32º Encontro Anual da ANPOCS

27 a 31 de outubro de 2008

GT 02 – A Metrópole e a questão Social

Sustentabilidade das periferias nas metrópoles brasileiras

José Moreira de Souza Ricardo Carneiro

Sustentabilidade das Periferias nas Metrópoles Brasileiras

No clássico estudo Morte e Vida de Grandes Cidades, Jane Jacobs (2001) afirma: “Os processos que ocorrem nas cidades não são misteriosos, passíveis de compreensão somente por especialistas. Podem ser compreendidos por quase todo mundo. Várias pessoas comuns já os compreendem; acontece que elas não lhes deram nomes ou levaram em conta que, ao compreender esses esquemas triviais de causa e efeito, podemos também dar-lhes direção, se quisermos” p. 491. Por sua vez, Levi Strauss (1957), referindo-se à cidade de São Paulo, nos anos quarenta do século XX generaliza: Um espírito malicioso definiu a América como um país que passou da barbárie à decadência sem ter conhecido a civilização. Poder-se-ia, com mais justeza, aplicar a fórmula às cidades do Novo Mundo: elas vão do frescor à decrepitude, sem parar na madureza. (...) Para as cidades européias, a passagem dos séculos constitui uma promoção; para as americanas, a dos anos é uma decadência. Porque elas não são apenas recém construídas: são construídas para se renovar com a mesma rapidez com que foram erguidas, isto é, mal. P. 96. Esses autores anunciam abordagens intrigantes. Seriam frases de efeito? Essa percepção sintética de uma variedade de processos se expressa em enunciados consistentemente verdadeiros? Neste artigo examina-se a contradição que se mostra na persistência dos espaços periféricos em contraste com a provisoriedade dos espaços centrais, nos quais a cidade se mostra como monumento, city, urbs, astu. Este artigo parte de uma constatação que sustenta a pergunta principal em que se baseiam os comentários desenvolvidos nas seções que o compõem. A constatação é a de que, nas metrópoles brasileiras, especificamente, e nas metrópoles, em geral, segundo consta de uma ampla bibliografia, os centros são objetos de repetidos cuidados resultantes de uma rápida deterioração. A pergunta é: quais são os móveis que conduzem a uma revisão permanente dos padrões espaciais dos centros urbanos modernos? Para compreender o sentido da pergunta, dedica-se uma primeira seção ao estudo da situação do problema, às principais linhas de investigação da realidade urbana no Brasil e às contabilidades sociais que pretendem dar conta dessa realidade. A segunda seção contempla o percurso da determinação dos centros urbanos e das centralidades com atenção especial para a trajetória de ; examinam-se o diagnóstico e as propostas do Projeto da Área Central de Belo Horizonte – PACE – para enfatizar como seria essa área exercendo sua função plena como espaço do terciário nobre. Nessa oportunidade, discute-se a preocupação com a deterioração dos centros metropolitanos, fenômeno que incomoda as principais metrópoles. A terceira seção dedica-se a mostrar como as funções do Centro são repartidas imediatamente pelas periferias imediatas e posteriormente para periferias mais distantes, ensejando uma rede especializada de pólos complementares às funções metropolitanas. Chama-se aí atenção para o remanejamento das periferias. A quarta e última parte é reservada ao estudo das periferias atuais e ao desafio que impõem à estruturação metropolitana. O artigo busca retratar a condição do morar periférico, explicitando algumas hipóteses para alcançar sua sustentabilidade

1. Referencial Interpretativo Fustel de Coulanges, ao se referir à Cidade Antiga, afirma: “a cidade entre os antigos, não se formava com o decorrer do tempo pelo lento desenvolvimento do número dos homens e das construções. Fundava-se em um só dia.” (1975:106) Desse modo, a história da cidade determinava o tempo dos cidadãos, os anos desde a fundação da cidade - “ab urbe condita”. Essa marca da fundação está profundamente arraigada à história das atuais metrópoles brasileiras: 25 de janeiro de 1554 é a data da fundação de São Paulo (Marcílio, 1973); 20 de janeiro de 1565, a da fundação de São Sebastião do Rio de Janeiro (Cavalcanti, 2004). Entretanto, a cidade de São Salvador registra o ano de sua fundação, 1549, sem uma data precisa, levando Carneiro a perguntar: “teria havido, mesmo, essa data? Em algum dia do ano de 1549, o governador geral terá declarado, solenemente, fundada a Cidade do Salvador?” (1980, p.56). Pois bem, se essas cidades definem ou mantêm indecisas suas datas de fundação, importa fixar, para o estudo que se propõe o que significa fundar uma cidade. Para isso, a metrópole lusitana conferia, à autoridade responsável, poderes estabelecidos em dois documentos, o “regimento” e o “foral”. Tais documentos foram dados a Tomé de Souza para fundar a cidade de Salvador e, presumivelmente, a Estácio de Sá, para a de São Sebastião (Cavalcanti, 2004). Quanto a São Paulo, esclarece Pompeu de Toledo:

“São Paulo não teve um foral de vila, qual seja: o documento pelo qual o rei constituía as vilas, lhes concedia privilégios e lhes cobrava direitos correspondentes. Antes, herdou o de Santo André. Ou melhor: continuou o de Santo André, como aconteceria com um município que abandonasse sua primitiva sede e o transferisse para um dos distritos dentro de sua jurisdição” (2003, p. 111).

De imediato, um contraste se depara. São Paulo é a primeira vila que acolhe uma centralidade nômade, inicialmente a de Santo André, depois a de São Vicente, tornando- se “cabeça” da capitania. Segundo Pompeu de Toledo (2003), a cidade viveria uma constante trajetória de mutação em sua forma urbana, sendo refundada várias vezes. A esse respeito, Marcílio registra que “São Paulo não foi uma cidade talhada na pedra; suas casas não foram feitas para durar. Na Metrópole dos arranha-céus do século XX pouca coisa, quase nada, lembra seu recente passado e o pequeno burgo de 1850” (1973, p. 10). A trajetória do Rio de Janeiro tem algumas semelhanças. De centro da Capitania a capital da colônia, de capital da colônia a capital do Império, de capital do Império a metrópole esvaziada sintetiza os grandes processos por que passa o sítio urbano da cidade (Cavalcanti, 2004). Empreendendo a caracterização do espaço metropolitano do Rio de Janeiro, Santos sublinha haver uma “moda” de modelo metropolitano sintetizado nesta antiga metrópole imperial:

“O modelo do Rio de Janeiro tende a ser o de uma metrópole de núcleo hipertrofiado; concentrador da maioria da renda e dos recursos urbanísticos disponíveis; cercado por estratos urbanos periféricos, cada vez mais carentes de serviços e infra-estrutura à medida em que se afastam do núcleo. (...) A descrição serve ainda que com adaptações às especificidades locais, a Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife ou qualquer de nossas áreas metropolitanas, com exceção talvez, da de São Paulo (1987, p. 8).”

Essa afirmação conduz à suspeita de haver aspectos recorrentes na formação do espaço urbano das metrópoles brasileiras. Isso levará alguns autores a descobrirem os invariantes no interior das especificidades. Entretanto, como Santos (1987) reconhece, existem pelo menos dois modelos de configuração dos espaços metropolitanos no país - um consolidado em São Paulo e outro cujo paradigma seria o Rio de Janeiro. Embora o referido autor não se detenha no exame do modelo metropolitano de São Paulo, a análise empreendida do modelo da antiga capital nacional autoriza inferir que a metrópole paulista tem uma estruturação menos concentradora, favorecendo a consolidação de centros tais como o ABCD em direção ao litoral e os que se expandem ao longo do eixo da Via Dutra até Mogi das Cruzes, além do eixo da Anhanguera em direção a Campinas. Feitas essas considerações mais gerais, vale a pena focar a atenção em seis tendências de consolidação de linhas de pesquisa sistemática sobre áreas metropolitanas. A primeira delas é empreendida por Flávio Villaça (1998), ocupado com a análise das áreas metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Porto Alegre e Recife. O que move o autor é o propósito de construir um referencial interpretativo para detectar a estrutura dos espaços metropolitanos no Brasil, a partir de suas principais metrópoles. Um segundo autor (Leme: 1999), ou melhor, uma obra que reúne um conjunto de autores em torno de um projeto comum, é Silva Leme, em Urbanismo no Brasil – 1895 – 1965. Nessa obra, uma rede de pesquisadores se debruça sobre o processo de formação do pensamento urbanístico brasileiro e acompanha as diferentes intervenções criadoras de espaços nas cidades, com destaque para as metrópoles. Pode-se dizer que os estudos fixam momentos dos processos urbanos no país, dos quais a pesquisa de Villaça é como uma continuação. Um terceiro autor que merece atenção é Frederico Holanda, cujo propósito consiste em detectar a sintaxe dos espaços urbanos que rege as configurações espaciais. O estudo de caso que o autor desenvolve acerca de Brasília, contrastando-a com outros tipos de cidade de épocas diferentes, a partir da hipótese da plena secularização das relações sociais, converge para uma proposta extremamente relevante, qual seja, a construção de “um índice de desempenho espacial”, que qualificaria o “IDH” instituído e universalizado pelo PNUD” (2002, p. 422). Uma quarta linha de pesquisa é que vem desenvolvendo o cálculo da IDH das áreas intituladas UDHs de alguns municípios metropolitanos. Esses estudos tiveram início na Região Metropolitana de Belo Horizonte1, no final da década passada. O último deles retratou o município de São Paulo, desagregado em 456 unidades espaciais intra- urbanas.

1 DESENVOLVIMENTO Humano e Condições de Vida: Indicadores para a Região Metropolitana de Belo Horizonte – 1980 – 1991. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro / Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. 1996. ATLAS do Trabalho e Desenvolvimento Humano da Cidade de São Paulo. São Paulo, 2007. A quinta linha de pesquisa aqui considerada é a que formou a rede de Observatório das Metrópoles2, cujos estudos vêm priorizando a compreensão da diferenciação dos espaços metropolitanos, através de análises comparativas, com base em algumas metodologias tomadas como paradigmas3. As questões formuladas por Lúcia Bógus e Suzana Pasternak no presente encontro da Anpocs são as que vêm incomodando os diferentes núcleos da rede que compõem o Observatório das Metrópoles4. Por fim, a sexta e última linha é aquela promovida pelo Ministério das Cidades e que editou, recentemente, a série de monografias intituladas “Como andam as Metrópoles”5. Há que se entender que, embora os autores das citadas monografias sejam também integrantes do Observatório das Metrópoles, a demanda específica de um Ministério determina o escopo dos estudos e relatórios, articulando-as a uma ampla política de desenvolvimento urbano nacional. Todas as linhas enumeradas têm, em comum, a atenção para a estruturação do espaço urbano das metrópoles, algumas em busca de análise de processos, outras à procura da diferença marcada por um determinado tipo de estruturação. Entretanto, a persistência cada vez maior da definição de medidas que favoreçam comparações, atestada pelos trabalhos mais recentes na área, deve merecer nossa atenção para além das teorias do que é ou não urbano. São indicadores orientados para a apreensão das desigualdades socioeconômicas no espaço das cidades, cuja mensuração desconecta-se da problemática urbana stricto sensu para atender, mais de perto, à formulação e implementação de políticas sociais, em especial aquelas de recorte focalizado. Dirce Koga sumariza os diferentes indicadores intra-urbanos que vêm sendo produzidos com vistas à comparação entre os espaços configurados, chamando a atenção para a importância do estabelecimento de medidas como “critérios e condições prioritários na obtenção de recursos junto às agências internacionais de financiamento” (2003, p. 81).

2Tal rede vem se fazendo presente nos encontros da ANPOCS desde o segundo lustro da década passada. 3 Apenas como exemplo consultar: RIBEIRO, Luiz César de Queiroz (org.). O Futuro das Metrópoles: Desigualdades e Governabilidade. Rio de Janeiro: Revan: Fase, 2000. CADERNOS Metrópoles / Grupo de Pesquisa PRONEX – n.1 [1999] São Paulo: EDUC, 1999. Esse primeiro número da série teve como organizadores Lúcia Bógus e Luiz César de Queiroz Ribeiro. MENDONÇA, Jupira Gomes de e GODINHO, Maria Helena de Lacerda. População, espaço e gestão na metrópole: novas configurações, velhas desigualdades. Belo Horizonte: PUC Minas, 2003. ANDRADE, Luciana Teixeira de, MENDONÇA, Jupira Gomes de, e FARIA, Carlos Aurélio Pimenta de (0rgs.) Metrópole, território, Sociedade e Política: o caso da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Belo Horizonte: PUC Minas, 2008. 4 Consultar www.anpocs.org,br 32º Encontro Anual da ANPOCS. Dinâmica intrametropolitana e organização socioespacial na Região Metropolitana de São Paulo. 5 As referidas monografias constituem um componente do Programa Nacional de Capacitação das Cidades. Ver, a respeito, MINISTÉRIO das Cidades. Como Andam as Regiões Metropolitanas. Programa Nacional de Capacitação das Cidades.Brasília 2008. [Disponível em PDF no portal www.cidades.gov.br. Essa relação entre índices e indicadores como critérios de obtenção de recursos externos aponta imediatamente para determinações das fontes de financiamento congruentes com a ordem urbana internacional ou global. Dentre os conjuntos de medidas sistemáticas sobre os espaços diferenciados das metrópoles, a autora confere destaque para o Índice de Desenvolvimento Humano - IDH, os Mapas de Pobreza e de Exclusão Social e o Índice de Qualidade de Vida Urbana – IQVU. Tais critérios não esgotam, evidentemente, as possibilidades de criação de índices e indicadores, mas informam a busca de homogeneidade para o estabelecimento de comparações e ordenação de prioridades6. A alocação de recursos públicos não é o único parâmetro para a produção de informações, interessando principalmente à ordem distante – agências financiadoras dos estados, da União ou internacionais. No entanto, a aplicação dos mesmos indicadores e índices para a compreensão da estruturação urbana pode ou não coincidir com a caracterização das diferenças e desigualdades que configuram os espaços e, por extensão, as necessidades decorrentes. De todas as medidas o IDH e o Índice de Condições de Vida – ICV são os que obtiveram maior aceitação como critérios de alocação de recursos no país. Entretanto, quando se trata de medidas, há que ter sempre presente um pensamento de Santo Agostinho fixado como epígrafe da obra O Primeiro ano de vida de René Spitz7, que diz: “Ita Domine Deus meus, ego metior, et quid metior nescio”8. As unidades de medida não caracterizam o real, mas uma realidade que se quer alcançar. Esse é o grande desafio das medidas, ao criar unidades, essas medidas homogeneízam o real9. Em face ao exposto vale fixar que todos os principais indicadores em uso no Brasil têm, por base, informações produzidas pelo IBGE a partir dos Censos Demográficos. Disso resulta que as informações que dão suporte à produção de índices e indicadores derivam

6 Na data de apresentação deste artigo, já deverá estar disponível nos endereços www.pnud.org.br. ou www.virtual.pucminas..br/idhs, os índices do IDHS que procuraram agregar ao IDS indicadores de sustentabilidade, juntamente com o Banco de Metodologias de Indicadores Municipais. Conferir: PUC Minas nº 289, agosto 2008, p. 8-9. 7 O referido pesquisador, cabe ressaltar, não está preocupado com o Desenvolvimento Humano como agregado de indivíduos, mas com o desenvolvimento da criança até um ano de idade. 8 “Assim Senhor meu Deus, eu estou medindo, mas o que meço, desconheço” (tradução nossa). 9 Vale ter presentes as considerações de Gaston Bachelard sobre os obstáculos do conhecimento quantitativo: On se tromperait d’ailleurs s’i l’on pensait qu’une connaissance quantitetive échappe en príncipe aux dangers de la connaissance qualitative. Le grandeur n’est pas automatiquement objetive et il suffit de quiter les objects usuels pour qu’on accueille les determinacions géometriques les plus bizarres, les determinations quantitatives les plus fantasistes” ... L’excès de precision. Dans le règne de la quantité, correspond três exactement a l’excès du pittoresque, dans le régne de la qualité. BACHELARD. Gaston. La formation de l’esprit scientifique. Paris : Librairie Phiplosophique J. Vrin, 1972 p. 211- 212. de uma concepção de medidas relevantes para acompanhamento do desenvolvimento nacional. Foi somente com a institucionalização das Regiões Metropolitanas que as informações dos censos passaram a ser mais requisitadas firmando consenso de uso para áreas urbanas, o que exigiu uma maior atenção para a delimitação dos Setores Censitários, sobre os quais repousam a possibilidade de desagregação das informações para unidades menores que os distritos dos municípios. Aqui se menciona um dos aspectos mais importantes no tocante à construção de indicadores: a variável espacial é denominador necessário de todos os índices para agregações superiores10. Avançando além dessas considerações, cumpre lembrar que as medidas em escala urbana, especialmente as metropolitanas, exigem hoje uma maior atenção, tendo em vista as determinações do Estatuto da Cidade11. A exigência de planos diretores participativos para todos os municípios metropolitanos, juntamente com a de um Plano Diretor Metropolitano de acordo com prescrições para alguns estados da Federação, coloca em relevo as propostas de diretrizes fundadas em diagnósticos das estruturações espaciais. Com isso, as medidas que fundamentam as políticas estaduais, federais e as necessárias à obtenção de recursos externos tornam-se insuficientes. Nem mesmo as desagregações dos espaços conforme bases de dados dos censos demográficos são adequadas, posto que os setores censitários ainda não obedecem a critérios de estruturação urbana mas, principalmente, aos de administração do censo. A necessidade de obter informações que facilitem acompanhar a estruturação do espaço urbano metropolitano poderá exigir o retorno a discussões de propostas do antigo CNPU – Conselho Nacional de Política Urbana -, sugerindo a implantação de Cadastros Metropolitanos12. A chamada de atenção para as unidades de vida urbana, mais do que para os zoneamentos de uso, as unidades de planejamento, as regiões administrativas,

