8 cm 16,7cm x 24cm 33 mm 16,7cm x 24cm 8 cm

Outros livros Índice da obra LIDEL NEURO C

NEUROCIÊNCIAS Capítulos

Parte I 1 Anatomia do sistema nervoso Este é um livro de texto abrangente destinado principal- Ana Cristina Rego 2 Células do sistema nervoso mente a estudantes das áreas da saúde, sobretudo Centro de Neurociências 3 Transporte axonal medicina e ciências biomédicas, no estudo das neuroci- e Biologia Celular (CNC) 4 Mielina e patologias associadas ências, neuroanatomia, neurofisiologia e neurobiologia. da Universidade de Coimbra; 5 Sinapse 6 Glutamato Dada a forma como foi concebido, é também uma refe- Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. 7 Ácido gama-aminobutírico rência para os profissionais e estudantes das áreas da 8 Acetilcolina

psicologia, biologia celular, bioquímica, biologia mole- IÊNCIAS 9 Catecolaminas Carlos B. Duarte cular, genética, ciências farmacêuticas e outras áreas 10 Serotonina Centro de Neurociências da ciência relacionadas com as neurociências. 11 Sistema purinérgico e Biologia Celular (CNC) 12 Neuropéptidos Esta obra foi escrita por destacados professores, investi- da Universidade de Coimbra; 13 Fatores neurotróficos Departamento de Ciências 14 Fases iniciais do desenvolvimento gadores e profissionais especializados nos tópicos que da Vida da Faculdade do sistema nervoso redigiram, sendo coordenada por três conceituados de Ciências e Tecnologia 15 Sinaptogénese investigadores da Universidade de Coimbra. Os capítulos da Universidade de Coimbra. 16 Plasticidade sináptica são profusamente ilustrados com figuras originais que 17 Sistemas de memória 18 Sistema visual descrevem os conceitos teóricos abordados pelos autores Catarina R. Oliveira 19 Sistemas auditivo e vestibular e que foram elaboradas por profissionais que se dedicam Centro de Neurociências NEURO 20 Sistemas olfativo e do paladar ao estudo e investigação na área, o que as tornam únicas. e Biologia Celular (CNC) 21 Movimento voluntário no ser humano da Universidade de Coimbra; Os conteúdos estão organizados em duas partes: uma Faculdade de Medicina Parte II dedicada ao desenvolvimento, à estrutura e à função do da Universidade de Coimbra; 22 Resposta neuronal ao stress sistema nervoso, e outra mais orientada para a clínica. Unidade para a Inovação Ê 23 Mecanismos de perceção da dor e Desenvolvimento (UID), 24 Esquizofrenia

Catarina R. Oliveira CIENCIAS

Ana Cristina Rego 25 Transtorno do espectro do autismo Acreditamos que esta obra, atual e rigorosa, será um mar- Centro Hospitalar e Universi- Carlos B. Duarte 26 Epilepsia co na história das neurociências em língua portuguesa. tário de Coimbra (CHUC). Coordenação: 27 Morte celular do sistema nervoso 28 Acidente vascular cerebral e isquémia neuronal Ana Cristina Rego 29 Envelhecimento cerebral e doença de Alzheimer Carlos B. Duarte 30 Doenças de priões ou encefalopatias Catarina R. Oliveira espongiformes transmissíveis Glossário disponível em www.lidel.pt, 31 até o livro se esgotar ou ser publicada Doença de Parkinson e outras uma nova edição atualizada ou com síndromes parkinsonianas alterações 32 Esclerose lateral amiotrófica 33 Doenças de expansão de poliglutaminas ISBN 978-972-757-693-7 34 Polineuropatia amiloidótica familiar 35 Neurogénese e terapia celular do cérebro www.lidel.pt 9 789727 576937 www.lidel.pt 36 Terapia génica de doenças neurodegenerativas © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS 15 Sinaptogénese...... 269 14 Fases iniciais dodesenvolvimento dosistema nervoso 13 Fatores neurotróficos 12 Neuropéptidos 11 Sistema purinérgico 10 Serotonina PARTE I eabreviaturasSiglas Prefácio Autores Índice 17 Sistemas dememória 16 Plasticidade sináptica 6 Glutamato 5 Sinapse 4 Mielina epatologias associadas 3 Transporte axonal dosistema2 Células nervoso 9 Catecolaminas 8 Acetilcolina 7 Ácido gama-aminobutírico 1 Anatomia dosistema nervoso António Mateus-Pinheiro,LuísaPinto, NunoSousa Sandra D.Santos,JoanaS.Ferreira, AnaLuísaCarvalho Maria JoanaPinto,LuísF.Martins, LuísLeitão,RamiroD.Almeida Domingos Henrique,CatarinaRamos Carlos B.Duarte Ildete L.Ferreira,EmíliaP.Duarte,DiogoComprido,GraçaBaltazar, AnaCristina Rego, Sara Xapelli,AnaPaulaSilva Ana M.Sebastião,RodrigoA.Cunha João PauloCapela,FélixDiasCarvalho Joana RosmaninhoSalgado,CláudiaCavadas João MiguelCordeiro,PauloCorreia-de-Sá Paula Agostinho,InêsPombinhodeAraújo Sandra D.Santos,AnaLuísaCarvalho Luís F.Martins,EmíliaP.Duarte,RamiroD.Almeida Joana PaesdeFaria,FilipaNeto,NunoG.Dias,JoãoBettencourtRelvas Diogo Comprido,MirandaMele,GracianoLeal,JoanaS.Ferreira,CarlosB.Duarte Fernanda Marques,JoanaAlmeidaPalha,JoãoCarlosSousa Miguel Castelo-Branco ...... 253 307 289 193 125 149 103 231 213 167 XII XI 57 17 71 37 85 V 1 IV Índice remissivo 36 Terapia génica neurodegenerativas...... dedoenças 663 35 Neurogénese eterapia celular docérebro 34 Polineuropatia amiloidótica familiar deexpansão depoliglutaminas33 Doenças lateral32 Esclerose amiotrófica deParkinson31 Doença eoutras síndromes parkinsonianas ou depriões encefalopatias30 Doenças espongiformes transmissíveis 29 Envelhecimento cerebral deAlzheimer edoença 28 Acidente cerebral vascular eisquémia neuronal 27 Morte celular dosistema nervoso 26 Epilepsia 25 Transtorno doautismo doespectro 24 Esquizofrenia 23 Mecanismos dor da de perceção neuronal22 Resposta aostress PARTE II 21 Movimento voluntário humano no ser 20 Sistemas olfativo edopaladar 19 Sistemas auditivo evestibular 18 Sistema visual Liliana S.Mendonça,LuísPereiradeAlmeida Ana CristinaRego Sofia Grade,AlexandraIsabelRosa,AnaC.Silva,LilianaBernardino, JoãoO.Malva, Maria JoãoSaraiva Ana CristinaRego,AndreiaTeixeira-Castro,PatríciaMaciel Júlia Costa,MamededeCarvalho Tiago FlemingOuteiro,DianaF.Lázaro,JoaquimJ.Ferreira Paula Agostinho,JoãoPedroLopes Cláudia M.F.Pereira,CatarinaR.Oliveira Armanda E.Santos,CarlosB.Duarte,AnaCristinaRego Ana FilipaNunes,RitaM.Ramalho,CecíliaP.Rodrigues Raquel Ferreira,LilianaBernardino,SaraXapelli Joana Fernandes,LaraFranco,JoãoPeça Gladys Caldeira,AnaLuísaCarvalho,JoãoPeça Isaura Tavares,DeolindaLima,ArmandoAlmeida Pedro Morgado,JoãoJ.Cerqueira,NunoSousa Carlota VicenteCunha,JoãoMassano Paulo F.Santos Inês PombinhodeAraújo,CaetanaMonteiroCarvalho Ana RaquelSantiago,MiguelCastelo-Branco,FranciscoAmbrósio ...... Neurociências ...... 575 513 541 591 641 605 413 629 497 461 349 369 381 437 683 483 325 401 561

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© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS sidade doMinho.sidade Instituto de Investigação emCiências Vida da e Saúde (ICVS) de Medicina – Escola Univer da António Mateus-Pinheiro doMinho.sidade Instituto de Investigação emCiências Vida da e Saúde (ICVS) de Medicina – Escola Univer da Andreia Teixeira-Castro versidade deCoimbra. Instituto deImagem Biomédica eCiências Vida da (IBILI) Faculdade da deMedicina Uni da - Ana Santiago Raquel Medicina Universidade da deCoimbra. versidade deCoimbra; Instituto deFarmacologia e Terapêutica Faculdade da de Experimental Instituto deImagem Biomédica eCiências Vida da (IBILI) Faculdade da deMedicina Uni da - Ana Paula Silva tituto deFarmacologia eNeurociências Faculdade da deMedicina Universidade da deLisboa. Unidade deNeurociências doInstituto deMedicina Molecular Universidade da Ins deLisboa; - Ana M.Sebastião de Ciências Vida da Faculdade da deCiências eTecnologia Universidade da deCoimbra. Centro deNeurociências eBiologia Celular (CNC) Universidade da deCoimbra; Departamento Ana Luísa Carvalho versidade deLisboa. Instituto deInvestigação doMedicamento (iMed.ULisboa) Faculdade da deFarmácia Uni da - Ana Nunes Filipa Centro deNeurociências eBiologia Celular (CNC) Universidade da deCoimbra. Ana C.Silva versidade deLisboa. Instituto deInvestigação doMedicamento (iMed.ULisboa) Faculdade da deFarmácia Uni da - IsabelAlexandra Rosa AUTORES Centro Hospitalar eUniversitário deCoimbra (CHUC). Medicina Universidade da deCoimbra; Unidade para aInovação eDesenvolvimento (UID), Centro deNeurociências eBiologia Celular (CNC) Universidade da deCoimbra; Faculdade de OliveiraCatarina R. de Ciências Vida da Faculdade da deCiências eTecnologia Universidade da deCoimbra. Centro deNeurociências eBiologia Celular (CNC) Universidade da deCoimbra; Departamento B. Duarte Carlos Medicina Universidade da deCoimbra. Centro deNeurociências eBiologia Celular (CNC) Universidade da deCoimbra; Ana Cristina Rego COORDENADORES/AUTORES Autores

Faculdade de - - Neurociências VI

Armanda E. Santos Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra. Armando Almeida Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. Caetana Monteiro de Carvalho Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra. Carlota Vicente Cunha Serviço de Neurologia do Hospital de Santo António, Centro Hospitalar do Porto. Catarina Ramos Champalimaud Research, Champalimaud Centre for the Unknown – Lisboa. Cecília M. P. Rodrigues Instituto de Investigação do Medicamento (iMed.ULisboa); Departamento de Bioquímica e Bio- logia Humana da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa. Cláudia Cavadas Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra. Cláudia M. F. Pereira Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Deolinda Lima Instituto de Biologia Celular e Molecular (IBMC) e Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto; Departamento de Biomedicina da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Diana F. Lázaro Department of Neurodegeneration and Restorative Research, University Medical Center Goet- tingen, Germany. Diogo Comprido Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra. Domingos Henrique Instituto de Histologia e Biologia do Desenvolvimento da Faculdade de Medicina da Universi- dade de Lisboa. Emília P. Duarte Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; Departamento de Ciências da Vida da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Félix Dias Carvalho Unidade de Ciências Biomoleculares Aplicadas (UCIBIO); Rede de Química e Tecnologia (REQUIMTE); Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Farmácia da Universi- dade do Porto. Fernanda Marques Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. Filipa Neto Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) e Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Autores

VII

Francisco Ambrósio Instituto de Imagem Biomédica e Ciências da Vida (IBILI) da Faculdade de Medicina da Uni- versidade de Coimbra. Gladys Caldeira Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III-Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Graça Baltazar Centro de Investigação em Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior (CICS-UBI), Covilhã. Graciano Leal Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Ildete L. Ferreira Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Inês Pombinho de Araújo Centro de Investigação Biomédica (CBMR) da Universidade do Algarve; Departamento de Ciências Biomédicas e Medicina da Universidade do Algarve. Isaura Tavares Instituto de Biologia Celular e Molecular (IBMC) e Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto; Departamento de Biomedicina da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Joana Almeida Palha Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. Joana Fernandes Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Joana Paes de Faria Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) e Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto. Joana Rosmaninho Salgado Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra. Joana S. Ferreira Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra. João Bettencourt Relvas Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) e Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto. João Carlos Sousa Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. João J. Cerqueira Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. João Massano Serviço de Neurologia do Hospital Pedro Hispano, Unidade Local de Saúde de Matosinhos; De- partamento de Neurociências Clínicas e Saúde Mental da Faculdade de Medicina da Universi- dade do Porto; Centro de Neurociências do Hospital CUF Porto. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências VIII

João Miguel Cordeiro Unidade Multidisciplinar de Investigação Biomédica (UMIB) – Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto. João O. Malva Instituto de Imagem Biomédica e Ciências da Vida (IBILI) da Faculdade de Medicina da Uni- versidade de Coimbra. João Paulo Capela Unidade de Investigação UFP em Energia, Ambiente e Saúde (FP-ENAS), Centro de Estudos em Biomedicina (CEBIMED) – Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Fernando Pessoa; Unidade de Ciências Biomoleculares Aplicadas (UCIBIO); Rede de Química e Tecnologia (RE- QUIMTE); Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto. João Peça Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. João Pedro Lopes Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Joaquim J. Ferreira Laboratório de Farmacologia Clínica e Terapêutica, Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa. Júlia Costa Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier da Universidade Nova de Lisboa. Lara Franco Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Liliana Bernardino Centro de Investigação em Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior (CICS-UBI), Covilhã. Liliana S. Mendonça Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Luís F. Martins Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Luís Leitão Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra. Luís Pereira de Almeida Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; Faculdade de Farmácia da Universidade de Coimbra. Luísa Pinto Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. Mamede de Carvalho Departamento de Neurociências do Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa Norte, EPE; Instituto de Medicina Molecular da Universidade de Lisboa; Instituto de Fisiologia da Fa- culdade de Medicina da Universidade de Lisboa. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Autores

