DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA

REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA

(Editada desde 1851)

v. 138 n. 07/09 julho/setembro 2017

FUNDADOR COLABORADOR BENEMÉRITO

Sabino Elói Pessoa Luiz Edmundo Brígido Bittencourt Tenente da Marinha – Conselheiro do Império Vice-Almirante

R. Marít. Bras. Rio de Janeiro v. 138 n. 07/09 p. 1-320 jul./set. 2017 A Revista Marítima Brasileira, a partir do 2o trimestre de 2009, passou a adotar o Acordo Ortográfico de 1990, com base no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa, editado pela Academia Brasileira de Letras – Decretos nos 6.583, 6.584 e 6.585, de 29 de setembro de 2008.

Revista Marítima Brasileira / Serviço de Documentação Geral da Marinha. –– v. 1, n. 1, 1851 — Rio de Janeiro: Ministério da Marinha, 1851 — v.: il. — Trimestral.

Editada pela Biblioteca da Marinha até 1943. Irregular: 1851-80. –– ISSN 0034-9860.

1. MARINHA — Periódico (Brasil). I. Brasil. Serviço de Documentação Geral da Marinha.

CDD — 359.00981 –– 359.005 COMANDO DA MARINHA Almirante de Esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira

SECRETARIA-GERAL DA MARINHA Almirante de Esquadra Liseo Zampronio

DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA Vice-Almirante (RM1) José Carlos Mathias

REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA Corpo Editorial Capitão de Mar e Guerra (Refo) Milton Sergio Silva Corrêa (Diretor) Capitão de Mar e Guerra (RM1) Carlos Marcello Ramos e Silva Jornalista Deolinda Oliveira Monteiro Jornalista Kelly Cristiane Ibrahim

Assessoria Técnica Capitão de Mar e Guerra (RM1-T) Nelson Luiz Avidos Silva Analista de Sistemas Feliciano Rodrigues Ferreira

Diagramação Designer Gráfica Amanda Christina do Carmo Pacheco Designer Gráfica Rebeca Pinheiro Gonçalves Baroni

Assinatura/Distribuição Suboficial-RM1-CN Maurício Oliveira de Rezende Marinheiro-RM2 Pedro Paulo Moreira Cerqueira Marinheiro-RC André Oliveira Vidal

Departamento de Publicações e Divulgação Capitão de Corveta (T) Ericson Castro de Santana

Impressão / Tiragem CMI – Serviços Editoriais Eireli ME / 8.500 REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA Rua Dom Manuel no 15 — Praça XV de Novembro — Centro — 20010-090 — Rio de Janeiro — RJ  (21) 2104-5493 / -5506 - R. 215, 2524-9460

A REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA (RMB) é uma publicação oficial daMARINHA DO BRASIL desde 1851, sendo editada trimestralmente pela DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA. As opiniões emitidas em artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores, não refletindo o pensamento oficial daMARINHA . As matérias publicadas podem ser reproduzidas, com a citação da fonte. A Revista honra o compromisso assumido no “Programa” pelo seu fundador, Sabino Elói Pessoa: “3o – Receberá artigos que versem sobre Marinha... 5o – ... procurará difundir tudo quanto possa contribuir para o melhoramento e progresso da nossa Marinha de Guerra e Mercante; programar ideias tendentes a dar impulso à administração da Marinha e a suas delegações, segundo o melhor ponto de vista a que seja possível atingir...” Ao longo de sua singradura, a RMB busca aperfeiçoar o “Programa” ao se atribuir a “Missão” de divulgar teses, ideias e conceitos que contribuam também para o aprimoramento da consciência marítima dos brasileiros. Como tal, está presente em universidades, bibliotecas públicas e privadas do País, entre outras instituições. Empenha-se em trazer teoria e técnica aplicadas para solver questões que retardam o desenvolvimento social e material da Nação. Divulga ensinamentos a respeito da ética e do trabalho, esclarecendo o que nos cabe realizar na Marinha e no País, respeitando conceitos e fundamentos filosóficos. Mostra como a conquista da honra ocorre na formação militar, analisando a lógica do mercado vis-à-vis com nossa ambiência naval. Atende plenamente à “índole da revista e, confiando no futuro, protestamos indiferença sobre política e prometemos não nos envolver em seus tão sedutores quanto perigosos enleios”.

Na internet: http://www.revistamaritima.com.br Contato e remessa de matéria: Assinatura e alteração de dados: E-mail: [email protected] E-mail: [email protected] Intranet: dphdm-083@dphdoc Intranet: dphdm-085@dphdoc

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O pagamento da assinatura pode ser feito por desconto mensal em folha de pagamento, por intermédio de Caixa Consignatária, no valor de R$ 5,00, ou enviando nome, endereço, CPF, cópia do comprovante de depósito na conta corrente 13000048-0 agência 3915, do Banco Santander, em nome do Departamento Cultural do Abrigo do Marinheiro, CNPJ – 72.063.654/0011-47. SUMÁRIO

8 EDITORIAL A Consciência Marítima Brasileira. Ética e liderança

9 NOSSA CAPA A LIDERANÇA E A ÉTICA MILITAR Archimedes Francisco Delgado – Capitão de Mar e Guerra (RM1) Significados de ética e moral – liderança. Ética na formação e desenvolvimento militar. Servir de exemplo para ensinar. Dever, pundonor militar e decoro da classe. Rosa das Virtudes

20 PODER NAVAL: presente e futuro (parte 2) Elcio de Sá Freitas – Vice-Almirante (Refo-EN) Estudo de exequibilidade. Projetos de concepção, preliminar e de contrato. Contrato de construção. Construção – testes e provas. Sistemas. Avaliações

32 PRINCÍPIOS DA ASSINATURA INFRAVERMELHA Tiudorico Leite Barboza – Contra-Almirante (Refo-EN) Emissão do infravermelho. Propagação da emissão. Mecanismo da detecção. Obtenção da assinatura

40 ONU APROVA TRATADO DE PROIBIÇÃO DE ARMAS NUCLEARES Leonam Dos Santos Guimarães – Capitão de Mar e Guerra (RM1-EN) Armas nucleares contrárias aos princípios da humanidade. Proibições. Renun cia às armas. Direitos, remediando danos. O caminho à frente

48 DAS FORÇAS ARMADAS E DO PODER JUDICIÁRIO SOB O PRISMA DOS DISCURSOS PRESIDENCIAIS DURANTE O REGIME MILITAR Reis Friede – Desembargador Federal Discursos de João Gourlat, Castello Branco, Costa e Silva, Médici, Geisel e Figueiredo. A Constituição e as Forças Armadas

66 NAS PROFUNDEZAS DOS OCEANOS Tássia Biazon – Bióloga Oceano global e o profundo. Pesquisa – ecossistemas. Exploração – recursos finitos – biodiversidade – impactos. Ciência do mar

83 A CÂMARA DE FALCONETE MAIS ANTIGA LOCALIZADA NO BRASIL – Uma Abordagem Técnico-Interpretativa Luiz Octavio de Castro Cunha – Arqueólogo Mergulhador Breve histórico. Interpretação do achado submarino. Análise técnica. Noções de restauração do bronze arqueológico

93 MULHERES NA MARINHA DO BRASIL E AFIRMAÇÃO DA ISONOMIA Isabella França Barbeito de Vasconcellos Süssekind – Advogada Princípio da isonomia. Da mulher – nas Forças Armadas – na Marinha do Brasil. Ascensão Social 102 ESTRATÉGIA NAVAL BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: A Necessidade da Projeção Oceânica Mauro Gonçalves Camara – Capitão de Fragata Geopolítica e estratégia. Mahan x Corbett. Pressupostos clássicos na atualidade. Pensamento estratégico naval

123 OS DEZ SEGUNDOS DO ALMIRANTE ARLEIGH BURKE Robinson Farinazzo Casal – Capitão de Fragata (T) Legado positivo de um líder. “ Burke 31 nós”. Aguerrimento e agressividade em combate da Marinha dos EUA

129 MEDICINA DE PRECISÃO: uma breve visão geral Rodolfo Castelo Branco Wadovski – Capitão de Fragata (RM1-FN) Biotecnologia e genética – medicina de precisão. Complexidade do sistema. Participação do paciente. Controvérsias. Potencial para o diagnóstico, prevenção e trata- mento de doenças

135 A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS Sergio dos Santos Silva – Capitão de Corveta Evolução histórica: remo – vela – vapor. Navios do pós-guerra. Motor de combustão interna – turbina a gás – nuclear. Propulsão híbrida

143 PLANEJAMENTO MILITAR E AS ESCOLAS DE PENSAMENTO ESTRATÉGICO DE MINTZBERG Igor de Assis Sanderson de Queiroz – Capitão de Corveta (RM2-IM) Ana Carolina Pimentel Duarte Da Fonseca – Doutora em Administração Flávio Sergio Rezende Nunes de Souza – Capitão de Corveta (IM) Marcos José Araújo dos Santos – Capitão de Corveta (IM) Fundamentação teórica: método PPM – conceitos – etapas – teste – escalas – análises

153 SEGURANÇA DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO Joziane Pinheiro – Capitão de Corveta (S) Riscos ocupacionais – gestão de riscos. Plano de ação – proposta de sistema de gestão

169 PROGRAMA OLÍMPICO DA MARINHA – RESULTADOS QUE VÃO ALÉM DO PÓDIO David Peixoto Manhães Junior – Capitão-Tenente (FN) O programa. Esporte nacional. Cunho social nos programas e projetos – inclusão social

176 UM PÍER TESTEMUNHA DA HISTÓRIA: Espaço Cultural da Marinha Anderson de Rieti Santa Clara dos Santos – Primeiro-Tenente (T) O entorno do píer: de zona portuária ao Espaço Cultural da Marinha. Histórico do século e meio 187 A LOGÍSTICA REVERSA E O PENSAMENTO SUSTENTÁVEL NA CADEIA DE FARDAMENTO DA MARINHA DO BRASIL Renan Alves Felix da Silva – Aspirante (IM) Política nacional de resíduos sólidos. Cadeia de fardamento da MB. Problemática do descarte de fardamento. Logística reversa

194 O CICLONE MATTHEW E SEUS IMPACTOS NA INDÚSTRIA MARÍTIMA Rafael Calheiros de Souza Cabral – Aluno da Efomm Ciclones tropicais – definição/formação. Sistemas de informação: auxílio a plataformas e navios. Metodologia – pesquisa

211 NECROLÓGIO

227 CARTA DOS LEITORES

231 O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

235 DOAÇÕES À DPHDM

239 ACONTECEU HÁ CEM ANOS Seleção de matérias publicadas na RMB há um século. O que acontecia em nossa Marinha, no País e em outras partes do mundo

