Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
“O culto da arte não preenche sua finalidade quan- do só existe para meia dúzia de homens e mulheres privilegiados. Então não é arte, mas linguagem ci- frada de uma sociedade secreta para a propagação de uma individualidade descabida. A arte é algo que incita paixões humanas, que dá visão lucidez, cora- gem e fé.” (Henry Miller)
Danúbio Villamil Gonçalves – trineto de Bento Gonçalves, pintor, grava- dor, desenhista e professor – nasceu em Bagé/RS, em 30 de janeiro de 1925. Aos três anos de idade, começou a desenhar. Com dez anos de idade mudou-se para o Rio de Janeiro, onde permaneceu por quatorze anos. Ali, estimulado pelo grande caricaturista Mário Mendez, passou a publicar caricaturas e ilustrações em Cena Muda e Mirim – revistas cariocas de circulação nacional – e a desenhar histórias em quadrinhos. Freqüentou nessa época os ateliês do escultor Zamoyski, de Cândido Portinari e de Roberto Burle Marx. Na Funda- ção Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, estudou xilogravura com Axel Leskoschek, metal com Carlos Oswald e desenho com Tomás Santa Rosa Júnior. Em 1943, realizou sua primeira mostra individual, em Bagé. Em 1949, viajou para Paris, como bolsista do governo francês, ali perma- necendo durante um ano e dois meses. Freqüentou o curso livre da Academia Juli- en e conheceu os principais museus da Espanha, Portugal, Inglaterra, Bélgica, Ho- landa, Suíça, Itália, Alemanha e Áustria, em viagem de estudo. Conviveu em Paris com Cândido Portinari, José Moraes, Iberê Camargo, Carlos Scliar e outros reno- mados artistas do Brasil e do mundo. Referindo-se a esses tempos, afirmou, em 2000, ao completar 75 anos, na abertura da obra caminhos e vivências: “Sou autodidata, muitos perguntaram. De certo modo, sim e não. Aluno de Jan Van Eyeck, Miguel Angelo, Velazquez, El Greco, Antonio Francisco Lisboa, Portinari, Lasar Segall, Diego Rivera, Siqueiros, Van Gogh, Matisse, Gauguin, Pi- casso, Egon Schiele, Henri Moore, Giacometti, etc., aprendendo com eles. De olho na arte maior. Com lupa investiguei originais no Brasil, Europa e EUA. De cara no desenho, cara na pintura, cara na escultura, cara na gravura, no tempo que os artis- tas sabiam desenhar e pintar.” De volta ao Brasil, fundou em 1951 – com Glauco Rodrigues e Glênio Bi- anchetti – o Clube da Gravura de Bagé e participou da formação do “Clube Ami- gos da Gravura” de Porto Alegre – no qual também participavam Carlos Scliar, Vasco Prado, Edgar Koetz, Carlos Mancuso, Carlos Alberto Petrucci, Plínio Ber-
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
-2-
nhardt e Ailema Bianchetti. Ali, desenvolvem o que alguns, mais tarde, denomina- riam como Realismo Regionalista. Historiando esse período, Danúbio nos relata: “No ano de 1950, Carlos Scliar se encontrava com o grande gravador [me- xicano] Leopoldo Mendez (...) Informado da importante trajetória do Taller de Gráfica Popular, fundado por Mendez, voltou ao Brasil entusiasmado como o pro- pósito de fundar o Clube de Gravura de Porto Alegre. A seguir surgiu o de Bagé, o de Montevideo, o de Recife, o de São Paulo e o do Rio de Janeiro (...) Todos em- penhados em pesquisas temáticas locais, em repúdio à onda ditada por Nelson Rockefeller, Nova Iorque, a favor da abstração, com o objetivo de arrefecer o espí- rito nacionalista da América Central e do Sul.” (Ser ou Não Ser Arte, Danúbio Gonçalves, 2003) Em recente artigo, escrito para o Jornal Fala Brasil (99ª edição, 2005), Da- núbio Gonçalves reproduz um importante depoimento de Carlos Scliar, que nos esclarece o processo do surgimento dos Clubes de Gravura, em 1950, em oposição ao “vanguardismo” abstrato e vazio: “Em fins de 1950 encontrei o Rio, e principalmente São Paulo, em plena fase de Museus, e a seguir, a partir de 1951, das Bienais, que entendiam em regu- lamento o vanguardismo do dia. Decidi me enfurnar no RS. Lá talvez, buscar mi- nhas raízes, mas pretendia parar para pensar. Lá encontrei um grupo de colegas, todos atravessando a mesma crise, e decidimos criar o Clube da Gravura, baseados na experiência do México. Seria para nós, uma espécie de Escola Livre, com mo- delo vivo para desenho, discussões, edições e tentaríamos reorganizar nossos co- nheci-mentos profissionais, na busca de uma linguagem que nos permitisse, uma obra viva, capaz de contactar com o público. De início éramos cinco (Glauco Ro- drigues, Glênio Biachetti, Vasco Prado, Danúbio Gonçalves e Eu). Nosso Lema: A primeira condição do artista é adquirir uma base profissional. Vivíamos no país um instante em que, em nome da pesquisa, se praticavam os maiores mal entendidos, pela irresponsabilidade e pontificados pela crítica.” Em 1952, o Clube da Gravura de Porto Alegre, do qual fazia parte Danú- bio, recebeu do Movimento Brasileiro dos Partidários da Paz (MBPP) o Prêmio Pablo Picasso, por seu importante trabalho artístico realizado em defesa da Paz e pelo congraçamento entre os povos. No prefácio do álbum “Gravuras Gaúchas” – editado sob o patrocínio do MBPP, com uma tiragem de 5.000 exemplares (algo excepcional para um livro de arte em nosso país), Jorge Amado destacou a impor- tância desse trabalho: “Num momento em que alguns agentes da confusão procuram desorientar os meios plásticos brasileiros, a série de gravuras reunidas neste álbum constitui uma excelente indicação do caminho que a arte brasileira, verdadeiramente brasi- leira, pode e deve seguir.
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
-3-
“Os gravadores do Rio Grande do Sul inspiraram-se na vida do seu Estado, fizeram do povo gaúcho o personagem central, de sua obra de criação artística. “As gravuras reunidas neste álbum valem como uma tomada de posição contra a decadência da arte, o cosmopolitismo, a imitação servil de uma pseudo- arte, o formalismo sem conteúdo, contra a arte desligada da vida, do homem e do futuro.” Em 1953, Danúbio mudou-se para Porto Alegre. Nesse mesmo ano, rece- beu, no 2º Salão Nacional de Arte Moderna do Rio de Janeiro, o “Prêmio de Via- gem ao País”. Ainda em 1953, visitou – junto com uma delegação cultural, formada pelos pintores Carlos Scliar, Djanira, Clau Deveza e pelo arquiteto Vilanova Artigas – a URSS, a Polônia e a Tcheco-Eslováquia. A produção de Danúbio Gonçalves revela – desde os anos 30 e 40 – uma grande preocupação política e social, explorando temas relacionados ao homem, o seu trabalho e a sua luta contra a opressão e a exploração. Sua obra, de caráter rea- lista e em linguagem direta, revela um grande humanismo. Colabora, através de ilustrações e artigos, com a revista Horizontes – de cu- ja direção participavam Carlos Scliar e Vasco Prado –, publicada no Rio Grande do Sul pelo Partido Comunista do Brasil. Em maio de 1954 – junto com Carlos Scliar, Clauco Rodrigues, Glenio Bi- anchetti, Carlos Mancuso, Lupicínio Rodrigues, Demétrio Ribeiro, Francisco Rio- pardense de Macedo, Dionélio Machado, Lacy Osório, Irineu Breitmann e