IX

Maria Joana Pinto Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Maria João Saraiva Unidade de Neurobiologia Molecular, Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) e Insti- tuto de Inovação e Investigação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto. Miguel Castelo-Branco Instituto de Ciências Nucleares Aplicadas à Saúde (CiBIT, ICNAS) e Instituto de Imagem Biomé- dica e Ciências da Vida (IBILI) da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Miranda Mele Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III – Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Nuno G. Dias Instituto de Biologia Molecular e Celular (IBMC) e Instituto de Investigação e Inovação em Saúde (i3S) da Universidade do Porto. Nuno Sousa Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. Patrícia Maciel Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. Paula Agostinho Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Paulo Correia-de-Sá Unidade Multidisciplinar de Investigação Biomédica (UMIB) – Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto. Paulo F. Santos Instituto de Imagem Biomédica e Ciências da Vida (IBILI) da Faculdade de Medicina da Univer- sidade de Coimbra; Departamento de Ciências da Vida, Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra. Pedro Morgado Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde (ICVS) – Escola de Medicina da Univer- sidade do Minho. Raquel Ferreira Centro de Investigação em Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior (CICS-UBI), Covilhã. Ramiro D. Almeida Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; III-Instituto de Investigação Interdisciplinar da Universidade de Coimbra. Rita M. Ramalho Instituto de Investigação do Medicamento (iMed.ULisboa) da Faculdade de Farmácia da Uni- versidade de Lisboa. Rodrigo A. Cunha Centro de Neurociências e Biologia Celular (CNC) da Universidade de Coimbra; Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS X (azul). proximal dosaxónios (tubulina β-III,averde). Os núcleos dascélulas corados estão com DAPI desenvolvem várias dendrites (MAP2,avermelho) eumaxónio. Afigura mostra a apenas região CulturaLegenda: deneurónios dehipocampo derato emcâmaras microfluídicas. Os neurónios Universidade deCoimbra Autores: Maria Joana Pinto eRamiro –Centro Almeida deNeurociências eBiologia Celular, ILUSTRAÇÃO DASENTRADASDECAPÍTULODAPARTE II marcadosestão (DAPI). aazul bulina, a vermelho) em neurónios de hipocampo de rato em cultura. Os núcleos dos neurónios MarcaçãoLegenda: de terminais pré-sinápticos (sinapsina, a verde) ao longo de neurites (tu- Universidade deCoimbra Autores: Maria Joana Pinto eRamiro –Centro Almeida deNeurociências eBiologia Celular, ILUSTRAÇÃO DASENTRADASDECAPÍTULODAPARTEI núcleos ilustram (aazul) Ocerebelo parietal. olobo ésimbolizado por células linfoblastoides. axonais. No occipital lobo emedula espinhal, representadas estão células estriatal, dotipo cujos nios GABAérgicos doestriado, enquanto aregião temporalpelas suasmitocôndrias édefinida funcional. arefletirmodo afrontal A especialização respetiva região é representadapor neuró- por diferentes decélulas tipos (imagens obtidas através demicroscopia defluorescência), de ilustra Afigura as principaisLegenda: central,áreas dosistema elobos representadasnervoso deMedicina,dade Universidade deCoimbra Autores: Luana Naia e Ana Cristina Rego – Centro de Neurociências e Biologia Celular e Facul- Título: ILUSTRAÇÃO DACAPA CRÉDITOS DASIMAGENS tingen, Germany. Department of Neurodegeneration and Restorative Research, University Medical- Center Goet Tiago Fleming Outeiro Munich, Germany. Helmholtz München Zentrum (HZ), Munich, Ludwig-Maximilians Germany; – University of Sofia Grade tituto deFarmacologia eNeurociências Faculdade da deMedicina Universidade da deLisboa. Unidade deNeurociências doInstituto deMedicina Molecular Universidade da Ins deLisboa; - Xapelli Sara eUniversitáriotalar deCoimbra (CHUC). Centro deNeurociências eBiologia Celular (CNC) Universidade da deCoimbra; Centro Hospi - D.Sandra Santos “As diferentes cores docérebro medula eda espinhal” Neurociências

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© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Prefácio entradas doscapítulos (Maria Joana Pinto Universidade eRamiro da Almeida, deCoimbra). a colaboração dosautores dasimagens capa da (Luana Naia, Universidade da deCoimbra) e Neurociências eBiologia Celular (CNC) Universidade da deCoimbra. Agradecemos também patrocinadores,tribuição dosseus nomeadamente BIAL, Janssen Neuroscience eoCentro de nais na área Saúde. da em português nesta área doconhecimento, epossibilitando aatualização científica de profissio- cias Biomédicas, Psicologia, Enfermagem eafins,permitindo colmatar a de necessidade textos dicina Veterinária, Biologia, Bioquímica, Ciências Farmacêuticas, Engenharia Biomédica, Ciên- ter sidoabordados.tes, poderiam tando conscientes deque obra esta não éexaustiva eque muitos outros temas, também relevan- menos (subdividida em pelo dois básica componentes)curricular na área deNeurociências, es- do foroem doenças neurológico. Estes os fundamentos são alicerçar que uma poderão unidade finalizando comda a neurogéneseregulação cerebralpotencial ea da aplicação terapia génica cas, deentre as quais incluem se oacidente cerebral vascular neurodegenerativas, eas doenças assim como osmecanismos demorte celular easua relevância emdiversas neurológi doenças - disfuncionais epatológicos aostress, associados dor (neuro)psiquiátricas edoenças eepilepsia, o controlo domovimento. Numa parte, compilou-se segunda informação sobre osprocessos e moleculares que determinam a formação memória, da a regulação dos principais sentidos e a análise dosprocessos de desenvolvimento neuronal eformação desinapses, celulares as bases deneurotransmissãocessos deneurotransmissores eaação eneuromoduladores, assim como creverem organizam como omodo se central osistema eperiférico nervoso efuncionam, ospro- impactos mundial. acimamédia da nível deprodução científicadas demais se destaca que áreas doconhecimentopor apresentar obra éum reflexoda investigação vitalidade da nesta área em Portugal, se que repercute num especializaram emdiferentes domínios doconhecimento dasNeurociências. No conjunto, esta mero deinvestigadores edocentes dediversos centros deinvestigação euniversidades que se temas área da deNeurociências, agregando, anível nacional, oscontributos deum grande nú- De salientarDe que aelaboração de parte das ilustrações não sido possível teria a con sem - Este livro tem como público-alvo estudantes do1.ºao3.ºciclo nas áreas deMedicina eMe- Na primeira partedeste compêndio, osvários capítulos foram organizados deforma ades- Este livro tem como principal objetivo reunir a informação mais relevante sobre diferentes Ana Cristina Rego, Carlos B. Duarte eCatarina Oliveira R. Os coordenadores obra, da 1 Miguel Castelo-Branco Anatomia do sistema nervoso – Os novos paradigmas de estudo da anatomia funcional do sistema nervoso: arquitetura básica e o exemplo do sistema visual

SUMÁRIO A compreensão plena da organização do sistema nervoso, nas suas vertentes de sentir, integrar e gerar respostas motoras, pressupõe a integração dos conceitos expostos neste capítulo com o conhecimento da estrutura básica dos neurónios e fibras nervosas, abordada no Capítulo 2 – “As células do sistema nervoso”. Este capítulo começa por descrever a organização macroscópica básica do sistema nervoso em termos da função que lhe é subjacente. O conhecimento da anatomia é de facto indissociável de uma correlação com a fisiologia, e seguimos essa filosofia na apresentação dos factos anatómicos, pelo que este texto deve ser lido sempre numa perspetiva anatomofisiológica, que é a abordagem que consideramos mais adequada. Na parte final deste capítulo discutimos a importância dos novos paradigmas de estudo de organização funcional do sistema nervoso, numa perspetiva microanatómica que acentua o paradigma de estudo neuroanatómico baseado na análise de correlações estrutura-função. A bibliografia recomendada si- tua-se nestas vertentes – desde referências básicas sobre a organização macroscópica1,2 e funcional3,4,5, até referências muito recentes sobre o estado da arte da compreensão da anatomofisiologia dos cir- cuitos cerebrais6. É dada ênfase aos princípios de organização estrutural e funcional, nomeadamente o princípio da modularidade dos circuitos cerebrais e do processamento distribuído e em paralelo (usando vias alternativas) da informação no sistema nervoso. Anatomia do sistema nervoso

3

A Sistema nervoso B

CN I

Estrutural Funcional CN II CN III CN IV CN V Central Autónomo CN VII CN VI CN VIII CN IX CN XI C1 CN X 2 Periférico Somático CN XII 3 4 5 6 7 8 Figura 1.1 A: Dicotomias estruturais (SNC versus T1 SNP) e funcionais (sistema nervoso somático ver- 2 sus autónomo) do sistema nervoso. B: Ilustração do 3 4 SNC e do SNP com relevo para os 12 pares de ner- 5 vos cranianos (I a XII) e os 31 nervos espinhais. 6 7 8 9 a homeostasia e as funções internas do corpo 10 (ritmo cardíaco, pressão arterial, digestão, etc.). O componente simpático do sistema ner- 11 voso autónomo prepara a resposta de “luta ou 12 foge” (“fight or flight”), enquanto o ramo pa- L1 rassimpático prepara o corpo para o repouso 2 quer em situação de relaxamento quer durante Nervos espinhais: a digestão. Estes sistemas interatuam de forma 3 • 8 cervicais • 12 torácicos coordenada. • 5 lombares 4 • 5 sagrados • 1 coccígeo 5 1. ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL S1 2 3 1.1. Principais divisões do sistema 4 nervoso central 5

Os hemisférios cerebrais constituem a maior parte do cérebro e são constituídos pelo córtex cerebral, núcleos como os gânglios da base, feixes de fibras nervosas e ventrículos O córtex cerebral é composto pelos lobos (contendo líquido cefalorraquidiano). Existem frontal (porção mais anterior), parietal (pós- duas divisões principais do cérebro anterior: tero-lateral), occipital (porção mais posterior) diencéfalo e telencéfalo. O telencéfalo contém e temporal (ínfero-lateral) que albergam con- a parte mais substancial do cérebro, o córtex juntos de áreas cuja função é discutida em se- cerebral. guida. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências 28

Membrana aracnoide Espaço subaracnoide 1

2 Composição celular das barreiras do cérebro

3

LCR

Membrana 1 aracnoide

Plexo coroide Célula 2 Sentido da circulação do LCR endotelial

Figura 2.4 Localização e constituição da barreira hematoencefálica e da barreira sangue-LCR. Ao nível das meninges é a membrana arac- 3 noide que separa os capilares sanguíneos fenestrados da dura-máter Células epiteliais do plexo coroide do parênquima cerebral (1). Nesta região, as células endoteliais dos vasos sanguíneos possuem entre si junções apertadas que asseguram a função de barreira (2). Ao nível dos plexos coroides os capilares são Junção apertada igualmente fenestrados (3), sendo neste caso as células epiteliais dos 1, 3 Barreira sangue-LCR plexos coroides que constituem a barreira que separa o sangue do LCR. 2 Barreira hematoencefálica Nos órgãos circunventriculares (não evidenciados na figura) existem neurónios especializados capazes de monitorizar diretamente os con- teúdos da corrente sanguínea e em resposta secretar substâncias para o sangue. O endotélio nestas regiões do cérebro é fenestrado, per- mitindo comunicação pontual nestas zonas. No entanto, estes locais estão separados do resto de cérebro devido à existência de células ependimais modificadas – os tanícitos.

2.1. A barreira hematoencefálica separa devido à existência de junções apertadas entre o sangue do parênquima cerebral as células endoteliais, ausência de fenestrações e escassa atividade de pinocitose13. As junções A barreira hematoencefálica está presente apertadas são formadas por diferentes proteí- na grande maioria dos capilares que irrigam nas transmembranares (ocludinas, claudinas e o parênquima cerebral e é formada pelas cé- outras) que se localizam entre as células e que lulas endoteliais dos capilares sanguíneos. se encontram ligadas a proteínas do citoesque- O endotélio dos capilares cerebrais difere do leto através de proteínas intermédias (Figura

endotélio da maioria dos outros capilares 2.5). Estas proteínas de junção impedem o © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Transporte axonal

41

A Sobreposição

10 μm

Faloidina-FITC

VGLUT

MAP2

B Sobreposição

10 μm

VGAT

GABAAR γ2

MAP2

Figura 3.3 Distribuição das sinapses e do citoesqueleto ao longo das dendrites de neurónios do hipo- campo em cultura. A: Distribuição das sinapses glutamatérgicas e do citoesqueleto de actina. Os neurónios do hipocampo foram mantidos em cultura durante duas semanas e depois de fixados com paraformaldeído foram incubados com anticorpos contra a proteína dendrítica MAP2 (azul) e contra o transportador vesi- cular do glutamato do tipo 1 (VGLUT; vermelho). A distribuição dos microfilamentos foi visualizada com faloidina (conjugada com um fluoróforo verde – FITC), que se liga a F-actina. A preparação foi visualizada num microscópio de fluorescência. As imagens à direita correspondem a uma ampliação da área limitada pelo retângulo na figura da esquerda. As setas amarelas indicam regiões contendo transportadores vesicu- lares do glutamato numa posição adjacente a espículas dendríticas, correspondendo a sinapses excitatórias possivelmente funcionais. As setas brancas apontam para protusões filamentosas das dendrites. Escala = 10 μm. B: Distribuição das sinapses GABAérgicas em neurónios do hipocampo de rato em cultura. As células foram mantidas em cultura durante duas semanas e depois de fixadas com paraformaldeído foram incu- badas com anticorpos contra a proteína dendrítica MAP2 (azul), contra o transportador vesicular do ácido gama-aminobutírico (GABA) (VGAT; verde) e contra as subunidades gama 2 dos recetores do GABA do tipo

A (GABAAR γ2; vermelho). A preparação foi visualizada num microscópio de fluorescência. As imagens à di- reita correspondem a uma ampliação da área limitada pelo retângulo na figura da esquerda. Escala = 10 μm. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências 68

de indivíduos no mundo e cerca de 8000 em Os axónios são relativamente poupados, Portugal (números da Sociedade Portuguesa pelo menos no início. Contudo, mesmo nas de Esclerose Múltipla à data desta publicação), lesões inativas, ocorre perda axonal ao longo e nas sociedades ocidentais é a primeira causa do tempo, que é hoje considerada a principal não traumática de incapacidade neurológica causa de lesão clínica irreversível. A causa da no adulto jovem. neurodegeneração na esclerose múltipla não é As primeiras manifestações da doença sur- bem conhecida; pensa-se que seja secundária gem habitualmente entre os 20 e os 40 anos. à desmielinização, mas também pode ser cau- O seu curso é variável; 80 a 90% dos doentes sada pela inflamação ou por lesão direta dos inicialmente experimentam uma fase de agra- axónios durante o ataque imunológico. vamento neurológico por surtos, com recupe- Há estudos que sugerem haver uma capa- ração espontânea parcial ou total, e estabilidade cidade inata robusta e eficaz de remielinização clínica durante a fase de remissão. No entanto, no SNC, mas que, por motivos pouco com- a maioria destes doentes evolui ao longo do preendidos, falha ou é incompleta na esclerose tempo para uma fase de deterioração neuroló- múltipla; com efeito, nesta doença a remielini- gica irreversível e progressiva (a chamada forma zação é extensa em apenas cerca de 20% dos secundariamente progressiva da doença). Em doentes17. Como tal, desenvolver estratégias 10 a 20% dos casos a doença é primariamente que promovam a remielinização parece ser um progressiva. Os sinais e sintomas dependem da objetivo terapêutico promissor – não só por localização e gravidade das lesões. A doença in- permitir restaurar a condução neuronal, mas terfere com a capacidade de locomoção e equi- também pelo papel neuroprotetor18. líbrio, afeta a sensibilidade, a visão e outras fun- ções. A fadiga está presente em quase todos os doentes. A memória, a atenção e a capacidade 12. MIELINA NA COGNIÇÃO, MEMÓRIA de resolver problemas são também afetadas. E DOENÇAS PSIQUIÁTRICAS Inicialmente considerado o protótipo de doença inflamatória crónica do SNC, a demons- Observações feitas nos últimos anos têm tração da lesão e perda axonal nas placas de revelado a importância da mielinização para esclerose múltipla levou ao reconhecimento da as funções cognitivas e de aprendizagem. Sa- natureza também neurodegenerativa da doença. be-se, por exemplo, que a capacidade de apren- A(s) causa(s) da esclerose múltipla não é/ dizagem de atividades motoras complexas em são completamente conhecida(s), e a heteroge- ratinhos envolve a produção de oligodendróci- neidade dos achados histopatológicos obtidos tos e nova mielina no cérebro adulto19. através de biopsias e autópsias de doentes le- Como referimos anteriormente, doenças vantou a possibilidade de não ser transversal a causadas primariamente por alterações da mie- todos os doentes. A teoria geralmente aceite é a lina associam-se, por vezes, a défices cognitivos de se tratar de uma doença autoimune na qual e alterações neuropsiquiátricas. Várias doenças linfócitos T reativos contra a mielina desem- psiquiátricas, entre outras a esquizofrenia, a penham um papel central. Ainda que várias depressão, a doença bipolar ou a perturbação linhas de evidência sejam a favor desta teoria, obsessivo-compulsiva, foram mais recente- não há ainda uma prova direta da origem au- mente associadas a defeitos na matéria branca. toimune da doença. Outras hipóteses são a de Em várias doenças psiquiátricas há alteração ter uma origem imune mas não autoimune, da expressão de genes relacionados com a mie- relacionada com uma infeção viral crónica, ou lina e com os oligodendrócitos, e sabe-se atual- ser causada primariamente pela lesão dos oli- mente que polimorfismos em genes da mielina godendrócitos, sendo a resposta inflamatória são fatores de risco para o desenvolvimento um evento secundário. de esquizofrenia, depressão e perturbação © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Sinapse