10 Em reunião preparatório para o Censo Demográfico de 1990 , realizada em fevereiro de 1985, no Rio de Janeiro com a presença de todas as Regiões Metropolitanas instituídas, sugeriu-se à Diretoria do IBGE que os setores censitários apenas fossem modificados de um Censo para outro por agregação ou desagregação. Por sua vez, o IBGE, a partir do Censo de 1991, passou a apresentar nos relatórios informações desagregadas por Bairros, Regionais, Sub-distritos e Distritos para todos os municípios que regulamentassem essas sub-divisões internas, além da distinção entre Urbano e Rural. Cumpre lembrar que os expedientes de macro-zoneamento empreendidos por diversos órgãos metropolitanos justificavam a necessidade de monitoração do desenvolvimento interno, tendo em vista diretrizes de programas e projetos. 11 BRASIL. Estatuto da Cidade; Guia para a implementação pelos municípios e cidadão. Brasília: Câmara dos Deputados, 2001. 12 Sobre o assunto ver: CNPU. Cadastro Metropolitano. Brasília, 1978. PLAMBEL As informações cadastrais na estrutura e na experiência do PLAMBEL. Belo Horizonte, 1979. METROPLAN. I Simpósio Internacional de Informações para o Planejamento Urbano. Gramado RS. 20 a 24 de junho, 1977. IDU- Instituto de Desarollo Urbano. Noticiero IDU. Bogotá, fev. 1978, nº 20. distritos e sub-distritos e a inserção dessas unidades numa escala que evidencie as múltiplas leituras da cidade de acordo com o interesse dos agentes que formam, conformam ou transformam o espaço urbano poderá pautar a ordem do dia do planejamento e sua monitoração. Disso pode resultar a criação de contabilidades sociais da vida urbana que enfatizem as diferenciações espaciais muito mais do que as igualdades e desigualdades, centros e periferias; medidas que deixam de lado aspectos tais como a resistência à homogeneidade tão exigida pelos agentes do mercado insinuados nas políticas públicas (Serpa, 2007; Santos, 1980). Essas ponderações remetem-nos diretamente para a questão das séries espaciais, componentes fundamentais das séries de medidas estatísticas. A atenção para a fragmentação dos espaços metropolitanos, mesmo que se ponha em relevo, como se fará neste artigo, as intervenções priorizadas dos centros urbanos das metrópoles e a ausência de serviços nas periferias, necessariamente exigirá interpretar o esforço de reificação de categorias abstratas, tais como centro e periferia, impostas como descritivas para intervenções de políticas públicas13. Se a Escola de Chicago postulou que a configuração do espaço urbano resulta da competição “natural” da qual seguem, como corolário, a busca pela centralização, concentração, segregação, invasão e sucessão (Poplin, 1972), destacando ainda que, nas áreas metropolitanas, necessariamente devem ocorrer anéis suburbanos, entre nós esse esforço se reproduziu em outros expedientes14. Como se verá mais à frente, a agência de planejamento da RMBH – PLAMBEL -, após sucessivos ensaios de zoneamento chegou às Unidades Básicas de Estrutura Metropolitana – UBES - substituídas posteriormente por uma hierarquia de leitura das estruturações metropolitanas, designada Sistema de Unidades Espaciais15. Esse sistema busca ler a estruturação metropolitana sob o diferente aspecto dos agentes públicos e privados que configuram determinações da ordem distante, envolvendo o Estado e sua burocracia, as marcas do

13 Mesmo que os órgãos de Planejamento das Regiões Metropolitanas não tenham conseguido impor estudos do corpo técnico, a determinação e diferenciação das periferias foi um esforço conjunto de todos eles. Sobre esse assunto a obra de Flávio Villaça (1998) permite um excelente recuperação, mesmo que o autor não tenha esse propósito. 14 Consultar: TASCHNER, Suzana Pasternak e BÓGUS, Lúcia M. M. “A cidade dos Anéis: São Paulo.” In RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz (org.) O futuro das metrópoles: desigualdades e mobilidade. Rio de Janeiro: Revan; FASE, 2000. e também “São Paulo com patchwork: unindo fragmentos de uma cidade segregada”. In BÓGUS, Lúcia M. e RIBEIRO, Luiz Cesar de Queiroz (org.s) Cadernos Metrópole: desigualdade e governança. Nº 1 São Paulo: EDUC, 1999. 15 Parece que a concepção da estrutura dos espaços metropolitanos compreendida por anéis se firmou como um arquétipo da configuração dos espaços. No caso da RMBH, mesmo com a busca das especificidades do comprometimento do espaço com a metropolização, a idéia dos anéis ainda insiste em se afirmar, especialmente na distinção entre Núcleo Central e Área Pericentral. capital monopolista materializada nos agentes financeiros e da produção, o capital concorrencial, dividido em inúmeros ramos de atividade e a força de trabalho organizada ou obediente aos ditames de sua reprodução; e a ordem próxima, materializando a ordem e a desordem espacial presente nas decisões geradoras de conflitos, acordos ou consensos que determinam as formas de habitar, os processos de morar. O Sistema de Unidades Espaciais da RMBH determina a agregação dos indicadores, índices, e parâmetros, ao mesmo tempo em que explicita a intenção da agência de planejamento de se fazer presente no diálogo com os demais agentes que configuram o espaço metropolitano. Numa ponta, a forma de comprometimento com a metropolização expressa nas macrounidades, em constante diálogo com as configurações espaciais criadas por outras burocracias - a ordem municipal, os distritos, sub-distritos, as administrações regionais, Leis de Parcelamento, de Usos e Ocupação, códigos de obras e de posturas, zoneamentos ambientais etc. Em sua concepção está embutida a fé no poder da informação e, principalmente, da informação como poder. Desse modo, ele obedece aos parâmetros do que caracteriza os padrões monetários – medida de valor e reserva de valor -, exigindo uma instância de tradução – conversão para definir os equivalentes de troca. Na outra ponta, a busca incessante de determinar essa unidade de valor se expressa na definição dos espaços homogêneos, configurados em obediência ou desobediência às disposições burocráticas das leis de Parcelamento, Uso e Ocupação do solo, dos zoneamentos, códigos de obras ou de posturas. Se, do lado dos macro-processos, a área metropolitana se mostra facilmente legível e inteligível, quando se chega à obsessão da homogeneidade, tudo escapa16. Há que reconhecer que a igualdade como valor último, posta como ideologia, evidencia a desigualdade como realidade preponderante; daí, a mais homogênea das áreas explicita ainda uma grande desigualdade. Mais do que isso, a busca de homogeneidade deixa escapar uma outra leitura do espaço presente na estruturação das unidades de vida urbana. Nessas, o que conta não são as igualdades, mas as diferenças, traduzindo o esforço dos cidadãos para descaracterizar a cidade regida pela ordem burocrática e afirmar suas diferenças.

16 In short, natural areas are homogeneous units found within the heterogeneous urban milieu. POPLIN, Dennis e. op. cit. p.85. As áreas homogêneas de que trata este artigo não são “naturais”. Elas resultam de opções dos agentes em fixar determinados usos, configurando um mercado imobiliário. Nessa busca incessante do rigor da medida, Bachelard já alertava com exemplos anedóticos. Il em épouisse la mesure jusqu’à la derniére decimale, como la notaire compte une fortune jusqu’au dernier centime. Ibid. P. 213 Há que lembrar sempre que a busca de homogeneidade nas relações espaciais contrasta com uma outra categoria, a de espaços segregados. A homogeneidade postula a integração, enquanto que a segregação, a existência de vida comunitária resistente a uma ordem urbana superior. Desse modo, os espaços segregados poderão exibir, em seu interior, altos coeficientes de desigualdade sócio-econômicas, ao passo que a situação se inverte nos espaços homogêneos. A segregação exibe processos de dominação bem mais nítidos do que a estratificação social do espaço pelo expediente do acesso desigual aos bens oferecidos pelo mercado. Uma segregação que estratifique o espaço também com base na desigualdade denuncia a existência de uma divisão do trabalho pré- moderna, mesmo que vigore em cidades altamente globalizadas. Segregação denuncia o limite da natureza anti-urbana 17. Segregação impõe a necessidade de luta étnica em favor da integração, ao contrário dos movimentos sociais urbanos que, conforme tratados pela literatura se manifestam pela luta de direito à igualdade de acesso aos serviços urbanos18. Isto posto, o artigo discorrerá, na próxima seção, sobre a preferência de intervenção pública nos centros urbanos, colocando em relevo a questão da centralidade metropolitana. Em seguida, ocupa-se da estruturação metropolitana, vista em seus conflitos entre a ordem distante, da qual o centro é a síntese e principal mediação, e a fragmentação do espaço, ensejando o recesso do espaço cidadão nas periferias.

2. Determinação dos Centros e criação de centralidades urbanas – metropolitanas.

17 Ver MOORE Jr. Barrington. Injustiça, as bases sociais da obediência e da revolta. São Paulo: Brasiliense, 1987. cap. 2 “ A autoridade moral do sofrimento e da injustiça”. 18 A determinação do parágrafo 5º do artigo 216 da Constituição de 1988 tem conduzido à possibilidade de criação de espaços nitidamente segregados, especialmente quando combinado com o artigo 68 das “Disposições Constitucionais Transitórias”. Estudos têm levado autores a descobrirem segregação étnica nos espaços metropolitanos. O artigo “Desigualdades raciais nas condições habitacionais da população urbana” examina a distribuição de negros pobres nas metrópoles do Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo para concluir que “as condições habitacionais são diferenciadas racialmente em grande medida porque a provisão de serviços urbanos está correlacionada com a pobreza e esta com a composição racial”. ... “O foco na questão racial ajuda mostrar a cara do foco na pobreza.” Mas acrescenta-se “embora não se trate de advogar um esquecimento de políticas dirigidas ao pobre branco”. P. 109-110. RIOS NETO, Eduardo e RIANI, Juliana de Lucena Ruas. In SANTOS, Renato Emerson dos (org.) Diversidade, espaço e relações étnico-raciais: o Negro na Geografia do Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. Da ampla bibliografia sobre movimentos sociais, consulte-se: GOHN, Maria da Glória. Teorias dos movimentos sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo: Loyola, 1997; DOIMO, Ana Maria. A vez e a voz do popular: movimentos sociais e participação política no Brasil pós-70. Rio de Janeiro: Relume Dumará: ANPOCS, 1995; POMPERMEYER, Malori José (Org.). Movimentos sociais em . Belo Horizonte: UFMG, 1987. Na obra Perspectivas urbanas: temas críticos en políticas de suelo en América Latina, os editores selecionaram, como último capítulo, à guisa de conclusão, artigo de David Barkin, escrito em 1994, intitulado: “Reconcebir la ciudad: una nueva perspectiva de las políticas de asentamientos humanos en América Latina”. Nele, após examinar o problema, o autor declara, como sintoma, os altos índices de pobreza e os níveis sem precedentes da concentração da renda, o que o leva a afirmar taxativamente que “de continuar esta situación, se producirán conflictos incontrolables que pudieran transcender las fronteras nacionales” (Smolka & Mullahy, orgs. 2007; p. 360). Tal situação de pânico conduz à proposição de que “se hace necesario concebir de nuevo la ciudad entera”( Smolka & Mullahy, p. 361). Chega-se, aqui, a algo que está no cerne da temática do presente artigo: requalificação, reforma, revitalização19 dos centros metropolitanos ou refundação da cidade. Em artigo publicado no início dos anos 80 do século passado, Castells examina os problemas dos centros nas áreas metropolitanas e a atenção que merecem por parte do Estado. O autor trata a crise da centralidade urbana como provocadora dos interesses pela renovação ou revitalização dos centros em escala mundial. Em seguida, comenta as experiências internacionais de renovação urbana, pondo em evidência a renovação do centro de Paris, o programa de renovação dos Estados Unidos, o qual é responsável por remanejamentos de população na ordem de 4 milhões de pessoas, além dos exemplos de Madri e outras metrópoles européias. Sua conclusão mais geral é que “o que está realmente deteriorado é a cidade central e não o centro, e o que realmente se renovou foi o centro urbano e não a cidade central (Catells, 1982 p. 72). No Brasil, as cidades metropolitanas têm sido objeto de refundação desde, pelo menos, o ano de 1873, quando as elites dirigentes de São Paulo (Toledo, 2003; Simões Júnior, 1999) se deram conta de que a cidade deveria se preparar para sua nova vocação, passando pelos projetos modernizantes das cidades que se consolidaram como capitais no período colonial – Rio de Janeiro, Salvador, Recife, Porto Alegre (Rezende, 1999; Fernandes et al. 1999; Moreira, 1999, Souza, 1999; Almeida, 1999) -, até essa varredura soprada pelos ventos da globalização. Esses momentos de fundação ou refundação das cidades metropolitanas merecem toda a atenção porque resultam de críticas aos padrões espaciais vigentes. Suspeitam da inadequação entre tais padrões e a vida espacial entendida como necessária às capitais, para colocarem em debate as pressões uma

19 Sobre a atualidade desses assuntos, consultar YÁZIGI, Eduardo. 2006, p. 18-30. ordem social expressa na vida social. Em outras palavras, explicitam revisões das regras da sintaxe urbana (Holanda, 2002). Com efeito, os padrões espaciais, ao surgirem nas pranchetas dos urbanistas, não resultam de uma criação ex nihilo. Ao contrário, são o primeiro exercício de interpretação de uma ordem urbana que deverá favorecer novos padrões de vida espacial, obedientes ao encaminhamento dos conflitos impostos pela vida social. Há, entretanto, um novo momento em que a questão urbana, especialmente a metropolitana, passa a gerar incômodos em grande escala. É aquele em que o saber técnico dos urbanistas se institucionaliza e em que duas das metrópoles nacionais chegam à casa dos 4 milhões de habitantes – Rio de Janeiro e São Paulo. Na agenda dos movimentos sociais a grita por Reforma Urbana assume lugar de importância. Nos anos 50, o Movimento Economia e Humanismo, materializado na Sociedade de Análises Gráficas e Mecanográficas Aplicadas aos Complexos Sociais – SAGMACS, realiza importantes estudos regionais e urbanos em Recife, São Paulo, Belo Horizonte, Rio de Janeiro e na Bacia Paraná-Uruguai (Leme, 1999, p. 33). No que diz respeito a Belo Horizonte, bem como a São Paulo, os estudos enfatizam a questão da área metropolitana (Leme, 1999). A distinção entre o Great e o Greater Belo Horizonte demarca a diferença entre a área conurbada – a Grande Belo Horizonte – e a área de influência direta da metrópole – a Região Metropolitana de Belo Horizonte (Dias, 1972). Entretanto, será o regime militar que cuidará de elaborar um amplo programa de “reforma urbana”, através da criação, já em 1964, do Banco Nacional da Habitação – BNH, seguido do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo - SERFHAU, do Conselho Nacional de Política Urbana – CNPU (Toledo e Cavalcanti, 1978; Barat, 1979; Schimidt, 1983), e da institucionalização das Regiões Metropolitanas, pela Lei Complementar n. 14/73. A SAGMACS é responsável pela criação da tradição de pensar a metrópole em Belo Horizonte. Essa tradição imigra nos anos 64 para o Departamento de Habitação Popular da Secretaria de Estado de Trabalho e Cultura Popular, posteriormente para o Conselho Estadual de Desenvolvimento, até a criação do Grupo da Grande Belo Horizonte, origem do PLAMBEL como diretoria da Fundação João Pinheiro20.

20 PLAMBEL – Ano 15: O resultado de um convênio. Belo Horizonte, jul. 1986. Direcionando, aqui, o foco analítico para o caso de Belo Horizonte, vale relembrar que a cidade tem marcas especiais. Ao contrário de todas as capitais existentes, ela foi fundada para ser “um espaço para a República” (Siqueira, 1973; Almeida, 1989). Como capital deveria ser a cidade síntese das Minas Gerais. O padrão espacial desenhado e obedecido a partir da criação da cidade revela a hierarquia de símbolos a serem decodificados intuitivamente por todos os seus moradores e visitantes. O núcleo central é circundado pela Avenida do Contorno – Avenida 17 de Dezembro, a qual demarca a muralha simbólica da centralidade, que deveria ser reconhecida, cultuada e reverenciada. O acesso a esse núcleo se daria pela Praça da Estação. Em seu entorno se constituiriam as atividades características da reprodução material da metrópole – armazéns, depósitos de mercadorias e indústrias. O padrão espacial concebido na planta explicita o saber técnico da estrutura urbana consolidada nos espaços de Washington, Buenos Aires e demais cidades tidas com atualização do moderno. Há um espaço central, no qual a cidade congrega os monumentos da ordem territorial e os agentes promotores dessa ordem. Há um espaço suburbano, que flexibiliza a ocupação, entendido como forma de acolhida dos que podem participar dos benefícios urbanos, obedecidas algumas condições. Há, finalmente, o espaço rural, que favorece a subsistência dos moradores da cidade. O centro urbano é dividido em seções, ordenando sua ocupação. Praças localizadas nos limites da muralha da Avenida do Contorno designam as portas de entrada e congraçamento 21. A centralidade urbana é conferida, de um lado, pelas necessidades materiais da cidade, e, de outro, pela consciência moral. As necessidades materiais se encontram na parte baixa do centro, articulando a área urbana à suburbana; as necessidades espirituais na parte mais elevada, cumprindo o mesmo papel articulador. Cumpre notar ainda que, além do matadouro outras funções urbanas estão localizadas na zona suburbana, como o hipódromo e o cemitério. Um e outro equipamento ocupam o lado oeste da zona urbana, contrastando o que está em baixo e o que se localiza no alto. As seções suburbanas,

21 Além da Praça da Estação, destacam-se as praças do Mercado – futura praça da rodoviária, Praça Rio Branco -, a Praça de Belo Horizonte, atual Praça Floriano Peixoto, além da qual estariam localizados equipamentos urbanos tipicamente suburbanos tais como matadouro, esgotos e oficinas; por último, a Praça da Catedral, localizada no ponto mais elevado de toda a área urbana, no final da Avenida Afonso Pena. Ver FUNDAÇÃO João Pinheiro. Panorama de Belo Horizonte: Atlas Histórico. Belo Horizonte, 1997 embora com ruas de apenas 14 metros de largura, têm previstos espaços de convergência, em praças de porte menor que as do perímetro urbano. Esse desenho original passou por algumas modificações antes mesmo de a cidade ser fundada. A primeira delas ocorre já em outubro do ano de 1895. Os padrões espaciais que merecem destaque, no entanto, estão fixados. Há funções urbanas que não são compatíveis com o espaço plenamente urbano – cemitérios e matadouros. Um outro aspecto a ser salientado é que nenhuma avenida ultrapassa a muralha urbana que demarca a zona central. Os planejadores não suspeitavam de uma cidade articulada por autovias. Decorridos cerca de 40 anos de sua fundação, Belo Horizonte estenderá vias que rompem com a Avenida do Contorno 22. A aposta do predomínio do modo ferroviário será o primeiro preço que a cidade deverá pagar, especialmente quando as elites dirigentes descobrem que algumas funções urbanas são pouco compatíveis com um espaço destinado a ser centro. É o caso da indústria e de novos meios de comunicação sustentados pelo modo aéreo. Esse padrão espacial do centro metropolitano estabelece as regras da vida espacial. Ao rés do chão - o primeiro signo da metrópole -, as simultaneidades vão se tornando mais escassas a cada subida de degraus determinadas pelos tempos seletivos. No centro metropolitano de comércio e serviços, o primeiro degrau, nenhuma grande praça favorece simultaneidades23. O centro do poder - a Praça da Liberdade - é também um amplo espaço favorável às simultaneidades; ele, porém, é interpretado como local de reunião das elites, dos convidados, e procurado como centro das manifestações cívicas, início ou término das passeatas. Desse modo, a cidade tem determinados dois grandes espaços públicos, os formados pela Praça da Estação – Praça da Rodoviária, capazes de promover co-presença da ordem de centenas de milhares de pessoas, e a Praça da Liberdade. O primeiro representa o espaço popular em seu cotidiano e, o segundo, o espaço cívico, das celebrações e das contestações. Como se pode ver em Villaça (1998, p. 121-122), a defasagem entre padrão espacial e vida espacial em Belo Horizonte se mantém até meados dos anos 40 do século passado24.