250 REVISTA DE REVISTAS Sinopses de matérias selecionadas em mais de meia centena de publicações rece- bidas do Brasil e do exterior

260 NOTICIÁRIO MARÍTIMO Coletânea de notícias mais significativas da Marinha do Brasil e de outras Marinhas, incluída a Mercante, e assuntos de interesse da comunidade marítima

EDITORIAL

A Revista Marítima Brasileira tem publicado, permanente e siste- maticamente, na página 4 de suas edições, um resumo de sua “Missão”: divulgar teses, ideias e conceitos que contribuam para o aprimoramento da consciência marítima dos brasileiros. Empenhar-se para trazer teoria e técnica aplicadas para solver questões que retardam o desenvolvimento social e material da Nação, além de ensinamentos da ética e do trabalho, respeitando fundamentos filosóficos. O propósito da repetição desta “Missão” é firmar como evidente que honra, hierarquia, disciplina, liderança e ética são primordiais na profissão militar, comparando a lógica e os preceitos do mercado de trabalho com a ambiência naval. E assim tem sido na história da RMB desde 1851, mesmo considerando as crises que o País enfrentou na área política, constitucional e institucional. “A índole da revista, protestando indiferença sobre política”, tem sido con- servada e, talvez, por isso mesmo, mantida a tradição, estamos completando 166 anos de existência. Cabe lembrar que o aprimoramento maior ocorreu nos últimos 30 anos, quando assumiu a Direção o Vice-Almirante Luiz Edmundo Brígido Bittencourt, que incentivou articulistas de ótima qualidade a produzir matérias de relevo para o cenário marítimo e para a Nação. Ele também arregimentou jovens – aspirantes, guardas-marinha e segundo-tenentes, como também praças – para se juntarem aos assinantes e colaboradores. Induziu-os à leitura e à produção de textos. A Revista Marítima passou a ser fonte de consulta inestimável para cursos de aperfeiçoamento e especialização de oficiais e de pessoal subal- terno. Houve substancial melhoria na qualidade e na quantidade de assuntos abordados. Revistas congêneres passaram a se corresponder rotineiramente e a permutar informações. Como desígnio maior sempre foram induzidos os temas da Ética e da Liderança. E assim tem sido, especialmente nas últimas edições, até parece que antevendo ocorrências no cenário nacional, com exemplos pouco edi- ficantes. Por isso mesmo coube à RMB destacar em sua capa a abordagem feita por autor qualificado em artigo que faz parte de um conjunto que inclui livro e matérias aqui publicadas e que tratam desses importantes temas.

8 RMB3oT/2017 NOSSA CAPA

A LIDERANÇA E A ÉTICA MILITAR

“O treinamento militar deveria focar nos valores profissionais militares e na importância da conduta disciplinada e profissional em combate.” Lieutenant General (US) Peter Chiarelli Commander of the Multinational Corps in Iraq, 2006 (Tradução do autor)

ARCHIMEDES FRANCISCO DELGADO* Capitão de Mar e Guerra (RM1)

SUMÁRIO Introdução A liderança e a ética militar

INTRODUÇÃO A origem da palavra ética é o termo grego ethos, cuja grafia é encontrada de duas comum certa confusão entre moral e formas: êthos, significando o local onde se Éética, levando a que sejam muitas vezes guardavam os animais e, por semelhança, utilizadas como sinônimos. A causa disso é de onde surgem os atos humanos; e éthos, que ambas têm origem em palavras gregas que significa comportamento, costumes, cujos significados são semelhantes. hábitos e caráter1. Por outro lado, a palavra

*Comandou o Aviso de Instrução Aspirante Nascimento, o Rebocador de Alto-Mar Tridente e a Base Fluvial de Ladário. Possui MBA em Gestão Internacional na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Curso Superior de Guerra Naval no Instituto de Guerra Marítima da Itália e Curso Superior de Estado-Maior In- terforças na Itália. É autor do livro Liderança – A arte de conduzir ao sucesso, professor de Liderança e de Jogos de Guerra na Escola de Guerra Naval. 1 RENAUD, I. “A noção de dever na ética contemporânea”. In: J.Brito (Coord.). Temas fundamentais de ética (pág. 31-44). Braga: Universidade Católica Portuguesa, 2001. A LIDERANÇA E A ÉTICA MILITAR

moral deriva do latim mos, que se refere quando seus atos e palavras são regidos pe- ao comportamento segundo costumes, los princípios morais vigentes e quando se normas e leis2. A confusão citada é devida preocupa em avaliar o resultado desses atos ao segundo significado de ethos, bastante e palavras sobre a sociedade ou o grupo de similar ao de mos. pessoas por eles influenciado, comumente Entretanto, como ressalta Adolfo chamado de stakeholders4. Sánchez Vasquez3, ambas as expres- Dessa forma, comportar-se de maneira sões – ethos e mos – indicam um tipo de ética é jamais contrariar os princípios e os comportamento humano adquirido pelo valores morais aceitos pela sociedade em hábito, ou seja, não natural. No caso da que se vive e evitar falar e agir de maneira a moral, decorre do padrão cultural vigente ofender ou prejudicar outras pessoas, salvo e é constituída pelas regras consideradas no caso em que tais atos e palavras tragam necessárias para o convívio dos integran- um benefício maior para a coletividade e tes de uma sociedade. estejam de acordo com Portanto, é formada aqueles princípios e pelos valores estabe- Comportar-se de maneira valores morais. lecidos pela sociedade No caso de líderes, e define o comporta- ética é jamais contrariar qualquer que seja o mento socialmente princípios e valores morais nível em que exerça aceito. essa liderança, o com- A ética, por sua aceitos pela sociedade. promisso com os prin- vez, é o ramo da fi- No caso de líderes, o cípios e valores morais, losofia que estuda os compromisso deve ser assim como a avaliação princípios que funda- dos atos e palavras, mentam a moral. Na realizado de maneira ainda deve ser realizado de prática, a ética regula mais criteriosa maneira ainda mais cri- a maneira como as teriosa, tendo em vista pessoas lidam com as a influência que o líder situações cotidianas e o modo como se exerce sobre o grupo que lidera e sobre as relacionam com os demais integrantes de pessoas que dele dependem. seu grupo social. Nesse sentido, o líder ético deve pautar Assim, apesar de conceitualmente dife- seu comportamento em alguns aspectos rentes, moral e ética guardam entre si es- importantes: treito relacionamento, uma vez que a moral 1 – Agir com humildade e ter como é o objeto de estudo da ética e fundamenta propósito criar valor e gerar benefícios para o chamado comportamento ético. as pessoas sobre as quais exerça influência Nesse ponto, é possível concluir, então, (stakeholders), tendo sempre em mente o que uma pessoa tem comportamento ético fato de que o mundo não gira ao seu redor.

2 TUGENDHAT, E. Lições sobre ética. Petrópolis: Vozes, 1999. 3 VASQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. São Paulo: Civilização, 1987. 4 Palavra inglesa para definir grupos ou indivíduos direta ou indiretamente afetados pelas ações realizadas por uma organização na busca por seus objetivos. Podem ser externos, tais como clientes, competidores, forne- cedores, governo, instituições financeiras, meios de comunicação; ou internos, como funcionários, acionistas, diretores e conselheiros.

10 RMB3oT/2017 A LIDERANÇA E A ÉTICA MILITAR

2 – Tratar as pessoas com respeito e No caso dos líderes militares, o grupo consideração, dedicando atenção aos seus sobre o qual exercem influência é cons- problemas e procurando atender suas reais tituído não só por seus chefes, pares e necessidades. Colocar-se na situação do subordinados, mas também pela sociedade outro e tentar entender o problema sob como um todo, uma vez que é para ela, em a sua ótica, tratando-o como gostaria de última análise, que os militares prestam ser tratado. seu serviço. 3 – Jamais abrir mão dos valores morais, Em face dessa grande amplitude de in- situando-os acima de qualquer desejo, opi- fluência, aliada ao fato de que a sociedade nião ou objetivo a ser alcançado. Os fins brasileira sempre considerou as Forças não podem justificar os meios. Armadas como exemplo de honestidade e 4 – Conscientizar-se de que suas ações retidão de procedimentos, é de suma im- afetarão a vida de muitas pessoas e de que portância que todos os militares cultivem seus liderados o veem como um exemplo a liderança ética, sem esmorecer. a ser seguido. A atual situação do 5 – Assumir a res- País, em que os políti- ponsabilidade por Liderança e ética militar cos enfrentam enorme seus atos e por aqueles descrença popular, e até praticados pelos seus precisam andar juntas, de mesmo alguns setores liderados em cumpri- modo que a sociedade e os do Judiciário sofrem mento às suas orienta- jovens militares brasileiros com a desconfiança, não ções, assim como pelas permite que os militares consequências deles recebam o devido apoio esmoreçam no cultivo advindas. O sucesso para resistir à atual e na disseminação aos é da equipe, mas o mais jovens das tradi- fracasso deve ser as- conjuntura nacional ções e dos valores que sumido pelo líder. sempre nortearam as 6 – Estar disposto a Forças Armadas. aprender e melhorar continuamente, como A liderança e a ética militar precisam pessoa e como profissional, consciente de andar juntas, de modo que a sociedade e que sempre haverá muito o que fazer e os jovens militares brasileiros recebam aprender. Liderança é uma jornada de o devido apoio para resistir à atual con- aprendizado sem fim. juntura nacional, em que diversos setores 7 – Comprometer-se consigo mesmo a tentam relativizar os valores tradicionais, construir um mundo melhor e mais justo, manipular as notícias, gerando desinfor- agindo de acordo com os valores morais mação, e fomentar a disputa pelo poder a vigentes na sociedade, sem se importar com qualquer custo. possíveis consequências desagradáveis. O Lembrando o grande Almirante Barroso, mundo será melhor e mais justo se cada comandante da força naval brasileira na cidadão fizer a sua parte. Batalha do Riachuelo, “o Brasil espera que 8 – Cuidar da coisa pública como se fosse cada um cumpra o seu dever”. Nos dias sua, tanto no que se refere a verbas, como a de hoje, esse dever parece ser mais árduo material. O bem público é de propriedade e necessário no campo da ética, embora de todos os cidadãos e, por isso, deve ser não se possa jamais relegar a capacidade tratado com o maior cuidado possível. de combate.