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de transporte mais importante é a bomba de características estruturais comuns. Nos ter- protões, que gera o gradiente eletroquímico minais pré-sinápticos de sinapses glutamatér- necessário para que ocorra a captação dos gicas, a concentração de glutamato no citosol neurotransmissores para o interior das vesí- (cerca de 10 mM) é inferior à concentração culas sinápticas (Figura 5.4). Outras proteínas deste neurotransmissor no interior das vesícu- de transporte importantes nestes organelos las sinápticas (60 a 250 mM)14. O isolamento são os transportadores de neurotransmisso- vesicular dos neurotransmissores do citosol res, que vão definir o tipo de terminal nervoso. permite ainda a proteção destes compostos da Por exemplo, num terminal nervoso glutama- degradação por enzimas e toxinas presentes no térgico as vesículas sinápticas possuem trans- citosol. Além do mais, a acumulação dos neu- portadores vesiculares de glutamato (Figura rotransmissores nas vesículas permite também 5.4). Por seu lado, as proteínas transportado- uma maior regulação da sua libertação para o ras são bastante heterogéneas e não possuem espaço extracelular.

Rab3 CSP Cinase II dependente GTP de Ca2+ – calmodulina

Snapin H+ Bomba H+ de protões H+ H+ H+ H+ H+ H+ H+ H+ H+ H+ H+

Sinapsina

VGLUT

SV2

Sinaptobrevina Sinaptotagmina

Sinaptofisina

Figura 5.4 Representação esquemática de uma vesícula sináptica. As vesículas sinápticas contêm no seu interior uma elevada concentração de neurotransmissores, que lhes confere várias vantagens funcionais. Apesar de ser uma estrutura de dimensões reduzidas, possui diversas proteínas associadas à sua membrana e que estão envolvidas em vários processos, como o enchimento das vesículas com os neurotransmisso- res, o transporte das vesículas para as zonas ativas e o processo de exocitose. Podem ser ainda proteínas transmembranares (VGLUT, VGAT, sinaptotagmina, VAMP/sinaptobrevina, sinaptofisina, sinaptogirina, SV2, SCAMP), proteínas membranares (sinapsina e rabfilina) ou proteínas associadas a vesículas através de

© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS modificações lipídicas pós-transducionais (CSP, proteínas rab). Glutamato

87

SN Glutamina Gln sintetase Glu

K+ 20 mM Glu Astrócito

Km = = 1 - 100 μM EAAT

EAAT Glu-/3Na+/H+ NMDAR SA

pré-sináptico VGLUT Neurónio Glutaminase Glu Gln Neurónio AMPAR pós-sináptico -

Km = 1-2 mM Glu- NMDAR - EAAT 10-15 mM Glu

+ ADP + Pi

H 1-2 μM Glu

60-250 mM + Glu- H ATP

Figura 6.1 Síntese e degradação do neurotransmissor glutamato. O glutamato sintetizado de novo no terminal pré-sináptico é armazenado em vesículas sinápticas, através de um mecanismo dependente do gradiente elétrico e do gradiente químico de H+ entre o interior e exterior das vesículas, e libertado por exocitose para a fenda sináptica quando ocorre despolarização pré-sináptica. O glutamato libertado é ra- pidamente removido da fenda sináptica por transportadores dependentes de Na+ presentes nos astróci- tos, células onde é convertido em glutamina pela enzima mitocondrial glutamina sintetase. A glutamina é transportada para fora das células da glia, e para o interior do terminal pré-sináptico, onde é novamente convertida em glutamato. Existem também transportadores de glutamato no terminal pré-sináptico, que permitem ao neurónio pré-sináptico recapturar parte do glutamato libertado, e na base da espícula dendrí- tica, evitando assim derrame de glutamato para fora da sinapse. Nos neurónios, acontece também síntese de glutamato de novo, por transaminação do α-cetoglutarato.

Quando um potencial de ação chega glutamato é removido pelos transportadores ao terminal pré-sináptico de um neurónio, de glutamato da membrana plasmática de ocorre fusão das vesículas sinápticas com a neurónios, mas fundamentalmente de astró- membrana pré-sináptica e libertação de glu- citos, transportadores esses dependentes de tamato para a fenda sináptica. O glutamato Na+ e K+ e acoplados aos gradientes eletro- difunde através da fenda sináptica e ativa químicos de Na+, K+ e H+. Esse acoplamento recetores pós-sinápticos na célula adjacente, permite o transporte de glutamato contra o assim como alguns recetores pré-sinápticos. seu gradiente de concentração, o que diminui No entanto, os níveis extracelulares de glu- rapidamente a concentração extracelular de tamato são finamente controlados, já que o glutamato para valores <3 µM. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Ácido gama-aminobutírico

119

Os recetores GABAB pertencem à super- 7.6). Em estudos utilizando animais deficien-

família dos recetores associados a proteínas G tes na subunidade GABAB1 ou na subunidade

(GPCR), de que também fazem parte os rece- GABAB2, verificou-se que não se formam re-

tores metabotrópicos do glutamato, e os rece- cetores GABAB funcionais. Por outro lado, em tores do paladar doce e umami (ver Capítulo sistemas de expressão heteróloga, observou-se 6 – “Glutamato”), entre outros. Cada subu- que quando se expressa apenas a subunidade

nidade é composta por sete domínios trans- GABAB1, não há recetores funcionais na mem- membranares, com um N-terminal extracelu- brana plasmática, ficando retidos no retículo lar e um C-terminal intracelular. Um recetor endoplasmático, demonstrando que a subu-

GABAB funcional é obrigatoriamente um dí- nidade GABAB2 é necessária para o endereça-

mero formado por uma subunidade GABAB1 e mento membranar. Quando se expressa apenas 23 por uma subunidade GABAB2 . O N-terminal a subunidade GABAB2, apesar de se detetarem

extracelular da subunidade GABAB1 contém o recetores na membrana plasmática, não se ve- local de ligação para o agonista, e a subunidade rifica ligação de GABA, o que demonstra que o

GABAB2 é essencial para o endereçamento do local de reconhecimento de ligandos se encon-

recetor para a membrana plasmática (Figura tra na subunidade GABAB1. Apenas se obtêm

Recetor GABAB

GABAB1 GABAB2

Golgi

Retículo endoplasmático

Figura 7.6 Tráfego intracelular dos recetores GABAB. A dimerização das subunidades GABAB1 e GABAB2 ocorre no retículo endoplasmático, após o que são transportados em vesículas de secreção para o complexo

© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS do Golgi e deste para a membrana plasmática. Acetilcolina

127

Vias colinérgicas ascendentes

Tálamo

Bolbo olfativo Hipotálamo Núcleos basais

Hipocampo

Núcleos do tronco Vias colinérgicas descendentes

Figura 8.1 Representação esquemática das principais vias colinérgicas centrais. Complexo do cérebro anterior medial: Fibras nervosas colinérgicas gigantes originadas nos núcleos da base do cérebro (região caudal do núcleo lenticular), designados no sentido rostro-caudal – núcleo do septo mediano, núcleos do ramo vertical e horizontal da banda diagonal de Broca, núcleo basal de Meynert. Projeções rostro-mediais com origem no septo mediano e ramo vertical da banda diagonal de Broca para o hipocampo. Projeções caudo-laterais para o neocórtex. Interneurónios estriatais: Grupo de neurónios longos localizados no es- triado e nucleus accumbens. Núcleos motores dos nervos periféricos: Neurónios longos equivalentes aos neurónios motores da medula espinhal com origem nos núcleos dos III–VI e IX–XII pares cranianos. Com- plexo parabraquial: Vias colinérgicas mais exuberantes do mesencéfalo. Com origem na parte superior da ponte (núcleo pedúnculo-pontino tegmentar), as fibras rodeiam os pedúnculos cerebelosos superiores em sentido dorsocaudal. No sentido rostral, projetam-se fibras do núcleo pedúnculo-pontino para os núcleos mediais do tálamo, substantia nigra e subtálamo. Existem projeções eferentes destes núcleos mesencefáli- cos para os núcleos basais do tálamo, hipotálamo e amígdala. Formação reticular: Região anatomicamente mal definida que vai da ponte até à medula espinhal constituída por fibras colinérgicas giganto-celulares e magnocelulares englobando a camada granular da rafe mediana (caudalmente) e os núcleos olivares inferiores (ventralmente). Vias colinérgicas descendentes: Projetadas para a região central da medula espinhal (colaterais dos neurónios motores, células de Renshaw).

A identificação da acetilcolina enquanto a ação desta substância simulava as ações da neurotransmissor confirma a natureza química estimulação elétrica dos nervos parassimpáti- da transmissão sináptica para a qual contribui cos. Em 1921, Otto Loewi terá alegadamente a síntese química da acetilcolina por Hunt em sonhado a experiência que demonstrou que a 1906 e a verificação, por Dale em 1914, de que acetilcolina é o mediador químico envolvido © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Catecolaminas

161 (cont.) Recetor Proteínas G Mecanismos de Localização Agonistas Antagonistas adranérgico acopladas transdução de sinal no SNG

β2 Gs Estimulação da Bolbo olfativo Isoprenalina Propanolol adenilciclase, Córtex piriforme aumento de cAMP Hipocampo ICI 118,551 Amígdala Terbutalina Córtex cerebelar

β3 Gs/Gi/0 Estimulação da Hipocampo BRL 37344 adenilciclase, Córtex CL316243 Propanolol aumento de cAMP Estriado SR 59230A Hipotálamo Cerebelo Tronco cerebral

cAMP: monofosfato de adenosina cíclico

Tabela 9.3 Mecanismos de transdução de sinal, localização no SNC, e agonistas e antagonistas dos diversos subtipos de recetores dopaminérgicos.

Recetor Proteínas G Mecanismos de Localização Agonistas Antagonistas adranérgico acopladas transdução de sinal no SNG

D1 Gs Estimulação da Córtex cerebral SKF-38393, SCH23390 adenilciclase; Nucleus SKF-81297 SKF83566 aumento da [Ca2+] accumbens Ecopipam intracelular Estriado

D2 Gi/0 Inibição da Nucleus Bromocriptina Raclopride adenilciclase, accumbens Rotigotina Sulpirida diminuição da Estriado Sumarinola formação de cMP

D3 Gi/0 Inibição da Nucleus Quinpirole Raclopride adenilciclase, accumbens 7-OH-DPAT Domperidona diminuição da Estriado Pramipexol formação de cAMP Ilhas de Calleja

D4 Gi/0 Inibição da Mesencéfalo Apomorfina Perospirona adenilciclase, Amígdala Perospirona diminuição da Córtex pré- formação de cMP frontal

D5 Gs Estimulação da Hipocampo A68930 SCH23390 adenilciclase; Hipotálamo aumento da [Ca2+] intracelular

ácido gama-aminobutírico (GABA) e receto- No cérebro de rato, os níveis mais elevados

res do glutamato do tipo N-metil-D-aspartato dos recetores adrenérgicos α1B foram encon- (NMDA). Alguns estudos mostraram que os trados em regiões envolvidas no stress e fun-

recetores α1A regulam a memória, a plasticidade ções neuroendócrinas e ainda noutros locais 14,15

© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS sináptica, a neurogénese e a gliogénese . como as células de Purkinje do cerebelo (ver Serotonina

189

que atuam noutros subtipos de recetores de serotonina pelo hipotálamo estimula os ner-

serotonina (5-HT4, 5-HT6, e 5-HT7) podem vos simpáticos que enervam o tecido adiposo ter alguns efeitos pró-cognitivos em pacientes castanho. A serotonina desempenha, também, com esquizofrenia33. um papel na definição da taxa metabólica glo- bal e no controlo da temperatura. A serotonina regula o eixo HPA em vários níveis e, portanto, 1.3.12. Ação alucinogénia determina efeitos complexos na resposta geral ao stress25. Alucinogénios são uma classe de subs- tâncias que induzem profundas mudanças na perceção e cognição. Os efeitos psicológicos 1.3.14. Mecanismos da dor produzidos por alucinogénios são altamente subjetivos, geralmente incluindo mudanças A serotonina modula a perceção da dor e no pensamento e humor, despersonalização e o processamento nociceptivo no SNC e SNP25. alterações da perceção que podem incluir alu- Localmente, no tecido inflamado, a libertação cinações visuais, sinestesias e sensações táteis. de serotonina sensibiliza as fibras nervosas No homem e em roedores, os efeitos com- periféricas que transmitem a informação no- portamentais dos alucinogénios como a LSD, ciceptiva ao SNC. Os neurónios serotoninér- a psilocibina e a mescalina são principalmente gicos do tronco cerebral enviam projeções

mediados pela ativação dos recetores 5-HT2A. descendentes para a medula espinhal que mo- Além disso, há indícios que apontam para um dulam a receção da informação nociceptiva.

papel secundário para os recetores 5-HT1A, Finalmente, os neurónios serotoninérgicos do

5-HT2C e recetores da dopamina. Uma anfe- tronco cerebral enviam projeções ascenden- tamina, a MDMA, produz euforia e um senti- tes para as regiões corticais e límbicas, que mento de empatia, com menor distorção sen- podem modular a perceção central da dor. Os sorial. Os efeitos da MDMA são, em grande vários níveis em que a serotonina modula o parte, atribuídos ao aumento na libertação da processamento nociceptivo e a perceção da serotonina, embora tenha já sido demonstrado dor podem também explicar a eficácia dos o seu efeito agonista direto sobre os recetores fármacos potenciadores da neurotransmissão 8 5-HT2A . Os efeitos dos agentes alucinogénios serotoninérgica no tratamento de distúrbios serotoninérgicos são distintos dos de outras da dor. Os antidepressivos tricíclicos e os an- classes de fármacos, nomeadamente anestési- tidepressivos inibidores seletivos do transpor- cos dissociativos, como a cetamina, os quais tador da serotonina podem funcionar como produzem efeitos do tipo alucinogénio media- analgésicos de ação central, modulando a dos por recetores glutamatérgicos. informação nociceptiva recebida na medula espinhal34.

