do processo hist é que rupturas ou continuidades. Nessa perspectiva, o material proposto como ásico para ória e a cultura do município representa um recurso b estudos sobre a hist ção da educação patrimonial bom recurso para efetiva . ção de educado áticas devem Na condi res, entendemos que nossas pr ões ônio existente, a fim de estimular reflex acerca do patrim trazer novos úvidas sobre ímbolos e valore entendimentos e suscitar novas d os s s presentes no ônio ex ção e a patrim istente e no significado deles para a comunidade. A preserva ância destes passa obrigatoriamente pela relação de pertencimento import ção que esses estabelecida entre o bem cultural, material ou imaterial, e a rela ção do passado e das lugares revelam sobre o passado e o presente. A ressignifica perspectivas de futuro que se percebem neles pode ser fundamental para o desenvolvimento da cidadania. ção patrimonial Segundo QUEVEDO-RODRIGUES (2011), ao tratar da educa “todas essas questões só serão reconhecidas se, no espaço em sala de aula, ção da importância da História e do escolar, ocorrer o debate, a conscientiza ônio Cultural, que passa pela educação p ” Patrim atrimonial de qualidade . ção, entendemos necessário o diálogo entre ícones Com base nessa afirma os ção d ória no município e do passado a fim de compreender a rela os lugares de mem ções sociais as representa formadas ao longo do tempo e presentes no cotidiano do é possível perceber que se perpetuam áticas de autoritarismo e lugar. Assim, pr ão decorrentes de um passado alicerçado no regime de grandes submiss ão social çã propriedades rurais e da exclus . Configura-se, assim, uma educa o é colocado, pois patrimonial de qualidade no centro de cujo processo o ser humano é para este ções devem servir que essas a .

4.2 Metodologia

údica e à interatividade O material confeccionado apresenta forma l voltada , ção. Nele ão envolvidos ários eixos pressupondo grande possibilidade de utiliza , est v ários aspectos temáticos como caracterizando-o como interdisciplinar, ou seja, com v ática ambiental, relações de poder e diversidade cultural problem . Esses temas

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ão ser desenvolvidos a partir do uso do material com os alunos, dependendo poder ções, das condi disponibilidades e possibilidades do contexto de cada grupo. é o conhecimento de O eixo gerador do material aspectos caracterizadores da ória e ípio, evidenciados em cartilha que apresenta hist da cultura do munic a forma ção das terras que compõem ípio. é partir do simples de ocupa o munic A proposta ões mais complexas. para encaminhar discuss Quem vivia nestas terras? Como se ção dessas terras pelos que vieram depois? Houve justiça deu o processo de ocupa nesses processos? Quem perdeu? Quem ganhou? Isso tem a ver com nossa vida órias são contadas na comunidade? hoje? Que hist ção do material õe Na confec , foi usada a diversidade de cores, o que pressup ável e údica de mostrar aspectos o envolvimento do aluno com ele, pela forma agrad l çã é de que o aluno reconheça seu entorno no material, do seu cotidiano. A inten o ão, sujeito de ória. sentindo-se, ent ssa hist ção patrim Procuramos reproduzir na cartilha de educa onial o ambiente ístico do município, com paisagens (rios, relevo e v ção) que retrata caracter egeta m o ço físico bossoroquense. espa ídos A partir da cartilha podem ser constru alguns jogos interativos como, por ça exemplo, palavras cruzadas e ca -palavras, bem como algumas pesquisas e entrevistas que podem ser desenvolvidas pelos alunos na comunidade a fim de ções contidas na cartilha. complementar as informa

