Product: OGloboSegundoCaderno PubDate: 30-11-2012 Zone: Nacional Edition: 1 Page: PAGINA_B User: Asimon Time: 11-29-2012 14:33 Color: CMYK

2 l O GLOBO l Segundo Caderno l Sexta-feira30.11.2012

exaustiva, estressante. [email protected] A escassez de participantes brasileiros chamou a atenção UM SOS PARA OS da diretora da competição, a HERMANO pianista Lilian Barretto. Alar- mada com a ausência de um participante sequer que viva VIANNA no Brasil, ela decidiu criar, pa- ra a edição de 2014 (o concurso PIANISTAS DO BRASIL é bienal), uma bolsa de estu- | | dos no exterior para o brasilei- ro residente que ficar entre os Escassez de brasileiros em concurso internacional promovido no Rio três primeiros colocados. TODO ARTO É POUCO — As edições anteriores faz BNDES anunciar bolsas de estudo e garimpo de talentos nacionais apontaram que precisamos in- “Arto Lindsay é tipo o Picasso da guitarra vestir em quem está estudan- rítmica.” Gostaria de assinar essa frase. Mas ANA BRANCO do aqui — conclui Lilian. — A seu autor é Glenn O'Brien, que na época CATHARINA WREDE diferença do nível entre quem [email protected] fica no Brasil e quem estuda escrevia a coluna Beat na revista “Interview”, fora aumenta a cada ano. Nas ainda editada por Andy Warhol. Glenn é um altavam 15 minutos para escolas estrangeiras, eles tro- liquidificador furioso de referências díspares que o pianista Ronaldo cam de piano de cinco em cin- F Rolim, paulistano de 26 co anos. Todos os alunos têm e mestre de afirmações estonteantes, mas invariavelmente verdadeiras. Sobre o DNA, anos, pisasse ontem no palco piano de calda. Aqui, os meni- grupo de Arto fundador da No Wave (estilo do auditório BNDES e se lan- nos estranharam ter que ensai- çasse aos ouvidos dos nove ju- ar com pianos de armário na cuja influência estética é cada vez maior): rados na plateia. Era a fase eli- Escola de Música da UFRJ. De- “banda soul biometálica cubista”. Sobre Arto minatória do III Concurso In- cidi também aumentar o nú- letrista: “ele está em algum lugar entre ternacional BNDES de Piano mero de pré-selecionados, de Tristan Tzara (o poeta dadaísta) e Johnny do Rio de Janeiro. No camarim, 20 para 25, porque muita gente Mercer (autor de “Moon river”).” Sobre o Arto o brasileiro tentava se concen- boa acaba não entrando. trar na partitura da Sonata K. cantor: “ele está em algum lugar entre Yma 332 em Fá Maior, de Mozart, FINAL SERÁ EM 8 DE DEZEMBRO Sumac (a diva peruana que se dizia princesa tocando-a na cabeça, mas a Além disso, Lilian anuncia o inca) e Hoagy Carmachael (mais conhecido mistura das notas da competi- projeto SOS Talentos de Músi- como compositor de “Stardust”).” dora italiana Elisa D’Uria, que ca, em parceria com o BNDES, se apresentava no momento, para garimpar pianistas nos com as que saiam do teclado conservatórios do país. itei tudo isso para acordar o leitor. Sou me- de ensaio do finlandês Tuomas Este ano, o concurso oferece nos criativo. Começaria este texto de forma Kyyhkynen, na sala ao lado, R$ 215 mil em prêmios, distri- C sóbria, repetindo o que escrevi aqui duas se- atrapalhavam. Rolim saiu em buídos entre o primeiro (R$ 80 manas atrás: Arto é nosso melhor embaixador. De- direção ao estacionamento do mil), segundo (R$ 55 mil)e ter- veria ter cargo vitalício no Ministério das Relações lugar e começou a ziguezague- ceiro(R$ 35 mil) lugares, além Exteriores. Seus serviços prestados para a divulga- ar entre os carros, absorvendo de R$ 15 mil para o Melhor In- ção da modernidade brasileira pelo mundo afora o silêncio. Logo após a prova, térprete de Música Brasileira e têm valor incalculável. Agora, pós-Brics, é bem