outros prestigiados intelectuais gaúchos – assinou o Manifesto PELA DEFESA DA NOS- SA CULTURA, em apoio à candidatura à Assembléia Legislativa da poetisa comu- nista Lila Ripoll. Ao mesmo tempo, preocupa-se em fazer sua arte chegar ao grande público, dando-lhe alcance e visibilidade, o que explica sua opção por meios que facilitem a sua circulação – como as gravuras – e fácil acesso – como os murais. Na década de 1950, produziu séries de xilogravuras que tiveram como tema questões regionais, realizando um registro histórico e social de seu tempo. Na série de xilogravuras intitulada Xarqueadas (1952), revela as difíceis condições de tra- balho nos matadouros. O caráter dramático da obra – “onde avultam homens avil- tados, animais sacrificados e uma profusão de carcaças sangrentas” (Paulo Gomes, caminhos e vivências) – é obtido através de uma síntese formal e do grande con- traste do claro-escuro. A tensão dos corpos permite imaginar o peso da matéria morta. Já na série Mineiros de Butiá (1956), trata com a mesma força da realidade e das condições desumanas do trabalho nas minas de carvão. Em 1958, Danilo Gonçalves construiu em Porto Alegre a sua residência- ateliê, onde vive e trabalha até os dias de hoje.
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
-4-
Eterno aprendiz da arte, no início da década de 60 estudou litografia com Marcelo Grassmann e Edmundo Brasil, em Porto Alegre. Danúbio participa ativamente da implementação do Atelier Livre da Prefei- tura Municipal de Porto Alegre, onde passa a lecionar litografia (1962 a 1995), on- de também ministrou aulas de xilogravura e desenho e onde foi diretor por quinze anos (1964 a 1979). Referindo-se a esse trabalho, Danúbio nos relata: “As artes gráficas progrediram no sentido da divulgação da imagem com a descoberta da LITOGRAFIA e LITOGRAVURA (...) Em 1962, entusiasmado com essa modalidade gráfica (tão atrativa ao desenhista e ao pintor), trabalhando com afinco, fui dominando seus segredos peculiares e alternativas. Através disso, recu- perei o processo para o nosso estado, através do Atelier Livre, onde, como diretor, criei o curso de litografia em Porto Alegre e o da Universidade Federal de Pelotas, que persistem até hoje.” (Ser ou Não Ser Arte, Danúbio Gonçalves, 2003) Em 1961, durante o movimento em defesa da “Legalidade”, foi instalado no Atelier Livre um Comitê de Propaganda e Resistência Popular, em apoio à posse de João Goulart, com forte engajamento dos artistas gaúchos, entre eles Da- núbio Gonçalves. Após o golpe militar, em abril de 1964, o Atelier Livre – dirigido por Da- núbio Gonçalves – foi fechado. Como ele mesmo nos relata, “passados alguns me- ses, com nossa surpresa, a nova direção cultural do município reabriu suas portas e fui indicado pela cantora Eni Camargo, por recomendação e aval do escultor e pro- fessor do Instituto de Artes, Fernando Corona, para assumir novamente a direção.” (Atelier Livre:30 anos. Porto Alegre: Secretaria Municipal da Cultura, 1992) A partir daí, o Atelier Livre retomou suas atividades normais, procurando driblar a censura e a repressão cultural que se abateram sobre o nosso país. A partir de meados dos anos 60, Danúbio dedicou-se mais à pintura, em quadros de temática ligada à vida rural, realizados com uma paleta cromática de tons rebaixados, como em Camponesa e Rebanho (1967). Mas, o seu olhar crítico e a denúncia social permanecem presentes. Um certo “abstratismo realista” vai marcar algumas de suas pinturas