4.3 Uso do Material na Sala de Aula

Esperamos que o material ora apresentado possa ser reproduzido e ído para os alunos da ública do município distribu rede p . Para tanto, o ção possa disponibilizamos, sem custos autorais, a fim de que a Secretaria de Educa údico de fazer uso dele. Dessa forma, talvez ajude a equacionar a falta de material l ória do município e à educação patrimonial. suporte e apoio ao ensino da hist õe interação entre aluno e ão A Cartilha pressup material, visto que s árias oportunidades de intervenção. Faz ém um à apresentadas v tamb convite ção dos pontos ípio, visita elementares para entender o povoamento do munic seu ções q desenvolvimento e os registros nas constru ue caracterizam tudo isso e podem ória. ser visualizados nos seus lugares de mem

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Com o material apresentado, pretendemos despertar nos alunos certo ência ém disso, encantamento com as evid s apontadas no livro. Pretendemos, al que áginas ências eles relacionem suas p com o entorno de suas casas e com suas viv ência da importância de ças que o passado despertando-lhes a consci ssas heran coloca para a sociedade para poderem lidar com elas de forma mais leve. Saber é uma aproveitar esse material tarefa na qual a subjetividade e a criatividade devem çar a curiosidade át ser usadas a fim de sensibilizar e agu para a pr ica da ção cidadã, na qual étnica são valores a ser participa a diversidade cultural e ídos. constru á ão p às O professor poder aproveitar a ocasi ara discutir assuntos referentes ões ambie ção da mata ciliar, prese ção dos afluentes e quest ntais como preserva rva çados de ção que vivem na beira dos rios. E ões dos animais amea extin ssas quest ão vitais ção ambiental ão suscitadas nas primeiras páginas do s para a preserva e est á a problemática das lavouras livro. Ligada a esses temas est extensivas, com uso óxicos demasiado de defensivos e agrot , que pode ser desenvolvida tendo como ências da cartilha ponto de partida as evid . ários momentos, é no quinto ano do Embora o material possa ser usado em v Ensino Fundamental que seu uso se torna mais elementar, visto que esse o ículo escolar contempla o estudo do município. Julgamos momento em que o curr é ponto de partida para o desenvolvimento de competências e que o material árias ao aluno ão habilidades necess -cidad . ência como o conjunto Compreendemos compet de saberes associados ao à ógico saber fazer, ou seja: s habilidades. Consideramos que esse material pedag tem potencial para desenvolver nos educandos habilidades para analisar o processo órico pelo qual Bosso és da hist roca se constituiu, atrav leitura textual e de imagens, óricos e relacionando dados e informações referentes a avaliando seus sujeitos hist ência a capacidade de ser um isso, a fim de desenvolver como principal compet ão crítico e autônomo que se c ções e consegue resolvê cidad oloca diante das situa - íveis. las da forma mais adequada, aplicando seu conhecimento e os recursos dispon ópria Assim, esperamos contribuir para que possam construir sua pr ções identidade, para agir com autonomia diante de situa -problema, incorporar a ção de um espaço de participação diversidade como pressuposto para a constru ã, pois, no momento em que o aluno decifra ódigos e símbolos e consegue cidad c

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á à sua realidade, deixa de ser um mero espectador e passa a formular relacion -los óteses, posicionando hip -se criticamente frente ao mundo em que vive.