1.3.13. Endocrinologia e metabolismo 1.3.15. Síndrome da serotonina As funções da serotonina no sistema en- dócrino e metabolismo incluem o controlo A síndrome da serotonina é uma condição central do equilíbrio energético, a modulação clínica que ocorre como resultado do aumento central do eixo hipotálamo-pituitária-suprar- nos níveis sinápticos da serotonina, resultando

renal (HPA) e a regulação direta do desenvol- principalmente na ativação de recetores 5HT2A vimento da glândula mamária. Os recetores no SNC35. A gravidade dos sintomas abrange

5-HT2C e 5-HT1B hipotalâmicos modulam um espectro de toxicidade que se correlaciona as vias da melanocortina, e a libertação de com a concentração sináptica da serotonina. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Sistema purinérgico

209

ação de antiepiléticos até agora disponíveis22. 4.3.1. Controlo do sono A manipulação aguda destes recetores desem- penha também um importante papel neuro- Uma das consequências mais conhecidas protetor em modelos de isquémia, hipóxia ou do consumo recreativo de antagonistas de re- hipoglicémia, enquanto a manipulação cró- cetores da adenosina, a cafeína e a teofilina, é

nica de recetores A2A reduz a extensão da lesão a alteração do ciclo de sono-vigília, estando quer a nível cortical quer no hipocampo nestas atualmente bem estabelecido que a cafeína diferentes situações patológicas21. A neuropro- (um antagonista de recetores de adenosina)

teção mediada pelos recetores A1 da adenosina inibe a indução do sono por interferir com o poderá ser devida predominantemente à ini- papel central da adenosina na homeostasia do bição da atividade neuronal, através da inibi- sono25. Há evidências de que os níveis extrace- ção da libertação de glutamato e da inibição lulares de adenosina em áreas cerebrais chave dos recetores NMDA durante o período de no controlo do sono vão aumentando ao longo défice metabólico4, enquanto a neuroproteção do dia, sendo este um processo de indução no-

exercida por bloqueio de recetores A2A poderá turna de sono; ao inverso, os níveis extracelu- envolver diversos mecanismos, nomeada- lares de adenosina diminuem durante o sono, mente redução de excitotoxicidade, alteração contribuindo esta redução para a indução do de processos neuroinflamatórios por ações despertar26. Estas variações circadianas dos ní- sobre a microglia, entre outros21. De um modo veis de adenosina representarão, contudo, um aparentemente paradoxal, o bloqueio crónico entre vários mecanismos de controlo do ciclo

de recetores A1 da adenosina poderá ter um sono-vigília, que envolve diversos circuitos ce- papel neuroprotetor em modelos de isquémia, rebrais e múltiplos neurotransmissores e neu- o que poderá estar relacionado com a indução romoduladores. de sobre-expressão destes recetores a nível do córtex e hipocampo10, sendo que diferentes si- tuações deletérias causam uma diminuição da 4.3.2. Dor e nocicepção

densidade destes recetores A1 e um aumento 6 da expressão e densidade dos recetores A2A . A dor tem origens e causas diversas. De Provavelmente a neuroproteção operada pela igual modo, as ações quer da adenosina quer adenosina dependerá da sinalização balan- do ATP sobre a dor são também variadas. De

ceada entre os recetores A1 e recetores A2A, um modo geral, a adenosina endógena tem podendo ser equiefetivas, e eventualmente si- uma ação antinociceptiva enquanto o ATP ex- nérgicas, estratégias de aumento da sinalização tracelular tem uma ação pró-álgica. A ativação

operada por recetores A1 e diminuição da sina- de recetores A1 na medula espinhal tem ação 6 lização operada por recetores A2A . antinociceptiva quer em modelos de dor neu- ropática quer de dor inflamatória aguda27. Por

ativação de recetores A1, a adenosina poderá 4.3. Outras funções específicas também inibir fenómenos de sensibilização e plasticidade envolvidos na dor crónica.

Além da capacidade de as purinas pode- A ativação de recetores A2A da adenosina rem controlar os vários processos celulares tem ações diferentes consoante o tipo de dor. descritos, é possível extrair conclusões sobre a No caso de dor inflamatória, a ativação destes função global desempenhada pelo sistema pu- recetores pode ser benéfica devido à ação an- rinérgico no controlo do fluxo de informação ti-inflamatória; contudo, por facilitação da ati- em diversos circuitos neuronais de diferentes vação de fibras aferentes periféricas, poderão regiões do SNC de que resultam evidentes efei- facilitar a nocicepção. A ativação de recetores

tos fenotípicos e comportamentais. A3 da adenosina induz dor por libertação de © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neuropéptidos

215

Quadro 12.1 Resumo dos principais neuropéptidos presentes em mamíferos e respetiva caracteriza- ção de acordo com a sua localização.

Hipotálamo

•• Hormona libertadora da corticotropina (CRH) •• Somatostatina •• Hormona libertadora da hormona de crescimento •• Hormona libertadora da tirotropina (TRH) (GHRH) •• Vasopressina •• Hormona libertadora das gonadotropinas (GnRH) •• Oxitocina

Hipófise

•• Adrenocorticotropina (ACTH) •• Prolactina (PRL) •• Hormona estimuladora dos melanócitos tipo α (αMSH) •• Hormona estimulante do folículo (FSH) •• β-endorfina •• Hormona luteinizante (LH) •• Hormona do crescimento (GH) •• Tirotropina (hormona estimuladora da tiroide) (TSH)

Péptidos gastrointestinais e cerebrais

•• Colecistocinina •• Neurotensina •• Gastrina •• Neuropéptido K, Substância P (taquicininas) •• Péptido libertador de gastrina •• Péptido intestinal vasoativo •• Motilina •• Galanina

Células neurais

•• Galanina •• Péptido YY (PYY) •• Neuropéptido Y (NPY) •• Péptido relacionado com o gene da calcitocina (CGRP)

menor concentração e, da mesma forma, ati- mecanismos responsáveis pela síntese e arma- vam os seus recetores a uma menor concen- zenamento dos neuropéptidos são fundamen- tração. Por exemplo, a concentração de acetil- talmente diferentes dos usados para as peque- colina e noradrenalina nas vesículas sinápticas nas moléculas neurotransmissoras e são mais é da ordem dos 100 a 500 mmol/L, enquanto parecidos com a síntese de proteínas secreta- a concentração de um neuropéptido é de 3 a das por células não neuronais (por exemplo, 10 mmol/L no máximo. Também a afinidade enzimas pancreáticas). As vesículas sinápticas da acetilcolina para com os seus recetores é na pequenas existentes nos terminais nervosos ordem dos micromolar a milimolar e no que são preenchidas com neurotransmissores con- diz respeito aos péptidos esta afinidade encon- vencionais sintetizados nos próprios terminais tra-se na faixa dos nanomolar a micromolar3. e muitos são recapturados após a sua liberta- Provavelmente a maior diferença entre os neu- ção. Deste modo, os neurónios que usam neu- ropéptidos e os neurotransmissores conven- rotransmissores clássicos têm a capacidade cionais está na sua biossíntese. de alterar a sua síntese local, permitindo res- ponder de uma forma rápida à depleção dos mesmos, o que ocorre em períodos de maior 1.1. Síntese, armazenamento e libertação atividade. Pelo contrário, o aumento da síntese dos neuropéptidos de péptidos requer um aumento da expressão de genes para o polipéptido e o subsequente Os neurotransmissores convencionais e os transporte axonal dos grânulos que contêm neuropéptidos podem coexistir na maioria das os péptidos até ao terminal nervoso, processo sinapses do sistema nervoso. No entanto, os este que pode demorar horas ou mesmo dias2. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Fatores neurotróficos

235

A Núcleo CPE BDNF Recetor glutamato BDNF Recetor TrkB mRNA (forma madura) AMPA CREB Sortilina pró-BDNF Recetor glutamato RER (forma imatura) NMDA Furina Complexo Recetor de IP3 Ribossoma de Golgi ou rianodina

Via secretora  2+ reguladora [Ca ]i Axónio Via secretora B constitutiva Glu Tráfego de BDNF para Plasminogénio as dendrites/axónios tPA Plasmina Corpo celular CCSV

Dendrite  2+ [Ca ]i

Figura 13.2 Síntese, secreção e transporte do BDNF. A atividade sináptica é responsável pelo aumento 2+ dos níveis de cálcio intracelular ([Ca ]i) na região pós-sináptica com consequente exocitose das vesículas contendo BDNF ou pró-BDNF (B). A exocitose destas vesículas pode ser mediada pela entrada de Ca2+ atra- vés dos recetores de glutamato do tipo NMDA e de canais de cálcio sensíveis à voltagem (CCSV), ou pela ativação de recetores de IP3 ou de rianodina que permitem a mobilização de Ca2+ acumulado em reservató- rios intracelulares. Na fenda sináptica a forma imatura da neurotrofina (pró-BDNF) é clivada pela plasmina, dando origem à forma madura e funcional (mBDNF). O mBDNF tem uma estrutura dimérica e ativa os recetores TrkB presentes na sinapse. O aumento dos níveis de cálcio intracelular tem também efeitos ao nível do corpo celular, uma vez que leva à ativação do fator de transcrição CREB (A). Esta proteína regula a transcrição de vários genes, incluindo o gene do BDNF. O RNA mensageiro que codifica esta proteína (BDNF mRNA) é exportado do núcleo, sendo traduzido no retículo endoplasmático rugoso (RER). A proteína recém-sintetizada é então processada no complexo de Golgi onde pode ocorrer a sua maturação. Neste, a interação com a proteína sortilina poderá desempenhar um papel importante na determinação da configu- ração correta do pró-BDNF. Por outro lado, a interação com a carboxipeptidase E (CPE) é importante para o endereçamento da pró-neurotrofina para a via secretora regulada. A furina cliva a forma imatura do BDNF convertendo-a na sua forma funcional. O transporte de BDNF para os axónios e as dendrites pode ocorrer pela via secretora constitutiva, mas acontece maioritariamente pela via secretora regulada.

O endereçamento seletivo do BDNF e do pró- Em condições fisiológicas normais as ve- -BDNF para a via regulada depende da intera- sículas contendo neurotrofinas e/ou pró-neu- ção da neurotrofina com um recetor existente rotrofinas são transportadas desde o corpo na região trans do complexo de Golgi, a carbo- celular até à região distal dos prolongamentos xipeptidase E (Figura 13.2B). A sequência de celulares (transporte anterógrado). Nos neu- aminoácidos do BDNF responsável pela inte- rónios do hipocampo as vesículas contendo ração com a carboxipeptidase E não existe no pró-BDNF/BDNF são maioritariamente ende- NGF, e essa diferença pode explicar o facto de reçadas para as dendrites, enquanto em neuró- as duas neurotrofinas serem endereçadas para nios corticais uma fração significativa de vesí- 4

© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS vias secretoras distintas . culas contendo a neurotrofina é transportada Fases iniciais do desenvolvimento do sistema nervoso

267 (cont.) C D

Superfície pial Ventrículo

CGR

Neurónio em migração

Processo da célula IN glia radial

FR

EPR

C: Esquema da retina neural e sua localização no globo ocular. As várias camadas e os respetivos tipos neuronais estão assinalados, desde as células fotorrecetoras (cones a azul e bastonetes a rosa) até às células ganglionares da retina (CGR) que projetam para o córtex cerebral. Entre estas duas camadas existem vários tipos de interneurónios (IN), como células amácrinas, horizontais e bipolares, que asseguram a comunicação e processamento inicial dos sinais nervosos produzidos nos fotorrecetores. Na zona mais interna da retina neural encontram-se as células epiteliais pigmentadas formando um epitélio (EPR) adjacente à camada de fotorrecetores. D: Migração radial dos neurónios durante o desenvolvimento do córtex. As células radiais da glia estabelecem prolongamentos (“processos”) que se estendem entre a superfície pial e os ven- trículos do córtex. Estes prolongamentos servem como base para a migração dos neurónios corticais, desde a sua origem na zona ventricular (ou subventricular) até à sua localização final nas várias camadas corticais.

do tubo neural. No entanto, no caso dos neu- longa distância, especialmente em animais de rónios do SNP, que proveem da crista neural, grande porte, como é o caso dos primatas. Por a distância percorrida é consideravelmente exemplo, durante a formação do córtex cere- superior e implica a passagem destas células bral, os neurónios de nascimento mais tardio por diversos ambientes embrionários. Mesmo têm de migrar ao longo de vários milímetros, no caso do SNC, há exemplos de migração de desde a zona ventricular e outras camadas © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Sinaptogénese

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Terminal axonal

Núcleo Célula muscular

Recetor de acetilcolina Agrina Laminina (α4β2γ1)

Rapsina Laminina (α5β2γ1) Canal de cálcio Laminina (α2β2γ1) MuSK SV2 Vesícula sináptica Microfilamento de actina

Figura 15.3 Diferenciação sináptica na junção neuromuscular. As proteínas laminina e agrina, responsá- veis pela indução da diferenciação pré e pós-sináptica, respetivamente, encontram-se embebidas na lâmina basal que ocupa o espaço entre o terminal axonal e a célula muscular. Existem três formas diferentes da la- minina na matriz extracelular da sinapse: laminina 4 (α2β2γ1), laminina 9 (α4β2γ1) e laminina 11 (α5β2γ1). A interação das diferentes lamininas com proteínas pré-sinápticas determina a organização do terminal pré-sináptico, incluindo a formação da zona ativa e agregação das vesículas sinápticas. A cadeia β2 interage com canais de cálcio sensíveis à voltagem e a cadeia α5 interage com a proteína pré-sináptica SV2. Por sua vez, a agrina interage com o recetor LRP4, o qual induz a dimerização e consequente autofosforilação do recetor MuSK na membrana da célula muscular, seguida da agregação dos recetores de acetilcolina. A rapsina é um efetor intracelular da sinalização agrina/MuSK e ancora os recetores de acetilcolina aos micro- filamentos de actina garantindo a sua agregação.

a miotúbulos em cultura a agrina induz agre- a agrina é sintetizada pelos neurónios moto- gação dos recetores de acetilcolina, ao passo res, secretada pelos seus terminais e retida na que a agregação destes recetores está compro- lâmina basal onde atua como molécula indu- metida em músculos de murganhos mutantes tora da diferenciação pós-sináptica na junção para a agrina. Posteriormente, concluiu-se que neuromuscular10. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências 304