e, principalmente, litografias, no final da década de 60. Danúbio nos comenta: “Os novos rumos astronáuticos no século XX motivaram o ‘humanismo abstrato’ em minhas litografias de 1968. Fase de breve duração que afunilaria no formalismo geométrico, incompatível com o que fui e sou. A seguir, volto saudoso à figura- ção...” (Danúbio Gonçalves: caminhos e vivências. Porto Alegre: Fumproarte, 2000, p. 93.) Dedica-se à gravura, ao mosaico, ao desenho e à pintura. Nesse período, produz diversos painéis em mosaico, como na Igreja de São Roque – em Bento
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
-5-
Gonçalves –, no Santuário do Sagrado Coração de Jesus – junto ao túmulo do Pa- dre Reus, em São Leopoldo – e na Igreja de São Sebastião – em Porto Alegre. De 1969 a 1971, Danúbio lecionou gravura no Instituto de Artes da Univer- sidade Federal do Rio Grande do Sul. Entre 1970 e 1978, realizou inúmeras palestras e cursos de xilogravura, li- tografia, desenho e pintura no Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Seu ri- co currículo inclui cerca de 50 exposições individuais, uma centena de coletivas e mais de uma dezena de premiações, além de importantes participações em salões e bienais nacionais e internacionais. Em 1984, com jovens gravadores de então, fundou o Núcleo de Gravura do Rio Grande do Sul. Suas obras, além de estarem presentes em inúmeras coleções particulares, fazem parte dos acervos de instituições referenciais como o Museu Nacional de Belas Artes, o Museu de Gravura Brasileira, o Museu de Arte Moderna de São Paulo, o Museu de Arte Contemporânea de São Paulo, a Pinacoteca Municipal de São Paulo, o Museu de Arte Moderna da Bahia, o Museu de Arte Contemporânea do Paraná, o Museu de Arte de Santa Catarina, o Museu de Arte do Rio Grande do Sul, a Pinacoteca da Prefeitura de Porto Alegre, o Museu de Artes Plásticas Puch- kin (URSS), o Association des Amis de la Collection Cérès Franco (Lagrasse, França), entre outros. Por sua enorme contribuição às artes em nossa cidade e em nosso estado – como pintor, gravurista, desenhista, professor, estimulador e difusor das artes plás- ticas –, Danúbio Gonçalves recebeu da Câmara Municipal de Porto Alegre, em 1992, o título honorífico de Cidadão de Porto Alegre. No final dos anos 90, publicou o livro “Do Conteúdo à Pós-Vanguarda”, onde polemiza com à produção artística pós-moderna, carente de conteúdo, descar- tável, inconsistente e sem memória. Em 2000, por motivo das comemorações dos 75 anos de Danúbio Gonçal- ves, foi publicado o livro “Danúbio Gonçalves - caminhos e vivências”, com textos de Paulo Gomes e Norberto Stori. Essa obra foi lançada no MARGS (Porto Ale- gre), paralelamente a uma amostra retrospectiva de sua obra. Posteriormente, essa amostra foi exposta em Brasília, Rio de Janeiro, Caxias do Sul, Pelotas e Bagé. Pa- ra essas exposições, o MARGS editou o catálogo “Danúbio Gonçalves”, com qua- se 100 páginas. Ainda em 2000, Danúbio passou a fazer parte do Conselho de Arte do Rio Grande do Sul (MARGS). Em 2004, realizou uma Exposição na sede da AJURIS, ocasião em que lançou seu livro “Ser ou Não Ser Arte”, prefaciado por Affonso Romano de Sant’Anna, onde apresenta sua visão de arte, historia sua trajetória como artista
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
-6-