4.4 O Produto: Cartilha de Educação Patrimonial

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

érmino de uma jornada ós O t de estudos nos permite entender que, mesmo ap ímos um longo caminho de buscas e descobertas, conclu apenas uma etapa. As ções e anseios de incessantes novas buscas limita , inerentes ao fato de sermos ão chegamos ao fim. A cada con ção, humanos, evidenciam que n stata surge a âmica cultural, que é a dinâmica da vida certeza de que, quando analisamos a din , nunca chegamos a um ponto final, mas a novos pontos de partida. Algumas ções pontuais têm ões considera forma conclusiva. Outras ainda ecoam como quest ão res n olvidas, e precisam, portanto, ser elaboradas e pensadas. ção foi produzi âmica Esta disserta da com o intuito de compreender a din ípio de Bossoroca, RS, no s cultural do munic entido de conhecer e analisar seu ônio cultural e a forma como patrim este vem sendo usado para fomentar processos ência alguns aspectos do seu passado histórico de identidade, colocando em evid ões ção da em detrimento de outros, produzindo invisibilidades e exclus . A produ pesquisa levou-nos, assim, a compreender muitos aspectos da cultura de Bossoroca. çã ônio é te Em rela o ao conceito de patrim , ficou compreendido que rreno de ões e disputas, ções que envolvem o discuss e ainda precisa ser discutido. As articula ônio e seu entorno estão sem ções e reações íticas patrim pre crivadas de a pol , pois ções ônio são as representa criadas a partir de determinado patrim , inegavelmente, ências ou transformações na realidade social. instrumento promotor de perman ão, ções de poder estão sempre presentes nas Pode-se perceber, ent que as rela ões patrimoniais, quest determinando o que se preserva ou deixa de preservar. O

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ônio evidenciado é articulador de identidades que podem manter ou romper patrim estruturas sociais. ção patrimonial constitui um caminho para A educa o rompimento das amarras ção existentes ou para sua manuten . Nesse sentido, o conhecimento dos processos ção de identi ões de forma dades pode servir como base das reflex sobre a realidade, configurando novas perspectivas de entendimento e relacionamento com o passado ções órico ém e com as estruturas e representa do processo hist . Pode tamb levar a ão ônio rupturas ou continuidades, pela reflex acerca do patrim existente, a fim de se çar úvidas sobre alcan esses novos entendimentos e, por outro lado, suscitar novas d ímbolos e valores ões os s presentes nessas quest e no significado delas para a ção e o entendimento do valor desse patrimônio passam comunidade. A preserva ção de pertencimento estabeleci obrigatoriamente pela rela da entre o bem cultural, ção material ou imaterial, e a liga que esses lugares revelam sobre o passado e o presente. ão d é ção Uma das possibilidades para compreens a cultura do lugar a rela ógica com os í ção dial cones do passado a fim de entender a rela entre os lugares de ória existentes no município e ções sociais mem as representa presentes no cotidiano do lugar. íc Consideramos, desde o in io deste trabalho, a prerrogativa de que era ário manter necess determinado distanciamento capaz de nos permitir perceber as ções que envolviam ões pa é situa as quest trimoniais em Bossoroca sem conceitos pr - ícil, concebidos, uma tarefa dif pois estamos vinculados ao meio. ória em Bossoroca evidenciam a necessidade de se Os lugares de mem ços com um passado que manter os la , de uma forma ou de outra, se pretende ê ância de conservar vivo no presente. Esses lugares t m a fundamental import às possibilidades de articular memórias vincular o que se quer guardar do passado que podem sustentar entendimentos acerca de determinados aspectos. Por meio ível ípio ços para deles, foi poss perceber que o munic de Bossoroca empreende esfor ísticos, e se relacionam preservar alguns lugares apresentados como tur diretamente com aquilo que se quer reverenciar do passado a fim de construir a identidade ípio. missioneira do munic Os caminhos percorridos tiveram como pressuposto a busca por conhecer e ônio cultural de Bossoroca entender o patrim , o que fizemos a partir desses lugares ória, ípio de mem procurando compreender o motivo pelo qual o munic se apresenta