A Redução de atividade Basal Aumento de atividade

Terminal pré-sináptico Célula da glia

Terminal pós-sináptico

Recetores sinápticos Recetores extrassinápticos Vesículas sinápticas

Densidade pós-sináptica Recetores intracelulares Neurotransmissor

B Controlo Bloqueio NMDAR

GluN1

SynGAP

VGLUT

Map2

 © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências 308

INTRODUÇÃO 1. CLASSES DE MEMÓRIA

Memórias são representações espaçotem- 1.1. Categorias qualitativas de memória porais internas do mundo com génese na ex- periência de cada sujeito. Cada uma destas A memória não deve ser considerada como representações é adquirida e codificada pela uma entidade única, mas como uma complexa atividade de circuitos cerebrais específicos. função mental dependente de vários sistemas Numa perspetiva psicológica, a memória pode cerebrais. Os neurocientistas distinguem, por ser considerada como uma função cognitiva; isso, várias classes de memória, cujo substrato na perspetiva biológica, a memória é antes neuronal subjacente difere entre classes (Figura uma função cerebral, determinante para o de- 17.1). Considerando a natureza daquilo que é senvolvimento de múltiplas atividades, assim recordado, é possível distinguir duas categorias como para a síntese e análise de nova informa- de memória: a memória declarativa (ou explí- ção e posterior aplicação em novos contextos. cita), quando se procede à evocação consciente Com efeito, a nossa memória determina em de experiências prévias, e a memória não de- larga escala aquilo que somos, na medida em clarativa (alternativamente denominada implí- que influencia as nossas decisões, ações e sen- cita ou memória de procedimento), quando timentos. Deste modo, procurar compreender experiências passadas influenciam e determi- a base neurobiológica dos mecanismos que nam o comportamento corrente, sem serem estão subjacentes à atividade mnésica é, de conscientemente recordadas1. certa forma, desvendar a própria natureza do No que se refere à memória declarativa, indivíduo. vulgarmente referida simplesmente como

Memória

Declarativa/Explícita Não declarativa/Implícita

Episódica Semântica Aprendizagem associativa Priming Aprendizagem não associativa

Procedimentos Respostas motores emocionais

Estriado dorsal Lobo temporal medial e cerebelo Amígdala Neocórtex Vias reflexas / Estriado ventral

Figura 17.1 Categorias qualitativas da memória de longo prazo. A memória declarativa, ou explícita, refere-se à evocação consciente de experiências ou factos passados. Esta pode ser episódica, ou semântica, sendo amplamente dependente do sistema temporal medial de memória. Por seu turno, a memória não declarativa, ou implícita, refere-se à evocação inconsciente de experiências prévias que afetam o nosso comportamento corrente. Nesta classe de memória, enquadram-se as aprendizagens associativa e não-as- sociativa, assim como a memória subliminar, ou priming, sendo que cada um destes processos cognitivos depende de estruturas e sistemas cerebrais específicos, descritos na figura, que serão focados com maior detalhe mais à frente. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Sistema visual

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A Esclera Coroide

Retina

Córnea

Fóvea Pupila Cristalino

Íris Nervo ótico Corpos ciliares

B C

F

CNE

H F – Fotorrecetores CPE B – Células bipolares B G – Células ganglionares da retina A A CNI libertam – Glutamato H – Células horizontais A – Células amácrinas CPI libertam – GABA G CCG ou – Glicina

Figura 18.1 Estrutura e anatomia do olho e da retina. A: Diagrama esquemático de um olho humano em vista sagital. B: Imagem de um corte de uma retina de rato marcada com hematoxilina e eosina e, onde é possível observar as principais camadas de células – CCG: Camada das células ganglionares. CPI: Camada plexiforme interna. CNI: Camada nuclear interna. CPE: Camada plexiforme externa. CNE: Camada nuclear externa. Imagens obtidas no grupo de investigação “Retinal Dysfunction & Neuroinflammation” (IBILI – Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra). Barra de escala: 50 µm. C: Diagrama esquemático com a distribuição e interações entre as principais células da retina e os três principais neurotransmissores libertados pelos neurónios. Os fotorrecetores (P), as células bipolares (B) e as células ganglionares (G) li- bertam glutamato (verde); as células horizontais (H) e as células amácrinas (A) libertam GABA (vermelho) ou glicina (azul).

1.2. Retina 1.2.1. Epitélio pigmentado da retina

A retina é a camada mais interna do olho e O epitélio pigmentado da retina é uma mo- é constituída por duas camadas: a retina neu- nocamada de células epiteliais que se estende rossensorial e o epitélio pigmentado da retina. das margens da cabeça do nervo ótico à ora © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências 350

INTRODUÇÃO cabeça e dos olhos e os ajustes da postura do corpo. As células sensoriais do sistema vesti- Os sentidos da audição e do equilíbrio no bular funcionam de modo semelhante às cé- homem localizam-se em estruturas do ouvido lulas sensoriais do sistema auditivo. Contudo, e permitem-nos detetar alterações do am- os estímulos que as ativam são diferentes. biente, nomeadamente sons, no caso da audi- No caso das células sensoriais vestibulares a ção, e a posição e os movimentos da cabeça, força e a aceleração da gravidade constituem no caso do equilíbrio. A audição permite-nos a força que as ativa, enquanto as células sen- também a comunicação com o ambiente atra- soriais auditivas são estimuladas pelas ondas vés dos sons, devido à capacidade de produzir sonoras. linguagem falada, que é detetada pelo sistema As estruturas responsáveis pela audição auditivo. Alem disso, através da música, é pos- são o ouvido externo, o ouvido médio e o ou- sível explorar as sensações e emoções evocadas vido interno, onde se localiza a cóclea (Figura pelos sons musicais no nosso cérebro. 19.1), a estrutura que contém as células sen- O sentido do equilíbrio, através do apa- soriais auditivas. Os canais semicirculares, o relho vestibular, deteta a posição e os movi- sáculo e o utrículo são as estruturas do ouvido mentos da cabeça, dá-nos a sensação de equi- interno responsáveis pelo equilíbrio, onde se líbrio, e ajuda a coordenar os movimentos da localizam as células sensoriais vestibulares.

Ouvido externo Ouvido médio Ouvido interno

Canais semicirculares Estribo Nervos (facial, estato-acústico, coclear) Bigorna Martelo Aparelho vestibular

Janela oval Orelha Cóclea Canal auditivo externo Janela redonda

Membrana Trompa do tímpano de Eustáquio Para a faringe Veia jugular interna

Figura 19.1 Estrutura do ouvido. As três regiões do ouvido: ouvido externo, ouvido médio e ouvido interno. No ouvido médio podem ver-se os três ossículos que transmitem as vibrações da membrana do tímpano para a janela oval (o martelo, a bigorna e o estribo). O ouvido interno contém duas estruturas principais: o aparelho vestibular e os canais semicirculares, que contêm as células sensoriais responsáveis 16

pelo equilíbrio, e a cóclea, que inclui as células sensoriais responsáveis pela audição . © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências 378

2.3. Sabor umami consequente libertação de neurotransmissores (ver Figura 20.6E) de natureza ainda desco- Umami é um termo japonês que significa nhecida21. delicioso ou saboroso. É uma sensação origi- nada pelo sal de sódio do aminoácido gluta- mato (MSG) e por 5´-ribonucleótidos, como o 2.5. Sabor azedo monofosfato de inositol (IMP) e monofosfato de guanidina (GMP). Quando adicionadas aos O sabor azedo resulta da acidez de uma de- alimentos, estas substâncias intensificam o pa- terminada solução. Os iões H+ dos ácidos ori- ladar dos mesmos, sendo por isso utilizadas na ginam a despolarização das células recetoras preparação de determinados pratos. através de vários mecanismos celulares. Um Estudos recentes mostraram que estas dos mecanismos resulta do bloqueio, pelos substâncias se ligam a vários tipos de recetores protões, de canais iónicos permeáveis a K+ distintos, todos eles pertencentes à família dos na região apical da célula recetora. A despo- recetores associados a proteínas G: os hetero- larização pode também resultar da entrada de dímeros de T1R1/T1R312,13, formas truncadas protões através de canais iónicos permeáveis a e cerebrais dos recetores metabotrópicos para H+, ou através dos canais de sódio sensíveis à o glutamato do tipo 1 (mGluR1)14,15 e do tipo 4 amilorida (ver Figura 20.6D). Tal como caso (mGluR4)16,17 e formas cerebrais dos recetores do sabor salgado, a despolarização conduz à metabotrópicos para o glutamato do tipo 2 e 3 abertura de canais de sódio sensíveis à volta- (mGluR2 e mGluR3)14,15. gem, com o consequente influxo de sódio. A As subunidades T1R1 e T1R3 são proteí- despolarização assim originada induz a aber- nas constituintes da família dos recetores para tura de canais de cálcio sensíveis à voltagem, a o amargo. Estudos realizados em murganhos entrada de cálcio e a estimulação da libertação que não expressam a subunidade T1R3 (T1R- de neurotransmissores pelas células gustativas. 3-KO) mostraram que a resposta à estimula- As principais moléculas candidatas a ocupa- ção com umami é muito reduzida ou mesmo rem o lugar de neurotransmissor responsável abolida18,19. A ativação destes recetores origina pela comunicação entre a célula gustativa sen- a despolarização e libertação de neurotrans- sível a sabores azedos e o neurónio aferente missores (ATP) através da via de sinalização são o ATP e a serotonina (5-HT)21. intracelular já descrita para os sabores amar- gos (ver Figura 20.6B). 2.6. Vias gustativas

2.4. Sabor salgado A transmissão do sinal das células recetoras gustativas para os neurónios aferentes é efe- O sabor salgado é induzido por diversos tuada através da libertação de neurotransmis- sais, principalmente NaCl, mas em menor me- sores. Além da estimulação do neurónio afe-

dida também por KCl, NH4Cl, entre outros. O rente, os neurotransmissores também podem estímulo salgado, NaCl, suscita outras quali- ter um papel neuromodulador no botão gus- dades de sabor, incluindo doce e azedo, prin- tativo. A serotonina é liberada pelos neurónios cipalmente quando em baixas concentrações. serotonérgicos existentes no botão gustativo Na membrana apical das células recetoras exis- e regula as propriedades das células recetoras tem canais de sódio sensíveis à amilorida20. Os adjacentes. Recentemente, a ATP também foi iões Na+ entram na célula através destes canais, identificada como um neurotransmissor. Estu- causando a despolarização membranar, a aber- dos realizados em murganhos geneticamente tura de canais de sódio sensíveis à voltagem e a modificados que não expressam os recetores © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Movimento voluntário no ser humano

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Núcleo caudado

Putamen Tálamo GPe NST Gpi SNr SNc

Figura 21.3 Gânglios da base. Esquema representativo da localização anatómica dos gânglios da base, no plano coronal. GPi: Globo pálido interno; GPe: Globo pálido externo; NST: Núcleo subtalâmico; SNc: Substantia nigra pars compacta; SNr: Substantia nigra pars reticulata.

para os núcleos ventroanterior e ventrolateral interno, promovendo o movimento. A sua do tálamo. A substantia nigra pars reticulata ação no estriado tem também um efeito sin- também projeta noutros núcleos do tronco ce- cronizador sobre um grupo de interneurónios rebral, incluindo o colículo superior. colinérgicos, através de um mecanismo de Um conceito essencial é que o globo pálido acoplamento por relaxamento, isto é, inibição interno é uma estrutura inibitória, ou seja, a simultânea de todos os neurónios, que ao re- sua estimulação provoca um decréscimo de cuperarem a atividade, o fazem em sincronia, ativação cortical e talâmica. Existem duas vias o que permite a seleção do padrão motor de- principais de comunicação entre as estruturas sejado e a aprendizagem de padrões motores recetoras e emissoras – direta e indireta. Existe complexos21,22. ainda uma ligação excitatória direta do cór- Ambas as vias têm início nos neurónios tex ao núcleo subtalâmico – a via hiperdireta. espinhosos do estriado, utilizam o ácido ga- A sua ativação estimula o globo pálido interno, ma-aminobutírico (GABA) como principal inibindo o tálamo e o córtex. neurotransmissor e terminam no globo pá- A via direta seleciona o movimento preten- lido interno e substantia nigra pars reticulata. dido, e a via indireta é um circuito inibitório A via direta contém essencialmente recetores paralelo que inibe os movimentos indesejados. D1 que são “ativados” pela dopamina, utiliza a Podemos vê-las na perspetiva de um meca- substância P e dinorfina como neuromodula- nismo central facilitatório e um mecanismo de dor e “inibe” o globo pálido interno, que, por surround inibitório20 (Figura 21.4). A dopa- sua vez, projeta os seus neurónios GABAér- mina, proveniente dos neurónios dopaminér- gicos (inibitórios) para os núcleos ventroan- gicos da substantia nigra pars compacta, tem teriores e ventrolaterais do tálamo, de onde efeitos opostos consoante atue nos recetores parte uma via glutamatérgica “ativadora” para de dopamina de tipo D1 da via direta (exci- o córtex motor. A via indireta é “inibida” pela tatório) ou nos D2 da via indireta (inibitório). ligação da dopamina aos recetores D2, utiliza

© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Globalmente, a dopamina inibe o globo pálido a encefalina como neuromodulador, tem duas 22 Pedro Morgado, João J. Cerqueira, Nuno Sousa Resposta neuronal ao stress

SUMÁRIO Em termos biológicos, o stress representa qualquer estímulo percecionado pelo organismo como uma ameaça (potencial ou real) para o seu equilíbrio. Quando confrontados com estímulos stressantes, os organismos vivos iniciam uma série de respostas com vista à manutenção da homeostasia e à forma- ção de memórias que permitam respostas proporcionadas em situações idênticas futuras. Contudo, quando ativados contínua ou excessivamente, os sistemas de resposta ao stress podem tornar-se pre- judiciais, condicionando défices funcionais importantes. Mecanismos de perceção da dor

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Raiz posterior NCD STT Gânglio raquidiano FD