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A LIDERANÇA E A compreensão do problema, o qual, segundo ÉTICA MILITAR ele, vem adquirindo importância vital e in- fluenciando os acontecimentos nos campos Em junho de 2006, o Pentágono anunciou de batalha do século XXI. que todos os militares dos Estados Unidos A primeira questão abordada pelo da América (EUA) em serviço no Iraque artigo foi se os militares precisariam ser iriam passar por um treinamento adicional moralmente bons cidadãos ou bastaria sobre ética militar, com ênfase nos valo- que fossem bons soldados. Nesse sentido, res cruciais do combatente. Tal decisão argumenta que, no momento da batalha, os originou-se de uma constatação, do então soldados querem ser conduzidos por um lí- comandante das Forças Multinacionais que der que tenha condições de vencer a batalha atuavam naquele país, de que os militares e garantir-lhes a vida, não importando se estadunidenses estavam deixando a dese- ele é um cidadão de moral elevada. Essa jar no aspecto da ética questão, que nos pare- militar. ce essencial, remete à Assim, para avaliar O comportamento imoral trindade paradoxal de os programas de ensino dos integrantes das Forças Clausewitz8, segun- de ética existentes no Armadas pode destruir o do a qual a guerra só meio militar, suas ba- pode ser vencida se ses teóricas e os efeitos apoio popular necessário for suportada por um das diferenças culturais ao cumprimento de suas poder militar crível, e nacionais sobre o seu pela vontade política conteúdo, foi realizado missões. e por uma opinião pú- na Universidade de Bons soldados precisam ser blica favorável. E aí Hull, Grã-Bretanha, também bons cidadãos cabe a pergunta: Será o seminário “Ética na que a opinião pública formação e desenvol- nacional apoiaria For- vimento militares”, ao qual compareceram ças Armadas cujos integrantes tivessem cientistas políticos, historiadores, filósofos comportamento considerado moralmente e representantes dos meios militar e acadê- inadequado? Certamente seria muito im- mico de dez países5. provável. Apoiado nas conclusões desse semi- E foi justamente essa a conclusão final a nário, o professor Paul Robinson6 publi- que chegou o seminário. O comportamento cou um artigo7 resumindo as conclusões imoral dos integrantes das Forças Armadas iniciais a que chegaram os participantes pode destruir o apoio popular necessário ao do seminário, de modo a assegurar maior cumprimento de suas missões. Portanto,

5 Alemanha, Austrália, Canadá, EUA, França, Holanda, Israel, Japão, Noruega e Reino Unido. 6 Paul Robinson é professor de Relações Internacionais na Universidade de Ottawa, Canadá, e foi vice-diretor do Instituto de Ética Aplicada da Universidade de Hull, Inglaterra. 7 “Ethics Training and Development in the Military”, disponível em ssi.armywarcollege.edu/pubs/parameters/ articles. 8 Karl von Clausewitz (1780-1831), militar prussiano, é considerado um dos maiores escritores sobre a guerra, sendo o seu livro Da Guerra uma referência mundial. É o autor da frase “A guerra é a continuação da política por outros meios”.

12 RMB3oT/2017 A LIDERANÇA E A ÉTICA MILITAR bons soldados precisam ser também bons Acrescente-se ainda a necessidade de cidadãos. E esse aspecto ganha relevância que os chefes e líderes da instituição se- nos períodos entre guerras, quando a maior jam os responsáveis por demonstrar essa parte das operações militares é de manuten- valorização para os subordinados, a cada ção da paz em países estrangeiros, havendo instante, por meio da premiação, como diz necessidade que o comportamento dos mi- Robinson, mas, principalmente, a nosso litares seja moralmente irrepreensível, para ver, por meio do exemplo. que não provoque sérios danos políticos ao Nesse sentido, vale relembrar uma frase seu país de origem9. bem conhecida de Napoleão Bonaparte, que Entretanto, o ensino formal de ética seria dizia: “Servir de exemplo não é a melhor suficiente para formar bons cidadãos? forma de ensinar; é a única.”. Tal afirmativa Após longa discussão sobre o tema, Ro- demonstra, com simplicidade, o grau de binson conclui que “o ensino da ética, por influência que o exemplo do líder exerce si só, não irá produzir soldados moralmente sobre seus subordinados. perfeitos”. Mais adiante, afirma ser “pouco Essa influência sobre o comportamen- objetivo ensinar às pessoas uma forma to dos liderados é, em última análise, a particular de compor- própria essência da tamento se elas perce- liderança, e por isso bem que a instituição à Servir de exemplo não é a os subordinados sem- qual estão vinculadas pre procurarão seguir premia e valoriza, na melhor forma de ensinar; o exemplo do líder e prática, outros tipos é a única imitá-lo, encarando-o de atitude”. Napoleão Bonaparte como um modelo. E O artigo do pro- como as ações valem fessor ressalta que a muito mais do que as “liderança moral é palavras, é preciso que um suplemento vital para o ensino formal o líder procure sempre demonstrar um com- da ética” (grifo nosso). E enfatiza ser “im- portamento ético e íntegro, pois de nada vale portante que os líderes disseminem uma pregar atitudes moralmente corretas se não cultura que encoraje o debate ético” e que as praticar rotineiramente. devem ser implantados programas capazes Reforçando esse entendimento, o EMA- de “criar uma cultura organizacional que 137 – Doutrina de Liderança da Marinha10 objetive discutir erros do passado, bem – é muito feliz ao relacionar em primeiro como promover tradições que enfatizem as lugar, dentre os atributos da liderança, conquistas militares e os exemplos positivos o exemplo, conferindo-lhe, com isso, a da ética militar e dos valores nacionais”. devida importância. Sobre o exemplo, o Não podemos deixar de concordar EMA-137 preceitua: com Paul Robinson, notadamente quando Não há nada que se exija tanto de um afirma a exigência de que a instituição líder quanto dar o exemplo pessoal, ou premie e valorize o comportamento ético. seja, o exemplo do seu comportamento,

9 Como ocorreu, por exemplo, no caso da soldado do Exército dos EUA Lynndie England, que torturou de forma humilhante um prisioneiro em Abu Ghraib, no Iraque, em 2004. Julgada no ano seguinte por uma Corte Marcial dos EUA, Lynndie foi condenada a três anos de prisão e a uma reserva desonrosa. 10 BRASIL. Estado-Maior da Armada. EMA-137: Doutrina de Liderança da Marinha. Rev.1 Mod.1. Brasília: EMA, 2017.

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pleno de valores inerentes à ética militar, erros do passado, cultivar as tradições e os aceitos e respeitados pelo grupo. [...] A valores nacionais, assim como enfatizar todo o momento, o líder é observado exemplos positivos de comportamentos por seus subordinados e deve buscar militarmente éticos parece ter potencial para conquistar-lhes a confiança, o respeito e produzir resultados bem interessantes. a admiração (EMA-137 – p. A-1). Todavia, ao se cultivar os valores tra- Em seguida, dentre os demais atributos dicionais da ética militar, é preciso que se do líder, o EMA-137 inclui a integridade- esteja atento para o perigo que pode ocorrer ética, composta por lealdade, coragem e desses jovens militares sentirem-se seres caráter, definindo-a como: moralmente superiores aos demais cidadãos, Honestidade, transparência e com- como se fizessem parte de uma casta privile- prometimento inquebrantável com os giada. Na verdade, não se pode esquecer que valores éticos da instituição, tais como: os militares fazem parte da mesma sociedade honra, lealdade para com seus superiores, que os cidadãos civis de seu país, embora pares e subordinados, fidelidade e cora- realmente cultivem valores éticos com mais gem, dentre outros (EMA-137 – p. A-1). rigor e perseverança. No caso brasileiro, os militares têm Portanto, segundo a Doutrina de Lide- sido, tradicionalmente, exemplos de rança da Marinha do Brasil, que corrobora idoneidade moral e de conduta ilibada, as teorias de liderança mais aceitas, o traduzidos na confiança que o povo tem exemplo é fundamental para o exercício da demonstrado pelas Forças Armadas11, a liderança e deve estar calcado em valores qual é fruto dos valores morais que nor- moralmente aceitos, cuja base é essencial- teiam a ética militar brasileira e que estão mente a ética. E isso é válido para qualquer definidos no artigo 28 do Estatuto dos que seja o ramo de atividade do líder e de Militares (EM) – Lei no 6.880, de 9/12/80 seus liderados. –, que estabelece: Apesar disso, não se pode negar que, nos Art. 28. O sentimento do dever, o dias atuais, a influência dos líderes sobre pundonor militar e o decoro da classe seus subordinados tem sofrido forte “con- impõem, a cada um dos integrantes corrência externa”, oriunda da internet e das das Forças Armadas, conduta moral redes sociais. Por isso, é arriscado acreditar e profissional irrepreensíveis, com a que somente o exemplo dos mais antigos e o observância dos seguintes preceitos de culto às tradições sejam capazes de inculcar ética militar (grifo nosso): os valores militares nos jovens alunos das I - amar a verdade e a responsabili- escolas de formação das Forças Armadas. dade como fundamento de dignidade É preciso, mais do que nunca, incluir nos pessoal; currículos dessas escolas aulas formais de II - exercer, com autoridade, efici- ética e liderança. E, para isso, talvez o estu- ência e probidade, as funções que lhe do de casos seja a técnica mais apropriada, couberem em decorrência do cargo; evitando-se, todavia, somente casos que III - respeitar a dignidade da pessoa apresentem aspectos negativos. Discutir humana;

11 De acordo com pesquisas realizadas nesse sentido entre 2010 e 2016, pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, as Forças Armadas são a instituição brasileira mais respeitada pela opinião pública, seguida pela Igreja Católica, pela imprensa escrita e pelo Ministério Público.

