Pobreza E Desigualdade Na Favela: Trajetórias De Mobilidade Social De Moradores Em Favelas Cariocas
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Departamento de Ciências Sociais POBREZA E DESIGUALDADE NA FAVELA: TRAJETÓRIAS DE MOBILIDADE SOCIAL DE MORADORES EM FAVELAS CARIOCAS Aluna: Viviane Costa da Silva Orientadora: Maria Sarah da Silva Telles Introdução: Ao considerarmos a desigualdade social como um dos mais preocupantes desafios da sociedade brasileira, tomamos como base para esse estudo a cidade do Rio de Janeiro, onde as desigualdades podem ser tão evidentes, quando favelas são vizinhas de condomínios luxuosos, apesar de no interior da favela moradores se depararem com imagens por algumas vezes degradantes, mas também com situações em que podem usufruir de parte da paisagem exuberante da cidade. As atividades que serão relatadas aqui fazem parte do projeto Pobreza e desigualdade na favela – trajetórias de mobilidade social de moradores em favelas cariocas, que teve seu início no ano de 2008. Já foram pesquisadas as favelas de Rio das Pedras, Morro Santa Marta, Morro da Providência, e em agosto de 2011, ano de minha entrada no projeto, a pesquisa teve início na favela do Morro do Alemão, que faz parte do Complexo do Alemão. No período em que estivemos no Morro do Alemão, fomos ao encontro de moradores tanto nas áreas mais pobres da favela, como também nas áreas mais estabilizadas, com o intuito de observar com maior clareza como cada morador percebe a sua trajetória de vida no interior dessa comunidade: as diferenças, as relações de vizinhança, sua percepção de pobreza, a mobilidade social e a situação de segregação. Essa pesquisa visa compreender alguns mecanismos sociais, principalmente aqueles que possibilitam a mobilidade social e busca evidenciar diferentes formas dessas famílias se adaptarem à pobreza ou a saírem dela. O alvo principal é buscar identificar em que condições esses moradores vivem, como se percebem, qual o seu olhar para com os outros, quais são as principais diferenças entre as gerações dessas famílias e o que pensam para o futuro. Metodologia: No período referente a dezembro de 2011 nossa pesquisa se restringiu à favela do Morro do Alemão, que está localizado na XXIX Região Administrativa de Complexo do Alemão e distante do Centro cerca de 20 Km, com um IDH de 0,711 e a expectativa de vida dos moradores desse bairro é de, aproximadamente, 65 anos. | Uma vez por semana íamos a campo, além da professora Sarah e eu, o grupo contou com o apoio do Christian, PIBIC, e com os alunos voluntários Caio e Marcos (todos estudantes do curso de ciências sociais da PUC-Rio). Nesse primeiro momento, parte do tempo também foi destinado à transcrição das entrevistas realizadas na comunidade. As perguntas foram elaboradas de forma a fazer com que os entrevistados refletissem sobre a trajetória de suas vidas e de seus familiares, tendo em vista sua condição social nos limites das favelas. A seleção das famílias ocorreu de forma aleatória, na maiorias das vezes encontrávamos com moradores pelo caminho e víamos aí uma oportunidade para o enriquecimento da pesquisa, alguns entrevistados foram indicados pelo Marcos, morador da Departamento de Ciências Sociais favela, no total foram entrevistadas cerca de vinte famílias distribuídas no espaço da comunidade. O período entre janeiro e julho de 2012 foi composto de reuniões semanais com debate de textos que nos ajudaram a ter uma maior compreensão para a elaboração sobre os dados colhidos para a pesquisa, além do trabalho de transcrição, de forma contínua. Em meio às entrevistas, percebemos também que a maior parte dos entrevistados eram do Nordeste do país, ou seus ancestrais vieram de lá. No primeiro dia em que fomos à campo na favela do Morro do Alemão, o grupo optou por conhecer o território em que íamos atuar, guiados pelo Marcos, um dos alunos voluntários, que nos apresentou um morador de origem nordestina, que por conseguinte nos apresentou sua família. Foi entrevistando essa família que começamos a perceber a dificuldade dos moradores em relação à obtenção do benefício do Programa Bolsa Família (PBF). Essa família entrevistada, constituída de pai, mãe, três filhos e um neto, sendo uma das filhas deficiente mental, havia perdido o direito ao benefício (PBF) porque uma das crianças havia faltado algumas vezes às aulas, e por sua vez, a vizinha dessa família não conseguiu fazer parte do (PBF) porque desconhecia o paradeiro do pai de seu filho, e lhe foi exigido a renda desse pai. Entrevistador- E os filhos, estudam? Resposta- Estudam Entrevistador- Você recebe o Bolsa Família, alguma ajuda? Resposta- Agora não, porque perdemos. Entrevistador (dirigindo-se a outro entrevistado) - E a sua família, recebe o benefício Bolsa Família? Resposta- Não Entrevistador- E por que? Resposta- Porque a minha mãe não sabe o paradeiro do meu pai, aí não tem como comprovar a renda. Em contrapartida, nós entrevistamos uma família em que a moradora dizia abrir mão do benefício (PBF), por acreditar que se recebesse a ajuda estaria tirando de alguém que necessitasse mais do que a família dela. Entrevistador- Como você vê o auxílio dos