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Buena ítida referência ao seu passado jesuítico como Terra Missioneira, numa n - guarani. ônio cultural de Bossoroca e a Quando iniciamos a pesquisa acerca do patrim é ípio forma como este utilizado, percebemos o empenho para que o munic fosse ça missioneiro ítica. reconhecido como um dos que guardam parte da heran -jesu íamos ção e empenho, as Perceb , no entanto, que mesmo com toda a motiva ções estabelecidas na sociedade e ções entre os rela a cultura incipiente nas rela óricos e sujeitos hist sociais, revelavam o passado estancieiro do lugar de forma ários elementos que ção muito clara. Hoje, a partir dos v elencamos na disserta , ção pública e alguns setores da podemos apontar para o fato de que a administra sociedade bossoroquense empenharam-se em construir uma identidade missioneira para Bossoroca. Nossas buscas nos possibilitaram entender que o que ocorreu em Bossoroca á diretamente ligado ao movimento apresentado por POMMER est (2006) como missioneirismo. écada de 80 ários De acordo com essa autora, a partir da d , v ípios munic passaram a buscar em seu passado uma forma de melhorar o presente. í O passado jesu tico-missioneiro foi, no caso, a maneira encontrada. Alguns desses ítico ógicos, entes buscaram nesse passado os fundamentos para discursos pol -ideol ão Lui ão como ela avalia o caso de S z Gonzaga. Em Bossoroca, entendemos que n ção de fundo políti ógico, n houve conota co-ideol o sentido de buscar aspectos que áticas ário da terra ou a ções de igualdade e relacionassem a pr de uso comunit rela fraternidade. Acreditamos que o que houve em Bossoroca foi um movimento onde ístico e ção de valor ser se vislumbrou o empreendimento tur a agrega que o missioneiro ensejava no momento. ísse uma identidade Compreendemos que o desejo de que Bossoroca constru écada de 1990. Antes, ó conseguimos missioneira constituiu-se a partir da d s óricos ão se perceber alguns registros hist , pois n faziam efetivos movimentos para ípio ítico é ligar esse munic ao passado jesu -missioneiro. Prova disso o fato de que os ão referem aspectos relacionados ao passado jes ítico nomes de ruas n u - ário missioneiro. Ao contr , referem nomes de estancieiros ou, em alguns casos, de ção luso profissionais liberais, figuras importantes naquele contexto (frente de ocupa - ão existem monumentos construídos antes do portuguesa). Da mesma forma, n íodo referido que manifestem conotação com o ítico per passado jesu -missioneiro, ções com possíveis evidências acerca disso. nem outras manifesta

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ão Desse modo, n encontramos elementos que mostrem buscas para que écada de 1990. Fica Bossoroca se apresentasse como missioneira antes da d ão, a influência que o movimento regional ex ção da evidente, ent erceu na constitui écada de 1990 identidade missioneira de Bossoroca a partir da d . ção Essa identifica ocorreu a partir da busca de aspectos do passado órico, já ção ou hist relacionados por historiadores locais, bem como pela constru releitura de elementos que serviram para se construir e mostrar para a comunidade envolvida uma Bossoroca fundamentadamente missioneira. Isso aconteceu a partir ência do movimento de construção de uma identidade dos anos 1990, sob a influ ític regional voltada ao passado jesu o-missioneiro. ção em não remexer no Outro aspecto que ficou subentendido foi a disposi ípio, pois isso ões e passado estancieiro do munic poderia fomentar discuss ções sociais que se firmam em aspectos da cultura entendimentos acerca das rela ão de alguns grupos sociais a outros reproduzindo estancieira tais como a submiss ções do passado, ção do ólico representa com a manuten universo simb das estruturas sociais vigentes. Buena Terra ão estabeleceu um diálogo eficaz e Entendemos que a ainda n ário para que suficiente com seu passado escravista. Isso seria necess todos ãos, entendendo seu passado e realmente pudessem se sentir cidad se ção do seu reconhecendo sujeito que participa da constitui presente e de seu futuro. álogo Por fim, entendemos que ali existe uma cultura peculiar, na qual o di ção da história jesuítico com o passado ocorre, ora pela busca de valoriza - ções sociais que expressam os valores da cultura missioneira, ora pelas rela ões estancieira. Excluem-se, assim, do palco das discuss os demais atores sociais: ígenas ind , negros, imigrantes e descendentes de imigrantes e outros. ímos que a identidade de ípio õe ém do processo Conclu sse munic comp -se, al ção da identidade missioneira de afirma e dos aspectos marcantes da cultura ções acerca do estancieira, por uma diversidade de possibilidades de disposi órico ões a questão passado hist . Essas possibilidades colocam na pauta de discuss ão, dos índios, ões que deixam de fora possibilidades de da escravid exclus ões éis, discuss e interfaces que podem ser compreendidos como: terra de coron ívio Dutra e ão terra de Ol de Noel Guarany, terra de escravid , Bossoroca do coronel ão Dutra, Jo e outras faces que poderiam subsidiar novos entendimentos sobre o órico é últipla e fluída. passado hist , o que comprova que toda identidade m