22 A análise do que se chama padrão espacial tem como base a obra Panorama de Belo Horizonte: Atlas Histórico, publicada pela Fundação João Pinheiro, em 1997. 23 Apenas em 1935, a Praça Raul Soares é incorporada aos padrões da vida espacial com a realização do Congresso Eucarístico. 24 Ver também PLAMBEL, O processo de desenvolvimento de Belo Horizonte – 1897 – 1970. Belo Horizonte, 1979. Assim que iniciados, em 1972, os estudos para o Planejamento da Região Metropolitana de Belo Horizonte, serão desenvolvidas diversas pesquisas para retratar o espaço25. Desses levantamentos resultou o Plano de Desenvolvimento Econômico e Social – PDIES - da RMBH, cujo detalhamento em ações foi prescrito no Esquema Metropolitano de Estruturas – EME. Do EME decorreram inúmeros programas, detalhados em projetos. Dois deles merecem comentário: o Modelo Metropolitano de Transporte Integrado – MOMTI – e o Projeto da Área Central – PACE. O MOMTI visava a implantar, dentro de uma concepção do sistema de transportes, uma cidade concebida como uma rede de centros hierarquizados. Desses centros, dois teriam porte metropolitano - o CM1, materializado no Núcleo Central da capital, e o CM226, localizado no Eixo Industrial, em . Previram-se também centros zonais, complementares aos centros de porte metropolitano, que reforçariam principalmente as sedes municipais. De acordo com o EME, em 1990, o CM1 e o CM2 concentrariam, respectivamente, 45% e 13% dos empregos da RMBH, ficando os restantes 42% dos empregos distribuídos pelos demais centros. Sonhava-se, portanto, com uma metrópole capaz de concentrar e distribuir emprego, superando os desafios impostos pela formação de periferias carentes27. Direcionado para a requalificação do centro metropolitano, o PACE buscava modificar a “especialização de suas funções atuais, bem como elevar o grau de sofisticação dos serviços que presta” (PLAMBEL, 1978). Duas intervenções básicas deveriam garantir a pretendida elevação do grau de sofisticação do Núcleo Central. A primeira consistia na implantação da Lei de Uso e Ocupação do Solo e, a segunda, as intervenções no sistema viário e de transportes. No espírito da Lei de Uso e Ocupação do Solo estava implícito que, a despeito de vir perdendo população, a área central poderia ainda ser um local adequado à moradia, desde que se cuidasse de disciplinar os demais usos, conciliando-os com o residencial.

FUNDAÇÃO João Pinheiro. Omnibus: uma história dos transportes coletivos em Belo Horizonte. Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro - Centro de Estudos Históricos e Culturais, 1996. ______. Saneamento Básico em Belo Horizonte: Trajetória em 100 Anos. Os serviços de água e esgoto. Belo Horizonte: FJP, 1997. ______. Belo Horizonte e o Comércio: 100 anos de História. Belo Horizonte, 1997. 25 As mais importantes são: Pesquisa Origem e Destino, Pesquisa Sócio-econômica, Pesquisa de Uso e Ocupação do Solo, Pesquisa da Vida Associativa. 26A criação do CM2 se justificava pelo fato de o governo estadual ter decidido, ao longo dos anos 30, pela criação de um espaço metropolitano da indústria. Esperava-se que o centro favorecesse a “presença futura de uma população residente de renda alta e média nas áreas de Betim e , capaz de assegurar uma demanda diversificada de bens e serviços” (Plambel, 1978, p. 11). 27 PLAMBEL. Programa EBTU/BIRD. Belo Horizonte, 1978. As intervenções no sistema viário, por sua vez, visavam a favorecer o uso residencial em áreas específicas, criar condições favoráveis para usos compatíveis com um centro metropolitano e, juntamente com as diretrizes de transporte, reforçar todas estas intenções 28. Ao avaliar a região metropolitana num percurso de 10 anos após a implantação do PACE, estudo realizado pelo PLAMBEL detecta que o Núcleo Central continuou perdendo população. Tão ou mais importante, constata também que a Lei de Uso e Ocupação do Solo, “ao estabelecer um Zoneamento concebido segundo as tendências observadas à época de sua elaboração, consagra e reforça a organização territorial vigente. A segregação e a estratificação dos espaços residenciais são amplamente estimuladas pelo Zoneamento, ao estabelecer zonas residenciais diferenciadas29”. O citado estudo “denuncia” um ponto da maior importância na estruturação da metrópole belohorizontina, que consiste na promulgação de leis obedientes a tendências verificadas quando de sua formulação e proposição. Além disso, para o que importa à temática do artigo, a Lei de Uso do Solo é denunciada por não contrariar minimamente a situação vigente, colocando a centralidade metropolitana como um problema não apenas de deseconomia, mas de interesses de classes em conflito. A avaliação do PACE mostra que as modificações introduzidas pelo poder público não surtiram os efeitos esperados. Os conflitos gerados pela inadequação do centro metropolitano transbordaram para seu entorno, com a saturação dos corredores de trânsito, “induzindo altos investimentos para remanejamentos ou mesmo exigindo a abertura de vias complementares de maior capacidade (...), os quais virão realimentar a mesma estrutura, sem lhe corrigir as distorções” (PLAMBEL, ibid). Dessa avaliação resultaram propostas para uma nova estrutura metropolitana, a qual não chegou a ser apreciada nem avaliada pelo Conselho Deliberativo da RMBH30. Entretanto, a Constituição do Estado de Minas Gerais, promulgada em 1989, prescreveu

28 O diagnóstico que informa a concepção do PACE salienta a presença, na área central, de usos que seriam típicos de comércio e serviços locais, além da atividade industrial. A responsabilidade por tais “disfunções” era atribuída, em grande parte, à forma como se definiam os itinerários dos transportes coletivos e à classificação das vias, que implicavam em deslocamentos com transbordos da ordem de 400.000 pessoas/dia, em 1972. Vistos como “desnecessários”, esses deslocamentos traziam, como conseqüência, a criação, reforço e ampliação de uma economia de transbordos, traduzida em supermercados, bancas de vendas a varejo e varejões, competindo com os serviços nobres de um centro metropolitano (FJP, 2007). 29 PLAMBEL, Processos gerais de formação da aglomeração metropolitana. Belo Horizonte, 1985 [texto para discussão interna ] 30 PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH. Belo Horizonte, março 1987 [textos para discussão interna] as normas básicas de constituição e gestão metropolitana, manteve a Região Metropolitana de Belo Horizonte e ampliou ainda o número de seus municípios. A nova Constituição previu também a elaboração do Plano Diretor Metropolitano como competência da Assembléia Metropolitana. Esse Plano foi ensaiado, mas não apreciado31. Com a determinação de os municípios metropolitanos elaborarem seus respectivos planos, os quais deveriam ser compatíveis com o Plano Metropolitano, aqueles que obedeceram à disposição superior valeram-se das diretrizes aprovadas pelo Conselho Deliberativo da RMBH ainda dos anos 70. Na presente década, a área central continua em pauta na agenda pública, com o Plano de Reabilitação do Hipercentro de Belo Horizonte, conhecido como Programa Centro Vivo. Em texto elaborado pela administração municipal, o Plano seria resultado de “um pacto entre a administração pública municipal e a comunidade por um Hipercentro melhor: ambientalmente mais qualificado, socialmente mais plural e, fundamentalmente, mais dinâmico do ponto de vista econômico”32. O programa Centro Vivo revê a Lei do Plano Diretor da década passada e detalha inúmeros obstáculos não contemplados em estudos anteriores, além de levar em consideração uma visão articulada do planejamento municipal. Entretanto, há que lembrar que o centro de Belo Horizonte é um centro metropolitano, o que implica que o “pacto entre a administração pública municipal e a comunidade” inclui, ou deveria incluir, a comunidade metropolitana. Um dos pontos a ser considerado pode ser resumido na afirmação do representante da sociedade civil no Colegiado Metropolitano, recém constituído, transcrita a seguir:

“a característica radioconcêntrica da RMBH, reiteradamente confirmada pelos processos de planejamento e intervenção pública, focada na capital e nos Vetores Oeste e Norte e na solução de anéis desconcentradores a partir de um olhar fortemente centrado em Belo Horizonte, desestimula o desenvolvimento das demais microrregiões”33.

31 PLAMBEL. Plano Diretor da região Metropolitana de Belo Horizonte – Síntese dos diagnósticos setoriais. 2. ed. Belo Horizonte, 1993. 32 PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE. O Programa Centro Vivo. Belo Horizonte, 2008. [comunicação do prefeito Fernando Pimentel] 33 PEREIRA, José Abílio Belo. RMBH, uma possibilidade de Estruturação Territorial. Belo Horizonte, abril 2008. [Trabalho apresentado em reunião técnica da Secretaria de Estado de Desenvolvimento Urbano] Tal afirmação explicita, como o maior desafio a ser enfrentado, a articulação do planejamento corretivo ao planejamento prospectivo. É mais fácil praticar planos corretivos travestidos de prospectivos. Parece ser este o desfio de todas as metrópoles brasileiras. Isto traz à reflexão o que ponderou Léfèbvre (1983) sobre o urbano como objeto virtual, em contraposição à sociedade burocrática de consumo dirigido. A parusia da sociedade urbana aponta para o fim das cidades, anunciando uma centralidade lúdica a qual substituirá a conversão dos espaços mortos em espaços culturais, museus de um passado que o presente não ousa destruir e do qual se serve para ampliar o setor de serviços urbanos. Como se viu, este foi, pelo menos, o caso do PACE de Belo Horizonte.

3. Os centros e as redes complementares às funções metropolitanas.

Na obra, Espaço intra-urbano no Brasil, Flávio Villaça se detém no que considera “especificidades do espaço intra-urbano” em distinção do “espaço regional”. “A estruturação do espaço regional é dominada pelo deslocamento das informações, da energia e das mercadorias em geral – eventualmente até da mercadoria força de trabalho. O espaço intra-urbano, ao contrário, é estruturado fundamentalmente pelas condições de deslocamentos do ser humano, seja como portador da força de trabalho – como no deslocamento casa / trabalho -, seja enquanto consumidor – reprodução da força de trabalho, deslocamentos casa- compras, casa-lazer, escola etc.” (1998, p.20) Trata-se de uma distinção importante, mas vale acrescentar algumas trivialidades. Superado o modelo cidade-estado, as redes urbanas são componentes essenciais da divisão do trabalho. Nenhuma cidade subsiste se não participa de uma rede de trocas, se não consolidar centros de produção de mercadorias ou serviços, gerar excedentes e promover o endividamento. Essa rede de trocas determina as opções de sistemas viários e modos de deslocamentos. A introdução dos deslocamentos por ferrovias trouxe como conseqüência, na maioria dos casos, a refundação de cidades, especialmente as metropolitanas. A predominância das rodovias implicou em novas transformações. A imposição de um e outro modo de deslocamentos inter-regionais impactou profundamente os padrões espaciais urbanos. Tanto o abandono recente dos modos ferroviários, quanto a acolhida dos modos rodoviários conduziram à construção de anéis para evitar a circulação de mercadorias no interior das áreas urbanas. No entanto, o efeito de tudo isso tem sido a criação de espaços para novos assentamentos. As “cidades dos anéis”, em boa parte, são determinadas pelas opções de favorecimento das vias de integração regionais. Os anéis rodoviários ou ferroviários, impostos como barreiras físicas, seccionam o espaço urbano e criam simbolicamente as muralhas que delimitam a urbe e seus arrabaldes ou periferias. Para o caso da RMBH, a construção do Anel Rodoviário no início dos anos 60 delimitou nitidamente a forma de comprometimento da ordem espacial preexistente à metropolização. O anel passou a demarcar uma divisão quase natural entre o Núcleo Central, a Área Pericentral e as Periferias. Como foi mostrado na seção anterior, o plano de Aarão Reis e suas modificações imediatas previam que as áreas urbanas e as suburbanas, desmembradas em seções, estabeleceriam padrões espaciais definitivos. Esses padrões espaciais determinariam as regras de co-presença em sua concepção de vida espacial. A distinção de “centro” e “periferia”, já aludida no documento, não implicava necessariamente uma estratificação de tratamento desigual dos moradores periféricos, mas de prioridade de urbanização do centro para as periferias, impondo a ocupação privilegiada da área central. A contradição, ou melhor, a inversão da tendência, de a vida social interpretar os acenos dos padrões das periferias como mais atraentes do que os do centro, se mostra logo nos primeiros anos da capital. A criação de colônias agrícolas nas seções suburbanas e sua desativação em uma década favorecem o desenvolvimento de um mercado de terras suburbanas, estimulando o crescimento da cidade da periferia para o centro34. A ambigüidade das áreas suburbanas, no entanto, determinará o desdobramento das subseções em duas metades desiguais. Uma delas herdará e ampliará as funções nobres contidas no perímetro da Avenida do Contorno, seja do ponto de vista do padrão de residências, seja do ponto de vista das atividades produtivas. A outra acentuará as funções suburbanas, desenvolvendo espaços industriais e de moradias operárias para, posteriormente, com a abertura das vias arteriais - ignoradas no plano original -, expandir os serviços metropolitanos ao longo dos novos eixos viários. À primeira expansão do centro, com suas benesses, deu-se o nome de Zona Sul, traduzindo um complemento da Área Central. A Zona Sul assume características diretamente vinculadas ao centro metropolitano. Com isto, a leitura de seu compromisso

34 Sobre o assunto ver: GUIMARÃES, Berenice. Cafuas, barracos e barracões: Belo Horizonte cidade planejada. Rio de Janeiro: IUPERJ . 1991. [Tese de doutoramento] e também PLAMBEL. O mercado da terra na RMBH. Belo Horizonte, 1977. com os grandes processos de metropolização de Belo horizonte é feita de maneira agregada na macrounidade designada Núcleo Central. A tabela 1, exibida a seguir, coloca em evidência dois aspectos da expansão do Núcleo Central na formação da Área Central, do ponto de vista dos assentamentos residenciais. Entre 1982 e 2002, as famílias com renda média inferior a um salário diminuem significativamente sua participação na área. Em ritmo menor, mas obedecendo à mesma tendência, os domicílios situados nas faixas de renda de cinco até 10 salários acusam taxas negativas. Aumentam significativamente as residências com renda superior a 20 salários e moderadamente as compreendidas nas faixas entre um e cinco salários. Isso mostra que o Núcleo Central, em sua expansão pela Zona Sul, de um lado, prosseguiu em sua vocação de ser um espaço seletivo para a população de alta renda, mas, de outro, não conseguiu expulsar as famílias de baixa renda, residentes nos aglomerados de favelas que se adensaram a partir do final dos anos 40 do século XX.

Tabela 1. População, domicílios ocupados em 1982 e 2002 e taxas de crescimento anual da macrounidade Área Central no período segundo faixas de renda média domiciliar Descrição Domicí % Pessoa % Dom % Pop % Taxa Taxa faixa renda lios 82 Dom s 82 Pess Tot DOM tot POP dom Pop 82 oas 2002 2002 2002 2002 82 Sem renda 2066 3,23 8509 3,09 576 0,67 1621 0,55 -6,18 -7,96

Até um SM 2052 3,20 6682 2,42 930 1,08 3253 1,10 -3,88 -3,54 > 1 até 2 4011 6,26 13470 4,89 5620 6,55 17889 6,06 1,70 1,43 SM > 2 até 3 4159 6,49 15431 5,60 5050 5,88 16543 5,60 0,98 0,35 SM > 3 até 5 5369 8,38 18753 6,80 7866 9,16 27354 9,26 1,93 1,91 SM > 5 até 10 12208 19,06 48130 17,46 11955 13,93 34837 11,80 -0,10 -1,60 SM > 10 até 15 9448 14,75 40150 14,57 9407 10,96 29212 9,89 -0,02 -1,58 SM > 15 até 20 6981 10,90 33678 12,22 8535 9,94 27733 9,39 1,01 -0,97 SM > 20 até 30 8898 13,89 43394 15,75 13350 15,55 47196 15,98 2,05 0,42 SM > 30 SM 8846 13,81 47407 17,20 22545 26,27 89666 30,36 4,79 3,24 Total 64036 100 275605 100 85835 100 295304 100,00 1,48 0,35 Fonte: PLAMBEL: Pesquisa Origem e Destino 1982; Fundação João Pinheiro: Pesquisa Origem e Destino 2002.

As demais porções são chamadas de Área Pericentral35 e se distinguem por sua diferenciação no comprometimento com as funções metropolitanas, que se faz de forma

35 A exposição dessa estruturação já foi apresentada em artigos de TEIXEIRA e SOUZA in RIBEIRO, Luiz César de Queiroz, 2000 p. 291-295 com ilustrações cartográficas à p. 317 e também pelos mesmos subalterna. O que irá distinguir os espaços pela forma de comprometimento com a metropolização é, sobretudo, o zelo constante das elites dirigentes e, consequentemente, da legislação e das instituições revestidas de poder de polícia em manter a Área Central incompatível com usos domiciliares inconvenientes36. As diferentes porções da Área Pericentral cuidarão de se diferenciar especialmente em razão das intervenções do poder público no sistema viário. Essa área tem a história de abrigar os trabalhadores que participaram da construção da cidade e também de conversão das ex-colônias e da zona rural em áreas urbanas. Ao longo dos anos, tal unidade espacial foi se diferenciando tanto como espaço de moradia quanto nas especializações de funções metropolitanas. A principal marca para sua caracterização como macrounidade é que ela fixa os limites da cidade metropolitana até o início dos anos 40 do século passado. Desse modo, a metrópole mineira conservava, até então, dois espaços bem distintos, o da área central e o da área suburbana, desiguais e complementares na escala das funções metropolitanas. O Pericentro é delimitado especialmente pelo Anel Rodoviário, cujo impacto determinou suas características no período contemporâneo. A tabela 2 sintetiza os processos de morar na Área Pericentral entre os anos de 1982 2002. Nota-se que sua marca principal é a perda de competitividade do uso domiciliar em relação a outros usos, resultante da expansão das funções metropolitanas para as áreas lindeiras aos grandes eixos viários. Esse é um contraste interessante. Enquanto a expansão do Núcleo Central para a Zona Sul garantiu crescimento de domicílios ocupados e de população residente, na Área Pericentral, os domicílios aumentam timidamente e a população exibe taxas negativas. Enquanto a Zona Sul ainda permanece atraente para os moradores de baixa renda – renda média até cinco salários -, a Área Pericentral só exibe taxas positivas para os grupos situados acima de 10 salários.