programas do Estado aqui no Alemão? Resposta- Eu acharia assim, que o PAC tinha que dar (...). Assim, tem muitos que moram em barracos, que moram em situações (...). Aí o que acontece então, o Bolsa Família que é para quem não tem condições, nem renda, mas muitos trabalham e ganham o Bolsa Família. Eu acho isso errado, porque aqueles que trabalham, eu acho que não tinham que ganhar. Por que? Porque além da gente, tem que olhar para trás, porque sempre tem alguém que não tem ninguém para ajudar. Entrevistador – Mas, esses muito pobres de quem você está falando, não ganham Bolsa Família? Resposta– Deve ganhar, mas nem muitos ganham a quantidade. São muitos filhos, muitos saem Departamento de Ciências Sociais para a rua para pedir, entendeu? Uma vez minha avó até me criticou. Não é crítica, vê se eu estou errada. A minha sogra, vira e mexe ajuda, então eu tenho alguém para me ajudar. Se eu não tivesse ninguém, aí sim. Mas se eu fizer eu tiro a vez de quem precisa. ( se referindo ao cadastro do Programa Bolsa Família). Dentro da favela pudemos observar grandes diferença sociais, numa relação entre “pobres” e miseráveis”; passamos por um lugar chamado Lagoinha, e a cada passo que subíamos o morro, a situação daqueles moradores parecia piorar. Notamos lugares em que parte das habitações era composta de barracos feitos uns de estuque e outros de chapa de zinco e lata. Passando por um desses lugares encontramos alguns jovens que aceitaram ser entrevistados. Essa entrevista nos chamou a atenção para o abandono precoce da escola, a falta de qualificação profissional e a falta de perspectiva daqueles jovens. Entrevistador- Quantos anos você tem? Resposta- Eu, tenho 20. Entrevistador- 20? Você parou de estudar em qual? Resposta- Eu, 5ª série. Entrevistador- Não quer pensar em voltar? Resposta- Agora não tia, eu estou pensando em voltar a estudar, mas agora não. Entrevistador- Qual é o seu sonho ? Resposta- Meu é ter uma vida melhor. Entrevistador- Como assim? Resposta- Trabalhar, ter minha família, minha casa própria, é isso. Entrevistador- Você mora com quem? Resposta- Eu? Moro eu e Deus. Entrevistador- E onde é que você mora? Resposta- Na cocheira, ali. Entrevistador- Você mora ali, perto dos cavalos? Resposta- Moro na cocheira. É impressionante constatar como o mercado imobiliário no interior da comunidade tem um custo alto, segundo os moradores esse custo se elevou a partir da entrada do Estado na comunidade. Enquanto buscávamos encontrar mais família para entrevistar, percebemos que havia muitos placas tanto de venda, como de aluguel de imóveis. Imóvel simples estava alugado por R$ 600,00, ou seja, acima do salário nacional oferecido na época, que era de R$ 545,00. Desenvolvimento da discussão da história: Segundo o livro Corporativismo e desigualdade: A construção do espaço público no Brasil, Valladares [5], em seu texto Cem anos pensando a pobreza no Brasil, nos relata que a pobreza urbana se tornou uma questão social nos anos cinquenta e sessenta, mas que a partir dos anos 30 a pobreza começa a se estampar sob a forma espacial de favela. Em entrevistas na favela do Morro do Alemão ficou notória a situação precária do trabalhador, onde os idosos eram aposentados e os mais jovens, em sua maioria, estavam desempregados ou obtinham algum tipo de trabalho informal. Departamento de Ciências Sociais Ainda segundo relato de Valladares, “os pobres passaram a ser compreendidos enquanto massa dos excluídos, dos marginalizados, colocados na periferia do sistema econômico com direito à participação restrito, quando muito à situação do subemprego”. Para a autora o termo “favelado” passou a ser sinônimo de “pobre”, e o espaço-favela ganhou atributos de cortiço, não no que se refere a epidemias, mas no que diz respeito a habitações precárias, à precariedade do saneamento básico, à falta de serviços essenciais. Segundo Saravi [2], citando dois outros autores (Rodgers, 1995, Maguire e Maguire, 1997), afirma que “os principais motores de exclusão social são o desemprego e a precariedade social do trabalho entre grupos de trabalhadores previamente integrados e as dificuldades que os novos trabalhadores enfrentam para ingressar no mercado de trabalho”. A reflexão desses autores ficou bem clara quando nos deparamos com a realidade do Morro do Alemão, onde muitos estão desempregados, sendo obrigados então ao trabalho informal. Quando conseguem, quando os jovens têm algum projeto de vida, sofrem com a carência de qualificação profissional, por isso se submetem a subemprego, a qualquer “bico” em busca de sua sobrevivência e de sua família. Encontramos crianças tomando conta de outras crianças para que seus pais pudessem trabalhar, por exemplo. Entrevistador- São quantos filhos, sua mãe? Resposta- Comigo seis. Entrevistador- Você estuda em que série? Resposta P- Eu estudo no 7º ano, na 6ª série, eu estudo em Vila Isabel Entrevistador- E a sua mãe trabalha aonde? Resposta- Na Tijuca Entrevistador- O que ela faz, você sabe? Resposta- Ela trabalha na faxina, ela trabalha de 7 às 16hs Entrevistador- Mas, como é que você tem tempo de estudar, cuidar de 3 irmãos, da cachorra? Resposta- O meu irmão quando está aqui.