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ção foi a relação ória Um dos pontos que mais nos chamou a aten com a mem de Noel Guarany. Mesmo sendo artista da terra, e um dos pioneiros do movimento ízes missioneiras ó foi reconhecido e rev que buscava as ra , s erenciado em seu solo íderes municipais ção assumiu natal, muito mais tarde, na troca de l , quando a oposi ípio (gestão o comando do munic 1996-2000). Dessa forma, os setores mais í em conservadores da sociedade de Bossoroca tiveram que aceitar esse fato da ão havia como sustentar uma identida diante, pois n de missioneira para Bossoroca úvida: se pretendeu renegando a figura de Noel Guarany. Fica instaurada a d construir uma identidade missioneira para Bossoroca sem efetivar nesse processo a figura de Noel Guarany? Mesmo sem ter sido esse o foco de nossas buscas, muitas vezes encontramos elementos nesse sentido. álogo com o Por fim, entendemos ali existir uma cultura peculiar, na qual o di ção de seu ítico passado ocorre, ora pela valoriza passado jesu -missioneiro, trazendo é inte ão para o presente apenas aquilo que ressante mostrar acerca desse. Assim, n ão avaliados ção territorial imposta pelos padres aos s assuntos como a domina ções sociais que expressam muitos aspectos da cultura guaranis, ou pelas rela ão e a exclusão a que negros estancieira, revelando a submiss e outros grupos foram ão são lembrados como sujeitos históricos. submetidos ao longo do tempo, pois n á latente Observamos que a cultura estancieira est no cotidiano das pessoas, ótic no sentido de homogeneizar entendimentos de mundo sob a a de quem domina ônio cultural de Bossoroca traduz o quanto as economicamente. Todavia, o patrim ão híbridas e deslocadas de um vínculo local, no momento em que identidades s revelam nexos com a cultura regional, nacional e global. ém ônio cultural é Tamb compreendemos que o que se afirma acerca do patrim ância ão incluída nas de fundamental import para que a comunidade se sinta ou n ão. Isso nos permite afirmar identidades missioneiras e/ou estancieiras da regi a ça de ção Patrimonial, cren que a cartilha de Educa desenvolvida como requisito para ão do Mestrado Profissionalizante em Patrimônio Cultural conclus tem potencial para ória do município despertar interesse sobre a hist , especialmente nos aspectos à baila ões sobre o papel do negro e do esquecidos, trazendo importantes discuss índio na história do ípio. ção munic Por meio da educa patrimonial, podem surgir ão d novos entendimentos sobre o passado para compreens o presente. Nesse é que p sentido retendemos disponibilizar esse material sem custos para que a

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ção possa reproduzi á às escolas da Secretaria Municipal de Educa -lo e encaminh -lo ública municipal. rede p ância a Para finalizar, consideramos de grande relev oportunidade que nos foi apresentada de desenvolver um produto que sirva como fecho ao trabalho de ção da vontade de pesquisa e estudo. Essa oportunidade serviu para operacionaliza realizar algo neste sentido, ou seja, um material para fomentar nas escolas as íveis e necessárias discussões sobre o passado histórico de Bossoroca. poss

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DOCUMENTOS ESCRITOS:

ália ício. Depoimento escrito concedido por Cor do Amaral Fabr Depoimento escrito concedido por Ilvo Jorge Bertin Fialho.

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