CP

FAL CA

Raiz anterior D Medula espinhal Gânglio simpático

Ia, Ib Aδ, C Vísceras

Aβ Órgãos tendinosos Aα C Vasos sanguíneos Aδ

Fusos neuromusculares Músculo esquelético

Recetores na pele

Figura 23.1 Esquema simplificado de um nervo espinhal e dos seus diferentes tipos de fibras e recetores sensoriais periféricos. Notar à periferia: as fibras sensoriais (I) com origem em pericárdios nos gânglios ra- quidianos (1.º neurónio) a inervarem os fusos neuromusculares e órgãos tendinosos de Golgi (fibras Ia e Ib; proprioceção) e os recetores capsulados da pele (fibras βA ; tato, vibração, pressão); as fibras sensoriais δA e C (II) a terminarem sob a forma de ramificações nervosas livres na pele, músculos e vísceras (dor e tem- peratura); as fibras motoras αA (III), provenientes de neurónios motores (NM) com os pericárdios no corno anterior da medula espinhal, a inervarem os músculos esqueléticos; as fibras autónomas B (pré-ganglionares com origem no corno intermédio da medula tóraco-lombar) e C (pós-ganglionares, inervam o músculo liso das vísceras) (IV). Já quanto à ramificação central das fibras sensitivas: a maior parte das fibrasα A (Ia e Ib) e Aβ não terminam na medula espinhal, mas continuam pelo funículo dorsal (FD) para terminarem nos núcleos grácil e cuneiforme do bolbo raquidiano (NCD) (I); enquanto outras terminam na profundidade do corno posterior da medula espinhal (II); as fibras δA e C terminam principalmente na superfície do corno dorsal e, no caso das fibras δA , algumas penetram até ao corno anterior para ativarem os neurónios motores nos refle- xos espinhais (III). Os axónios dos neurónios espinhotalâmicos da medula (2.º neurónio) cruzam para o lado oposto e ascendem ao encéfalo pelo funículo ântero-lateral (FAL). No que se refere a fibras motoras, as fibras Aα provenientes dos neurónios motores inervam os músculos estriados, enquanto as fibras B provenientes da coluna intermediolateral (pré-ganglionares) e as fibras C com origem nos gânglios da coluna simpática (pós-ganglionares) controlam a atividade dos músculos viscerais. CA: Corno anterior da medula. CP: Corno posterior da medula espinhal. NCD: Núcleos da coluna dorsal (grácil e cuneiforme). STT: Trato espinhotalâ- mico. Adaptado de Byers e Bonica, Bonica’s Management of Pain, 3.ª Edição, Capítulo 3 (2001). © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Esquizofrenia

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multidimensionais de diagnóstico, baseados no dopaminérgica pela administração de anfeta- uso simultâneo de dados genéticos, imagiolo- minas. No entanto, esta formulação original gia e com apoio nas neurociências cognitivas e da teoria dopaminérgica não diferencia os na neurofisiologia, poderá auxiliar na identifi- sintomas negativos ou positivos da doença ou cação de endofenótipos e numa melhor carac- o funcionamento de dopamina através de dife- terização da doença “pessoal” de cada indiví- rentes recetores, nem mesmo a ação desta em duo (Figura 24.2). vias anatómicas diferentes27. Na década de 90, usufruindo do recurso a dados de imagiologia e análise de tecidos post 3. CIRCUITOS NEURONAIS, ANIMAIS mortem, bem como de dados das vias do con- MODELO E A NEUROBIOLOGIA trolo motor, emocional, do sistema de recom- DA ESQUIZOFRENIA pensa e em processos cognitivos, foram feitos avanços significativos na compreensão do 3.1. A hipótese dopaminérgica papel da dopamina em esquizofrenia. A dis- da esquizofrenia função no sistema dopaminérgico está, então, ligada a transtornos do movimento e volição, Uma primeira versão da teoria da do- vício e abuso de drogas, mas também a per- pamina em esquizofrenia foi desenvolvida turbações na organização de pensamentos e devido aos dados farmacológicos dos meca- memória. Em primatas, existem cinco vias do- nismos de ação das drogas antipsicóticas no paminérgicas (Figura 24.3): bloqueio de recetores de dopamina. Assim, a • A via nigroestriatal, envolvida no con- esquizofrenia foi inicialmente vista como uma trolo e estabilização dos movimentos. hiperdopaminergia. Um outro dado que apoia Esta via inclui os neurónios dopaminér- esta hipótese é a noção de que é possível in- gicos da substantia nigra que projetam duzir surtos psicóticos em pacientes esquizo- para o estriado. frénicos ou com suscetibilidade para esquizo- • A via mesolímbica contém os neuró- frenia através da desregulação da transmissão nios dopaminérgicos da área tegmental

Classificação baseada Dados Classificação em sintomas biológicos personalizada Esquizofrenia

Genética Infeções Conectividade Genética estrutural e Ativação Défice intelectual funcional imunitária + SNP, CNV Mutações Fisiologia Malnutrição raras Comportamento Stress Espectro do autismo Experiência de vida

Figura 24.2 Medicina estratificada para doenças neuropsiquiátricas. O diagnóstico e tratamento da maio- ria dos transtornos psiquiátricos baseiam-se exclusivamente nos sintomas apresentados pelos pacientes. No entanto, tendo em conta os recentes dados genéticos, fisiológicos e de imagiologia, nota-se uma clara sobreposição dessas perturbações. Assim, é premente uma abordagem mais dirigida que integre informação biológica adicional dos pacientes, nomeadamente, dados de genética, de imagiologia e de testes cognitivos,

© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS o que permitirá a distinção de endofenótipos e o desenvolvimento de terapias mais personalizadas. Transtorno do espectro do autismo

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• Interferência significativa dos sintomas 3. EPIDEMIOLOGIA na área social, ocupacional ou outras áreas importantes da vida. Na década de 60 do século xx, as primei- • Quando a conjugação de sintomas não ras avaliações da prevalência de autismo in- pode ser mais explicada por um outro dicavam que se tratava de um distúrbio raro, diagnóstico como, por exemplo, defi- com uma presença de 2-4 em cada 10 000 ciência intelectual. crianças1. No entanto, estes números estariam potencialmente subestimados devido ao des- O DSM-5 incorpora também o uso de es- conhecimento sobre autismo. Atualmente, pecificadores que visam um diagnóstico mais dados de um estudo em larga escala publicado detalhado das ASD, nomeadamente quando pelo Centers for Disease Control and Preven- existe associação a condições genéticas co- tion em 2010, apontam para que 1 em cada 68 nhecidas (por exemplo, síndrome do X-Frá- crianças (ou 14,7 por cada 1000 crianças com 8 gil, síndrome de Down, síndrome de Rett), a anos) sofram de uma forma de autismo2. Este uma condição médica relevante (por exemplo, aumento deve-se, em parte, às modificações epilepsia) ou a um historial de exposição a fa- ocorridas ao longo dos anos nos critérios de tores ambientais de risco (por exemplo, ácido diagnóstico, o que permitiu um alargamento valpróico, baixo peso no nascimento). A se- do espectro dos transtornos de autismo, e a veridade e natureza do défice nas interações inclusão de outras síndromes no diagnós- sociais pode variar com a idade e o estádio tico, bem como de casos menos severos. Ou- de desenvolvimento, mas normalmente com- tros dados deste estudo confirmam também promete as interações no ambiente familiar, na evidências anteriores onde é observada uma escola e na comunidade. Apesar de existir uma incidência quatro vezes superior de ASD em expressão crónica no diagnóstico de autismo, crianças do sexo masculino2. os distúrbios comportamentais podem evoluir de forma dinâmica ao longo do tempo1. Além das duas características principais 4. GENÉTICA DO AUTISMO (falhas na comunicação e nos comportamen- E TRANSTORNOS DO ESPECTRO tos sociais, e interesses restritos e movimentos DO AUTISMO repetitivos), várias outras disfunções clínicas estão presentes numa proporção significativa 4.1. Genes versus ambiente de crianças diagnosticadas com autismo, como pode ser observado na Figura 25.1. Por exem- Quando existe um familiar afetado por um plo, alterações sensoriais1 estão presentes em ASD, o risco de aparecimento de sintomas em mais de 90% dos pacientes, sendo que outros irmãos ou parentes de primeiro grau é signifi- distúrbios comuns incluem as alterações mo- cativamente elevado. Por exemplo, irmãos de toras e da marcha, ansiedade, epilepsia, distúr- indivíduos com ASD evidenciam uma taxa de bio do sono e comorbidade com outras doen- risco que pode chegar aos 20%3. Além disso, ças neuropsiquiátricas. vários estudos mostram que em gémeos mo- nozigóticos, se um irmão for diagnosticado po- sitivamente, a probabilidade de existir concor- dância (isto é, ambos serem afetados) é de 82 a 92%. No entanto, a concordância é apenas de 1 a 20% quando os gémeos são dizigóticos4. Isto 1 A s alterações sensoriais podem ser hipersensibilidade a sugere que a similaridade genética entre gé- estímulos, ou o reverso, uma hipossensibilidade, sendo meos monozigóticos constitui um fator de risco que uma mesma criança pode exibir ambos os estados preponderante. No entanto, é importante ter

© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS em diferentes alturas. Epilepsia

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O papel pró-epilético da IL-1b é ainda refor- diferenciação de novos neurónios. No entanto, çado pela associação entre a prevalência de também é possível que condições de atividade algumas formas de epilepsia e a prevalência moderada das células da microglia e a expo- de algumas variantes de genes que codificam sição a concentrações moderadas de citocinas para IL-1b e para IL-1ra. Por exemplo, foi pró-inflamatórias possam resultar em neuro- observada uma correlação significativa entre proteção e estimulação da neurogénese28. polimorfismos na posição -511 do promotor No giro dentado do hipocampo verifica- do gene que codifica para a IL-1b, aumento -se que as crises epiléticas potenciam a dife- da expressão da citocina e o desenvolvimento renciação de novos neurónios granulares. No de epilepsia do lobo temporal com esclerose entanto, nestas condições as células apresen- mesial. Por outro lado, uma variante do gene tam uma menor compactação e inserção na que codifica para IL-1ra, o alelo IL1RN*2, está camada granular do giro dentado, e formam associada a ganho de função de IL-1b e é con- sinapses aberrantes que contribuem para o siderado um fator de risco para doenças infla- fenómeno de sprouting das fibras musgosas, matórias5. bem descrito em modelos animais e humanos Na camada subgranular do giro dentado de epilepsia do lobo temporal29. existem células estaminais neurais e células progenitoras que se diferenciam em astrócitos e em células granulares do DG (ver Capítulo 5. ALVOS MOLECULARES NO 35 – “Neurogénese e terapia celular do cére- TRATAMENTO DA EPILEPSIA bro”). Nesta estrutura, o nicho neurogénico inclui células do tipo 1, do tipo 2 e do tipo 3, O tratamento da epilepsia tem beneficiado com capacidade proliferativa e que apresentam grandemente nas últimas quatro décadas marcadores de imaturidade/célula estaminal do desenvolvimento de novos fármacos que como a nestina, Sox2 e GFAP. Os progenitores atuam predominantemente em mecanismos do tipo 3 encontram-se em fase proliferativa, associados ao controlo da propagação dos mas começam a perder os marcadores de ima- potenciais de ação e da transmissão sináptica. turidade e adquirem características fenotípicas Nesse sentido, poderão ser administrados fár- da linha neuronal , num processo que leva à macos que atuam como inibidores de canais diferenciação funcional de neurónios jovens. de sódio (por exemplo, carbamazepina, lamo- Os neuroblastos resultantes da divisão assimé- trigina), ativadores de canais de potássio (por trica dos progenitores saem do ciclo de divisão exemplo, flupirtina), inibidores de canais de celular e migram localmente para a camada cálcio do tipo N e P/Q (por exemplo, gabapen- granular do giro dentado, onde se integram tina, pregabalina), inibidores de canais de cál- funcionalmente como novos neurónios gra- cio do tipo T (por exemplo, etossuximida), nulares. Este processo de neurogénese cons- inibidores da libertação de neurotransmisso- titutiva desempenha um papel muito impor- res (via SV2A) (por exemplo, levetiracetam),

tante na renovação da arquitetura sináptica do ativadores do recetor GABAA (por exemplo, hipocampo e provavelmente desempenha um benzodiazepinas, fenobarbital), inibidores da papel importante na formação da memória e captação ou degradação de GABA (por exem- recordação de memórias armazenadas27. plo, tiagabina, vigabatrina) e inibidores dos Em conjunto, o processo inflamatório pa- recetores do tipo NMDA (por exemplo, ácido rece ter um efeito predominantemente ini- valproico)30 (Figura 26.4). bitório sobre a neurogénese no hipocampo. Noutra linha, novas técnicas cirúrgicas Em particular a IL-1b, a IL-6 e o TNF-a (pelo têm sido desenvolvidas para impedir a propa- menos em concentrações elevadas) têm um gação e disseminação das crises nos circuitos efeito predominantemente tóxico e inibem a epiléticos, caso a epilepsia seja refratária ou © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Morte celular do sistema nervoso

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subsequente dano mitocondrial que culmina A família p53, constituída pelos fatores na morte celular por apoptose. de transcrição p53, p63 e p73, representa um Além das neurotrofinas funcionarem importante ponto-de-controlo apoptótico nos como sinais de sobrevivência para suprimir neurónios, com os seus membros a atuarem o programa de morte, a interação de neuro- como sensores responsáveis pela integração de trofinas com o recetor de neurotrofinas p75 múltiplos sinais de morte e sobrevivência1. Um (p75NTR) pode induzir a morte celular, sob importante exemplo desta “função de fiscaliza- certas condições, sugerindo que as neurotro- ção” é observado nos neurónios simpáticos em finas podem atuar como ligandos de morte, desenvolvimento, em que a forma truncada dependendo do contexto celular20. O p75NTR e antiapoptótica da proteína p73 (ΔNp73) é um membro da superfamília dos recetores antagoniza as funções apoptóticas dos mem- TNF que pode ligar todas as neurotrofinas. O bros p53 e p63 (TAp63) para promover a sua seu domínio intracelular contém uma região sobrevivência (Figura 27.5). Por outro lado, o que apresenta similaridade com o domínio de p75NTR é o principal recetor de morte celular morte característico de outros membros da fa- dos neurónios simpáticos e induz a atividade mília TNF. Foi já documentada a indução de e/ou expressão da JNK, p53, e possivelmente morte, após interação de várias neurotrofinas TAp63, por ativação de cinases a montante. com o recetor p75NTR, em diferentes tipos de p53 e TAp63, a última das quais é a proteína células neuronais1,32. de morte celular dominante nestes neurónios,

NT NT

p75 Trk

JNK ΔNp73

TAp63 p53

Bax

Caspase- -3/-6/-7

Apoptose

Figura 27.5 Representação esquemática da regulação dos sinais de morte e sobrevivência, pelos mem- bros da família p53, nos neurónios simpáticos em desenvolvimento. A sobrevivência neuronal é mediada pela ligação da neurotrofina (NT) ao seu recetor específico (Trk), o que resulta na estabilização da proteína ΔNp73, por ativação de cascatas de sinalização. A ΔNp73 inibe a atividade pró-apoptótica das proteínas p53, JNK e, possivelmente, TAp63. Por sua vez, o recetor p75 induz a atividade de JNK, p53 e, possivelmente, TAp63, através da ativação de cinases localizadas a montante. Seguidamente, as proteínas p53 e TAp63

© LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS induzem a via mitocondrial da apoptose. Acidente vascular cerebral e isquémia neuronal