comprometido com os valores humanistas e polemiza com a pseudo-arte “pós- moderna”, formalista, vazia de conteúdo e de péssima qualidade que hoje prepon- dera na maioria dos salões e Bienais, no Brasil e no mundo, irrigada pelos favores do grande capital e pela mídia a ele servil. Em março de 2005, Danúbio inaugurou seu monumental painel-mural “Contribuição da Comunidade Judaica no RS - 100 Anos”, todo ele feito em lajo- tas, pintadas uma a uma, e medindo 30 metros de cumprimento por 3 metros de al- tura, colocado no “Viaduto Jorge Alberto Mendes Ribeiro” na Terceira Perimetral. Em Bagé, além de três exposições artísticas individuais, foi homenageado em 2005 como Convidado Oficial da Semana Comemorativa dos 143 anos da sua terra natal. Em outubro deste ano, no Teatro da OSPA, recebeu pelo conjunto da sua obra o “Troféu Artista do Ano”, outorgado pela Secretaria de Estado da Cultura. Da mesma forma, foi homenageado por seus 80 anos através da inaugura- ção de uma placa comemorativa na oficina de litografia do Atelier Livre da Prefei- tura de Porto Alegre Demonstrando estar em plena forma, apesar de seus 80 anos de idade, Da- núbio ilustrou inúmeras obras: “Noite”, de Érico Veríssimo (Edição Confraria dos Bibliófilos do Brasil); “Escritores de origem itálica: Armindo Trevisan, José Cle- mente Pozzenato e Sérgio Faraco” (Edição da Câmara de Comércio Italiana), a- graciado com o Troféu Melhor Livro Ilustrado (Porto Alegre); “O Rio Grande em Receitas”, de Carlos Castilho (Edição RBS). Da mesma forma, fez a capa da Revista Dom Quixote da AJURIS – come- morativa à obra de Cervantes – e as ilustrações do Calendário “50 Anos de Grama- do” (Ópera Mea, Novo Hamburgo). Incansável, Danúbio ainda ministrou um Curso de Gravura no Santander Cultural e realizou Palestra no Curso de Litografia do Atelier Livre de Porto Ale- gre Para concluir o ano com chave de ouro, foi o artista convidado da última edição de 2005 do Projeto Encontros com a Arte no Paço, em mais uma homena- gem à suas 80 primaveras.
------
Fazendo uma avaliação de sua trajetória e referindo-se à força de sua obra, Clovis Assumpção nos diz: "Danúbio Villamil Gonçalves possui uma tendência pela figura. As figuras aos grupos, deparadas e confrontadas em denso clima humano. Uma vida violenta circula entre elas, dando-lhes a condição. Figuras carregadas de vitalidade em am
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
-7-
bientes impregnados de força. Não falseia nunca. Sempre fiel ao conteúdo inviolá- vel. Este tratamento direto e carinhoso, embora de um carinho violento, às vezes, não prejudica o fundamental do pintor, não perturba sua plástica. Jamais uma con- cessão à retórica, ao literário. Sempre o roteiro árduo". (DANÚBIO Gonçalves: de- senho, gravura, pintura – 1964/1976. São Paulo: MAM, 1976) E Jacob Klintowitz (Versus: dez anos de crítica de arte. São Paulo, 1978) complementa: “A sua tendência natural é gráfica. Mesmo as pinturas – quando melhores – têm um forte acento gráfico, com definição de desenho, planos estabelecidos, valo- res de claro e escuro evidentes. A cor não oferece para esse artista um interesse vi- tal. Seu mundo percorre as linhas do desenho e da obra impressa. (...) a importân- cia desse artista sóbrio e discreto no universo gráfico brasileiro precisa, finalmente, ser lembrada. Seu trabalho registra um tipo de vida e folclore em via de desapare- cer; depois, esse trabalho envereda na abstração para retornar, enfim, a uma figura- ção mágica em que o artista encontra todos os seus desencontros e realiza uma o- bra madura e serena." Artista apaixonado, pesquisador incansável, dono de grande perfeição téc- nica, Danúbio