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IV - cumprir e fazer cumprir as leis, XVIII - abster-se, na inatividade, do os regulamentos, as instruções e as or- uso das designações hierárquicas: dens das autoridades competentes; a) em atividades político-partidárias; V - ser justo e imparcial no julgamen- b) em atividades comerciais; to dos atos e na apreciação do mérito dos c) em atividades industriais; subordinados; d) para discutir ou provocar discus- VI - zelar pelo preparo próprio, sões pela imprensa a respeito de assun- moral, intelectual e físico e, também, tos políticos ou militares, excetuando-se pelo dos subordinados, tendo em vista o os de natureza exclusivamente técnica, cumprimento da missão comum; se devidamente autorizado; e VII - empregar todas as suas energias e) no exercício de cargo ou função em benefício do serviço; de natureza civil, mesmo que seja da VIII - praticar a camaradagem e de- Administração Pública; e senvolver, permanentemente, o espírito XIX - zelar pelo bom nome das de cooperação; Forças Armadas e de cada um de seus IX - ser discreto em suas atitudes, integrantes, obedecendo e fazendo maneiras e em sua linguagem escrita obedecer aos preceitos da ética militar e falada; (Lei 6.880/80). X - abster-se de tratar, fora do âm- bito apropriado, de matéria sigilosa de Assim, não há o que se discutir quanto qualquer natureza; ao significado da ética militar brasilei- XI - acatar as autoridades civis; ra e aos preceitos que a caracterizam. XII - cumprir seus deveres de ci- Entretanto, muito se tem questionado a dadão; respeito da atualidade desses preceitos, XIII - proceder de maneira ilibada na acusando-os de “fora de moda” ou “de vida pública e na particular; difícil aceitação pelas novas gerações”. XIV - observar as normas da boa Sustentando essa discussão, os que educação; acusam de caducidade os valores que XV - garantir assistência moral e constituem os preceitos da ética militar material ao seu lar e conduzir-se como argumentam que as novas gerações – as chefe de família modelar; chamadas gerações y e z – não aceitariam XVI - conduzir-se, mesmo fora do com facilidade preceitos que lhes sejam serviço ou quando já na inatividade, de impostos como verdades, sem a devida modo que não sejam prejudicados os justificativa lógica e aceitável. princípios da disciplina, do respeito e A geração y, constituída pelos nascidos do decoro militar; após 198512, desenvolveu-se, segundo al- XVII - abster-se de fazer uso do posto guns sociólogos, numa época de grandes ou da graduação para obter facilidades avanços tecnológicos e prosperidade eco- pessoais de qualquer natureza ou para nômica. Seus pais, não querendo repetir o encaminhar negócios particulares ou abandono sentido em sua própria infância de terceiros; e adolescência, encheram-nos de presentes,

12 A maioria dos estudiosos dos EUA considera a geração y os jovens nascidos a partir do início dos anos 80. Entretanto, alguns estudiosos brasileiros julgam que os aspectos que os moldaram sofreram um atraso de cerca de cinco anos para fazer efeito no nosso país.

RMB3oT/2017 15 A LIDERANÇA E A ÉTICA MILITAR

atenções e atividades, fomentando a sua au- dades. Procuram manter-se “conectados” toestima. Com isso, esses jovens cresceram e buscam ser aceitos em grupos de jovens julgando-se seres especiais e superdotados, com interesses semelhantes. Em princípio, no que foram estimulados pelos filmes e não são fiéis a organizações, e a afeição jogos eletrônicos de ação; pela convivência, a marcas constitui a forma preferida de desde tenra idade, com sistemas de alta expressar um comportamento coletivo, tecnologia e pela capacidade de realizar não dando importância aos tradicionais tarefas múltiplas13. símbolos de status pessoal. Esses jovens Em face desse sentimento, ao entrarem são impulsivos, impacientes e, no merca- no mercado de trabalho, normalmente não se do de trabalho, não pensam duas vezes sujeitam à realização de tarefas subalternas, antes de mudarem de emprego, caso não típicas de início de carreira, e julgam-se se sintam valorizados ou confortáveis no merecedores de cargos e salários elevados ambiente corporativo. desde cedo, por terem sido acostumados Conforme observa Renato Trindade, pelos pais a obter tudo o que desejam. Uma presidente da Bridge Researchs, empresa de suas características atuais é a utilização paulista especializada no público jovem, de aparelhos de telefonia celular para muitas “essa geração precisa que as coisas sejam outras finalidades além de apenas fazer e muito bem explicadas. O que para a geração receber ligações, como é característico das anterior poderia ser algo óbvio – a questão gerações anteriores. da hierarquia dentro de uma corporação ou Esse grupo, exigente e ávido por ino- regras de comportamento – para eles nem vações, tem se tornado o público-alvo das sempre o é”. Prossegue Trindade dizendo ofertas de novos serviços e da difusão de que “eles precisam que os limites sejam novas tecnologias. Preocupado com o explicitados. Mas escutam a empresa e meio ambiente e as causas sociais, tem aceitam esses limites, desde que compre- um ponto de vista diferente das gerações endam sua razão de ser”. anteriores, que viveram épocas de guerras Quanto à geração z, dos nascidos a partir e desemprego. Com o mundo praticamen- de 200515 e que em breve estará se juntando te estável e mais favorável à liberdade ao efetivo das nossas Forças Armadas, é es- de expressão, esses jovens passaram a perado que seu comportamento no mercado preocupar-se com valores antes menos de trabalho seja semelhante ao da geração y, prioritários, como vida pessoal, bem-estar com recrudescimento em alguns aspectos. e enriquecimento pessoal, deixando de Isso porque os jovens da geração z estão lado os valores coletivistas, típicos de sendo mais influenciados ainda pelo avanço períodos de carência de recursos. tecnológico. Assim, consideram tediosa a Segundo Clayton Melo14, a geração vida sem conectividade, são imediatistas, y é constituída por jovens “liberais no autodidatas, críticos, exigentes, dinâmicos, consumo, mas um tanto conservadores no maduros e assertivos. Além disso, se acostu- aspecto social”, onde não apreciam novi- maram a viver virtualmente o que a realidade

13 Ryan, Rebecca. Millenial Leaders. Ed. Morgan-James, 2008. 14 Disponível em http://idgnow.uol.com.br/carreira/2010/01/22/o-que-deseja-como-pensa-e-age-a-geracao-y/ (acessado em 23 de novembro de 2010). 15 Para a maioria dos estudiosos dos EUA, a geração z é formada pelos jovens nascidos a partir de 2001. Entretanto, alguns estudiosos brasileiros julgam que os aspectos que os moldaram sofreram um atraso de cerca de cinco anos para fazer efeito no nosso país.

16 RMB3oT/2017 A LIDERANÇA E A ÉTICA MILITAR

não permite e, devido à rapidez das evoluções de esportes, culto ao amor livre e outras tecnológicas, estão condicionados a deixar de quebras de costumes fizeram dessa geração valorizar as coisas rapidamente, pela obsoles- a responsável pelo surgimento de novos cência. A facilidade de acesso à informação costumes e novos valores. os tornou generalistas, e as redes sociais lhes Assim, pode-se concluir que a tarefa impuseram certa dificuldade de interação so- dos líderes nos anos 60, quando os baby cial e baixa capacidade de expressão escrita, boomers chegaram ao mercado de trabalho além de impaciência para ouvir. e às Forças Armadas, foi mais árdua do que Essa pequena digressão em torno das a dos líderes atuais. Diferentemente daquela características dos jovens de hoje faz-se época, os jovens de hoje não julgam que os necessária para analisar a argumentação valores cultivados pelas gerações anteriores daqueles que defendem a caducidade dos estejam ultrapassados e devam ser substituí- preceitos da ética militar, os quais têm o dos, não buscam uma quebra de costumes ou foco no interesse coletivo, contrariamente uma mudança na ordem social e não pregam ao foco individualista das gerações y e z. nenhuma revolução, seja ela política, social, Para isso, vale lembrar que os especialis- econômica, cultural ou religiosa. tas reconhecem que, apesar de ansiosos, Dessa forma, o que se faz necessário ambiciosos e individualistas, esses jovens modificar é a forma como os valores são aceitam os limites que lhes são impostos, transmitidos às novas gerações y e z, e não desde que os compreendam, e são conser- os valores. A prática do “faça o que digo, vadores em seus hábitos sociais. mas não o que faço”, comum na segunda Portanto, não se trata de aversão aos metade do século passado, não funciona valores aceitos e respeitados pelas gera- mais, pois as novas gerações não aceitam ções anteriores e listados no artigo 28 do que algo deva ser feito de determinada ma- Estatuto dos Militares, o que indica uma neira apenas porque os mais velhos assim o postura completamente diferente daquela desejam ou ensinam. Os jovens aceitam os adotada pela geração nascida logo após valores, mas é preciso que lhes seja expli- a Segunda Guerra Mundial, chamada de cada a razão pela qual são importantes que geração baby boomer16, a qual tem sido sejam cultuados. E, mais ainda, é preciso descrita como portadora de uma “onda que os mais velhos pratiquem o comporta- de choque”. Os chamados baby boomers, mento que exigem dos jovens. Mais uma estes sim, estão associados a um movi- vez, devemos ressaltar o valor do exemplo. mento de rejeição ou de redefinição dos Mesmo assim, atravessamos hoje um valores tradicionais que, segundo eles, período que alguns estudiosos insistem teriam levado o mundo a duas guerras em caracterizar por uma “crise de valores mundiais e, consequentemente, a um pe- morais”, com o que não concordamos. Em ríodo de escassez de recursos e de falta de nossa opinião, a crise que atravessamos é conforto. Cabelos grandes, calças justas, de exemplos; ou, melhor especificando, minissaias, abolição do uso do soutien, de liderança, o que não ocorreu nos anos uso de tênis como calçados sociais, e não 60. Naquela época, apesar da rebeldia dos apenas como equipamento para a prática jovens, o exemplo dos mais velhos era muito

16 A Geração Baby Boomer é conhecida assim devido à explosão demográfica após a Segunda Guerra Mundial. São pessoas nascidas entre 1950 e 1960 que passaram por forte transformação cultural, capitaneada pela ascensão da TV.

RMB3oT/2017 17 A LIDERANÇA E A ÉTICA MILITAR

claro e virtuoso. Não se podia contestar a cabe ao líder diferenciar seus liderados com honestidade, o altruísmo, o preparo profis- base na simpatia ou na subserviência; cabe, sional ou o caráter, apenas para citar algumas ao contrário, premiar e valorizar os mais características, dos líderes de então. E, com competentes profissionalmente, os dotados isso, ainda que rebeldes, os jovens tinham de coragem moral e os que ajam com ética. bons exemplos nos quais se espelhar. Con- E, acima de tudo, cabe aos líderes servir de testavam alguns valores, mas percebiam que exemplo aos seus liderados e praticar os os mais velhos realmente acreditavam neles valores éticos militares. e os praticavam (ao menos, transmitiam essa Entretanto, voltando ao Estatuto dos percepção aos mais jovens). Militares, é possível afirmar que todos os Quanto aos líderes de hoje, são na verda- líderes, ou seria melhor chamá-los sim- de aqueles jovens que se rebelaram contra os plesmente de chefes, cumprem os preceitos valores cultivados nos éticos listados no ar- anos 60 e seus filhos. tigo 28, notadamen- Os pais dos jovens te nos incisos III, V, das gerações y e z são VI, VII e XIV? Será os filhos dos baby que todos os chefes boomers que, talvez da atualidade tratam por terem sido criados seus subordinados sob disciplina rigoro- com respeito e edu- sa e perceberem que cação, conforme seus pais não eram tão preceituam os inci- autênticos e virtuosos sos III e XIV? Será quanto pareciam, não que todos os chefes souberam transmitir da atualidade são aqueles valores e im- justos e imparciais por limites aos seus no julgamento dos filhos, atendendo a atos e na aprecia- todas as suas vontades ção do mérito dos A Rosa das Virtudes e criando-os em um seus subordinados, mundo irreal, em que podiam fazer de tudo. como preceitua o inciso V, negando a Dessa forma, quando esses jovens che- prática do apadrinhamento ou, como se diz gam ao mercado de trabalho ou às Forças na Marinha, da “cocha não adquirida pela Armadas, não admitem que suas vontades competência”? Será que todos os chefes não sejam atendidas, que não possam fazer da atualidade zelam pelo preparo próprio, tudo o que queiram e que lhes seja exigido moral, intelectual e físico e também pelo obedecer a regras que lhes impõem limites dos subordinados, como preceitua o inciso que nunca conheceram. VI, não buscando esconder seu despreparo O problema não decorre da falta de valo- com o uso abusivo do estilo autoritário de res ou de ética dos jovens. Decorre, isto sim, liderança? E o mais importante: Será que da falta de limites, o qual tem sua origem na os chefes atuais estão empregando todas falta de bons exemplos. Não cabe ao líder as suas energias em benefício do serviço, atender às vontades de nenhum subordinado; conforme estabelece o inciso VII, relegando cabe, sim, atender às necessidades verdadei- seus interesses pessoais, inclusive os de ras e justas da maioria de seus liderados. Não carreira, para segundo plano?