sentenciou, severo: R$15 mil do Prêmio Almeida mais fácil vender nossa cultura no exterior. Brasil, — Não fui bem. Podia ter fei- Sozinho. Ronaldo Rolim é o único brasileiro disputando prêmio de R$ 80 mil Prado — compositor brasileiro de Hélio Oiticica ao tecnobrega (o DJ alemão Dani- to muito melhor. homenageado. Pela primeira el Haaksman — outro bom embaixador — acaba Apesar da autocrítica, ele (Uzbequistão), Dongkyu Kim e está em declínio é a estrutura vez o público poderá votar em de lançar coletânea desse gênero amazônico na descobriu, na noite de ontem, Yejin Noh (ambos da Coreia do do ensino no Brasil. Está total- seu candidato preferido, que Europa, repetindo a estratégia abre-alas que usou que tinha sido um dos oito se- Sul). Rolim é o único represen- mente defasado. Somos obri- receberá R$ 15 mil. para seu CD pioneiro de funk carioca fora de nos- lecionados, dos 16 que se apre- tante brasileiro no concurso e, gados a ir para o exterior não Segundo o presidente do jú- sos bailes), é “cool”. Até outro dia, nossa imagem — sentaram na fase eliminatória, ainda assim, ele não mora no para fazer carreira, mas para ri, o francês Jean-Philippe Col- quando havia alguma — era exótica. Arto me dizia: para as semifinais — que acon- Brasil. Aos 18 anos, o paulista- estudar. A minha geração é de lard, o concurso do BNDES já “Tento mostrar que , Hélio Oiticica tecem amanhã, domingo e ter- no foi para Baltimore, nos um potencial tremendo, mas o está entre os mais importantes e Nelson Rodrigues são nomes centrais, e não peri- ça-feira. Além do paulistano, EUA, aprimorar seus estudos e Brasil nunca teve cultura de do mundo, tendo se tornado féricos, na arte moderna mundial.” foram para a segunda rodada nunca mais voltou. concurso. Acho que isso até as- membro, em 2011, da WFIMC A credibilidade que Arto tinha (e continua a ter) Akihiro Sakiya (Japão), Mikhail — Muitas pessoas têm falado sustou alguns de nossos talen- (World Federation of Internati- na cena de vanguarda de Nova York (onde traba- Berestnev (Rússia), Nino Bak- que o piano brasileiro está em tos, porque eles não se sentem onal Music Competitions). A lhou com “todo mundo”, de Jean-Michel Basquiat radze (Georgia), Sun-A Park declínio, mas eu não concordo preparados para fazer as pro- final acontece no próximo dia a John Zorn), e depois de Berlim (onde colaborou (EUA), Tamila Salimdjanova — argumenta Rolim. — O que vas. E é uma preparação muito 8, no Teatro Municipal. l com os dois Heiner, Muller e Goebbels) ou Tóquio (onde colaborou com Ryuichi Sakamoto ou com trilhas dos desfiles da Comme des Garçons) fazia com que suas lições brasileiras fossem levadas a sério (convencendo até Laurie Anderson a partici- MEDALHÃO REBELDE par de espetáculo sobre Carmen Miranda), abrin- CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 1 do cada vez mais espaços para visões menos este- reotipadas sobre nosso país. Suas intervenções por aqui, de produções de discos de Marisa Monte ao ntre os homenageados desfile carnavalesco organizado em Salvador em de “Abraçaço” está Car- parceria com Matthew Barney e o Cortejo Afro, le- E los Marighella. citando varam suas atividades de mediador para outro pa- livro (“Marighella, o guerri- tamar, contribuindo para cada vez mais saudáveis lheiro que incendiou o mun- questionamentos sobre a localização das frontei- do”, de Mario Magalhães), fil- ras entre o nacional e o global. me (“Marighella”, de Isa Grins- Quando fiquei fã do DNA (como Lester Bangs, eu pum Ferraz) e música (“Mil fa- queria ver essa banda tocando no Madison Square ces de um homem leal”, dos Garden), não sabia que Arto tinha conexão brasi- Racionais