Tabela 2 População, domicílios ocupados em 1982 e 2002 e taxas de crescimento anual da macrounidade Área Pericentral no período segundo faixas de renda média domiciliar Faixa de Domicíl % Dom Pesso % Dom % Pop tot % POP Taxa Taxa renda ios 82 82 as 82 Pesso Tot DOM 2002 2002 dom Pop as 82 2002 2002 Sem 5194 2,67 22650 2,50 1104 0,54 3041 0,40 -7,45 -9,55 renda

autores em BÓGUS, Lúcia M. e RIBEIRO, Luiz César de Queiroz, 1999, p. 99-131. CARNEIRO e SOUZA in ANDRADE, Luciana Teixeira et. al. 2008, p. 232-237. TEIXEIRA e SOUZA in MENDONÇA E GODINHO, 2003 p. 19-42. 36 FJP. Relatório final: Cadastramento de Famílias Moradores em Conjuntos habitacionais. Belo Horizonte, 2006. GUIMARÃES, Berenice Martins in. RIBEIRO Luiz César de Queiroz. Op cti. P. 355. Até um 11088 5,71 36675 4,04 1732 0,85 5727 0,75 -8,86 -8,87 SM > 1 até 23878 12,29 91779 10,12 18403 9,05 56374 7,38 -1,29 -2,41 2 SM > 2 até 29219 15,04 123634 13,63 22937 11,28 78663 10,30 -1,20 -2,24 3 SM > 3 até 38854 20,00 179047 19,74 36500 17,95 132890 17,40 -0,31 -1,48 5 SM > 5 até 45795 23,58 234992 25,91 52705 25,92 200686 26,28 0,71 -0,79 10 SM > 10 até 20625 10,62 108600 11,97 28972 14,25 116142 15,21 1,71 0,34 15 SM > 15 até 9753 5,02 54912 6,05 14934 7,35 61803 8,09 2,15 0,59 20 SM > 20 até 7082 3,65 39370 4,34 14265 7,02 57667 7,55 3,56 1,93 30 SM > 30 SM 2757 1,42 15236 1,68 11764 5,79 50627 6,63 7,53 6,19 Total 194244 100 906896 100 203317 100 763620 100,00 0,23 -0,86 Fonte: PLAMBEL: Pesquisa Origem e Destino 1982; Fundação João Pinheiro: Pesquisa Origem e Destino 2002.

Dois outros espaços vinculam-se estreitamente às funções do Núcleo Central, sendo eles os grandes responsáveis por conferir à Área Pericentral sua maior diversidade na interação com as funções do centro metropolitano. Correspondem, de um lado, à Pampulha e, de outro, à Cidade Industrial, núcleo formador do Eixo Industrial. Na década de 30, as funções da metrópole encontravam-se em discussão. No cerne dessa discussão estavam as idéias da necessidade de estruturação de um espaço adequado para a indústria e outro para as novas tecnologias de transportes – leia-se aeroporto. Os resultados dos debates no tocante ao espaço da indústria se materializam, inicialmente, no parque industrial inscrito na Área Central e, posteriormente, na Cidade Industrial Juventino Dias. A função aeroporto remete à Pampulha, que acolherá também a função do lazer metropolitano. Vale sublinhar as diferenças do espaço da indústria em relação ao espaço do transporte aéreo no momento em que são criados. À indústria interessam as facilidades da articulação ferroviária. Assim, ela se localiza na convergência das ferrovias Central do Brasil e Rede Mineira de Viação, apontando para os mercados afluentes do Rio de Janeiro e de São Paulo. Ao transporte aéreo importa a nobreza da festa, do encontro, do lazer. Desse modo, a indústria deve criar o espaço do trabalho e do operário, enquanto o aeroporto o do lazer, do jogo, do esporte e do descanso. De fato, a Pampulha não pode ser compreendida sem referência aos grandes usos de porte metropolitano. Será o campus da UFMG que definirá finalmente a área como espaço residencial para uma classe média alta. A Pampulha, no entanto, irá estimular precocemente investimentos dos empreendedores imobiliários no seu entorno, sinalizando, desde os anos 40, sua ocupação futura. Tais investimentos se intensificam a partir dos anos 50 e, principalmente, nos anos 60, quando se inicia a efetiva ocupação do campus universitário. A tabela 3 retrata o percurso dos moradores da Pampulha entre 1982 e 2002. Comparada com a Área Central, nota-se que a Pampulha exibiu ritmos mais expressivos de ocupação residencial – taxa de 3,08% ao ano – e de população, que se faz a taxas superiores à vegetativa. No entanto, foi menos seletiva para estratos de renda superiores a 5 salários, apesar de a maior taxa de crescimento de domicílios ocupados incidir sobre aqueles de renda superior a 10 salários.

Tabela 3 População, domicílios ocupados em 1982 e 2002 e taxas de crescimento anual da macrounidade Pampulha no período segundo faixas de renda média domiciliar Faixa de renda Domicí % Dom Pessoas % Dom % Pop tot % POP Taxa Taxa lios 82 82 82 Pesso Tot DOM 2002 2002 dom Pop as 82 2002 2002 Sem renda 793 3,10 4141 3,24 476 1,02 1309 0,71 -2,52 -5,60 Até um SM 1138 4,45 4215 3,30 594 1,27 1916 1,04 -3,20 -3,87 > 1 até 2 SM 3323 13,00 13467 10,55 3257 6,95 9480 5,15 -0,10 -1,74 > 2 até 3 SM 3046 11,92 14358 11,24 4195 8,95 14320 7,78 1,61 -0,01 > 3 até 5 SM 4245 16,60 21604 16,92 7365 15,71 27751 15,07 2,79 1,26 > 5 até 10 SM 5684 22,23 29626 23,20 12532 26,73 52803 28,68 4,03 2,93 > 10 até 15 SM 2133 8,34 11430 8,95 6731 14,35 27436 14,90 5,91 4,48 > 15 até 20 SM 1960 7,66 10850 8,50 3864 8,24 15978 8,68 3,45 1,95 > 20 até 30 SM 1277 4,99 6860 5,37 4129 8,81 17231 9,36 6,04 4,71 > 30 SM 1968 7,70 11141 8,72 3749 8,00 15875 8,62 3,28 1,79 Total 25568 100 127692 100 46891 100 184100 100,00 3,08 1,85 Fonte: PLAMBEL: Pesquis a Origem e Destino 1982; Fundação João Pinheiro: Pesquisa Origem e Destino 2002.

A contraface da Pampulha é a Cidade Industrial Juventino Dias, localizada em Contagem37. Uma e outra são projeções do centro metropolitano de Belo Horizonte, pensadas e implantadas à mesma época – a década de 1940. A Cidade Industrial demarca um dos instantes em que a capital se torna a Grande Belo Horizonte, com as funções da metrópole expandindo-se para além dos limites do município. Pelo Decreto-Lei nº 770, de 20 de março de 1941 ficava determinada a área que seria desapropriada com tal finalidade, somando cerca de 270 hectares (Fonseca, 1978, p. 366). Desse momento de concepção e criação da Cidade Industrial, merece ser fixado o fracasso do plano da Cidade Operária como aliada necessária à Cidade Industrial. A área reservada a sua construção será futuramente ocupada por uma seqüência de favelas.

37 Quando de sua implantação, Contagem era um distrito do município de Betim. Será também lembrada para a implantação de vilas operárias, tendo sua ocupação consolidada com a implantação de conjuntos habitacionais, a partir dos financiamentos do Sistema Financeiro da Habitação – SFH. O espaço industrial que escapa a Belo Horizonte com a decisão de localizar a Cidade Industrial em Contagem certamente desafiou a administração municipal. A compensação veio em 1954, quando entra em operação o primeiro alto forno da então inaugurada siderurgia da Mannesmann38. Localizada no Barreiro, a siderúrgica obrigará Belo Horizonte a se confrontar com o problema do espaço para os trabalhadores. O Barreiro, pela sua história, transforma-se no principal centro de comércio e serviços do espaço industrial da capital, multiplicando sua população em mais de sete vezes39 entre 1952 e 1960. O “centro” comercial da Cidade Industrial propriamente dita instala- se no limite do território municipal. Essas são as principais conseqüências da implantação da Cidade Industrial do lado de Belo Horizonte. Da parte do distrito de Contagem, a primeira conseqüência é sua emancipação e conseqüente elevação à categoria de município, no ano de 1948, à qual se segue o parcelamento de amplas áreas tendo em vista a oferta de lotes para o operariado. Dentre eles, o mais importante foi a Cidade Jardim Eldorado, projeto do urbanista Sérgio Bernardes. Desde sua emancipação, Contagem deverá se defrontar com o desafio constante de articular sua vocação de novo espaço da indústria com o equacionamento da produção de espaço de moradia para os trabalhadores discriminados segundo a condição de comparecer ao mercado imobiliário. O primeiro desafio irá se mostrar na multiplicação de favelas no interior do hexágono que demarca o distrito industrial e nos fundos de vale, à margem dos córregos. O segundo tem a ver com a complexa tarefa de assegurar a oferta de serviços urbanos básicos para a população moradora com os parcos recursos do município, tendo em vista que o espaço da indústria aparece mais ligado ao estado que ao poder local. Betim, que perdeu o distrito de Contagem com a criação da Cidade Industrial e que, desde as primeiras décadas do século XX, vinha apoiando a construção da capital, também se movimenta, criando seu parque industrial. Sua industrialização ganha impulso na década de

38 A localização da planta industrial da empresa em Belo Horizonte, e não na Cidade Industrial, nada tem de casual. De acordo com a interpretação de Benedicto Valadares (1966, p. 217-219), tratava-se de uma compensação, promovida pelo então presidente Getúlio Vargas, face à decisão de construir a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro, saldando, dessa forma, uma “dívida” com os mineiros. Ver também ESTELIAM, Sulamita. Estação Ferrugem. Petrópolis: Vozes, 1998. p. 26. 39 Steliam, ibid. p. 81 60, com a inauguração da Refinaria Gabriel Passos, e se consolida na década de 70, com a instalação da fábrica da Fiat Automóveis, determinando sua vinculação ao Eixo Industrial. A tabela 4 registra as modificações das condições das famílias no período que vai de 1982 a 2002. Percebe-se que, apesar de as taxas de crescimento dos domicílios ocupados por famílias com renda acima de 5 salários serem ascendentes, em 2002 cerca de 2/3 das residências ainda auferiam renda que variavam entre 2 e 10 salários, e apenas 11,8% se inscreviam em faixas superiores a 10 salários.

Tabela 4: População, domicílios ocupados em 1982 e 2002 e taxas de crescimento anual da macrounidade Eixo Industrial no período, segundo faixas de renda média domiciliar Faixa de Domicílio % População %. Domicílio % Dom População %. Pop. Taxa Taxa renda s 1982 Dom 1982 Pop. s 2002 2002 2002 2002 dom Pop 82 82 Sem 6744 4,19 31829 3,98 5523 1,84 18721 1,57 -1,0 -2,6 renda Até SM 11006 6,84 40081 5,01 4619 1,54 15397 1,29 -4,2 -4,7 > 1 até 2 31343 19,49 142817 17,85 51410 17,15 169265 14,23 2,5 0,9 SM > 2 até 3 31615 19,66 150477 18,80 54134 18,05 200300 16,84 2,7 1,4 SM > 3 até 5 37863 23,54 196225 24,52 70620 23,55 285627 24,02 3,2 1,9 SM > 5 até 31157 19,37 174116 21,76 78050 26,03 334228 28,10 4,7 3,3 10 SM > 10 até 7579 4,71 42574 5,32 22625 7,55 105180 8,84 5,6 4,6 15 SM > 15 até 1929 1,20 12261 1,53 6362 2,12 30288 2,55 6,1 4,6 20 SM > 20 até 1117 0,69 6961 0,87 4991 1,66 22740 1,91 7,8 6,1 30 SM > 30 SM 470 0,29 2907 0,36 1504 0,50 7598 0,64 6,0 4,9 Total 160821 100 800248 100 299838 100 1189345 100 3,2 2,0 Fonte: Fonte: PLAMBEL: Pesquisa Origem e Destino 1982; Fundação João Pinheiro: Pesquisa Origem e Destino 2002.

Do ponto de vista da metropolização, os moradores do Eixo Industrial não se identificam com as periferias propriamente ditas, apesar de não terem sido contemplados com a prometida Cidade Operária. O tipo de ocupação que caracteriza a macrounidade designada como Periferias tem marcas distintas das que se desenvolveram no Eixo Industrial. Elas resultam de ações de diferentes agentes imobiliários, nas quais se denunciam o propósito de designar o espaço de moradia adequado à pobreza metropolitana. Um dos traços mais antigos é o de implantar parcelamentos em torno de povoações sem qualquer atenção para o crescimento vegetativo da mesma. A segunda marca das periferias é a de estabelecer loteamentos em áreas nas quais as atividades rurais ou de mineração tornaram-se pouco atraentes para os proprietários. Nesse caso, os parcelamentos podem assumir três características, às vezes complementares: ou têm como objetivo a oferta de lotes a pessoas de baixo poder aquisitivo, ou se destinam a pessoas interessadas em comprar mais de um lote para implantação de chácara, ou ainda são vistos como reserva de valor. Uma terceira marca é a própria ação do poder público, consolidada especialmente após a criação do BNH. Ao determinar o custo da terra urbana e ao optar pelo menor preço para atender à população de baixa renda, os diferentes agentes financeiros que gravitavam em torno do SFH criaram periferias preparadas para ocupação intensiva. Seu impacto ultrapassará em muito a macrounidade em análise40. Nela, os investimentos mais expressivos mostram-se em grandes conjuntos habitacionais implantados nos municípios de , Santa Luzia, Ribeirão das Neves e Sabará, além de Contagem e Belo Horizonte. A característica principal da ocupação periférica é dada pela escala dos parcelamentos, seguida da forma de ocupação. Enquanto os povoados típicos surgem da necessidade de apoio a alguma atividade – lugar de convergência para favorecer o comércio ou aos encontros necessários à vida social dispersa no rural – a ocupação periférica se consolida pela falta de acesso dos moradores aos espaços urbanos nos quais a vida favorece os encontros e sua reprodução.

Comparada ao Eixo Industrial a principal diferença das Periferias se mostra nas taxas de crescimento, tanto dos domicílios ocupados, quanto da população. Um aspecto curioso, é que as Periferias, como um todo, exibem alguma vantagem na melhoria da renda familiar. Em 2002, as residências com renda entre 2 e 10 salários equivalem aos mesmos 2/3 do total observados no Eixo Industrial. No entanto, as residências com renda superior a 10 salários representam 13,2% do total. As taxas de crescimento dos domicílios ocupados e da população a partir de 10 salários são bastante superiores às registradas no Eixo Industrial, conforme mostram os dados da tabela 5.

Tabela 5: População, domicílios ocupados em 1982 e 2002 e taxas de crescimento anual da macrounidade Periferias no período, segundo faixas de renda média domiciliar Faixa de Domicíli % Populaçã %. Domicílio % Populaçã %. Pop. Taxa Taxa renda os 1982 Dom o 1982 Pop. s 2002 Dom o 2002 2002 dom Pop 82 82 2002 Sem 4882 3,45 23843 3,39 5143 1,60 16576 1,28 0,26 -1,80 renda Até um 12794 9,04 45586 6,48 5474 1,70 20451 1,57 -4,16 -3,93 SM > 1 até 2 34594 24,44 155338 22,09 52195 16,23 173275 13,34 2,08 0,55

40 Juntamente com o Levantamento da População Favelada, concluído em 1965, os técnicos do Departamento da Habitação Popular da Secretaria de Estado do Trabalho de Minas Gerais, elaboraram dois documentos de fundamental importância, antecipando análises que seriam feitas posteriormente: Expansão Urbana na estrutura subdesenvolvida e Contribuições para análise do problema habitacional e da organização territorial. Esses documentos são assinados por técnicos que teriam relevante importância na criação do PLAMBEL e foram coordenados pelo arquiteto Nei Pereira Furquim Werneck. SM > 2 até 3 30929 21,85 151323 21,51 57709 17,95 212985 16,40 3,17 1,72 SM > 3 até 5 29733 21,01 159904 22,73 77878 24,22 324125 24,95 4,93 3,60 SM > 5 até 21153 14,95 124295 17,67 80701 25,10 354921 27,32 6,92 5,39 10 SM > 10 até 4700 3,32 26666 3,79 25356 7,89 117191 9,02 8,79 7,68 15 SM > 15 até 1823 1,29 11238 1,60 9151 2,85 41743 3,21 8,40 6,78 20 SM > 20 até 719 0,51 3920 0,56 5423 1,69 26071 2,01 10,63 9,94 30 SM > 30 SM 194 0,14 1232 0,18 2534 0,79 11653 0,90 13,71 11,89 Total 141521 100 703345 100 321564 100 1298992 100 4,19 3,12 Fonte: PLAMBEL: Pesquisa Origem e Destino 1982; Fundação João Pinheiro: Pesquisa Origem e Destino 2002.

O Sistema de Unidades Espaciais busca caracterizar unidades bem configuradas, de acordo com o tipo de ocupação e a marca imposta ao espaço do ponto de vista das forças de metropolização, como se tem analisado. Entretanto, quando de sua concepção, existiam também áreas aparentemente de uso não urbano, cuja vocação revelava-se indecisa. Em algumas delas, o uso agropecuário se mostrava em recesso, podendo ser parcelada de um momento para outro, sem possibilidade de se antecipar o tipo de segmento de mercado ao qual se destinaria. Em outras, o uso da indústria extrativa anunciava desativação, impossibilitando, de igual forma, antecipar usos alternativos. Às áreas com tal característica deu-se o nome de Franjas do Aglomerado. Entendia-se que elas seriam afetadas em curto ou médio prazo pelas forças da metropolização, transgredindo, desse modo, a competência do poder municipal sobre sua trajetória, o que as fazia merecedoras de atenção especial dos agentes de planejamento e controle metropolitano. Algumas franjas se localizavam próximas a áreas de crescimento periférico, mas nem por isso se podia afirmar que seriam parceladas para população de baixa renda; outras se localizavam próximas ao Eixo Industrial, mas não permitiam apostar em sua destinação a usos vinculados aos ramos de produção da indústria. A elas se somavam áreas que poderiam ser atraentes aos moradores da Zona Sul de Belo Horizonte, mas não autorizavam sua ocupação exclusiva segundo o padrão vigente. Desse modo, a macrounidade Franjas é o desenho do espaço virtual e impreciso em um dado momento. As áreas que a compõem podem permanecer imprecisas por muito tempo, diferenciar-se de sua vizinhança, ou integrar-se a ela. A tabela 6 mostra a diversidade das Franjas. Sua marca especial são as elevadíssimas taxas de crescimento no período mais recente, mais especificamente, entre 1992 e 2002. Tabela 6: População, domicílios ocupados em 1992 e 2002 e taxas de crescimento anual da macrounidade Franjas no período, segundo faixas de renda média domiciliar Faixa de Domi %. Dom Popula %. Pop Domicílio %. Popula %. Taxa Taxa renda cílios 1992 ção 2002 s 2002 Dom ção Pop dom POP 1992 2002 2002 2002 2002 92 - 92 - 2002 2002 Sem renda 14 0,83 48 0,75 77 1,87 217 1,30 18,89 16,28 Até um SM 3 0,20 20 0,32 9 0,22 19 0,11 10,67 -0,85 > 1 até 2 207 12,46 520 8,09 768 18,51 2483 14,92 14,03 16,92 SM > 2 até 3 149 8,98 451 7,01 681 16,40 2902 17,43 16,41 20,46 SM > 3 até 5 329 19,82 1251 19,44 688 16,59 2721 16,34 7,67 8,08 SM > 5 até 10 293 17,66 1309 20,35 691 16,65 3200 19,22 8,96 9,35 SM > 10 até 98 5,93 451 7,02 178 4,28 679 4,08 6,10 4,17 15 SM > 15 até 66 3,99 191 2,97 90 2,17 407 2,45 3,12 7,85 20 SM > 20 até 97 5,83 372 5,78 227 5,46 785 4,71 8,89 7,75 30 SM > 30 SM 403 24,30 1819 28,27 741 17,85 3237 19,44 6,28 5,94 Total 1658 100,0 6433 100,00 4150 100,00 16650 100,00 9,61 9,98 Fonte: PLAMBEL: Pesquisa Origem e Destino 1982; Fundação João Pinheiro: Pesquisa Origem e Destino 2002.