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Relembrando as características das novas retorno desejado e fomentada a confiança gerações, os jovens de hoje não aceitam dos subordinados nos seus chefes, condição como verdadeiras e justas decisões ou ordens sine qua non para o exercício da liderança. baseadas somente na vontade dos chefes. Concluindo, o ensino teórico da ética é Também não aceitam limites somente útil e deve ser realizado em todos os níveis porque o chefe lhes deseja impor. É preciso da formação do militar. A fonte para isso é que as decisões, as ordens e os limites sejam o EM, notadamente o artigo 28, e, no caso explicitados e explicados, para que os jovens particular da Marinha, a Rosa das Virtu- os compreendam e os aceitem. O convenci- des. Porém de nada valerá esse esforço mento, nos dias de hoje, deve ser a principal se não houver uma conscientização dos forma de obter a execução de tarefas pelos mais antigos, em todos os postos e gradu- subordinados. O autoritarismo vem perden- ações da carreira, sobre o impacto que seu do efetividade e, salvo nos casos em que haja exemplo causa nos subordinados. E para risco à integridade física dos subordinados, que esse impacto seja positivo e gere uma a probabilidade de que o estilo de liderança reação em cadeia capaz de manter vivos autoritário seja eficaz é os valores da ética mi- muito pequena. litar, é preciso que os E, para que o con- A crise atual não é de ética, mais antigos cultuem vencimento ocorra, é mas sim de liderança e pratiquem, verdadei- fundamental o exem- ra e honestamente, os plo. Se os chefes não- valores da Rosa das cultuarem e praticarem os preceitos éticos Virtudes e os preceitos estabelecidos no estabelecidos no Estatuto dos Militares, artigo 28 do EM, principalmente aqueles de nada valerá ministrar aulas sobre ética contidos nos incisos III, V, VI, VII e XIV. para os subordinados, sejam eles oficiais, Assim, a conclusão final a que se pode aspirantes, alunos do Colégio Naval, praças chegar é que a crise atual não é de ética, ou aprendizes-marinheiros. mas sim de liderança. E para reverter essa No caso da Marinha do Brasil, temos situação, o caminho é, mais do que ensinar, outra excelente ferramenta que explicita os praticar os valores morais da ética militar valores morais que devem nortear o com- e incrementar a realização de eventos que portamento dos nossos oficiais e praças, demonstrem a importância da liderança, que é a Rosa das Virtudes, distribuída aos como palestras, simpósios, estudos de alunos das escolas de formação quando do caso, exibição comentada de filmes etc., seu ingresso. Mas, não basta distribuir a com a participação de todos os servidores Rosa das Virtudes e exigir que os jovens lotados nas Organizações Militares, desde cultivem os valores ali expressos. É preciso o marinheiro mais moderno até o coman- dar o exemplo de honra, lealdade, fidelida- dante, pois só com a participação deste os de, disciplina e de todos os demais valores subordinados perceberão a importância ali expressos, os quais devem ser praticados do tema. O exemplo é tudo, inclusive na de cima para baixo, do mais antigo para demonstração de que a ética e a liderança o mais moderno, para que seja obtido o são fundamentais para a carreira militar.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Comportamento; Ética; Exemplo; Honra; Liderança; Moral;

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ELCIO DE SÁ FREITAS* Vice-Almirante (Refo-EN)

SUMÁRIO

Estudos de Exequibilidade Projeto de Concepção. Trade-Offs Projeto Preliminar Projeto de Contrato Formulação do Contrato de Construção Licitação para a construção Edital de Licitação Avaliação financeira de estaleiros candidatos à construção Avaliação técnica de estaleiros candidatos à construção Construção, testes e provas Construção Testes e provas Integração de Sistemas Comissionamento e shakedown Avaliação de Engenharia e Avaliação Operacional Avaliação em Serviço e feedback

ESTUDOS DE EXEQUIBILIDADE Os estudos de exequibilidade destinam-se a verificar se é possível, e como é possível, ma nova classe de navios resulta de satisfazer os Requisitos de Estado-Maior. Unecessidades indispensáveis para a Valem-se de cálculos paramétricos de pro- Marinha cumprir sua missão, determinadas jeto, comparações com dados de projetos an- pelo seu mais alto escalão de planejamento, teriores, modelos de síntese e outros recursos o Estado-Maior da Armada (EMA), que disponíveis. Se necessário, podem verificar então estabelece, de modo abrangente, os se é possível cumprir a missão prescrita com requisitos para a nova classe. uma combinação de outros meios navais.

* Serviu na Diretoria de Engenharia Naval de dezembro de 1981 a agosto de 1990, tendo sido seu diretor de abril de 1985 a agosto de 1990. Colaborador frequente da RMB. Autor do livro A Busca de Grandeza. PODER NAVAL: PRESENTE E FUTURO (PARTE 2)

PROJETO DE CONCEPÇÃO. volvimento ou a serem nacionalizados3 no TRADE-OFFS primeiro navio da classe ou nos seguintes, isso deverá ser questão importante desde a Durante a etapa de concepção de um fase de concepção, pois terá forte impacto navio de combate devem ser geradas vá- no projeto do navio e nos custos, tempos e rias versões, comparando-se seus méritos riscos do programa. quanto a capacidade operativa, custo de Todas as características principais de um obtenção1, custo de operação, necessidades navio de combate consolidam-se no projeto e custos de apoio e manutenção, necessida- de concepção. Alterar uma ou mais dessas des e custos de infraestrutura, vantagens e características em fases subsequentes será riscos de tecnologias disponíveis, tempo de dispendioso ou inviável. obtenção, e finalmente, o custo de ciclo de Ao iniciar-se a concepção, dispõe-se de vida2. A comparação de méritos entre essas estimativas de custo obtidas por comparação várias versões — cada com os custos de proje- uma com vantagens e tos anteriores, próprios desvantagens em re- As características principais ou alheios, se disponí- lação às demais — é veis. Ao final da fase o que na literatura téc- de um navio consolidam-se de concepção, tem-se nica se designa por es- no projeto de concepção. a primeira estimativa tudos de trade-off. Em Alterar uma ou mais de custo resultante do certos casos, os estudos projeto para o primeiro de trade-off podem ser dessas características em navio da classe. Ela terá convenientes para es- fases subsequentes será que ser revista várias colha entre diferentes vezes durante o projeto tipos de meios bélicos dispendioso ou inviável preliminar e o de con- a utilizar num dado trato, ficando menos conjunto de missões. imprecisa à medida que a configuração final Na fase de concepção, é indispensável do navio se aproximar da que finalmente terá. intensa interação do setor técnico com o ope- rativo, o financeiro e com as bases industriais PROJETO PRELIMINAR de defesa nacional e internacional. Esta fase deve ser longa, pois tem importância decisi- Escolhida uma versão de concepção, va. Ao seu final, a probabilidade de sucesso inicia-se o projeto preliminar, que detalha da nova classe está determinada. Até então, todos os aspectos da concepção e incor- o dispêndio terá sido inferior a 2% do custo pora alterações resultantes de interações total de obtenção do primeiro navio da classe. técnico-operativas-financeiras, mas que Caso se pretenda instalar sistemas ou não afetem as características principais da equipamentos nacionais ainda em desen- versão de concepção.

1 O custo de obtenção engloba todos os custos incorridos até obtenção do primeiro navio da classe, mas não deve incluir custos de desenvolvimento de sistemas ou equipamentos que serão usados também em outros navios. Custos de desenvolvimento devem ser contabilizados em seus respectivos programas. 2 O custo do ciclo de vida (life cycle cost) é a soma de todos os custos associados ao navio, desde o início da sua concepção até o término do descarte, ao final da vida útil. 3 Nacionalizar, neste artigo, significa radicar ou desenvolver no País capacidades de projeto, produção, apoio, manutenção e operação.

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É importante que o setor operativo par- e condicionamento de ar, compatibilidade ticipe intensamente de todo o projeto pre- eletromagnética, margens de projeto etc. liminar, sugerindo alterações ou adições Por seu custo e importância, diversi- em requisitos operativos, mas atento às dade e velocidade de evolução, o sistema implicações em riscos, tempos e principal- de combate é o que demanda mais intensa mente em custos. Essas alterações sempre interação do setor operativo com o setor ocorrem. Quanto mais tarde ocorrerem, técnico durante as fases de concepção e menos viáveis e mais dispendiosas serão. preliminar, particularmente quanto às aná- Poderão dificultar ou inviabilizar a com- lises de custos de obtenção e manutenção. patibilização orçamentária do programa. O projeto preliminar também deverá Também é importante a participação produzir a primeira versão do Plano de de especialistas do setor de manutenção Apoio Logístico Integrado5 para a classe da Marinha (Arsenal da Marinha do Rio do navio e nova estimativa dos custos de de Janeiro — AMRJ, obtenção e do ciclo de Base Naval do Rio vida útil. de Janeiro — BNRJ, Por seu custo e outras bases navais importância, diversidade PROJETO DE e centros de manu- CONTRATO tenção de sistemas de e velocidade de evolução, combate). Ela deverá o sistema de combate é o Segue-se o proje- intensificar-se ainda to de contrato, ainda mais na fase de projeto que demanda mais intensa mais detalhado que o de contrato, quando se interação do setor operativo preliminar. O proje- inicia a formulação do com o setor técnico durante to de contrato deverá sistema de apoio lo- produzir todos os do- gístico integrado para as fases de concepção cumentos — técnicos, a classe de navios que e preliminar gerenciais e financei- se está projetando. ros — suficientes para As alterações de encomendarem-se os maior impacto técnico-operativo-financeiro sistemas e equipamentos principais com são as do sistema de combate, que pode longo prazo de entrega, produzir-se satisfa- ultrapassar 50% do custo de obtenção do toriamente o navio6 e prover-se o seu apoio navio e que responde por percentagem logístico integrado. ainda maior na modernização de meia-vida. Na fase de projeto de contrato é que Além disso, o sistema de combate influi começa a acelerar-se a curva de dispêndios intensamente no projeto e na construção da versus tempo. Ao seu final, terão sido plataforma4, em termos de arranjo arquite- dispendidos ou comprometidos cerca de tural, pesos e volumes, capacidade e espe- 10% do custo de obtenção do primeiro cificações de demanda de energia elétrica navio da classe.