Gonçalves foi um pioneiro em diversas técnicas. Nunca se rendeu aos modismos vazios, combatendo-os no campo da teoria com a sua crítica mor- daz. Fez parte de um grupo de artistas que fizeram oposição aberta às correntes abstratas – vazias de conteúdo – que dominaram grande parte da arte brasileira a partir do final dos anos 40 e durante toda a década seguinte. Em fins de 2003, Danúbio Gonçalves publicou Ser ou Não Ser Arte, onde denuncia os descaminhos de grande parte da assim chamada “arte contemporânea” e sua instrumentalização pelos possuidores dos grandes meios financeiros e deten- tores do quase monopólio da crítica e da mídia, que ao longo do tempo procuraram sufocar qualquer arte engajada ou comprometida com as grandes causas da huma- nidade: “No continente americano havia forte tendência dos países insurgentes para a imagem engajada politicamente (existente na importante pintura mural e na gra- vura mexicana). Exemplo que ameaçava expandir-se pelos países emergentes. Nel- son Rockefeller mandou destruir um mural de Diego Rivera que havia encomenda- do para o Rockefeller Center de Nova Iorque, porque o artista se recusou a retirar certos detalhes indigestos para os Estados Unidos. Também o grande painel ‘Pesa- delo de Guerra e o Sonho da Paz’, de Rivera, para fazer parte da arte mexicana ex- posta em Paris, foi recusado pelo governo de seu país por ‘conter ataque às potên- cias ocidentais’. Nele propunha a assinatura pela PAZ, contra o emprego da bomba atômica. Obra roubada do Museu de Belas Artes e destruída (...) Nelson Rockefel- ler receitava o abstrato, arte muda, como o figurino a ser adotado pelo artista sul-
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
-8-
americano. Critério tentado através das primeiras bienais paulistas”. (Ser ou Não Ser Arte, Danúbio Gonçalves, 2003, pp.15 e17) Essa sua denúncia é aprofundada em recente artigo para o Jornal Fala Bra- sil (100ª edição, 2005), onde faz uma dura crítica à 5ª Bienal de Porto Alegre por seu abstracionismo vazio, que entediou a todos que a visitaram: “A Quinta Bienal continua no quintal (...) quando estive lá, encontrei salões vazios ou com poucos sonolentos visitantes. (...) Confusão traumática, sabichona, prosaica, a favor da obra dita ‘contemporânea’ (adotada pela patota da curadoria). Não permitindo a ‘arte moderna’ figurar no mesmo evento. A não ser que tal sepa- ração do ‘moderno e contemporâneo’ signifique maroto expediente, para evitar confronto. Pois, lado a lado, possibilitaria verdade comparativa com certas babo- seiras apelidadas de Arte. (...) Aceitando qualquer coisa como Arte, desde que so- corrida pelo perfumado discurso conceitual. (...) ‘Novo espaço’, ‘Escultura instala- ção’, e lorotas verborrágicas. Poluindo com chapa de ferro enferrujado, dobraduras fáceis que provocaria gargalhadas aos artesãos excelentes do origame oriental. “Abstração pinçada ditatorialmente, já acontecida na primeira Bienal ban- deirante com anuência do Mr. Rockfeller, adjunto cultural da CIA (...) preocupado com o exemplo crescente do muralismo mexicano, podendo influenciar outras Américas. Apoiou, em manobra calculada, ao formalismo geométrico e ao abstra- cionismo. Saída ajustada ao propósito imperialista. Em manobras política contrária ao conteúdo social na arte. Desrespeitando o engajamento da arte, o da arte religio- sa acontecida, gerada por vários séculos, que dignificou e produziu o que de me- lhor conhecemos na história da arte universal.”