Outra forma de comprometimento com a metropolização expressa-se nas áreas de expansão metropolitana que se constituíram em diferentes momentos, incorporando as características dos processos que os definem. Tais áreas se assemelham ao que a Escola de Chicago chamou de “cidades satélite”, mas, por guardarem vínculos históricos próprios, não se adequam plenamente a esta tipologia. Para algumas delas, a inserção nos processos metropolitanos se dá numa circunstância em que a autonomia dos espaços municipais é afetada tão profundamente a ponto de o poder municipal assumir a instância de mínima decisão. É o caso dos municípios incorporados no Eixo Industrial, ou dos que foram contemplados com estabelecimentos penitenciários ou grandes equipamentos de porte metropolitano, tais como aeroportos, barragens, áreas de proteção de mananciais, ou ainda daqueles que tiveram, em parte ou no todo, efeito da expansão das periferias. Existem, porém, na maioria dos municípios que compõem as áreas de Expasão Metropolitana, porções do território que ainda contam com relativa autonomia, garantida tanto pela distância ao centro metropolitano quanto por um maior cuidado dos dirigentes locais no tocante à discussão das decisões que possam afetar seu projeto de desenvolvimento auto-sustentável. Apesar disso, toda porção do território, uma vez dada como de expansão metropolitana, absorve funções que afetam a autonomia local, em maior ou menor grau. Cumpre lembrar que as características de estruturação espacial que antecede a metropolização são suprimidas ou fortemente afetadas pela inserção de uma área na expansão metropolitana. Como caracterização em macrounidade, enfatiza-se a marca da descontinuidade, que não é outra coisa que dizer que as áreas de expansão não são conurbadas ao centro metropolitano 41. Pode-se dizer que a marca principal de uma área de Expansão Metropolitana é a de absorver uma ou mais funções metropolitanas que alteram profundamente a estrutura espacial pré-existente. Os melhores exemplos recentes se mostram nos efeitos da implantação do Aeroporto Internacional de , em Lagoa Santa, e a construção do Rodoanel. Em síntese, o que se há de buscar na análise das áreas de expansão metropolitana é esse tipo de inserção parcial nas funções metropolitanas e os impactos causados na ordem local. As informações da tabela 7 permitem a visualização da evolução dos domicílios ocupados e população residente da macrounidade entre 1982 e 2002. Tabela 7: População, domicílios ocupados em 1982 e 2002 e taxas de crescimento anual da macrounidade Área de Expansão Metropolitana no período segundo faixas de renda média domiciliar Faixa de Domicílio % Populaçã %. Domicílio % Dom Populaçã %. Pop. Taxa Taxa renda s 1982 Dom o 1982 Pop. s 2002 2002 o 2002 2002 dom Pop 82 82 Sem 2977 5 10743 4 1826 2 6341 1 -2,4 -2,6 renda Até um 4983 9 19371 7 2213 2 7259 2 -3,9 -4,7 SM > 1 até 2 12287 22 50959 18 20903 19 66315 15 2,6 1,33 SM > 2 até 3 10962 19 50847 18 22483 20 83915 19 3,66 2,54 SM > 3 até 5 12385 22 67051 24 25870 23 105133 24 3,75 2,27 SM > 5 até 9704 17 59753 21 25691 23 116582 27 4,99 3,40 10 SM > 10 até 2446 4 14242 5 6379 6 27653 6 4,91 3,37 15 SM > 15 até 618 1 3609 1 2702 2 11267 3 7,65 5,86 20 SM > 20 até 608 1 3270 1 1870 2 8187 2 5,77 4,70 30 SM > 30 SM 164 0 926 0 1081 1 4722 1 9,90 8,48 Total 57134 100 280772 100 111019 100 437373 100 3,38 2,24 Fonte: PLAMBEL: Pesquisa Origem e Destino 1982; Fundação João Pinheiro: Pesquisa Origem e Destino 2002.

41 Quando essa macrounidade foi concebida, no início dos anos 80, como categoria de apreensão da realidade metropolitana, tinha-se, como objetivo, chamar a atenção dos dirigentes municipais para alguns efeitos negativos da intenção de ser metropolitano a todo custo. Nas áreas de expansão, as forças de metropolização ingressam no território municipal exigindo do poder local maior atenção para a ação dos agentes imbricados no processo, de um lado, e uma articulação em nível supra-municipal, em instâncias de gestão envolvendo municípios vizinhos e/ou o estado, de outro.

O percurso que se faz, acompanhando as áreas de Expansão Metropolitana, exibe características semelhantes às das Periferias, mas boa parte das semelhanças é apenas aparente. O exame agregado e mesmo desagregado mostra a predominância de famílias de baixa renda, tendendo sempre para ¾ das famílias residentes. Entretanto, as áreas de Expansão Metropolitana geralmente exibem um padrão de autosustentabilidade muito superior ao das Periferias, residindo nisso a grande diferença. Interessa salientar, ademais, que a primeira perda no plano local é a de controle do crescimento dos domicílios ocupados e, conseqüentemente, da população. Para comprovar o que se afirma, basta atentar para essas informações: em 1982 havia, nas áreas de Expansão Metropolitana, 57.134 domicílios ocupados, abrigando 280.772 moradores. Vinte anos depois, os domicílios já eram 111.019 e a população, 437.373 pessoas, com aumentos de, respectivamente, 94,3% e 55,8% do total no período. O aumento do uso residencial é mais tímido que o das Periferias, mas exibe um dinamismo que o distancia do que se mostrou na Área Pericentral. Já o potencial de acumulação, indicado pela participação de famílias com renda superior a 10 salários, é inferior ao do Eixo Industrial e até mesmo ao das Periferias. Em 1982, no Eixo Industrial, 6,9% do total, nas Periferias, 5,3% do total, e na Área de Expansão, 6,7% do total de famílias tinham renda média superior a 10 salários. Em 2002, os resultados foram, respectivamente, 11,8%, 13,2% e 10,8% do total. Desse ponto de vista, as áreas de Expansão Metropolitana, que se mostravam próximas ao perfil do Eixo Industrial vinte anos antes, posicionaram-se abaixo das Periferias no final do período considerado. A macrounidade Área de Comprometimento Mínimo se caracteriza principalmente pelo isolamento frente ao centro metropolitano. Na definição desse tipo de área levou-se especialmente em consideração o movimento diário da população. Em 1982, dois municípios foram considerados como pertencendo a essa macrounidade: Caeté e . Pedro Leopoldo não se inscreve mais nessa macrounidade, embora mantenha ainda boa parte dos moradores independentes de áreas externas ao município. Quanto a Caeté, com a estagnação econômica a que é levado desde meados dos anos 80, o município passa a se comportar como componente da Área de Expansão Metropolitana, mas com características sui generis. Não se trata da manifestação de um processo de crescimento descontrolado da população, mas do fato de a população local ser obrigada a procurar emprego no centro metropolitano. Em 2002, 20,9% das pessoas que trabalhavam tiveram que se deslocar do município. O movimento interno, que era de 95% em 1982, se reduz para 89,5% em 2002 (FJP, 1982, 2002). Isto posto, pode-se afirmar que os 14 municípios que firmaram o convênio com o objeto de apoiar o planejamento da RMBH em 1972, e que passaram a constituir a Região Metropolitana por força da Lei Complementar 14/1973, integram hoje uma região de direito e de fato. Dois municípios que foram classificados, na década de 80, como pertencendo à Área de Comprometimento Mínimo, passaram a pertencer, por caminhos diversos, à de Expansão Metropolitana, perdendo a condição de isolamento. Não acontecerá o mesmo com aqueles que, ao longo dos anos 90 e início da presente década, foram incluídos na RMBH, por diferentes leis complementares à Constituição do Estado de Minas Gerais. Isto inclui e , incorporados à RMBH pela Lei Complementar nº 48, de 12/11/97; , , , , , Nova União e Taquaraçu de Minas, incorporados pela Lei Complementar nº 56, de 12/01/2000; e Itatiaiuçu, incorporado pela Lei Complementar nº 63, de 10/01/2002. Além disso, a Constituição do Estado de 1989 já havia definido como integrantes da RMBH, junto com os municípios originais, os de , Esmeraldas, Igarapé e . Desse conjunto de municípios alguns, em parte ou no todo, tornaram-se componentes das áreas de Expansão Metropolitana, como os casos de Mateus Leme, Esmeraldas, Matozinhos e Capim Branco; outros, ao Eixo Industrial, como os casos de , Igarapé e São Joaquim de Bicas; parte de Brumadinho passou a compor a Franja Sul; parte de Esmeraldas, às Periferias. Os demais, Jaboticatubas, Baldim, Taquaraçu de Minas, Nova União, Florestal, Rio Manso, Itaguara e Itatiaiuçu foram considerados como pertencentes à Área de Comprometimento Mínimo. Do mesmo modo, uma parte de Esmeraldas e de Brumadinho também foi interpretado como componente dessa macrounidade. A tabela 8 mostra que a Área de Comprometimento Mínimo é a que perde sistematicamente população, constituindo-se em núcleos de emigração. As taxas positivas acontecem nos estratos de maior renda, sempre próximas do crescimento vegetativo. Nota-se também os efeitos gerais de mudança de composição do grupo familiar. Os assentamentos domiciliares exibem, regra geral, taxas superiores à do aumento da população, o que significa que o espaço residencial se adensa mesmo quando a população diminui.

Tabela 8: População, domicílios ocupados em 1982 e 2002 e taxas de crescimento anual da macrounidade Área de Comprometimento Mínimo no período, segundo faixas de renda média domiciliar Faixa de Domicílio % Populaçã %. Domicílio % Dom Populaçã %. Pop. Taxa Taxa renda s 1982 Dom o 1982 Pop. s 2002 2002 o 2002 2002 dom Pop 82 82 Sem 1444 6,46 3790 3,48 284 1,06 968 0,96 -7,81 -6,59 renda Até um 1848 8,26 8512 7,81 600 2,23 2148 2,13 -5,47 -6,65 SM > 1 até 2 4187 18,72 15936 14,63 5958 22,12 18632 18,43 1,78 0,78 SM > 2 até 3 4547 20,33 21152 19,41 4891 18,16 17257 17,07 0,36 -1,01 SM > 3 até 5 4706 21,04 24529 22,51 6641 24,66 25008 24,74 1,74 0,10 SM > 5 até 3906 17,47 25021 22,96 5999 22,27 25628 25,36 2,17 0,12 10 SM > 10 até 1309 5,85 7552 6,93 1872 6,95 8593 8,50 1,80 0,65 15 SM > 15 até 161 0,72 1071 0,98 385 1,43 1528 1,51 4,46 1,79 20 SM > 20 até 232 1,04 1222 1,12 234 0,87 1067 1,06 0,05 -0,68 30 SM > 30 SM 23 0,10 174 0,16 69 0,25 242 0,24 5,59 1,67 Total 22363 100 108959 100 26931 100 101070 100 0,93 -0,38

Fonte: PLAMBEL: Pesquisa Origem e Destino 1982; Fundação João Pinheiro: Pesquisa Origem e Destino 2002.

Fechando o percurso, viu-se que as áreas de Comprometimento Mínimo exibem diferentes maneiras de inserção no espaço metropolitano. Algumas se mostram comprometidas por força da Lei, implicando que o tratamento a ser dado a elas é o mesmo de qualquer outra pertencente ao amplo território polarizado pela capital, numa circunstância em que os municípios com maior poder de atração regional, muito provavelmente, realizem trocas mais intensas com a RMBH do que os incluídos na legislação. Em outras, a metropolização se apresenta como forma de coação à expansão territorial, como nos casos de Rio Manso e do distrito de Serra Azul, em Mateus Leme. Há também formas de comprometimento cuja marca se expressa no simbólico, como acontece com Caeté, através da Serra da Piedade. Um fenômeno recente que merece atenção é o parcelamento de áreas rurais para domicílios de uso ocasional. Esse fenômeno que pode, a médio ou longo prazo, gerar o modo de vida suburbano, tal como se deu em e Brumadinho, vem ocorrendo em Esmeraldas, Jaboticatubas, Caeté e Taquaraçu, além dos municípios localizados nas unidades de Expansão Metropolitana. Isso quer dizer que o menor comprometimento com a metropolização não pode ser visto apenas sob a ótica dos movimentos diários da população, devendo também incluir os efeitos de atividades para a economia local. A explicação para o fato de a totalidade dos municípios pertencentes à Área de Comprometimento Mínimo registrar baixas taxas de crescimento demográfico deve merecer a maior atenção, tendo em vista os processos de polarização regional e a dinâmica das macro-estruturas.

4. A permanência das Periferias O modo de comprometimento com a metropolização pode ser obtido pelo cálculo de índices de complexidade urbana. Tal índice, aplicado a cada área, define a hierarquia de preferência das atividades tomadas uma a uma, ou de todas elas em conjunto. No primeiro caso, tem-se o Índice de Complexidade por Atividades e, no segundo, o Índice de Complexidade Global42. No cálculo desses índices, despreza-se o uso residencial. A mensuração desses índices para a área metropolitana, contudo, exige a presença de um Cadastro Técnico Metropolitano, como já lembrado anteriormente. As bases de dados disponíveis em séries históricas para a RMBH apenas permitem um diálogo com os mesmos, considerando-se a relação entre residência e atividades; no caso, a relação entre a população residente e os índices de atratividade de cada área segundo padrões de co-presença. O EME e o MOMTI tinham uma concepção de espaço metropolitano polinucleado, no qual as atividades seriam distribuídas conforme uma hierarquia de centros, buscando interagir com o padrão do morar periférico. Predominava, no meio técnico, a ideologia de “planejar para a população de baixa renda”, expressa no lema “fundamental é o bem comum43”. A revisão das diretrizes contidas nas metas do EME, nos anos 80, resultou em diversos estudos, entre eles a elaboração do Sistema de Unidades Espaciais Metropolitanas. Deles decorreram a readequação das propostas do EME, consolidadas no documento Detalhamento das Propostas de Estrutura Urbana da RMBH. Esse documento aprofunda propostas elaboradas em outro nível hierárquico, o das macrounidades e dos complexos diferenciados de campos.

42 O Índice de Complexidade Global – IG – é a relação entre o somatório dos produtos dos índices de complexidade das atividades não residenciais pelas respectivas áreas construídas e o somatório dos produtos dos índices de complexidade de todas as atividades pelas respectivas áreas construídas. Por sua vez, O índice de Complexidade de Cada Atividade – IA – é a relação entre o produto do desvio padrão das respectivas áreas construídas pela área construída da atividade e a dimensão total da área estudada. CASTELO BRANCO, Alípio Pires. Programa CURA de Belo Horizonte: seleção de alternativas e escolha das áreas CURA. Vol I. Belo Horizonte: PBH/SUDECAP, 1980. p. 17 43 Afirmação do arquiteto Nei Furquim Werneck in PLAMBEL – Ano 15. Nei reconhece que, apesar dos anos de autoritarismo o PLABEL se insinuou nas frestas buscando favorecer à população da RMBH, mais do que cumprir diretrizes autoritárias. Para cada um dos sub-complexos diferenciados de campos, foram detalhadas propostas que podem ser classificadas como alterações no padrão espacial – intervenções urbanísticas -, no plano da vida espacial – favorecimento de complexidade de rótulos -, e da vida social, - medidas dos efeitos das intervenções sobre a população e suas condições de vida. Os parâmetros consistiram na população residente em cada área e nos nela empregos disponíveis. Se as condições de prover a própria subsistência aumentassem nas áreas consideradas, ou se distribuíssem de maneira equânime, as diretrizes de modificações de padrões espaciais e de vida espacial teriam alcançado as metas propostas. Nesta seção, expõe-se, para algumas unidades selecionadas em determinadas macrounidades, os resultados das propostas e a situação tal qual foi averiguada em 2002. As metas elaboradas nos anos 80 tinham, como horizonte, o ano 1995, data para a qual não existem informações. Entretanto, avaliar o alcance das metas sete anos após assume vital importância, posto que as ações de planejamento na RMBH foram abandonadas e deixadas, principalmente, aos cuidados dos municípios, do estado - através dos órgãos setoriais, sem qualquer preocupação com a articulação - e do setor privado, conforme suas intuições44. Para avaliar as propostas dos anos 80, são apresentadas tabelas sintéticas do perfil das unidades de terceiro nível, contemplando as taxas de crescimento dos domicílios e da população, de um lado, e das razões de dependência quanto à renda e às ocupações, de outro. Obtém-se, com isso, algo aproximado da concepção do índice de complexidade urbana. Com base na relação taxas de crescimento de domicílios ocupados e da população residente, de um lado, e das oportunidades de trabalho ou de acesso à renda, de outro, torna-se possível identificar os enclaves de alta e baixa renda – espaços exclusivamente residenciais – e a efetividade das policentralidades em sua devida hierarquia.