4 Considere-se como plataforma todo o navio, menos o sistema de combate que para efeitos deste artigo, abrange o sistema de armas e o C4ISR. 5 O Apoio Logístico Integrado engloba todas as questões de apoio e manutenção, além de treinamento de pessoal, infraestrutura etc. É um componente importante do custo do ciclo de vida útil do navio. Para uma breve introdução ao assunto, consulte-se a referência [1], páginas 96 a 101. 6 Aí se incluem, entre outros, requisitos e especificações para testes e provas em fábricas, em oficinas, no cais e no mar.

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Terminado o projeto de contrato, deverão partes: o contrato de construção propria- estar bem definidas a configuração do navio; mente dito (cláusulas contratuais) e todas as especificações dos seus sistemas e equi- as especificações e documentos técnicos pamentos; as correspondentes necessidades relevantes produzidos na fase de projeto de infraestrutura de apoio, manutenção e de contrato. treinamento da tripulação e a estimativa dos Antes mesmo de preparar o Edital custos de obtenção e de ciclo de vida útil. de Licitação, deverão ser formuladas as Também deverão estar bem determinados o principais cláusulas do futuro contrato tempo até a incorporação do primeiro navio de construção. Elas deverão ser parte do da classe e os riscos gerenciais, técnicos e Edital de Licitação. Os licitantes deverão financeiros do programa de obtenção. Por- conhecê-las antes de investir tempo e tanto, poderá ser mais segura a decisão da dinheiro na licitação. Assim também se Marinha por uma das seguintes alternativas, abreviará a discussão do contrato com o diante da necessidade de compatibilizar licitante vencedor, pois ela se limitará a seu programa global cláusulas secundárias. de obtenção de meios Ainda que as fases com as disponibilida- Contratos de preço fixo anteriores tenham sido des orçamentárias rea- bem conduzidas, de- listicamente esperadas são apropriados somente ficiências no contrato para os próximos cinco quando os riscos são de construção poderão a dez anos: mínimos. Tentativas de comprometer seve- 1 – prosseguir o ramente o programa, programa para a ob- atribuir todos os riscos ao tanto em qualidade da tenção do número ini- contratado serão inúteis. Se construção como em cialmente previsto de custos, tempo de ob- navios da classe; o contratado falir, o risco tenção e desempenho 2 – prosseguir o recairá inaceitavelmente operativo do navio. programa, mas reduzir sobre o contratante Para minimizar essa o número inicialmente possibilidade, deverão previsto de navios da ser observadas algumas classe. regras básicas na formulação do contrato. Postergar ou cancelar o prosseguimento Elas resultam de análises de contratos, tais do programa será provavelmente inviável, como as realizadas, por exemplo, pela pois os contratos para fornecimento de Rand Corporation, em mais de um país, sistemas e equipamentos com longo prazo comentadas nas referências [2], [3] e [4]. de entrega já terão sido assinados. Pela sua importância, são aqui transcritas: I – A estrutura dos contratos com os FORMULAÇÃO DO CONTRATO contratados principais7 (para a plataforma DE CONSTRUÇÃO e o sistema de combate) deverá ter cláu- sulas adequadas para administrarem-se O contrato para construção de um navio os riscos técnicos do programa. Os riscos de guerra consta essencialmente de duas e seu tratamento deverão ter sido alvo de

7 Considere-se como contratado principal aquele que, contratado diretamente pela Marinha, deverá fornecer um equipamento ou sistema de grande importância, para o qual precisará, a seu turno, valer-se de subcontratados.

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estudos anteriores ao contrato, incluindo As técnicas são as mais frequentes. Entre seu exame com os futuros contratados elas, destacam-se as de Garantia de Qua- principais. Daí deverão resultar cláusulas lidade (GQ). Para essas, deverá haver um que permitam a necessária flexibilidade ao sistema preestabelecido e organizações contrato. Nelas se estabelecerão responsa- competentes, tanto da parte do contratante bilidades, procedimentos e distribuição de como dos contratados e subcontratados. riscos entre o contratante e o contratado, Tal sistema existe nas Marinhas de países tanto em termos gerenciais como em mar- desenvolvidos. Nossa Marinha gradati- gens de tempo e custo. Contratos de preço vamente montou e utilizou um Sistema de fixo são apropriados somente quando os GQ nos programas navais das décadas de riscos são mínimos. Tentativas de atribuir 1980 e 1990. todos os riscos ao contratado serão inú- V – Também no contrato deverá ser teis. Se o contratado falir, o risco recairá estabelecido um processo para tratar de inaceitavelmente sobre o contratante. No alterações. Estas sempre são propostas caso de um navio de combate, o risco será durante um programa, tanto por iniciativa muito grave. do contratante como II – Os contratos do contratado. Podem com os contratados Obrigações de incidir sobre os requi- principais deverão re- sitos de desempenho querer que cláusulas documentação são difíceis da plataforma ou de equivalentes às do pa- de especificar, e há seus sistemas e equi- rágrafo acima estejam contratados que relutam em pamentos e sobre o nos contratos com os cronograma do projeto subcontratados. cumpri-las. São vitais para ou sobre as responsa- III – Não basta es- o sucesso de um programa e bilidades das organi- pecificar os requisi- zações envolvidas no tos de desempenho. para projetos futuros projeto, na construção Deverão ser também e nos testes e provas especificados os testes e provas para da plataforma. É importante que a direção sua medição. Para isso, é importante a e a gerência do programa entendam o im- participação da área tecnológica da Base pacto de alterações propostas – em prazos, Industrial de Defesa. Porém não se deve custos e desempenhos – e que tenham um especificar como atingir os requisitos de procedimento para aprovar ou rejeitar as desempenho. Tal responsabilidade é dos propostas. Para isso precisarão da base contratados8. tecnológica de apoio. IV – No contrato, deverá ser estabele- Comentário: Nos programas navais cido um processo de decisão detalhado e das décadas de 1980 e 1990, a Marinha ágil, capaz de examinar e solucionar em instituiu e utilizou um satisfatório proces- tempo hábil questões que surgem durante so para tratar de alterações. um programa. O processo deverá incluir as VI – O contrato deverá conter proce- organizações apropriadas. dimentos detalhados e cronogramas para Comentário: As questões que surgem sua execução física, financeira e docu- sempre são técnicas, financeiras e legais. mental.

8 Os dois últimos períodos deste preceito não se aplicam a sistemas projetados e construídos pela própria Marinha.

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Comentário: Pagamentos antecipados LICITAÇÃO PARA A são risco inaceitável, exceto em casos CONSTRUÇÃO excepcionais. Pagamentos insuficientes geram riscos. A cada evento contratual Edital de Licitação de pagamento deverão corresponder as respectivas obrigações que o contrata- Além de obedecer aos ditames legais, do deverá cumprir: obrigações físicas é indispensável que o Edital de Licitação (estruturas, sistemas, equipamentos etc. especifique claramente todas as questões construídos, montados ou instalados), relevantes do processo de licitação, obrigações de GQ (estruturas, siste- particularmente as relativas às avalia- mas, equipamentos etc. aprovados em ções financeiras e técnicas, abordadas inspeções, testes ou provas), obrigações nos dois itens seguintes, e o critério de documentais (desenhos, especificações, classificação final dos competidores, documentação de GQ, documentação bem como o de possível exclusão de de apoio logístico, documentação de licitantes. software etc. apro- Várias são as ques- vadas). tões relevantes a es- Obrigações de do- No contrato deverá haver pecificar no Edital. cumentação são di- margem adequada para Nelas se incluem as fíceis de especificar, contingências decorrentes já abordadas no título e há contratados que designado por For- relutam em cumpri-las. dos riscos técnicos. A mulação do Contrato São vitais para o suces- margem deverá ser de Construção deste so de um programa e trabalho, além do tra- para projetos futuros. proporcional aos riscos tamento de licitantes VII – A construção que sejam associações não deverá iniciar-se antes de o projeto de estaleiros nacionais com estrangeiros. de construção estar consolidado. Para Tais associações poderão ser úteis e até isso, requisitos de pagamento de eventos recomendáveis, conforme se discute nas contratuais deverão incluir a aprovação páginas 220 a 235 da referência [1], mas pela Marinha de documentos de projeto só admitidas quando o contrato de asso- que precedam suficientemente respecti- ciação for parte integrante da proposta vas fabricações e montagens. Evitar-se- competidora e tornar-se parte integrante -ão assim atrasos e custos decorrentes de do contrato de construção pretendido. trabalhos para desfazer ou alterar partes já construídas ou montadas, mas não Avaliação financeira de estaleiros conformes a documentos previamente candidatos à construção aprovados do projeto de construção. VIII – No contrato deverá haver margem Navios de guerra são produtos de adequada para contingências decorrentes alta densidade técnica, elevado custo de dos riscos técnicos. A margem deverá ser obtenção e longos prazos de produção, proporcional aos riscos. Num programa quando comparados, por exemplo, a como o do Submarino Collins, como exem- tanques e aviões de combate. O preço de plo, a margem deveria ser de 10% a 15% [5]. construção pago ao estaleiro é da ordem

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de 30% do custo total de obtenção do decorrerá tempo longo e imprevisível até que navio9. E o custo dispendido ou com- a construção prossiga no estaleiro insolvente prometido pela Marinha ainda a meio da ou noutro financeiramente sólido e tecnica- construção de um navio de guerra é da mente capaz. Durante a longa paralisação, ordem 50% do custo total de obtenção. será problemático manter os equipamentos Para uma fragata moderna, isso corres- já instalados no navio ou ainda aguardando ponde a cerca de 300 milhões de dólares, instalação. Ficará prejudicada a operação da e provavelmente excede o patrimônio esquadra e, pior que tudo, serão abalados o líquido de muitos estaleiros. ritmo e a confiança em construirmos o poder Durante a construção, que inclui o corres- naval indispensável ao País. pondente projeto de detalhamento10, aumenta Paralisações na construção de um navio rapidamente o custo até então acumulado de guerra são um risco inaceitável. Quase ou comprometido na sempre ocorrem por obtenção, não só pelos insolvência do estalei- dispêndios do estalei- Paralisações na construção ro11. Para minimizar o ro, mas principalmente de um navio de guerra risco é indispensável pelos sistemas e equi- avaliar financeiramente pamentos adquiridos são um risco inaceitável. os estaleiros candidatos diretamente pela Ma- Quase sempre ocorrem por à construção. rinha e instalados ou insolvência do estaleiro. aguardando instalação. Avaliação técnica de Assim, antes do final da Para minimizar o risco estaleiros candidatos construção, a Marinha é indispensável avaliar à construção já poderá ter dispendido ou comprometido cerca financeiramente os Navios de guerra de 70% do custo total de estaleiros candidatos são produtos especiais: obtenção do navio. Esse à construção densamente técnicos e valor poderá ascender de alto custo unitário12. a 90% ainda antes dos Seus construtores têm testes e provas finais para aceitação final e que ser especializados. Imaginar que es- entrega pelo estaleiro. taleiros de navios mercantes possam logo Se o estaleiro paralisar a construção por construí-los confiavelmente é desconhecer dificuldades financeiras, a Marinha poderá ou ignorar realidades. ter imobilizado até 90% do custo total de Um estaleiro de navios mercantes pode obtenção, já dispendido ou comprometido. tornar-se construtor de navios de guerra, Dadas as implicações e tramitações legais, mas essa transição não será curta nem fácil.