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NMDA-R VSCC

PL

Fosfolipase A2 Arginina AA + O •– nNOS 2

Xantina • Citrulina + NO desidrogenase Xantina

Xantina oxidase PTP Apoptossoma Cit c

•– Apaf-1 Ácido úrico + H2O2/O2 dATP Caspase-9

 •– Caspase-3 O2  H O Mitocôndria 2 2

Núcleo

Fragmentação DNA

DFF40/CAD DFF45/ICAD

Figura 28.7 Excitotoxicidade, stress oxidativo e morte celular por apoptose. O aumento da concentração intracelular de Ca2+ que resulta da ativação em excesso dos recetores do glutamato (particularmente os re-

cetores NMDA) promove a ativação de várias enzimas citosólicas, como a fosfolipase A2 ou a isoforma neu- ronal da sintase do óxido nítrico, e a conversão de xantina desidrogenase em xantina oxidase. Estas enzimas – estão envolvidas na formação de radicais livres e espécies reativas de oxigénio, nomeadamente O2· , ·NO – 2+ e H2O2. O O2· é também formado pela mitocôndria, em resultado do aumento da captação de Ca pelo uniporte membranar. Por outro lado, o Ca2+, o decréscimo dos níveis de ATP e os radicais livres potenciam a abertura do poro de permeabilidade transitória mitocondrial, conduzindo à libertação de citocromo c. Este interage com deoxi-ATP, Apaf-1 e pró-caspase-9, formando o apoptossoma. A formação do apoptossoma conduz à ativação da cascata de caspases, nomeadamente a caspase-9 e caspases efetoras (caspases 3 e 6), culminando na fragmentação e condensação da cromatina.

dos recetores NMDA ou não-NMDA, condu- secundariamente à libertação de citocromo c, zindo a uma disrupção da produção de energia em resultado do défice da cadeia mitocondrial pela mitocôndria e à morte celular, em parte transportadora de eletrões após estimulação devido à inibição da enzima aconitase, uma com NMDA ou em sequência da ativação dos enzima chave no ciclo dos ácidos tricarboxí- recetores AMPA28. Em condições normais, a licos sensível a espécies reativas de oxigénio17. proteína antiapoptótica Bcl-2 previne a liber- •– Um aumento da formação de O2 pode con- tação de citocromo c e desta forma também •– duzir também à libertação de citocromo c, impede a produção de O2 mitocondrial. tal como observado em neurónios sujeitos ao No nosso organismo, as enzimas superó- processo de excitotoxicidade. No entanto, a ge- xido dismutase (SOD, Mn-SOD ou SOD2 e •– ração tardia do O2 mitocondrial pode ocorrer Cu/Zn-SOD ou SOD1) controlam os níveis © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Envelhecimento cerebral e doença de Alzheimer

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19.2. Disfunção glutamatérgica Alzheimer permitiu o desenvolvimento de fármacos para o tratamento sintomático desta A libertação excessiva de glutamato na patologia, os quais foram aprovados para ad- fenda sináptica, a qual ocorre por um processo ministração terapêutica nos doentes em vários exocitótico dependente de Ca2+ e através de um países. Estas terapias farmacológicas estão di- transportador membranar, pode causar a so- recionadas para corrigirem alterações espe- breativação dos recetores pós-sinápticos para cíficas nos sistemas de neurotransmissão da este neurotransmissor. Os recetores para o glu- acetilcolina e do glutamato29. O donepezilo, tamato associados a canais iónicos, designados a galantamina e a rivastigmina são inibidores ionotrópicos, podem ser do subtipo NMDA da acetilcolinesterase, aumentando a disponi- (N-metil-D-aspartato), cainato ou AMPA bilidade de acetilcolina na fenda sináptica. A (ácido a-amino-3-hidroxi-5-metil-4-isoxazo- galantamina também atua como um modu- lepropiónico). A excessiva ativação destes rece- lador da atividade dos recetores colinérgicos tores, principalmente daqueles localizados fora nicotínicos, tornando mais eficiente a trans- da sinapse (extrassinápticos), conduz a grandes missão do impulso nervoso. A memantina é aumentos na concentração intracelular de Ca2+ uma antagonista do recetor NMDA do gluta- e de Na+, levando à ativação de processos neu- mato, prevenindo a excessiva ativação destes rodegenerativos (excitotoxicidade). Alguns es- recetores, ou seja, a excitotoxidade, sem afetar tudos têm mostrado alterações nos recetores do a sua atividade fisiológica. Estes fármacos são glutamato do subtipo NMDA na doença de Al- geralmente bem tolerados e administrados em zheimer, o que originou o desenvolvimento de associação, mas apenas apresentam efeitos be- um antagonista incompetitivo, a memantina, néficos durante um período de tempo limitado, que inibe a atividade deste recetor, prevenindo não prevenindo a progressão da doença. o processo de excitotoxicidade e conduzindo a uma melhoria das atividades cognitivas28. Os astrócitos têm um papel importante na regula- 21. POTENCIAIS ALVOS TERAPÊUTICOS ção da neurotransmissão glutamatérgica, pois são responsáveis pela recaptação do glutamato Vários esforços têm sido feitos no sentido da fenda sináptica, através dos transportadores de desenvolver novas estratégias terapêuticas GLT1 (glial glutamate transporter 1) e GLAST que atuem nos mecanismos patogénicos sub- (glutamate aspartate transporter), e pela con- jacentes à doença de Alzheimer, prevenindo versão do glutamato em glutamina, uma reação desta forma a sua progressão. A maior parte catalisada pela enzima glutamina sintetase. A destas estratégias tem como pressuposto teó- glutamina sintetizada nos astrócitos serve para rico a hipótese da cascata de Aβ (Figura 29.5) formar glutamato de novo nos neurónios. Vá- e visa inibir a produção e agregação de Aβ e/ rios estudos têm mostrado que na doença de ou aumentar a sua remoção do cérebro, pre- Alzheimer ocorrem alterações significativas venindo o seu efeito neurotóxico (Figura no número e na atividade dos transportadores 29.6)30. Assim, têm sido desenvolvidos ativa- GLT1 e GLAST dos astrócitos, afetando a sua dores da a-secretase e inibidores/modulado- remoção da fenda sináptica, contribuindo deste res das β ou das g-secretases com o objetivo modo para o processo de excitotoxicidade. de diminuir a produção de Aβ cerebral. Com- postos com capacidade para prevenir a forma- ção de oligómeros tóxicos de Aβ têm também 20. TERAPÊUTICA SINTOMÁTICA sido testados. Outra estratégia terapêutica em desenvolvimento é a imunoterapia, a qual tem O conhecimento das alterações na neu- como finalidade aumentar a remoção de Aβ, rotransmissão que ocorrem na doença de podendo ser feita de modo passivo ou ativo. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Doenças de priões ou encefalopatias espongiformes transmissíveis

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SNC SNP Intestino Sistema linfático Sistema Intestino Sistema linfático Sistema

Figura 30.3 Vias da neuroinvasão por priões. Entrando no organismo por via oral, a proteína infeciosa do prião é transportada através do sistema digestivo do hospedeiro até atingir o intestino, onde passa para o sistema linfático (detalhe). Após se acumular no tecido linfático, vai dispersar-se pelo SNP e, subsequente- mente, o PrPSc vai passar para o SNC.

através do intestino, onde se vai replicar e acu- esplénico28. Curiosamente, a infeção por PrPSc mular em células dendríticas, macrófagos e cé- pode também ocorrer de uma forma anteró- lulas foliculares dendríticas do tecido linfático grada, do cérebro e medula espinhal para os associado ao intestino (placas de Peyer), bem tecidos periféricos, como já foi demonstrado como em fibras e gânglios do sistema nervoso em casos de iCJD, onde a PrPSc se desloca entérico. No entanto, a forma como ocorre a através do nervo ótico, no seguimento de um propagação de PrPSc do sistema linfático para transplante de córnea7. o sistema nervoso não é totalmente conhecida, apesar de se saber que os órgãos linfáticos são profusamente enervados pelo sistema nervoso 6. PRIÕES, NEUROINFLAMAÇÃO simpático e que fibras sensoriais do nervo vago E NEURODEGENERESCÊNCIA são largamente distribuídas pelo trato gas- trointestinal e comunicam quimicamente com Existem diferentes mecanismos propostos células dendríticas ativadas. para explicar a morte neuronal apoptótica que A dispersão inicial da infeção por PrPSc ocorre nas doenças de priões. Estudos in vitro para o SNC ocorre de uma forma retrógrada sugerem que a forma completa da proteína em termos de direção, através das fibras sim- PrPSc, bem como alguns fragmentos sintéti- páticas e parassimpáticas dos nervos vago e cos de péptido de prião, são tóxicos quando © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Doença de Parkinson e outras síndromes parkinsonianas

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H50Q

G51D A30P E46K A53T/E

1 60 96 140 aa Ligação de membrana NAC Região acídica

Figura 31.3 Proteína alfa-sinucleína. A alfa-sinucleína é uma proteína de 140 aminoácidos onde se dis- tinguem três regiões diferentes. Estão assinaladas as mutações associadas a formas familiares da doença de Parkinson. N: Terminal amínico. C: Terminal carboxílico.

familiares a que está associada. A idade média PINK1 é uma cinase serina/treonina mito- de início da doença é 32 anos, sendo que apre- condrial. Mutações neste gene são considera- senta, nestes casos, progressão lenta. velmente mais raras do que mutações no gene A parquina é uma E3 ligase da ubiquitina e que codifica a parquina. Clinicamente, as fa- está por isso envolvida na degradação de pro- mílias afetadas são muito semelhantes. No en- teínas pelo proteassoma. Assim, pensa-se que tanto, não existem ainda estudos patológicos a perda de função da parquina possa levar à nas famílias afetadas com estas mutações. acumulação dos seus substratos, o que pode influenciar a formação dos corpos de Lewy. PARK7

PARK5 Formas de doença de Parkinson autossó- micas recessivas foram associadas a mutações O locus PARK5 codifica para a proteína no locus PARK7, que codifica a proteína DJ-1 UCH-L1, uma enzima que pertence à família que se pensa estar envolvida na resposta ao das hidrolases da ubiquitina, participando na re- stress oxidativo. Mutações na DJ-1 causam iní- ciclagem das cadeias de ubiquitina. Pensa-se que cio precoce da doença (entre os 32 e 48 anos). a mutação identificada em doença de Parkinson Nestes casos a doença apresenta progressão (I93M) reduz a atividade da enzima, realçando lenta e boa resposta à levodopa. mais uma vez a importância da via de degrada- ção do proteassoma na patologia. Esta forma da doença é transmitida de forma autossómica do- PARK8 minante com penetrância incompleta. Uma vez que ainda não foram identificadas A alta frequência da mutação G2019S outras mutações no gene PARK5 que causem no locus PARK8, que codifica a proteína doença de Parkinson, subsistem algumas dú- LRRK2, nas formas familiares e esporádicas vidas de que este gene seja de facto causador de doença tem trazido um renovado interesse da doença. para a causa genética da doença. Esta muta- ção tem sido reportada com uma frequência elevada em casos esporádicos de doença de PARK6 Parkinson em diferentes populações (6,1% em espanhóis e portugueses, 18,3% em Ju- Mutações no gene PINK1 causam formas deus Ashkenazi e 39% em populações árabes recessivas de doença de Parkinson. A proteína norte-africanas). © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências 600

funcionalidade desses neurónios. O trans- porte axonal ocorre nos sentidos anterógrado e retrógrado e é promovido pelos motores moleculares das famílias cinesina e dineína, respetivamente14. Foram descritas mutações na subunidade p150Glued da dinactina do complexo dineína/dinactina em pacientes com ELA. Além disso, ratinhos transgéni- cos com mutações em genes necessários aos transportes retrógrado e anterógrado (por exemplo, ratinhos Cra1 ou Loa) sofrem de de- generação do neurónio motor. Proteínas dos neurofilamentos e a perife- rina são dois tipos de filamentos intermediá- rios detetados em inclusões axonais de pacien- tes com ELA. Por exemplo, a sobre-expressão de subunidades de neurofilamentos provocou a sua acumulação no corpo celular, o que levou, no caso da cadeia pesada do neurofila- mento, a atrofia do neurónio motor. Por outro lado, sobre-expressão da periferina causou a morte de neurónios motores durante o enve- lhecimento.

Figura 32.4 Estrutura tridimensional da Cu/Zn 3.3. Stress oxidativo SOD (SOD1)25. Os dois monómeros encontram-se representados em amarelo e castanho, o cobre em magenta, o zinco em prateado, o loop eletrostá- A existência de stress oxidativo em ELA tico em vermelho, o loop do zinco em prateado e tem sido apoiada por um largo número de ex- as pontes persulfureto intramonómero em laranja. periências15. Por exemplo, foram observados Figura construída com o PyMol, gentilmente cedida níveis elevados de 3-nitrotirosina, um marca- pelo Prof. Cláudio Soares. dor de stress oxidativo, em pacientes com ELA familiar e esporádica. O stress oxidativo é o resultado da produ- A sobre-expressão da Cu/Zn SOD (SOD1) ção desregulada de espécies reativas de oxigé- mutante em modelos celulares e animais pro- nio, como peróxido de hidrogénio, peroxini- voca ainda a fragmentação do complexo de trito, radicais anião superóxido e hidroxilo. As Golgi13, à semelhança do observado em neu- espécies reativas de oxigénio são subprodu- rónios motores de pacientes com ELA. O me- tos da cadeia respiratória mitocondrial e, em canismo subjacente é desconhecido. menor extensão, resultam da ação de outras enzimas oxidativas celulares, incluindo a xan- tina oxidase no citoplasma e o sistema P450 3.2. Inibição do transporte axonal no retículo endoplasmático. A descoberta de mutações na Cu/Zn SOD (SOD1) – uma en- Os neurónios motores podem ter axó- zima antioxidante – que provocam ELA veio nios com mais de um metro, por conse- apoiar a relevância do stress oxidativo nesta guinte, o transporte axonal é crucial para a doença. Foram avançadas várias hipóteses © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Doenças de expansão de poliglutaminas

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Acetilação de histomas Núcleo RE

FT

Gene mutante Recrutamento FT anormal de fatores de RNA mensageiro transcrição Recetor de IP3 mutante Ca2+ Ca2+ Ativação de caspases Bcl-2 Bax Proteína Cit c Toxicidade de mutante mitocôndria nativa Folding Refolding anormal Proteólise Tóxico vs. não tóxico? Interações Proteína Agregação proteína- mutante -proteína misfolded anómalas UPS/degradação proteassómica Agregados insolúveis Autofagia/ Oligómeros degradação Inibição do lisossómica proteassoma