Núcleo Central

44 Ao longo desse tempo, com a extinção do PLAMBEL, a Fundação João Pinheiro elaborou vários relatórios de pesquisa cujo tema central era Gestão e Desigualdade na RMBH. Esses relatórios avaliam o quadro de desigualdades e a responsabilidade ou não da descentralização, do ponto de vista da articulação ou desarticulação das agências prestadoras de serviços urbanos e do ponto de vista das condições de enfrentamento das desigualdades examinadas como Metropolização da Pobreza. O último deles, com o nome de Gestão do Espaço Metropolitano: Homogeneidade e Desigualdade na RMBH, é uma das fontes deste artigo. Para o Núcleo Central, a meta síntese proposta consiste no “desestímulo à excessiva especialização (...), que deverá ser buscada através do fomento ao assentamento habitacional e menor ritmo de implantação de atividades econômicas” (PLAMBEL, 1987). A proposta do PLAMBEL acreditava que as Leis de Uso do Solo e as intervenções do PACE, devidamente monitoradas, garantiriam uma retomada do crescimento da população no interior da área delimitada pela Avenida do Contorno, mas que ações planejadas deveriam desacelerar o ritmo de crescimento das atividades aí localizadas. Como se vê pela tabela 9, o Núcleo Central contrariou todas as propostas. A população moradora acusou taxas negativas, do mesmo modo que os empregos gerados. Apesar da perda de população, os domicílios ocupados cresceram a uma taxa de 0,33% ao ano entre 1982 e 2002 (FJP, 2007). A área continuou com as taxas mais elevadas de atratividade – 10,5 - medida pelo número de empregos gerados comparados com a população efetivamente ocupada. Detinha também a mais elevada razão de dependência em relação à renda, 73% dos moradores tinham algum rendimento, 43% da população em idade economicamente ativa ocupava postos de trabalho remunerado e a renda média domiciliar subiu de 13,82 salários para 21,02 salários no período (FJP, 2007) O Núcleo Central, sob esse ponto de vista, livre de usos domiciliares inconvenientes, tornou-se quase o padrão de um centro metropolitano desejado, não fossem os incômodos causados pela deterioração de algumas áreas do Hipercentro, onde as contradições da área vão se mostrar mais evidentes. No Hipercentro, a população diminui a taxas de 3,33% ao ano entre 1991 e 2002, enquanto os domicílios ocupados aumentam 2,7% ao ano. Em algumas áreas, o uso residencial praticamente entra em recesso completo; em outras, as residências aumentam à taxa de 4,4% ao ano. Essa área gerava, em 1982, mais de 160 mil postos de trabalho; peso mantido em 2002 (FJP, 2007). Dessas ocupações, apenas uma pequena parcela – cerca de 1% do total – era absorvida por moradores do próprio Hipercentro, com trabalhadores residentes em áreas externas ao perímetro da Avenida do Contorno preenchendo mais de 94% das oportunidades locais de trabalho, qualquer que fosse o setor produtivo. (PLAMBEL, 1982). A dependência do Hipercentro para se reproduzir fica evidente quando se compara o local de moradia dos trabalhadores. Apenas 11,3% das pessoas que nele trabalham residem no Núcleo Central, enquanto que os moradores das Periferias preenchem 33,7% das ocupações, seguidos dos residentes na Área Pericentral, com 26,7% do total. Considerando os movimentos diários de busca do Hipercentro por todos os motivos, os moradores das Periferias representam 38,4% do total (FJP, 2007).

Tabela 9: Propostas e verificação das atividades do Núcleo Central – 1980 – 2002. Núcleo Central 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Parâmetros Tendência Proposta Tendência Proposta Verificado a - População 83.585 98780 98780 1,12% 1,12% 71104 -0,73% b - Empregos 466.405 718541 647667 2,92% 2,21% 318589 -1,72% a/b - % 17,92 13,75 15,25 22,32 Fonte: PLAMBEL: Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002

Este conjunto de interpretações, embora sumário, permite compreender que a sustentatibilidade das Periferias é extremamente dependente do centro metropolitano, por melhores que tenham sido as intenções explicitadas nas diretrizes do planejamento governamental, as quais ajudam também a explicar seu fracasso. A Zona Sul, que se agrega ao Núcleo Central e que compõe a Área Central como macrounidade, merece uma análise especial. Surgida originalmente como área suburbana, foi progressivamente conquistando a condição de área complementar ao centro. Num primeiro momento, apresenta-se como alternativa de expansão das residências para famílias de alta renda, para tornar-se também espaço privilegiado para abrigar grandes equipamentos de serviços de porte metropolitano. A tabela 10 mostra as intenções da década de 80 e o verificado em 2002. Esperava-se que as intervenções propostas pudessem desacelerar o ritmo de localização de atividades na área para serem distribuídas em outras unidades, com o objetivo de favorecer novas centralidades. As informações obtidas em 2002 mostram um quadro diferente. Houve desaceleração do crescimento demográfico, devido à queda geral da fecundidade e às novas composições dos grupos familiares, e aceleração maior das atividades geradoras de postos de trabalho. Houve também nítida elitização, fazendo com que a renda média familiar saltasse de 16,8 salários mínimos na unidade denominada Santo Antônio/São Bento/Cidade Jardim para 26,2 salários em 2002; e, na que leva o nome de Mangabeiras, passasse de 14,6 para 18,5 salários (FJP, 2007). O aumento das atividades econômicas mostra ainda que a região oferece postos de trabalhos para residentes em outras macrounidades. Em 2002, o coeficiente de atratividade da área do Santo Antônio era 1,33 e, o do Mangabeiras, 1,21. A razão de dependência quanto à renda exibe também uma situação bastante confortável – 57% no Mangabeiras e 62% no Santo Antônio -; a razão de dependência do trabalho confirma características do tipo de morador – 40% no Mangabeiras e 47% no Santo Antônio (FJP, 2007). Entretanto, o que mais chama a atenção nessas informações é que a renda média familiar da unidade do Mangabeiras é inferior à do Santo Antônio. Isto pede uma análise mais atenta e que não é revelada nesse nível de aproximação. Tabela 10: Propostas e verificação das atividades da Zona Sul: Santo Antônio / Mangabeiras – 1980 – 2002 Zona Sul 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Parâmetros Tendência Proposta Tendência Proposta Verificado a – População 172524 229581 229581 1,92% 1,92% 224950 1,21% b – Empregos 61669 86281 82080 2,26% 1,92% 122909 3,18% b/a - % 35,75 37,58 35,75 54,64 Fonte: PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002 Antes de se tornar extensão do Núcleo Central, a Zona Sul era uma das porções da zona suburbana. Além disso, parte dela é caracterizada pela alta declividade, o que desestimulou, por muito tempo, a ocupação das encostas íngremes pelos agentes do mercado imobiliário. Em razão do custo zero para o mercado, tolerou-se sua ocupação por segmentos populares de baixa renda. A encosta se favelou em duas grandes porções: a favela da Serra, próxima ao Mangabeiras, e a do Santa Lúcia, na unidade do Santo Antônio. A Zona Sul, diferentemente do Núcleo Central, manterá, portanto, formas de viver periférico muito próximas ao centro. Para chegar a diferença entre as duas unidades, cumpre fixar que 71,6% dos domicílios favelados estão localizados na unidade Mangabeiras. A renda média do aglomerado da Serra, equivalente a 2,63 salários em 2002, é inferior à do aglomerado do Santa Lúcia, com 3,22 salários. Entre os residentes no aglomerado da Serra, 80% trabalham na Área Central, dos quais apenas 18% se deslocam para o Núcleo Central por motivo de trabalho; no Santa Lúcia, 90% trabalham na Área Central e 24% têm, como local de trabalho, o Núcleo Central (FJP, 2007). Isto posto, cabe salientar o potencial de desenvolvimento sustentável da favela. Dos moradores do Santa Lúcia, 17% encontram trabalho no local, obtendo renda que varia entre 1,4 e 1,7 salários; já entre os moradores do aglomerado da Serra, 19% trabalham no próprio local, com renda média que varia entre 1,3 e 1,8 salários (FJP, 2007).Vale sublinhar que essas favelas são favorecidas pela localização, o que representa a vantagem de resistir como periferia no Núcleo Central.

Área Pericentral Na Área Pericentral, haverá diversas marcas da Área Suburbana. Entretanto, como já mostrado, ela foi se transformando ao longo dos anos em espaço de moradia do que se convencionou chamar de classe média. Sua diversidade exigiria uma análise bem mais longa do que a que comporta o presente artigo, a qual será ilustrada através do exame de sub-complexos de campos selecionados. O primeiro deles é o da Lagoinha – área que se constituiu como bairro operário antes mesmo da construção da capital. Essa vocação foi acentuada nos anos 40, com a construção do Conjunto IAPI – São Cristóvão. Outro marca que a distingue é a favela Pedreira Prado Lopes, contígua à favela Senhor dos Passos. Tais favelas vêm resistindo aos esforços de remoção desde os primeiros anos da cidade e favoreceram inúmeros programas habitacionais para população de baixa renda, sem se renderem a eles. Lagoinha é também símbolo de programas de revitalização, tendo em vista a contigüidade com o Núcleo Central e, ao mesmo tempo, de resistência à escolha de permanecer um bairro com marcas deterioradas do passado. A tabela 11 mostra as intenções dos planejadores para a área. Já nos anos 80 suspeitava- se de decréscimo da população e de aceleração das atividades geradores de emprego e ocupações. A situação, em 2002, mostra um quadro bastante anômalo. Houve uma redução drástica da população, o que implicou na elevação da razão emprego / população, apesar de os postos de trabalho terem também se reduzido. A razão de dependência da renda, em 2002, era de 53%, enquanto a razão de dependência do trabalho ficava em 33%, apontando para uma população envelhecida. Predominavam, na área, pessoas ocupando posições burocráticas e ocupações manuais, especializadas ou não, com rendimento individual entre 2,5 e 3,0 salários (FJP, 2007).

Tabela 11: Propostas e verificação das atividades na Lagoinha – 1980 – 2002

Lagoinha 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Parâmetros Tendência Proposta Tendência Proposta A - População 48305 47336 47336 -0,14% -0,14% 20187 -3,89% B - Empregos 18400 31291 27378 3,60% 2,68% 12763 -1,65% b/a - % 38,09 66,10 57,84 63,22 Fonte: PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002

Entretanto, há uma realidade interna a essa unidade que é merecedora de destaque. Trata-se de distinguir a população favelada da que ocupa o conjunto São Cristóvão. A renda domiciliar média do São Cristóvão é o dobro da dos moradores da Pedreira – 7,9 e 3,5 salários, respectivamente; a renda média per capita, contudo, é três vezes maior, respectivamente, 2,41 e 0,76 salários. A diferença se deve ao tamanho médio dos residentes por domicílio. Quanto ao local de trabalho, 97,5% dos residentes no São Cristóvão trabalham fora da área em que residem, enquanto, na Pedreira, 78,0% dos moradores trabalham fora (FJP, 2007). O que há de mais curioso na comparação dessas áreas é que, do ponto de vista da história e do espaço urbano, elas se aproximam. Uma e outra são conquistas operárias; a distância entre os limites é de apenas uma rua. Outro sub-complexo de campos selecionado para análise é o de nome Renascença/Cidade Nova. Sua formação está ligada inicialmente ao esforço de industrialização da capital nos anos 20 e 30 do século passado, com a instalação da indústria têxtil. A essa vocação, soma-se o interesse do município de escolher uma de suas áreas para construção da “Cidade dos Pobres” – Cidade Ozanan – que, junto com Vila Concórdia, aponta para as marcas de periferia interpretadas pelos agentes do poder público para este tipo de área operária. Cachoeirinha, de um lado, Renascença, de outro, Matadouro no terceiro vértice e Vila Concórdia, no quarto, configuram vocações diversas de especialização do espaço de ocupação operária. A região do Matadouro impõe marcas de ocupação periférica resistente, que não se extingue nem mesmo com a construção do anel rodoviário no final dos anos 50. Por sua vez, a Cachoeirinha determina padrões espaciais bem típicos das vilas operárias. A Renascença determina um novo tipo de assentamento, de maior complexidade. Embora não se vá aprofundar sua análise neste artigo, vale sublinhar que uma das marcas do espaço operário nessa região é a resistência à homogeneidade socioeconômica. O sub-complexo da Renascença, com essas raízes históricas, permaneceria indefinidamente com suas características originais se, no início dos anos 60, não fosse parcelada uma ampla área vizinha, com o nome de “Cidade Nova”, cujo padrão imitava o da Cidade Jardim, inventada pelo poder público nos anos 40, junto ao Núcleo Central. Tal loteamento, aparentemente, contrariava a lógica da estruturação espacial, a não ser pela vizinhança com o Horto Florestal. A abertura da avenida Cristiano Machado – que irá ter ao Aeroporto Metropolitano - nos anos 70 e a da avenida José Cândido da Silveira, contornando o Horto e favorecendo o acesso à cidade de Sabará, confirmarão a vocação da Cidade Nova como centro “primaz da unidade”. A tabela 12 exibe as intenções dos planejadores para essa área. A projeção da população trazia embutida um pequeno êxodo de moradores, certamente aqueles de rendimentos pouco compatíveis com os efeitos dos investimentos públicos e privados. As informações obtidas em 2002 mostram que os efeitos foram maiores que o projetado. Contraditoriamente, o emprego não aumentou nem mesmo no ritmo da tendência verificada. Mesmo assim, ao longo de 20 anos, as atividades mantiveram um ritmo de crescimento bastante significativo, ampliando o volume de emprego, resultante do estabelecimento de shopping centers, hotéis de elevada qualidade e uma rede de serviços de porte metropolitano.

Tabela 12: Propostas e verificação das atividades na Renascença / Cidade Nova – 1980 – 2002 Renascença 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Tendência Proposta Tendência Proposta A - População 80500 97649 97649 1,30% 1,30% 97425 0,87% B - Empregos 12023 35293 40622 7,44% 8,46% 37868 5,35% b/a - % 14,94 36,14 41,60 38,87 Fonte: PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002

Interessa, portanto, conhecer dois aspectos da região. O primeiro tem como emblema a Cidade Nova, um quase enclave dos “ricos”, e, o segundo, as inúmeras vilas que proliferaram na região, tomando inicialmente o nome de Vilas Reunidas para serem reconhecidas pelo poder municipal como Bairro União. A atenção para esses dois aspectos conduz a conclusões intrigantes. A primeira é que os moradores de baixa renda não se deixaram expulsar pelas forças atraentes do mercado. O valor de uso prevaleceu sobre o valor de troca. As modificações têm mais a ver com intervenções viárias com efeitos de remoção das famílias residentes nos domicílios localizados em áreas contempladas. São os novos padrões de composição das unidades domiciliares os principais responsáveis pelas mudanças. A segunda é que os agentes do mercado não tiveram tanto poder para expulsar os moradores antigos. Preferiram atuar nos espaços vazios, seja criando novos loteamentos, seja verticalizando as áreas remanescentes. No exame da ocupação da Cidade Nova, percebe-se que é nela que se evidencia toda a pujança. Entre 1982 e 2002, os domicílios ocupados aumentaram 67,9%, passando de 2.560 para 4.297; a população também cresceu 19%, de 12.296 para 15.376 pessoas. Isto torna evidente que o uso residencial é o reforço principal para os demais e que, ao longo dos anos, houve uma acentuada verticalização dos assentamentos domiciliares, posto que, se todos os domicílios tivessem apenas uso unifamiliar horizontal, a área estaria saturada ao alcançar 1.680 unidades construídas para esse fim. Em 2002, a área contava com 2,6 vezes a quantidade de domicílios ocupados (FJP, 2007), superando a saturação horizontal. A ação dos agentes imobiliários fica mais evidente diante da constatação da progressiva verticalização da Cidade Nova. Nos últimos 20 anos, a área torna-se ligeiramente mais acessível para estratos de renda média inferior à dos ocupantes originais. Em 1982, no início da substituição das residências unifamiliares, a renda média familiar superior a 15 salários se estendia a 60,0% dos domicílios; já em 2002, 56,6% estavam nessa condição (FJP, 2007). Merece destacar que o maior investimento aconteceu com o objetivo de atender ao estrato de rendimento mais elevado. Foram construídas 831 novas unidades habitacionais destinadas a famílias com renda superior a 30 salários, num aumento de 325% em 20 anos. As famílias na faixa de 10 a 15 salários foram contempladas com mais 478 novas unidades – variação de 160% - e as de 5 até 10 tiveram um crescimento também expressivo, de 554 novas unidades – variação de 325%. A faixa de 15 a 20 salários recebeu mais 170 unidades, numa variação de 31%. Examinado sob esse ponto de vista, vê-se que os agentes do mercado perceberam a diversidade da área quanto à localização e ao valor simbólico. Dois grandes grupos tornam-se atraentes para investimentos na Cidade Nova. O primeiro é o de alta renda; o segundo é o das faixas de renda média variando entre 5 e 10 salários mínimos. Ao destacar a análise do sub-complexo da Renascença / Cidade Nova, foi possível mostrar que o espaço Pericentral se manteve ambíguo quanto a conservar suas antigas marcas periféricas – suburbanas – ou de se valer das proximidades do Núcleo Central, partilhando com ele o acolhimento de funções metropolitanas. Um percurso por todo esse espaço mostraria as contradições presentes no sub-complexo da Gameleira, no qual o Campus da PUC Minas promove a verticalização e afluência dos bairros Coração Eucarístico e Minas Brasil, ao mesmo tempo em que convive com espaços operários dos bairros Alto dos Pinheiros, Dom Cabral e favela 31 de Março. Do outro lado, a permanência insistente das periferias ficaria mais evidente no exame do sub-complexo Santa Efigênia, no qual o Aglomerado da Serra insiste em se expandir ocupando toda a encosta até a divisa com o município de Sabará, independentemente das grandes intervenções viárias configuradas na Avenida dos Andradas. Essa permanência das periferias se mostrará presente também na Pampulha, selecionada para ser uma área nobre metropolitana. Seu sucesso, ao incentivar os empresários na multiplicação de loteamentos especulativos – morar na Pampulha seria realizar o sonho mineiro da vista para o mar – cria bairros com os nomes exóticos de Copacabana, Leblon, Jardim Atlântico, Urca, cujos lotes foram vendidos em inúmeras cidades do estado, apresentados apenas numa planta. Disso não se poderia aguardar resultados diferentes de ocupação por movimentos de sem casa, configurados mais uma vez em padrões periféricos ou para reassentamento de flagelados das enchentes, como irá acontecer com a uma parcela contígua ao bairro Urca, denominada de Confisco.