9 O custo total de obtenção de um navio de guerra inclui várias outras parcelas dispendidas pela Marinha, desde custos de projeto (da ordem de 10% do custo total de obtenção do primeiro navio da classe) até os de sistemas, equipamentos e materiais contratados diretamente pela Marinha, tais como o sistema de combate (próximo a 50% do custo total de obtenção quando neles se inclui o C4ISR e o sistema de armas). 10 O projeto de detalhamento também é chamado projeto de construção. Consiste em projetar e especificar todos os detalhes necessários à produção do navio, mas obedecendo aos requisitos do projeto de contrato. 11 Paralisações também podem ocorrer por incêndios e acidentes, ou por atrasos na entrega de equipamentos principais ao estaleiro. Nesses casos elas não são totais, nem de longa duração. 12 Considerem-se modernas corvetas, fragatas, destróieres, submarinos e navios-aeródromos.

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Requererá continuidade, ação constante da País dependerão do propósito da contra- Marinha e associações cautelosas13 com tação. Serão mínimas se o propósito for estaleiros estrangeiros14. apenas receber satisfatoriamente o navio Contratar um estaleiro não especializado projetado, construído e testado no exterior tecnicamente para construir uma fragata ou e incorporá-lo à Armada. um destróier, ou até mesmo uma corveta Se a contratação do projeto e da cons- moderna, é risco tão grande quanto o de trução no exterior for passo intermediário contratá-lo sem a necessária solidez finan- para projetar-se, construir-se e manter-se ceira. Para minimizar esse risco, é indis- no Brasil um poder naval dissuasivo e pensável avaliar técnico-financeiramente eficaz, integrado num processo contínuo os estaleiros candidatos à construção. de desenvolvimento e defesa nacional, as capacitações necessárias à Marinha serão CONSTRUÇÃO, TESTES E bem maiores. Para este fim, alternativas PROVAS existem, geralmente ilusórias. A referên- cia [1] analisa essa questão e propõe uma Construção solução, particularmente no trecho entre suas páginas 220 e 235. Ela consiste num A fase de construção é a mais ex- planejado e controlado processo associa- ternamente visível do tivo entre o estaleiro processo de obtenção da Marinha (AMRJ), de um navio de guer- Para minimizar o estaleiros privados ra. Por isso, em países risco de paralização, é nacionais e estaleiros de desenvolvimento indispensável avaliar eminentes estrangei- tardio, mal se perce- ros, em que a Marinha bem a importância e a técnico-financeiramente os terá que recuperar e complexidade das fases estaleiros candidatos aumentar a capacidade que a precedem e que a técnico-gerencial em sucedem. à construção projeto e construção Modernos navios de que chegou a acumular guerra, como corvetas, fragatas, destróieres nas décadas de 1970 a 1990. e submarinos, são produtos complexos Se projeto e construção forem inteira- e especiais da indústria de construção mente nacionais, as capacitações necessá- naval. Construí-los bem requer certas rias à Marinha serão máximas. O mesmo se capacitações particulares, tanto técnicas aplicará ao estaleiro nacional, que já deverá como organizacionais e gerenciais, tanto do ter evoluído suficientemente no processo contratado como do contratante, a Marinha. associativo citado no parágrafo precedente. Se contratarmos o projeto e a constru- Várias questões técnico-gerenciais são ção de um navio de guerra em estaleiro críticas na fase de construção, testes e pro- eminente no exterior, as capacitações do vas. Citaremos algumas: contratado estarão quase garantidas. As a) sequenciamento e controle do projeto capacitações necessárias à Marinha e ao de construção;

13 As cautelas incluem a rejeição a técnicas de marketing em transferência de tecnologia. Sobre esse assunto, consulte-se a referência [6]. 14 Consulte-se a referência [1], páginas 227 a 229.

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b) sequenciamento e controle do pro- várias dessas questões competem princi- gresso físico e dos dispêndios da cons- palmente ao estaleiro, que normalmente trução; projeta e produz todo o navio. Para projeto c) análise e aprovação, ou reprovação e construção no Brasil, a responsabilidade e de documentos do projeto de construção; ação da Marinha têm que ser mais ampla e d) análise e aprovação, ou reprovação intensa. Requer estrutura técnico-gerencial de especificações técnicas de itens críticos e participação cada vez mais profissional, a serem adquiridos pelo estaleiro; decorrente de conhecimento e experiência e) análise e aprovação, ou reprovação acumulados numa sucessão contínua de de documentos de Garantia de Qualidade obtenções de navios de guerra. (Procedimentos Padrão, Formulários de Inspeção e Teste, Formulários de Con- Testes e provas cessão, Calendário de Inspeções, Testes e Provas etc.); A obtenção de um moderno navio de f) análise e aprovação, ou reprovação guerra requer inúmeros testes e provas. Eles de documentos de apoio logístico, tanto se realizam nas instalações de fabricantes, do estaleiro como de seus subcontratados no estaleiro, no porto e no mar. São um principais; conjunto planejado, complexo e articulado g) controle, distribuição e arquivamento que se destina a maximizar a probabilidade da documentação técnica, tanto a dos contra- de obter-se o desempenho especificado para tados diretamente pela Marinha como a do o navio.Testes e provas ocorrem no País e estaleiro e de seus subcontratados principais; no exterior15, desde o início da construção h) análise e aprovação, ou reprovação, até a incorporação à Armada, ou mesmo de alterações ao projeto propostas pela depois. Regulam-se por especificações Marinha ou pelo estaleiro; apropriadas e normas da International i) planejamento e execução, com os Standards Organization (ISO). contratados diretamente pela Marinha, da Parte desse conjunto de testes e provas integração de sistemas, tanto da plataforma é reponsabilidade da Marinha e de seus como do sistema de combate; contratados diretos. Outra é responsabili- j) participação em inspeções, testes e dade do estaleiro construtor e de seus con- provas, e aprovação ou reprovação dos tratados. Para navios de guerra projetados resultados; e construídos no Brasil, o planejamento k) análise de possíveis pleitos de reajuste geral, coordenação, participação e controle do contrato; e de todo esse conjunto é responsabilidade l) trabalho conjunto com o estaleiro, ou da Marinha. Depende particularmente de com outros contratados diretamente pela sua estrutura técnico-gerencial de Projeto Marinha (fornecedores de sistemas ou e de Garantia de Qualidade. equipamentos principais), para solucionar Embora haja normas aplicáveis à maio- problemas decorrentes de riscos inerentes ria dos testes e provas, alguns requerem ao projeto e à construção. procedimentos específicos, e aí se enqua- Para navios projetados e construídos dram vários de responsabilidade do esta- no exterior, a responsabilidade e ação em leiro, particularmente aqueles destinados

15 De onde vêm necessariamente vários sistemas, equipamentos e materiais.

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a comprovar requisitos de desempenho16. O segundo sistema principal é o Sistema Como já dito na formulação do contrato de Combate. Ele comanda e controla os siste- de construção: “Não basta especificar os mas de navegação, comunicações, vigilância, requisitos de desempenho. Deverão ser reconhecimento, detecção, rastreamento, também especificados os testes e provas informações táticas e o sistema de armas. para sua medição. Para isso, é importante Após serem instalados, testados e integra- a participação da área tecnológica da Base dos fisicamente todos os sistemas e subsiste- Industrial de Defesa. Porém não se deve mas de cada um dos dois sistemas principais, especificar como atingir os requisitos de é necessário fazer sua integração informática desempenho. Tal responsabilidade é dos ao respectivo sistema de software: o Sistema contratados”. de Gerenciamento de Informações da Plata- As últimas provas de responsabilidade forma e o Sistema de Combate. Alguns sinais do estaleiro são as de mar contratualmen- de comando e controle do Sistema de Geren- te previstas. Aprovados seus resultados, ciamento de Informações da Plataforma são o estaleiro terá cumprido suas obriga- também enviados para o Sistema de Combate. ções, salvo as que ainda forem neces- A fase de integração de sistemas envolve sárias para apoio à instalação de armas, simultaneamente equipes da Marinha, do equipamentos e sistemas adquiridos estaleiro e de fornecedores de sistemas e diretamente pela Marinha, e à integração equipamentos, nacionais e estrangeiros. A desses sistemas17. integração do Sistema de Combate pode estender-se além da data oficial de aceita- INTEGRAÇÃO DE SISTEMAS ção do navio entregue pelo estaleiro.

Navios de guerra são densa combinação COMISSIONAMENTO de dois sistemas principais de comando E SHAKEDOWN e controle, cada um composto de vários sistemas e subsistemas. Após a Marinha aceitar formalmente o O primeiro sistema principal denomina- navio entregue pelo estaleiro, ele é comis- -se Sistema de Gerenciamento de Informa- sionado, incorporando-se à Armada. Isso ções da Plataforma. Ele comanda e controla não significa que iniciou seu serviço na a plataforma, isto é, toda a arquitetura do Marinha, pois a integração de sistemas, po- navio, com seus sistemas de propulsão, derá continuar, principalmente a do Sistema geração e distribuição de energia, máquinas de Combate. Além disso, deverão ainda auxiliares e controle de avarias. realizar-se provas de mar importantes, mas

16 O desempenho do navio como um todo, ou de cada um de seus sistemas e subsistemas, depende de uma cadeia de ações: projeto, fabricação e montagem. Deficiências de desempenho verificadas em qualquer das fases de testes e provas de cais, porto ou mar podem resultar de falhas em qualquer uma ou mais de uma daquelas ações em cadeia. Portanto, quando se fala em responsabilidade do estaleiro por um teste ou prova, entenda-se que o estaleiro é o responsável pela sua execução, mas não necessariamente ou exclusivamente por seus resultados. Por exemplo, o estaleiro é responsável pela execução da prova de mar para verificar a velocidade máxima do navio, mas geralmente não é responsável pelo resultado dessa prova, pois tal resultado depende primariamente dos projetos do casco e do sistema de propulsão, normalmente não realizados nem encomendados pelo estaleiro. 17 O estaleiro continuará ainda a ser responsável por correções ou adições que estiverem pendentes na data de entrega do navio à Marinha, mas as realizará em prazo constante do Termo de Aceitação do Navio.