E questiona: “Como se nesses anos não existisse importante manifestação plástica di- vergente. Nitidamente uma mercossubilidade voltada para o abstrato, ignorando propositadamente a importância da arte figurativa brasileira. “O evento da mercossubilidade, apoiado e incentivado por verbas conside- ráveis, ditando verborragia cômica como ‘consistência histórica’; ‘Democratização do reconhecimento’; ‘A arte transgride fronteiras’, através de sofisticados impres- sos reforçados pelo aluguel da mídia, persistindo ao homenagear artistas escolhidos no figurino tendencioso e, às vezes, empregatício. Por isso voto no ‘Não’ à amné- sia ou ‘esquecimento’ de homenagear a Candido Portinari em pleno centenário de nosso monumental pintor. A Vasco Prado, a Carlos Scliar e a Glauco Rodri- gues. Três destacados artistas gaúchos, renomados além do RS, com vasta obra convincente e significativa por suas fases marcantes e seriedade experimental. Simpatizante do apelo abrangente à temática vital e ao conteúdo social majoritário. Por tal postura, tão alijados das Bienais e do cabresto imperialista.”
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
-9-
Para concluir essa nossa exposição de motivos, concedamos a palavra ao grande Érico Veríssimo, conforme expôs no catálogo de amostra realizada no ICBNA de Porto Alegre, em 1971: "Entre a pintura acadêmica lambida e 'bem feitas' que fotografa o mundo, e os coloridos labirintos geométricos ou caóticos de certo tipo de arte abstrata, desti- tuída de humanidade, existem – é lógico – mil outros caminhos e descaminhos. Tenho a impressão de que, para usar de uma boa expressão popular, Danúbio 'acer- tou a mão' e atingiu a plena maturidade artística nesta nova fase em que não foge ao mundo objetivo, à imagem humana nem os desfigura, mas transfigura-os poéti- ca e dramaticamente. A visão deste artista não é a da fiel câmara fotográfica nem a do espelho côncavo ou convexo que recria o mundo e a humanidade em grotescos termos de caricatura. “Danúbio consegue dar a temas regionais (veja-se, por exemplo, Picador e O Guri das Cabeças) um interesse e um sentido universais, desprezando os porme- nores de natureza puramente documentária. “Outro aspecto muito simpático da personalidade artística de Danúbio Gonçalves é sua atividade de artesão. Como os pintores renascentistas, ele mesmo prepara suas tintas, suas telas, a madeira em que faz suas gravuras; e é ele próprio quem transpõe para a pedra os seus desenhos e imprime depois suas reproduções. E com que alegria e amorosa paciência ele faz todas essas coisas! “Com seu jeitão de homem do campo, retraído e meio tímido, Danúbio vi- ve a sua vida no tom em que fala, isto é, em surdina. Guarda-se todo – força, ternu- ra, paixão, lirismo – para a sua arte. Espalha, por assim dizer, em seus quadros, to- das as economias que faz na vida cotidiana. E o resultado aí está..." Por todas as razões acima apresentadas, propomos aos nossos Pares a apro- vação do presente Projeto de Resolução, concedendo o PRÊMIO ARTÍSTICO LUPICÍNIO RODRIGUES, instituído pela Casa para agraciar, além de composito- res, músicos e poetas, também artistas plásticos de destaque no cenário rio- grandense e brasileiro, como é o insigne artista gaúcho e porto-alegrense Danúbio Gonçalves.
Sala das Sessões, 3 de janeiro de 2006.
VEREADOR RAUL CARRION
/js
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
PROJETO DE RESOLUÇÃO
Concede o Prêmio Artístico Lupicínio Rodrigues ao Artista Plástico Danúbio Villamil Gonçalves.
Art. 1º Fica concedido o Prêmio Artístico Lupicínio Rodrigues ao Artista Plástico Danúbio Villamil Gonçalves, nos termos da Resolução nº 810, de 24 de outubro de 1984.
Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.
Av. Loureiro da Silva,255 90013-901 Porto Alegre RS câ[email protected] Fone/Fax (51) 3220-410 Câmara Municipal PROC. Nº 0161/06 de Porto PR Nº 046/06 Alegre
CURRÍCULO ARTÍSTICO DE DANÚBIO GONÇALVES PREMIAÇÕES