Eixo Industrial

O Eixo Industrial é a macrounidade na qual o padrão de periferia se apresenta como um bom desafio para análise. Como se viu, previa-se que a Cidade Industrial deveria abrigar um espaço planejado para os operários. A nova centralidade inventada pelo estado não poderia compreender o espaço operário como periférico. Pelo contrário, a indústria não pode subsistir sem mão de obra em suas diversas escalas. Tal necessidade permaneceu na consciência do Estado até o início do governo militar - a Secretaria de Estado do Trabalho era também da Habitação e da Cultura Popular. A intenção ficou na intenção e apenas alguns poucos ensaios foram feitos com o objetivo de criação de conjuntos habitacionais. Nada de Cidade Operária. Algumas indústrias criaram vilas exuberantes, cujo exemplo maior é a vila da Fábrica de Cimento Itaú. A Magnesita S.A. foi uma das primeiras a se estabelecer numa porção das áreas reservadas para a cidade operária. Por último, a Cia. Belgo Mineira criou dois bairros operários distantes da fábrica. O espaço interno ao hexágono, que configura a Cidade Industrial, deveria abrigar as indústrias localizadas por ramo de atividade, com concessão para umas poucas casas para operários. O que aconteceu realmente é que os operários, ou aspirantes a operário, de mais baixa qualificação escolheram as áreas mais sujeitas as risco, criando nelas a sua cidade. Desse modo, contraditoriamente, a periferia operária passou a ocupar o centro das indústrias. Entretanto, a construção da Cidade Industrial ensejou a criação de parcelamentos com planta ambiciosa visando o assentamento operário. O mais importante deles tomou o nome de Cidade Jardim Eldorado. A centralidade da cidade operária não pode ser compreendida sem referência ao Eldorado, bairro que se torna objeto de freqüentes requalificações, tendo em vista seu poder de centralidade. Ele é escolhido para o Projeto Cura, antes mesmo do PACE para o Núcleo Central. É nele que se ensaiam os primeiros estudos para compreensão da estruturação dos espaços da RMBH, com os conceitos de campos como unidade de vida urbana. A análise aqui vai se deter especialmente nos espaços que seriam entendidos como periferias do Eixo Industrial. Aceita-se, portanto, como hipótese, que, no caso da RMBH, o espaço operário não é periférico, posto que o espaço da indústria incorpora centralidades que implicam a presença do espaço operário. Uma periferia do espaço industrial terá marcas bem diferentes das que definem as Periferias do espaço metropolitano. Do mesmo modo que o espaço de lazer metropolitano, materializado na Pampulha, gerou uma periferia deste setor terciário, o espaço do trabalho na indústria gerará uma periferia sonhando com sua inclusão em tal atividade. Isso será bem diferente das periferias da área Pericentral, das Áreas de Expansão Metropolitana e, principalmente, das designadas propriamente de Periferias. O Eixo Industrial, que se forma com a criação da Cidade Industrial, propiciará a proliferação de parcelamentos destinados à moradia operária de acordo com uma hierarquia de tratamento do trabalhador. Além dos conjuntos e vilas construídas pelas indústrias, os parcelamentos podem ser categorizados segundo a qualidade dos equipamentos urbanos oferecidos. Tomando-se a Cidade Jardim Eldorado como parâmetro, nota-se que as ruas são entregues à população sem pavimentação. Água e iluminação elétrica servem a apenas uma parte da área parcelada, aguardando o ritmo das ocupações. A segunda leva de parcelamentos para operários acontece na Fazenda Riacho das Pedras. Nela, as glebas se tornam acessíveis aos trabalhadores em diferentes oportunidades. O Bairro Riacho das Pedras é posto à venda com ruas sem pavimentação, mas servido de rede de água e iluminação. Isso garantiu sua rápida ocupação, possibilitando a oferta de novos loteamentos, sempre com padrão superior. Outro padrão é o que oferece ao mercado os bairros das Indústrias e Amazonas. As ruas têm calçamento e iluminação, mas sem serviços de água, cabendo aos proprietários cavarem cisternas. O padrão mais recente acontecerá na região do Barreiro, onde os proprietários dos terrenos preferiram articular a oferta de lotes a grandes empreendimentos em conjuntos habitacionais. Uma grande variedade de formas, normalmente especulativas, caracteriza aquilo que se considera como moradia adequada para operários, segundo a leitura dos agentes do mercado. Os lotes são oferecidos sem qualquer melhoria, apontando para uma ocupação de longo prazo. A empresa que mais usou desse expediente em todo o Eixo Industrial foi a COMITECO, que loteou indiscriminadamente em toda a RMBH nos anos 50 e 60. O nome dos parcelamentos era sempre convidativo, como já se nomeou os da Pampulha. Na região de Betim, foram designados como Jardim Teresópolis, Jardim Petrópolis, Jardim das Alterosas e Jardim dos Inconfidentes, através dos quais são ocultadas as surpresas na declividade dos terrenos. Pode-se adiantar uma pergunta: se os parcelamentos destinados ao espaço operário não são, em si mesmos, periféricos, então qual é a concepção de espaço periférico no Eixo Industrial? De imediato, há um padrão espacial presente no saber técnico dos empreenderes de que a reprodução da força de trabalho pede uma moradia considerada como máquina higiênica. Lugar de comer, dormir e depositar dejetos. As vilas operárias construirão espaços mais ou menos de acordo com essa concepção. Em diferentes momentos, foram construídos dois conjuntos habitacionais para operários, de natureza emblemática. O primeiro deles, inaugurado em 1958, com o nome de bairro JK, tinha casas geminadas, com luz, água e esgoto sanitário, lotes divididos por cercas de arame, ruas com meio fio e compactadas, terminal de transporte coletivo, escola e centro esportivo. O segundo fez parte dos primeiros ensaios do BNH de construção de casas para trabalhadores de baixa renda e se localizou na região do Barreiro conhecida como Vale do Jatobá. Ao contrário do JK, o bairro ficava distante de qualquer área urbana, as ruas eram estreitas e as casas obedeciam ao padrão mínimo do BNH - água, luz e calçamento. O resultado da construção dessas duas “cidades operárias” foi que, enquanto o bairro JK viabilizou a ocupação das áreas contíguas do Eldorado, o Conjunto do Vale do Jatobá favoreceu uma seqüência de loteamentos para população de baixa renda, incluindo favelas. Desse contraste resulta que, embora com exigências menores, a moradia operária inserida na concepção de cidade operária integra as necessidades do operário não apenas como reprodução simples de sua força de trabalho. A cidade operária exige a constituição de um setor terciário com alguma diversificação, ensejando centralidades. As periferias do Eixo Industrial têm características sui generis, como já insistido. Sua marca é a esperança de emprego nas indústrias, por mais remota que seja essa esperança. Desse modo, vão sobressair três grandes tipos. O primeiro é caracterizado por municípios hipoteticamente vinculados ao Eixo Industrial e que se tornam permissivos ao parcelamento indiscriminado do solo, atraindo uma população de baixa renda que não encontra emprego imediatamente. O município padrão nesse caso foi o de Ibirité, antigo Várzea do Pantana. O segundo tipo, semelhante ao primeiro, se caracteriza por amplas regiões contempladas por parcelamentos especulativos, no embalo da industrialização de Contagem. O caso mais nítido é o do município de Betim até a construção da Refinaria Gabriel Passos da Petrobrás nos anos 60 e a inauguração da FIAT Automóveis nos anos 70. A marca desse tipo é a disponibilidade de lotes, que atraiu volume imenso de população não preparada para o padrão de ocupação exigida para a indústria. Assim, os imóveis são ocupados por uma população trabalhadora não qualificada, que deverá procurar trabalho em outros locais. Betim se transformou, contraditoriamente, em cidade dormitório de sua população trabalhadora, ao mesmo tempo em que recrutava força de trabalho em Contagem e Belo Horizonte. O terceiro tipo tem, como exemplo, o esforço de Contagem de remover populações pretensamente localizadas em áreas de riscos ou favelas dos distritos industriais - regra geral, em fundos de vale inundáveis ou áreas sujeitas a movimentos de terra -, para as quais cria assentamentos em periferias distantes dos centros de emprego. O símbolo desse empreendimento é o bairro conhecido como Nova Contagem, cuja ocupação se iniciou em 1985. Nele, foram reassentadas algo próximo de quatro mil famílias, tornando-o atraente para os sem terra, que cuidaram de favelar as áreas internas de risco e todo o seu entorno. O empreendimento de Nova Contagem foi também responsável por uma acelerada ocupação no município vizinho, aproveitando a displicência do poder local em favorecer parcelamentos indiscriminados do solo rural. Para compreender um pouco mais a marca do desenvolvimento periférico no Eixo Industrial, exemplifica-se rapidamente o processo com o caso de Nova Contagem. O empreendimento tem características próprias de um programa habitacional para famílias de baixa renda. Os domicílios foram doados pelo poder público devidamente urbanizados, inicialmente sem água e, até o final de 2007, sem rede de esgoto. O efeito de Nova Contagem como periferia planejada do Eixo Industrial não pode ser minimizado. Ao longo de 20 anos, o bairro Icaivera, cuja metade pertence ao município de Betim, passou a ter uma ocupação intensa. Surgiram, do lado de Esmeraldas, inúmeros loteamentos ocupados rapidamente por população de baixa renda. Multiplicaram-se invasões planejadas e promovidas por vereadores do município de Contagem e desenvolveram-se programas adicionais de habitação para famílias pobres na década de 90. Para se avaliar o impacto de Nova Contagem na formação da periferia do Eixo Industrial, observa-se que, em 1982, o único povoado existente na área era o do Retiro, com 420 moradias ocupadas e 2.365 habitantes. No restante da região, abrangendo Betim e Esmeradas, havia domicílios dispersos. Em 2002, os domicílios ocupados alcançaram a cifra de 12.982 unidades e, a população, 55.200 pessoas (FJP, 2007). Isto quer dizer que os domicílios aumentaram 31 vezes e a população 23 no período. O crescimento da área situada em Contagem reproduz o mesmo que se desenvolveu em Betim. A diferença é que, em Betim, a ocupação se deu por obra dos agentes privados do mercado e, em Contagem, por ação direta dos agentes públicos, seguidos imediatamente por agentes privados. Como periferias do Eixo Industrial, toda essa ampla região é servida por transporte coletivo cujo destino final é a Cidade Industrial, podendo se articular com o resto da Região Metropolitana através do metrô. Será isso que diferenciará esse espaço da macrounidade que leva o nome de Periferias. Quando da elaboração de propostas para a unidade Retiro /Nova Contagem, ela era tão inexpressiva que não se avaliou tendências para a mesma. A tabela 13 exibe o percurso realizado em 22 anos. Do ponto de vista do trabalho, a unidade era mais sustentável nos anos 80 do que veio a ser em 2002.

Tabela 13 : Propostas e verificação das atividades no Retiro / Nova Contagem– 1980 – 2002 Retiro/Nova Contagem 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Tendência Proposta Tendência Proposta a - População 3027 76386 15,81 b - Empregos 625 8176 12,40 b/a - % 20,65 10,70 Fonte: PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002 Após este percurso, nota-se que o Eixo Industrial, ao concentrar as indústrias, criou um espaço diversificado para a população trabalhadora, nem sempre adequado às exigências do setor industrial. Nota-se, ainda, que o espaço do operariado se concentra principalmente nas proximidades da Cidade Industrial e em algumas áreas da região do Barreiro. Os loteamentos especulativos favoreceram uma intensa ocupação por famílias de baixa renda, sem acesso às vantagens do emprego industrial. Isto se torna mais evidente pelo exame das áreas em direção a Ibirité e também de Betim.

Periferias Uma visão global dessa macrounidade explicita o que seria o padrão demográfico e socioeconômico das famílias residentes nas Periferias. Os domicílios ocupados aumentaram 127,2% em 20 anos, equivalendo a uma taxa de crescimento da ordem de 4,2% ao ano. A população cresceu 84,7% no mesmo período, partindo de 703.445 pessoas em 1982 para alcançar 1.298.992 pessoas em 2002, expressando uma taxa de 3,1% ao ano (FJP, 2007). Embora pareça um crescimento “modesto”, o exame dos complexos e sub-complexos mostrarão as diferenças de ritmos, comparando-se as periferias recentes com as que se iniciaram nos anos 50 e 60 do século passado. As famílias de baixa renda são a marca das Periferias. Em 1982, os domicílios com renda de até 5 salários representavam 79,8% do total e ainda mantinham elevada participação 20 anos depois, equivalendo a 61,7% do total (FJP, 2007). Nesse período, houve muitas mudanças. Entretanto, a marca do viver periférico é aliar a condição de baixo rendimento à de baixa sustentabilidade regional e de baixo acesso aos benefícios urbanos. Sob esse ponto de vista, os moradores das Periferias carecem do direito à cidade. O sub-complexo de campos do Bairro Nacional era, nos anos 80, uma região de difícil acesso, pouco articulada, localizada nos fundos do Zoológico. Sua comunicação, seja com Contagem, seja com Belo Horizonte, dependia de um transporte coletivo raro e deficiente. O padrão de ocupação periférica irá se manter, apesar de mudanças efetuadas no sistema viário e de transporte coletivo. Pela tabela 14, percebe-se que os empregos existentes na unidade, em 1980, poderiam atender a apenas 3,1% de sua população. A população cresceu a taxas elevadíssimas no período e o aumento dos postos de trabalho ficou acima da tendência, porém aquém do que se pretendia. O saldo, no entanto, foi favorável, sem retirar a marca de periferia, posto que os empregos existentes na unidade, em 2002, poderiam atender menos da metade da população economicamente ativa residente.

Tabela 14: Propostas e verificação das atividades no Bairrro Nacional – 1980 – 2002 Nacional 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Tendência Proposta Tendência Proposta a - População 5767 32541 40280 12,23% 13,84% 57556 11,02% b - Empregos 191 2403 5692 18,39% 25,40% 9999 19,71% b/a - % 3,31 7,38 14,13 17,37 Fonte: : PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002

As considerações sobre o perfil das áreas homogêneas desse sub-complexo podem revelar suas carências. Destaca-se o caso da área homogênea Pedra Azul / Nacional. Nela, o elevado crescimento de domicílios, aliado a uma alta taxa de população de baixa renda, são os principais destaques. Entre 1982 e 2002, os domicílios aumentaram 6,1 vezes e, a população, 4 vezes. A predominância de baixa renda diminuiu, mas manteve- se elevada – 91,7% em 1982 para 61,7% em 2002. A despeito de os domicílios com renda de até 5 salários terem regredido, a pobreza continuou alta; no estrato de até 5 salários, os domicílios com renda de até 3 salários representavam 62,1% em 2002. Apesar disso, em uma pequena área não ocupada anteriormente, houve condição para fixação de moradia de famílias com renda superior a 10 salários mínimos que, totalmente ausentes 20 anos antes, passaram a representar 10,6% dos domicílios ocupados em 2002 (FJP, 2007). Isto permite concluir que as periferias promovidas pelo mercado imobiliário privado vivem pelo menos dois momentos. O primeiro deles, de ocupação dispersa, com um contingente predominante de pobreza e baixa renda, e, o segundo, de maior seletividade, quando a pobreza decresce, mesmo mantendo-se majoritária. Cumpre lembrar que a pobreza, numa economia metropolitana, possibilita a criação de alguns segmentos que promovem a acumulação baseada na baixa renda.

Venda Nova Venda Nova é um sub-complexo de campos pertencente ao complexo de campos denominado Venda Nova / Justinópolis / Via Norte. Essa região acusou aumento de sua população em 79,7% entre 1982 e 2002 (FJP, 2007). O nome do complexo de campos faz intuir sua complexidade. Há um núcleo principal de expansão periférica – Venda Nova – a partir do qual a metrópole se expande, de um lado, em direção ao município de Ribeirão das Neves, alcançando o povoado de Campanhã – Justinópolis –, e estende-se pelo município de Vespasiano – Via Norte. A formação das periferias nos sub-complexos é diferente. Em algumas áreas, especialmente as que formam o sub-complexo de Venda Nova, a ocupação é precedida por uma onda de loteamentos especulativos, apelando para a proximidade da Pampulha. Em Justinópolis, predominam loteamentos irregulares, facilmente acessíveis à população de baixa renda. No eixo da Via Norte – conhecida atualmente como Linha Verde -, conjugam-se loteamentos especulativos, próximos ao entroncamento da MG 20 com MG 40, a intervenções do SFH, consolidadas pela construção do Conjunto Morro Alto. No complexo de campos Venda Nova / Justinópolis / Via Norte, as características das periferias se mostram muito mais vigorosas do que no da Ressaca. A evidência mais eloqüente é o crescimento do número de domicílios ocupados e da população, que se multiplicaram, respectivamente, por 2,3 e 1,8 vezes, entre 1982 e 2002. O vigor desse crescimento é ainda mais significativo quando se considera que, em 1982, existiam 44.700 domicílios ocupados, abrigando uma população de 230.516 moradores (FJP, 2007). Apesar de, em 20 anos, ter havido alguma diversificação das condições socioeconômicas das famílias, os domicílios com renda média até 5 salários mantiveram participação elevada. As modificações ocorridas favoreceram principalmente as famílias com renda entre 5 e 10 salários, cujo número se multiplicou por 2,1, ampliando sua participação de 14,5% para 28,5% no período. As famílias com renda superior a 15 salários aumentaram quase 6 vezes, passando de 1,5% para 3,9% do total (FJP, 2007). Nessa visão geral, o complexo de campos deixa explícito que a expansão periférica tem momentos diferentes. O primeiro, de aceno exclusivo à população de baixa renda, e, o segundo, de maior complexidade, consolidando um mercado seletivo sem excluir totalmente as faixas mais pobres. Mesmo com a redução relativa dos domicílios com renda inferior a 3 salários, há um aumento significativo deles no total. No caso do complexo analisado, os domicílios ocupados por famílias pobres aumentaram 47,9% no período, contra um crescimento de 130,9% do total de domicílios ocupados, ou seja, nas periferias, o espaço da pobreza tem melhor acolhida, ao mesmo tempo em que se torna linha de frente para promover urbanização e complexidades urbanas. Descendo aos sub-complexos de campos, visualiza-se também um outro aspecto do crescimento periférico, as favelas. Tradicionalmente, favelas se localizavam em áreas onde a oferta de emprego se tornava atraente. O favelamento nas periferias terá um outro móvel que justificará semelhante tipo de ocupação, denunciando aspectos perversos do mercado imobiliário e da economia metropolitana. O núcleo de Venda Nova manteve-se distante e quase apático até os anos 60, a partir dos quais se multiplicaram conjuntos habitacionais na área. A ocupação do sub- complexo de Venda Nova, em 1982, já dava mostras de seu transbordamento pelo distrito de Justinópolis, em Ribeirão das Neves. Nesse ano, os domicílios ocupados da região em análise correspondiam a 54,1% de todo o complexo, distribuindo, com Justinópolis, a atração da população de baixa renda, onde se localizavam 43,7% das residências (FJP, 2007). O eixo da Via Norte iniciava sua ocupação no padrão das periferias e, apenas 20 anos depois, assumirá o ônus de dividi-la com Justinópolis. O adensamento da ocupação foi maior no sub-complexo de Venda Nova. Em 2002, os domicílios dessa unidade correspondiam a 52,9% e os de Justinópolis a 36,4% do total. A distribuição das famílias por faixa de renda já dava mostras de alguma complexidade na ocupação do espaço (FJP, 2007). Em 1982, apesar da marca nítida de ocupação periférica, as famílias com renda até 5 salários representavam 76,9% do total – participação inferior aos demais sub-complexos aqui considerados. Os domicílios com renda de até 3 salários mínimos eram 56,0% do total. Embora maioria, ainda exibiam uma taxa inferior às dos sub-complexos vizinhos. Em 20 anos, a maior modificação incidiu sobre os domicílios pobres, que passaram a representar 32,9% do total. A pobreza, vista sob esse aspecto cresceu “apenas” 31,5% no período, em contraste com a taxa de 126,2% do sub-complexo. Mesmo assim, Venda Nova era o espaço preferido para moradores com renda variando entre 3 e 10 salários, contingente que representava 52,7% dos domicílios ocupados em 2002. Esse perfil e a escala em dezenas de milhares favoreceram o aumento de famílias com renda maior de 10 salários, cujo quantitativo, em 2002, correspondia a 6,2 vezes o de 1982 (FJP, 2007). Cumpre ressaltar que a multiplicação de domicílios de renda superior a 10 salários mínimos não reflete necessariamente o crescimento da riqueza regional, mas o interesse dos agentes imobiliários de investir em algumas áreas para segmentos de mercado mais seletivos. Somente a análise por área homogênea pode explicitar essas intenções. Importa fixar também que entre os sub-complexos vizinhos, Venda Nova, foi o que mais recebeu intervenções modificando o espaço urbano, que tornaram a região mais atraente para os segmentos médios, como preceituavam os técnicos de planejamento nos anos 80. Pelo exame da tabela 15, percebe-se a grande carência de Venda Nova no ano de 1980. Os empregos, se fossem preenchidos exclusivamente pelos moradores locais, eram absolutamente insuficientes e a tendência verificada não era alentadora. Não se vislumbravam, apesar disso, alternativas vigorosas que pudessem romper com esse circulo de vida periférica. As informações de 2002 são um pouco mais alentadoras. A relação emprego / população aumentou quase três vezes e o crescimento da população se deu a taxas menores do que as esperadas. Mesmo assim, Venda Nova ainda acusa elevada dependência, sendo obrigada a buscar condições de subsistência em outras áreas. Tabela 15: Propostas e verificação das atividades da Unidade de Terceiro Nível, Venda Nova – 1980 – 2002 Venda Nova 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Tendência Proposta Tendência Proposta a - População 121107 222404 252000 4,14% 5,01% 215611 2,66% b - Empregos 7330 23848 31291 8,18% 10,16% 43878 8,47% Venda Nova 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Tendência Proposta Tendência Proposta b/a - % 6,05 10,72 12,42 20,35 Fonte: : PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002