Citoplasma

Proteassoma

Lisossoma

Figura 33.4 Mecanismos moleculares neuropatológicos na doença de Machado-Joseph. O processo pa- tológico inicia-se provavelmente com a síntese da ataxina-3 (ATXN3) mutante, que contém uma sequên- cia expandida de poliglutaminas, e que altera a conformação nativa da proteína, modelada pela presença de chaperones. Uma parte das proteínas com conformação anormal (misfolded) será potencialmente degradada ao nível do lisossoma, enquanto a outra porção será marcada com moléculas de ubiquitina (Ub) e degradada ao nível do proteassoma. A ATXN3 mutante tem a capacidade de se autoassociar, faci- litando assim a formação de espécies oligoméricas e agregados insolúveis. Um mecanismo alternativo é a potencial clivagem da ATXN3 mutante e a formação de um fragmento tóxico que amplifica o processo de agregação e patogénese. Todas as espécies intermédias formadas ao longo do processo de agregação poderão originar a ocorrência de interações proteicas anormais no ambiente celular, facilitando também deste modo a patogénese da doença de Machado-Joseph. Não é claro se estas espécies terão a capaci- dade de inibir o proteassoma, ativar caspases e/ou alterar a função mitocondrial. Produtos intermédios do processo de agregação são translocados para o núcleo, onde recrutam fatores nucleares como fatores de transcrição (FT), coativadores e co-repressores, inibindo a sua função normal, resultando numa alteração do processo transcricional. © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurociências 636

reportório extenso de ligandos, entre os quais indutível do óxido nítrico, sendo que este au- várias moléculas precursoras de fibras de ami- mento era já evidente em biopsias de nervo de loide; in vitro , foi demonstrado que agregados indivíduos PAF 0. In vitro, a exposição de cul- de TTR ligam RAGE, ativam uma cascata de turas primárias de neurónios a agregados de sinalização mediada pela cinase ERK 1/2, que, TTR conduz à produção desta sintetase, com- além de migrar para o núcleo, fosforila o fator provando o efeito dos agregados na indução de NF-kB que, por sua vez, ativa genes de infla- stress oxidativo26. mação27. Uma análise detalhada da expres- são de RAGE em biopsias de nervos PAF em diferentes estados da evolução da doença foi 4.3. Ativação de genes de remodulação realizada mostrando um aumento da expres- da matriz extracelular são deste recetor e da cinase ERK 1/2 com a evolução da doença. A ligação de agregados de Na PAF, a deposição extracelular de TTR TTR a membranas celulares poderá, portanto, é acompanhada por alterações no tecido con- interferir com mecanismos de sinalização ci- juntivo. Dado o caráter invasivo e traumático toplasmáticos, conduzindo a disfunção celular, das biopsias de nervo, foram estudadas, por nomeadamente neurodegenerescência. serem menos invasivas e traumáticas, biopsias de glândulas salivares labiais (um tecido tam- bém muito afetado pela deposição de TTR nos 4.2. Stress inflamatório e oxidativo doentes PAF) para a realização de estudos de comparação de expressão génica entre doentes A expressão de citocinas pró-inflamató- PAF e indivíduos normais. Observou-se que rias encontra-se aumentada nos nervos PAF26, genes relacionados com a remodelação da ma- sendo que indivíduos PAF 0 apresentam já ní- triz extracelular, nomeadamente o biglicano e veis aumentados destas citocinas. Estes dados a lipocalina associada à gelatinase neutrofílica indicaram que o stress neuronal nos doentes (NGAL) estavam sobre-expressos na PAF28. PAF se inicia em estados pré-sintomáticos. No Verificou-se ainda que nas glândulas salivares entanto, é surpreendente que da produção de são ativados mecanismos semelhantes aos que citocinas pró-inflamatórias não resulte o re- operam no nervo, já que nos nervos PAF estes crutamento de macrófagos, desconhecendo- genes se encontravam também sobre-expres- -se os mecanismos impeditivos subjacentes. sos. A metaloprotease-9 (MMP-9), que existe Contudo, verifica-se o aumento de uma cito- como um complexo com a NGAL, estava tam- cina anti-inflamatória, a interleucina-10, no bém aumentada nos tecidos PAF e in vitro foi decurso da progressão da PAF, o que sugere capaz de degradar agregados e fibras de TTR. a existência de um balanço entre mecanismos No entanto, na presença de componentes uni- pró e anti-inflamatórios28. versais das fibras de amiloide, as fibras de TTR O envolvimento do stress oxidativo na tornaram-se resistentes à proteólise. O estudo PAF foi inicialmente observado em biopsias das alterações da matriz extracelular poderá de cólon, onde marcadores de peroxidação li- ser relevante na compreensão dos mecanismos pídica e de modificação proteica por radicais associados à patogénese desta doença. livres estavam particularmente elevados em locais com deposição de fibras de amiloide. Em nervos PAF verifica-se também o aumento 4.4. Ativação da resposta ao choque de marcadores de stress oxidativo, nomeada- térmico (heat shock response) mente de hidroxinonenal (HNE), e de oxida- ção de DNA (8-hidroxi-2’-desoxiguanosina, As proteínas de choque térmico (heat shock 8-OHdG)29 de 3-nitrotirosina e da sintetase proteins – HSP) têm sido associadas a uma © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Neurogénese e terapia celular do cérebro

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as células do tipo B da zona subventricular, e stress diminuem a proliferação na zona sub- foram identificados como os precursores pri- granular, o que se correlaciona com perdas no mários de novos neurónios no giro dentado. desempenho de tarefas de aprendizagem de- No entanto, um estudo sugeriu que as células pendentes do hipocampo1. horizontais da zona subgranular, ou células do tipo II, podem autorreplicar-se e dar origem a neurónios e células da glia5. Os autores propu- 6. REGULAÇÃO DA NEUROGÉNESE seram a existência de uma relação recíproca entre os precursores Sox2+ dos tipos radial e A neurogénese depende de interações mo- horizontal. Apesar de não existirem evidências leculares e celulares que constituem o nicho definitivas, a visão prevalente é a de que os as- neurogénico. Os fatores que regulam a neuro- trócitos radiais do tipo I dão origem a células génese podem ser agrupados em intrínsecos, do tipo II. Estas, por sua vez, originam proge- extrínsecos e ambientais. nitores intermediários ou células do tipo III que geram os neuroblastos. Os neuroblastos migram para a camada granular do giro den- 6.1. Fatores intrínsecos tado e diferenciam-se em neurónios granula- res maduros e funcionais13. As células das zonas neurogénicas pos- suem características intrínsecas fundamentais e específicas que permitem a ocorrência da 5.2. Relevância funcional da neurogénese neurogénese. Estas incluem a expressão de fa- na zona subgranular tores de transcrição como Sox2, Mash1, Dlx2, Pax6 e Olig2. Animais com deficiência nos O hipocampo processa a informação res- níveis de Sox2 apresentam um número redu- ponsável pela formação de vários tipos de me- zido de precursores em divisão e de neurónios. mória incluindo a memória espacial, e desem- Mash1 contribui para a geração de interneuró- penha um papel central no condicionamento nios GABAérgicos no bolbo olfativo, enquanto das emoções. Dlx2 e Pax6 são essenciais para a produção de Várias evidências suportam um papel da neurónios periglomerulares dopaminérgicos. neurogénese da zona subgranular no processa- Olig2, por sua vez, opõe-se à ação de Pax6. A mento e armazenamento da memória no hipo- expressão dos diversos fatores de transcrição é campo. De facto, a neurogénese no hipocampo regulada por enzimas que controlam o estado é afetada por disfunções neurológicas que pro- de ativação da cromatina, incluindo histona- vocam declínio cognitivo como a isquémia ce- -acetiltransferases, deacetilases de histonas, rebral, a epilepsia, a doença de Alzheimer, entre metilases e demetilases14. outras. Por outro lado, a inibição da neurogé- nese com agentes antimitóticos ou com irradia- ção produz défices na execução de tarefas que 6.2. Fatores extrínsecos requerem memória dependente do hipocampo. Existem também evidências que sugerem um Os componentes extracelulares do nicho papel para a memória e aprendizagem no re- neurogénico também exercem um papel ful- forço da sobrevivência e integração de novos cral na manutenção das células estaminais e neurónios nos circuitos neuronais da camada neurogénese. Estes incluem fatores solúveis in- granular do giro dentado. tervenientes em vias de sinalização como a via A neurogénese na zona subgranular tam- Wnt/b-catenina, pró-neurogénica, a via sonic bém tem sido envolvida na regulação do hedgehog (Shh), que promove a proliferação, humor. A depressão e a exposição crónica a a via bone morphogenetic proteins (BMP), que © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS Terapia génica de doenças neurodegenerativas

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transcricionais (um domínio N-terminal de desempenham um papel central no início e na translocação, um domínio de repetição cen- progressão destas doenças, e que constituem tral que medeia a ligação ao DNA, uma região alvos moleculares promissores. C-terminal que possui sinal de localização nu- clear e um domínio de ativação de transcrição) ligados a um domínio nuclease. Esta tecnolo- 5.1. Doenças de poliglutaminas gia é muito promissora principalmente no que diz respeito à especificidade destas moléculas As doenças de poliglutaminas são doenças para o alvo terapêutico. neurodegenerativas hereditárias, autossómi- Na tecnologia CRISPR-Cas9 a correção do cas dominantes, causadas por uma repetição genoma é mediada por nucleases guiadas por anormal do tripleto CAG num gene específico RNA. Deste modo, nas células em que se pre- para cada doença, que se traduz numa cadeia tende efetuar a correção genómica é necessário poliglutamínica expandida e patogénica na introduzir/expressar dois componentes, uma respetiva proteína (ver Capítulo 33 – “Doen- nuclease-guiada por RNA, como a Cas9, e um ças de expansão de poliglutaminas”). Das nove “RNA guia”, sendo este último constituído por doenças da cadeia poliglutamínica identifica- dois blocos, o CRISPR RNA e o transativador das até à data, neste capítulo focamo-nos na CRISPR RNA. A porção CRISPR RNA vai doença de Huntington e na doença de Macha- guiar a Cas9 para um alvo/sequência específica do-Joseph. do DNA através da complementaridade RNA: DNA. Deste modo, o CRISPR RNA, uma se- quência de 20 nucleótidos no terminal 5´, es- 5.1.1. A doença de Huntington tabelece o local de corte e é específico do gene a corrigir, enquanto o transativador CRISPR A doença de Huntington é causada pela re- RNA é constante. Assim sendo, é possível di- petição patológica de CAG (>40 repetições) no recionar a atividade da Cas9 para qualquer gene huntingtina, localizado no cromossoma sequência de DNA apenas alterando os 20 nu- 4. A doença de Huntington caracteriza-se pela cleótidos do CRISPR RNA, desencadeando a presença de inclusões de huntingtina mutante correção genómica de forma eficiente e rápida. no citoplasma e núcleo. As abordagens tera- pêuticas disponíveis são meramente sintomá- ticas, dado que aliviam os sintomas motores e 5. APLICAÇÕES EM DOENÇAS psiquiátricos, mas não atrasam o desenvolvi- NEURODEGENERATIVAS mento das disfunções cognitivas e motoras. Várias estratégias tendo por base a terapia A utilização da terapia génica no trata- génica têm sido desenvolvidas e testadas em mento de doenças neurodegenerativas pressu- ensaios pré-clínicos e clínicos com o objetivo põe um conhecimento dos mecanismos mole- de modificar a progressão da doença. A ex- culares de doença que possam constituir alvos pressão do fator neurotrófico ciliar no cérebro terapêuticos. Tal conhecimento é infelizmente de modelos animais de doença de Hunting- limitado. Existem, no entanto, elementos co- ton, recorrendo a lentivírus e adenovírus, re- muns entre as doenças neurodegenerativas sultou numa redução significativa da lesão no mais prevalentes, tais como a doença de Al- estriado e em benefícios explícitos em termos zheimer, de Parkinson e doenças de poliglu- comportamentais. O implante de fibroblas- taminas, dos quais se destacam a acumulação tos geneticamente modificados de forma a aberrante de proteínas que perderam a sua segregarem fator neurotrófico ciliar humano conformação normal (misfolded) ou que exi- e encapsulados numa membrana polimérica bem uma tendência para a agregação e que promoveu também efeitos neuroprotetores, © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS © LIDEL – EDIÇÕES TÉCNICAS 8 cm 16,7cm x 24cm 33 mm 16,7cm x 24cm 8 cm

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NEUROCIÊNCIAS Capítulos

Parte I 1 Anatomia do sistema nervoso Este é um livro de texto abrangente destinado principal- Ana Cristina Rego 2 Células do sistema nervoso mente a estudantes das áreas da saúde, sobretudo Centro de Neurociências 3 Transporte axonal medicina e ciências biomédicas, no estudo das neuroci- e Biologia Celular (CNC) 4 Mielina e patologias associadas ências, neuroanatomia, neurofisiologia e neurobiologia. da Universidade de Coimbra; 5 Sinapse 6 Glutamato Dada a forma como foi concebido, é também uma refe- Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. 7 Ácido gama-aminobutírico rência para os profissionais e estudantes das áreas da 8 Acetilcolina

psicologia, biologia celular, bioquímica, biologia mole- IÊNCIAS 9 Catecolaminas Carlos B. Duarte cular, genética, ciências farmacêuticas e outras áreas 10 Serotonina Centro de Neurociências da ciência relacionadas com as neurociências. 11 Sistema purinérgico e Biologia Celular (CNC) 12 Neuropéptidos Esta obra foi escrita por destacados professores, investi- da Universidade de Coimbra; 13 Fatores neurotróficos Departamento de Ciências 14 Fases iniciais do desenvolvimento gadores e profissionais especializados nos tópicos que da Vida da Faculdade do sistema nervoso redigiram, sendo coordenada por três conceituados de Ciências e Tecnologia 15 Sinaptogénese investigadores da Universidade de Coimbra. Os capítulos da Universidade de Coimbra. 16 Plasticidade sináptica são profusamente ilustrados com figuras originais que 17 Sistemas de memória 18 Sistema visual descrevem os conceitos teóricos abordados pelos autores Catarina R. Oliveira 19 Sistemas auditivo e vestibular e que foram elaboradas por profissionais que se dedicam Centro de Neurociências NEURO 20 Sistemas olfativo e do paladar ao estudo e investigação na área, o que as tornam únicas. e Biologia Celular (CNC) 21 Movimento voluntário no ser humano da Universidade de Coimbra; Os conteúdos estão organizados em duas partes: uma Faculdade de Medicina Parte II dedicada ao desenvolvimento, à estrutura e à função do da Universidade de Coimbra; 22 Resposta neuronal ao stress sistema nervoso, e outra mais orientada para a clínica. Unidade para a Inovação Ê 23 Mecanismos de perceção da dor e Desenvolvimento (UID), 24 Esquizofrenia

Catarina R. Oliveira CIENCIAS

Ana Cristina Rego 25 Transtorno do espectro do autismo Acreditamos que esta obra, atual e rigorosa, será um mar- Centro Hospitalar e Universi- Carlos B. Duarte 26 Epilepsia co na história das neurociências em língua portuguesa. tário de Coimbra (CHUC). Coordenação: 27 Morte celular do sistema nervoso 28 Acidente vascular cerebral e isquémia neuronal Ana Cristina Rego 29 Envelhecimento cerebral e doença de Alzheimer Carlos B. Duarte 30 Doenças de priões ou encefalopatias Catarina R. Oliveira espongiformes transmissíveis Glossário disponível em www.lidel.pt, 31 até o livro se esgotar ou ser publicada Doença de Parkinson e outras uma nova edição atualizada ou com síndromes parkinsonianas alterações 32 Esclerose lateral amiotrófica 33 Doenças de expansão de poliglutaminas ISBN 978-972-757-693-7 34 Polineuropatia amiloidótica familiar 35 Neurogénese e terapia celular do cérebro www.lidel.pt 9 789727 576937 www.lidel.pt 36 Terapia génica de doenças neurodegenerativas