MC's) recentes, Cae- leira. Ele mesmo me contou sobre sua infância tano acredita que se chegou a pernambucana quando nos encontramos no Rio, um momento de olhar nova- no início dos anos 1980. Ficamos amigos (Arto me mente para o personagem. apresentou a muitos de seus amigos, como Caeta- — É o tempo natural da res- no), mas permaneci tiete. Seus discos solos, com piração histórica — diz o músi- usos surpreendentes de percussão brasileira ou co. — Minha canção parece eletrônica pós-hip-hop sob melodias de pop per- um protesto, da época das can- feito, continuam a me maravilhar. Permaneço ções de protesto. também aluno do Arto pensador/radar daquilo de A raiva com que se refere aos mais interessante que acontece no planeta (este assassinos da missionária e do ano, por exemplo, ele já trabalhou até com o cine- guerrilheiro aparece também asta Apichatpong Weerasethakul na Tailândia). Te- quando ele se dirige à musa de nho interesse especial em ideia que Arto vem de- “Funk melódico”: Caetano senvolvendo com a produção de paradas/pro- evoca a “mulher indigesta” de cissões/passeatas/desfiles artísticos (já acontece- Noel Rosa para se dirigir a uma ram em Veneza e Los Angeles, entre outras cida- personagem que “produz rai- des). O Brasil tem longa tradição, desde o Triunfo va, confusão, tristeza e dor”, Eucarístico colonial, de colocar arte para andar na provando que “o ciúme é o es- rua. Gostaria de ver um dos desfiles de Arto em trume do amor” (citação ao Vi- nosso solo. nicius de Moraes e seu verso Temos a sorte de ter Arto morando no Rio. Sua “O ciúme é o perfume do lista atual de atividades com base carioca impres- amor”). Falando em amor, siona: disco duplo (um CD retrospectivo com o “Quando o galo cantou” se ins- melhor dos discos solos e outro CD ao vivo, com pira no pagode romântico. registro dos shows com voz e guitarra — o próximo — Gosto daquela brincadei- será realizado hoje no New Museum, em Nova ra rítmica, uma corridinha na York); participação na exposição com curadoria de letra, que faço um pouquinho Hans Ulrich Obrist na casa de Lina Bo Bardi, em na canção. É uma homena- São Paulo; produção do disco novo da banda Tono; gem, até mais no dizer a ex- produção de DVD do Ilê Aiyê; reapresentação do pressão “pagode romântico” desfile “Somewhere I read”, com música tocada em na letra — avalia Caetano. — telefones celulares, na Noruega; reapresentação Mas o principal é que Tom, do projeto “36 years in 1 night”, inspirado em “Si- meu filho, adora, como bom mão do deserto” de Buñuel (cada músico na sua jogador de futebol. torre de cinco metros com seu próprio sistema de O show de “Abraçaço” chega som e um arrastão de 60 adolescentes) em Bolo- aos palcos em março de 2013. nha; planejamento de curadoria de um projeto de Encerrando uma trilogia que instalações e performances no Inhotim. Ufa! Mes- estabeleceu novos parâmetros mo assim, tenho a impressão que não estamos para sua música, Caetano pro- aproveitando devidamente a presença do Arto na cura driblar o papel de mito in- cidade. Ele tem muito mais o que fazer por aqui. l tocável da MPB, que vem sen- do reafirmado nos tributos aos SEGUNDATERÇAQUARTA QUINTASEXTASÁBADO DOMINGO seus 70 anos e em homena- FELIPE Pelo FRANCISCO Pelo HERMANO JOSÉ CAETANO gens como o prêmio Pessoa do HIRSCH mundo BOSCO mundo VIANNA MIGUEL VELOSO Ano do Grammy Latino, que CRISTINA EDUARDO WISNIK RUIZ GRAÇA ele acaba de ganhar. BERLIM NOVA YORK — Não queria homenagem ANA EDUARDO por fazer 70 anos. Acho um PAULA LEVY pouco chato, parece que só o SOUSA LOS ANGELES LONDRES que você tem é uma idade. É uma tolice — diz o baiano. — Sou um medalhão rebelde. l