Via Norte

O terceiro complexo é o denominado Via Norte. Essa área tinha uma ocupação tímida na região conhecida como Cipriano, no município de Vespasiano. O impulso à sua ocupação aconteceu no final dos anos 70, sinalizado pela construção do conjunto habitacional Morro Alto, que visava às famílias de baixa renda, mas não à pobreza. As chuvas torrenciais de 1979 a 1981 foram oportunidade para descaracterizar a ocupação do conjunto, que recebeu famílias de desabrigados pelas enchentes. Desse modo, o sub- complexo deixa à vista duas frentes de ocupação: a primeira, nas áreas do Cipriano, obedientes, no início, ao mercado para baixa renda, e, a segunda, em seguida ocupada por famílias assistidas por uma política habitacional de emergência, sinalizando a instituição de um espaço dos necessitados que passam a favelar o entorno do conjunto. São marcas que darão, ao sub-complexo, características bastante próprias. Em 1982, o conjunto Morro Alto praticamente não tinha moradores, contando com apenas 981 domicílios ocupados. No ano seguinte, com a transferência dos assistidos, o crescimento da área explodiu, incentivando a ocupação dos parcelamentos existentes mais à frente. Em 2002, foram encontrados 11.024 domicílios ocupados; o número de famílias se multiplicou por 11,2 vezes e o da população por 10,2 vezes no período. Os moradores originais viviam em situação de extrema penúria. Nada menos que 98,9% do total tinham renda de até 5 salários, sendo que, para 83,3%, a média de renda se localizava em até 3 salários, e 48,9% tinham renda familiar de até 2 salários. Apenas 1,1% tinham renda situada na faixa entre 5 e 10 salários (FJP, 2007). De todos os sub- complexos, a Via Norte, ao ser surpreendida no instante de sua constituição, exibia o quadro da formação mais típica de um espaço periférico. Passados 20 anos, as famílias com renda de até 3 salários representavam 61,8% do total e o conjunto dos domicílios de baixa renda significava 80,9% do total. A melhora aconteceu com a multiplicação de moradores com renda entre 5 e 10 salários, cuja participação no total de domicílios saltou de 0,9% para 14,6% (FJP, 2007). O sub- complexo Via Norte é, desse modo, um paradigma da periferização recente, visível, apenas em outras áreas quando se abandona o plano agregado dos sub-complexos para uma análise mais detida das áreas homogêneas. Pela tabela 16, compreende-se melhor a trajetória dessa unidade. Em 1980, as oportunidades de emprego se aproximavam de zero. Taxas elevadíssimas seriam necessárias para garantir um mínimo de oportunidade para sustentar o desenvolvimento local dependente. As tendências de crescimento da população apontavam para taxas elevadas, gerando expectativas de que atividades de suporte às condições locais de moradia – comércio e serviços locais e de bairro – crescessem, propiciando empregos. Isso de fato aconteceu, mas a região permaneceu carente. A relação empregos / população se manteve muito baixa e exige taxas muito mais elevadas para vislumbrar sua sustentabilidade.

Tabela 16: Propostas e verificação das atividades da Unidade de Terceiro Nível, Boleira / Via Norte– 1980 – 2002 Via Norte 1980 1995 Taxas 2002 Taxas Tendência Proposta Tendência Proposta a - População 4696 13468 15120 7,28% 8,11% 46066 10,94% b - Empregos 75 1704 1765 23,15% 23,44% 5527 21,59% b/a - % 1,60 12,65 11,67 12,00 Fonte: PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002

A atenção para essa unidade merece destaque por ser a mais diretamente afetada pela transferência do novo Centro Administrativo do Estado de Minas Gerais. A decisão pela necessidade de um novo centro administrativo se coloca desde o início da primeira gestão do governo Aécio Neves e foi tomada na gestão atual. A escolha do sítio para sua implantação recaiu no local ocupado pelo Hipódromo Serra Verde, sem uso efetivo no período recente. Com isso, o empreendimento vai ao encontro das Periferias, nos limites entre Belo Horizonte, Vespasiano e Santa Luzia. Com ele, uma nova realidade se vislumbra. O sonhado sub-centro metropolitano de Venda Nova, que polarizaria os centros regionais de Justinópolis, São Benedito e Vila Esportiva, poderia se fortalecer. Eis aqui a oportunidade para se discutir esse efeito sobre a configuração das periferias imediatas, ao mesmo tempo que os decorrentes da transformação da Praça da Liberdade em “Corredor Cultural”. Na condução das obras, o governo se compromete a utilizar, qualificando, a mão de obra local, ou seja, os trabalhadores residentes nos sub- complexos Via Norte, Venda Nova e São Benedito. Segue-se o modelo do desenvolvimento sustentável. Garantidos os empregos por dois anos, certamente a população moradora poderá melhorar os serviços locais. Isso, porém, não permite inferir que a condição de morar periférico estará garantida. Uma vez implantado, o novo Centro Administrativo terá um movimento diário estimado em 30.000 pessoas por dia. Uma das possibilidades seria que algumas dessas pessoas buscassem residir nas proximidades do local de trabalho. Para isso, seria necessária a existência de áreas disponíveis. As diretrizes de impacto ambiental, no entanto, determinaram a criação de uma grande área de preservação no entorno do referido centro e seu projeto de implantação estabeleceu ainda a remoção e reassentamento das áreas faveladas. Resta considerar se, nas áreas ocupadas, há espaço ou condição para acolhida de novos moradores de acordo com o padrão residencial. O obstáculo facilmente visualizável é o da incongruência entre o morar periférico e o da nova procura. Como foi mostrado quanto ao efeito Cidade Nova, os espaços com marca de periferias antigas resistiram à mudança, ou seja, a propriedade do imóvel para o pobre não é um bem de capital, avaliado pela sua liquidez. O tempo de construção da moradia transforma a casa em obra que resiste à conversão em produto. A euforia dos agentes imobiliários, noticiada com freqüência pelos meios de comunicação, tem a ver com móveis especulativos, muito mais do que com a realidade prático-sensível. Isto não é novidade. Porém, há que se esperar pelo menos dois efeitos. O primeiro deles é de que as obras do novo centro aumentem o valor dos terrenos dos lotes vagos, criando uma onda especulativa e diminuindo o ritmo de sua ocupação dentro da lógica de adensamento periférico. O segundo é que sejam lançadas, no mercado, áreas parceladas e construções destinadas a prováveis clientes interessados em residir nas proximidades do Centro Administrativo. Nesse caso, as áreas disponíveis estarão muito além, próximas às sedes dos municípios de Vespasiano, São José da Lapa e Lagoa Santa. Se isto vier a ocorrer, serão favorecidas áreas da macrounidade de Expansão Metropolitana, cuja ocupação foi favorecida pelo empreendimento Via Norte, revitalizada com o nome de Linha Verde, e não as Periferias propriamente ditas. Para se compreender um pouco melhor o que se afirma, deve-se ter em mente que o Novo Centro se dirige a periferias consolidadas. Há que se entender, portanto, qual é o padrão vigente de mobilidade residencial intra-metropolitana, juntamente com a sustentabilidade de cada espaço residencial, mobilidade para acesso a trabalho e reprodução ampliada da força de trabalho. Com esse intuito, examina-se o comportamento dessas variáveis, tendo como referências a Área Central e as Periferias. Quanto à mobilidade intra-metropolitana, onde se considera a residência atual e a residência anterior com base em informações de 2002, observa-se que, na Área Central, a maior mobilidade é a dos moradores do Núcleo Central. Nele, 62,16% dos residentes, mudando ou não, permaneceram na Área Central. A menor é a dos moradores do Mangabeiras, onde 76,02% dos residentes não se mudaram para outra macrounidade diferente da Área Central. A condição dos moradores de Periferias de encontrar espaço de moradia no Núcleo Central segue a mesma tendência. A Área Central é atraente para 3,92% dos seus moradores atuais, ao passo que Mangabeiras absorve apenas 2,58% (FJP, 2002) Mudando o foco de atenção para os sub-complexos das Periferias, o que se nota é que as periferias geram periferias por antiguidade, ou seja, há relação direta entre o tempo em que o espaço periférico foi constituído e a mobilidade residencial na mesma. As Periferias, por sua natureza, são espaços de acolhida, mas elas promovem uma mobilidade interna, na medida em que se consolidam. No caso de Venda Nova, por ser área de ocupação mais antiga, 67,08% das famílias residentes em 2002 já residiam em periferias anteriormente. Na Via Norte, por ser mais recente, apenas 49,97% dos moradores atuais vieram das periferias. Note-se, mais ainda, em todos os casos, são os moradores da Área Pericentral aqueles que mais buscam residências nas periferias (FJP, 2002). A atratividade para o trabalho é uma das medidas que indica a condição de uma determinada área de garantir emprego para sua população trabalhadora. Sobre esse aspecto, essa medida depura o que se buscava com a comparação entre população moradora e empregos disponíveis. No caso do Centro Administrativo, a elevação do emprego na área não faz decorrer o aumento de oportunidades de trabalho para os moradores das periferias imediatas. A tabela 17 mostra que os trabalhadores residentes em Venda Nova encontram mais facilmente ocupação no próprio sub-complexo do que os de São Benedito e da Via Norte. Sob esse aspecto há que se considerar também o tipo de qualificação para o trabalho dessa mão de obra disponível e o tipo de emprego oferecido. No sub-complexo de Venda Nova, 55,10% da mão de obra disponível está empregada em trabalhos manuais, especializados ou não, incluindo o emprego doméstico. Na Via Norte, essa participação alcança 72,21%, com maior participação de mão de obra não especializada e do emprego doméstico. Em São Benedito, são 66,4% do total, onde o emprego doméstico tem o maior peso. Se a esse tipo de ocupação se somam as profissões não manuais de rotina, chega-se a 78% dos trabalhadores em Venda Nova, 91% nos da Via Norte e 87% nos do São Benedito (FJP, 2002).

Tabela 17: Atratividade do trabalho, segundo subcomplexos de campos selecionados

Subcomplexos de Campos Moram02 Trabalham02 Atratividade02 Venda Nova 75.868 43.878 57,83 Boleira/ Via Norte 13.535 5.527 40,84 São Benedito 45.458 17.476 38,44 Fonte: PLAMBEL, Detalhamento das propostas de estrutura urbana da RMBH; FJP: Pesquisa Origem e Destino 2002.

Este percurso pelas periferias selecionadas mostrou que a condição de morar não é algo que obedece mecanicamente às determinações do mercado. O mercado responde pelas opções de acesso, mas não pelas de permanência, uma vez quitada a dívida. A sustentabilidade das periferias, pelo que se examinou, será sempre parcial, por mais que progridam os sucessos do Estado de Bem Estar Social.

Conclusão A imprensa nacional noticiou com destaque, em 6 de agosto deste ano, a divulgação de um relatório elaborado pelo IPEA, onde se mostra a retração da pobreza e o crescimento da classe média. Em Belo Horizonte, o jornal Estado de Minas comentou eufórico a notícia em sua edição do mesmo dia: O número de pobres cai mais na Grande Belo Horizonte do que no resto do país. A alta de renda e o emprego com carteira assinada ajudam a engrossar a classe média, que já representa mais da metade da população brasileira. Segundo estudo divulgado ontem pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a capital mineira reduziu a pobreza em 39,6% entre 2002 e 2008. É o maior índice entre as seis regiões metropolitanas pesquisadas e está mais de 10 pontos percentuais acima da segunda colocada, São Paulo, onde a baixa renda recuou 28,1% no mesmo período. Com isso, a classe média belo-horizontina não fica para trás e já é a segunda maior do país, encostando na de São Paulo.

Euforias à parte, pobreza e periferias devem aguardar um longo percurso para conquistarem um lugar permanente ao sol. Quanto à pobreza, há que distinguir, como se fez neste artigo a diferença entre a pobreza indigente e a pobreza limitada. O primeiro grupo vive trajetórias submetidas a conjunturas. Manter-se indefinidamente no limiar dessa pobreza é contar os dias para morrer. Por isso, ela cresce e regride. Em 1970 era 30%, em 1976, 6,6%; em 1988 retoma sua ascensão, alcançando 19,5% do total na RMBH. Já a pobreza limitada torna-se inerente à manutenção de um sistema de desigualdade. Se a primeira incomoda a consciência, conclamando ações voluntárias de assistência, a segunda é defendida como condição de acesso ao trabalho. Pode-se dizer que o espaço de moradia adequado à pobreza limitada é o das periferias, ao passo que o do pobre indigente é o centro. Onde quer que haja centro, desenvolve-se um espaço para a pobreza indigente. No momento em que essa pobreza passa a incomodar, regra geral, um espaço é designado para ela, determinando o viver periférico. A trajetória dessa pobreza em Belo Horizonte pode ser identificada pelos nomes dos bairros que lhes dizem respeito: Concórdia, Providência, Vila Maria – para fazer analogia com o símile da cidade de São Paulo -, Cidade Ozanan. Esse percurso de designação de espaço para a pobreza orientado por respostas tópicas do Estado em face à ausência de políticas mais consistentes para o problema remete a uma outra constatação que foi pouco examinada neste artigo. Ao designar um espaço de assentamentos adequados à pobreza, o Estado aponta para locais onde o acesso à terra se aproxima de custo zero. A conseqüência disso é o favelamento no seu entorno, o que é visível em todos os casos. Sob esse aspecto, no momento em que pobres são abrigados com “padrões de dignidade”, o espaço do entorno foi determinado para ocupações “irregulares”. Assiste-se assim a um momento típico de segregação espacial. Deverá caber aos pobres segregados por esses expedientes todo o esforço para se integrarem na vida urbana. A integração se dará pela porta do trabalho. Porém, na medida em essa porta se torna estreita, não restarão outras alternativas senão a de conformismo com a segregação e a obrigação de viver determinado pelas urgências. Cumpre lembrar também que o expediente de favelar pode assumir, em certos momentos, características de confrontação com o poder público por reforma urbana, como foi o caso das invasões promovidas por movimentos operários no Eixo Industrial nos início dos anos 60. Nomes de favelas tais como “Operário Estudantil” ou “31 de Março” não foram escolhidos de graça, nem designam segregação, mas protestos pela inclusão. Muito diferente das que levam nomes pejorativos como Atrevidos, Pau Comeu, Cocorocó, Buraco do Peru e Vila dos Marmiteiros. A segregação que o é com todas as letras consiste num espaço estigmatizado, reconhecido pela marca pejorativa e sempre evitado. Quando a segregação se dá pelo critério de pobreza, deve ser compreendida mais como uma punição exemplar; porém, quando acontece por outros motivos, como critérios étnicos ou de cor, é mais uma declaração de conflito aberto e provocação para abertura da luta urbana por direitos de cidadania. No caso específico da RMBH, não há como exemplificar a existência desse tipo de segregação, por mais que as estatísticas mostrem onde predominam pessoas com pele escura. Há sim diversos espaços segregados, como os das penitenciárias em Ribeirão das Neves e em Nova Contagem e, principalmente, o da segregação dos leprosos na Colônia Santa Izabel, em Betim. Esse último se caracteriza como o modelo mais perfeito de segregação por estigma, o que terminou vinculando segregação por morbidade e por pobreza. Um analista desavisado poderia interpretar haver aí segregação devido à pobreza, posto que a área apresenta o menor valor do ICV e também do IDH da RMBH. Aqui pobreza é epifenômeno. No que se refere à criação de espaços periféricos por expedientes de mercado, não há como afirmar com precisão a existência de segregação. Os espaços periféricos podem ser mais bem designados como “enclaves” da pobreza limitada. Tais enclaves não existem em sua pureza absoluta, podendo ser apenas um ponto de partida de acesso às condições de subsistência por conta própria, por mínimas que sejam essas condições. Um enclave perfeito ou de acordo com o tipo ideal seria aquele em que os moradores se situariam na mesma faixa de renda ou estariam qualificados pelas mesmas condições de acesso ao trabalho. Sob esse último aspecto, as vilas operárias seriam enclaves, com a diferença que as mesmas não são determinadas pelo mercado de terras. O enclave mais típico da formação de periferias seria aquele que marca os instantes iniciais de ocupação dos loteamentos populares ou especulativos. De fato, o sonho de consumo de um mercado de terras funcional à divisão do trabalho é o da organização do espaço de moradia por enclaves. Esse desejo é denunciado na forma de organização do espaço de cidades-empresas tais como Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro, ou Ipatinga, em Minas Gerais. Cada um no seu lugar, tudo conforme a ordem da divisão do trabalho. Com isso, a cidade cujo espaço é estruturado pela lógica dos enclaves constrói, com facilidade, centros sem centralidade. Cidade sem vida urbana. No dizer de Frederico Holanda privilegiam a formalidade sobre a urbanidade. Enclaves de baixa renda, para existirem, necessitam estar totalmente integrados a um centro, dada sua total dependência. A hierarquização por enclaves é necessária à estratificação social do espaço determinada pelas desigualdades e é mais funcional ao sistema capitalista. O fato de a cidade resistir a essa forma de estruturação quer dizer que a centralidade urbana, ao ensejar simultaneidades, espaços de co-presença, convergência da multiplicidade de tempos sociais é, principalmente, um espaço onde o urbano pulsa como problemático e apenas a compreensão dos problemas é relevante. Esforços de revitalização, requalificação, renovação e, no extremo, refundação das cidades, denunciam pressa de evitar que a centralidade urbana ultrapasse os limites suportáveis dos padrões espaciais e de vida social. Isso se torna nítido, nos casos, por exemplo da refundação do Rio de Janeiro, com o advento da República, de São Paulo, com a leva de imigrantes estrangeiros – São Paulo foi republicano antes da Proclamação -, e, no exemplo mais recente de transferência do Centro Administrativo de Belo Horizonte, obediente às tendências recorrentes de remoção dos centros administrativos do centro da cidade. No que diz respeito às periferias, há que fixar, pelo percurso realizado, que elas são muitas e se multiplicam segundo as centralidades de que são subalternas.

Referências Bibliográficas

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