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de responsabilidade exclusiva da Marinha, 1 – Quantificar o desempenho do navio na fase de avaliação de engenharia e ava- em cada uma das funções operativas pre- liação operacional. vistas em seu projeto. Terminada a integração de sistemas, inicia- 2 – Determinar a causa de possíveis -se a fase de shakedown com o navio no mar, desempenhos insuficientes e identificar para identificar e corrigir falhas de segunda e avaliar alterações que aperfeiçoem o ordem não detectadas18 na longa sequência projeto, a serem feitas durante a vida útil de testes e provas até então realizadas. Na do primeiro da classe ou na construção dos fase de shakedown a tripulação também se navios seguintes. familiariza com o novo navio e se qualifica 3 – Relacionar métodos, hipóteses, da- para suas diversas funções. dos e critérios de projeto com os resultados obtidos. Esta atividade é um dos fundamen- AVALIAÇÃO DE ENGENHARIA E tos do desenvolvimento tecnológico. AVALIAÇÃO OPERACIONAL AVALIAÇÃO EM SERVIÇO E Avaliação de Engenharia e Avaliação FEEDBACK Operacional é a ultima fase na obtenção de uma nova classe19. Porém é básica Concluída a avaliação de engenharia/ para capacitação crescente em projeto e operacional, o navio inicia efetivamente construção de um Poder Naval. Baseia-se o serviço na Marinha21. É importante nos resultados de todos os testes e provas monitorar seu desempenho nos primeiros das fases anteriores e em testes e provas anos de serviço e daí extrair informações adicionais20. Abrange todo o navio, tanto úteis para toda a classe, principalmente a plataforma como o sistema de combate. informações de apoio logístico22. Elas Deve ter os seguintes propósitos: também serão úteis em novos projetos.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Construção Naval; Poder Naval; Engenharia Naval;

18 Ocorrência dessas falhas é um fato estatístico. 19 Em nossa Marinha, esta fase realizou-se pela primeira vez na obtenção da Corveta Inhaúma [7]. Porém, seus benefícios não puderam aplicar-se nas três outras corvetas da classe, pois todas se construíram segundo o mesmo protótipo. 20 Provas para verificar manobrabilidade, comportamento no mar, assinatura acústica, assinatura magnética, assinatura infravermelha, seção reta radar equivalente, resistência a choque etc. Esta última é incomum e de extrema severidade. 21 Diante de urgências, não é raro que o primeiro navio da classe entre em serviço antes de terminar as avaliações de engenharia operacional, cujos testes e provas são então realizados em intervalos de exercícios operativos, com inevitáveis prejuízos técnicos. 22 O Plano de Apoio Logístico da classe é formulado durante as fases de projeto, dele resultando aquisições e outras providências para manutenção e apoio. Porém, para torná-lo eficaz, é indispensável que as necessida- des de apoio logístico sejam monitoradas constantemente durante os primeiros anos de serviço, atualizando progressivamente o plano original.

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REFERÊNCIAS [1] FREITAS, Elcio de Sá. A Busca de Grandeza. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha, 2014. [2] Idem, páginas 302 a 304. [3] Idem, páginas 205 a 332. [4] Idem, páginas 353 a 355. [5] Idem, página 304. [6] FREITAS, Elcio de Sá. “Transferência de Tecnologia”. Revista Navigator. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha. [7] BARBOZA, Tiudorico Leite. “Concepção das Corvetas da Classe Inhaúma” - RMB 2o trimestre 2017. Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha.

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TIUDORICO LEITE BARBOZA* Contra-Almirante (Refo-EN)

SUMÁRIO

Introdução Princípios da emissão do infravermelho Propagação da emissão Emissão devido ao firmamento (céu) e ao mar O mecanismo de detecção Obtenção da assinatura infravermelha Conclusão

INTRODUÇÃO por ocasião da denominada avaliação de engenharia do projeto e construção das ste artigo se propõe a abrir espaço na corvetas da classe Inhaúma [1], quando o ERMB para um assunto que se supõe arraste de conhecimento científico-tecno- seja de interesse da comunidade de leitores lógico propiciado pelo projeto e construção da revista, qual seja o acervo de conheci- das corvetas daquela classe havia elevado mentos sobre os princípios da assinatura o patamar de conhecimento do Setor do infravermelha. A expertise sobre o assunto Material sobre vários aspectos, como é o foi incorporada à Marinha do Brasil (MB) caso da assinatura infravermelho.

* Serviu no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro na Divisão de Oficinas Estruturais e, mais tarde, como vice- -diretor; na Diretoria de Engenharia Naval e no Centro de Projetos Navais, nos projetos das corvetas classes Inhaúma e Barroso. Doutor em Ciências (DSc) em Engenharia Oceânica pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Faz parte atualmente do corpo docente do Centro de Instrução Almirante Wandenkolk. PRINCÍPIOS DA ASSINATURA INFRAVERMELHA

PRINCÍPIOS DA EMISSÃO DO d) infravermelho extremo (XIR de ex- INFRAVERMELHO treme infra-red), região que se estende de 15 µm (20 Tz) a 1m m (300 GZ). A emissão da energia térmica Como a emissão do laser se dá num Todos os materiais emitem radiação na comprimento de onda de 1,063 µm portanto

região do infravermelho do espectro eletro- na faixa do infravermelho próximo, este magnético. Esta energia pode ser usada para fato abre a possibilidade de possível ilu- detectar a presença de navios de guerra e minação do alvo com laser e sua detecção assim prover mísseis de autodiretores que por detector infravermelho. utilizem a detecção desta mesma energia As regiões de particular interesse para de- para a busca de seus alvos. Diferentemente tecção e reconhecimento são as bandas MIR do radar, que utiliza técnica ativa, dirigindo (banda II) e FIR (banda III), não somente por um pulso de energia contra o alvo e detec- causa das características de emissão, mas tando sua reflexão, a detecção infraverme- também porque nessas bandas as condições lho é passiva, ou seja, é devida à energia de propagação são mais favoráveis. emitida pelo alvo, embora desde o final da década de 1980 houvesse, principalmente Emissão da radiação infravermelha na França, pesquisa e desenvolvimento voltados para a possibilidade de utilizar A teoria da emissão infravermelho é detectores infravermelho para a detecção calcada no conceito de emissor perfeito ou de um alvo iluminado por laser. Esta pos- “corpo negro”, definido como o objeto capaz sibilidade será discutida a seguir, quando de absorver totalmente a energia incidente, se comentará o espectro infravermelho e o qualquer que seja seu comprimento de onda. espectro da emissão laser. O suporte fundamental desta teoria é consti- tuída de três leis, que serão aqui apresentadas O espectro infravermelho por serem absolutamente indispensáveis para o bom entendimento do texto. A região do infravermelho é, por conve- niência, subdividida em cinco sub-regiões, 1) Lei de Planck cada uma delas tendo uma denominação Estabelece a formulação teórica para a que indica a sua proximidade da região do emissão espectral do corpo negro dada por : espectro visível. São elas: a) infravermelho próximo (NIR de near onde: infra-red), região que se estende de 0,75 µm (400 Tz) a 3 µm (100 Tz);

b) infravermelho médio (MIR de middle h = Constante de Planck = 6,6256x infra-red), região que se estende de 3 µm -34 10 Joule.s; (100 Tz) a 3 µm a 6 µm (50 Tz); k = Constante de Boltzmann=1,38054 Joulex(ok)-1; c) infravermelho distante (FIR de far c = velocidade da luz = 2,988x 108 m/s; e infra-red), região que se estende de 6 µm t = temperatura absoluta do corpo negro (50 Tz) a 15 µm (20 Tz); e em oK

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A Figura 1 abaixo apresenta a Lei de ção que se concentra a maioria dos cálculos Planck em forma gráfica. e desenvolvimentos aplicáveis às técnicas de detecção da radiação infra- vermelha. Esta energia também pode ser expressa pela luminân- cia, que pode ser definida de maneira simplificada como 1/π vezes da emitância (L=R/π). Na prática, os objetos comuns não são, geralmente, corpos negros, e sim corpos ditos cinzentos, e, assim, a aplicação desta lei sofre uma correção por meio da apli- cação de um termo denominado emissividade espectral. De uma maneira simplificada, podemos dizer que a energia total emitida por um corpo a uma temperatura T toma a forma Rt= Є s T 4, onde Figura 1– Representação gráfica da Lei de Planck Є é a sua emissividade, variando entre 0 e 1, mas normalmente 2) Lei de Wien menor que 1, pois o valor 1 só é aplicável a Estabelece as coordenadas do máximo um corpo negro. da curva de distribuição espectral da Lei de Planck sendo dado por: Valor máximo em µm = PROPAGAÇÃO DA EMISSÃO

A consequência da Lei de Wien é que Entre o corpo emissor e o detector, há quanto maior seja a temperatura de um cor- atenuação da radiação, ou seja, o detector po negro, menor é o comprimento de onda recebe apenas parte da energia emitida. Essa na qual ele emite. atenuação é governada por uma lei exponen- cial, ou seja, a transmissão através de um 3) Lei de Stefan-Boltzman percurso da atmosfera pode ser expressa por Esta lei estabelece a emitância total -kx F=F0 e , onde F0 é o fluxo de radiação inci- do corpo negro para uma temperatura T dente, k é o chamado coeficiente de extinção dada por: e x a distância considerada na propagação. 4 Rt = s T Essa atenuação se deve a dois mecanis- -8 s =Constante de Stefan = 5,67 X 10 mos básicos, a saber: 2 o -4 (W/m ) x ( k) – absorção molecular pelos gases da atmosfera, principalmente vapor-d´água e Matematicamente, Rt significa a área gás carbônico; e sob distribuição espectral e, fisicamente, – difusão pelas gotículas de água e a energia total contida no espectro para a partículas existentes na atmosfera, como temperatura considerada. É nesta formula- poeira, neblina e fog.

34 RMB3oT/2017 PRINCÍPIOS DA ASSINATURA INFRAVERMELHA

A absorção pela atmosfera é altamente dependente do com- primento de onda da radiação, fazendo com que na prática haja duas “janelas” de transmissão e, em consequência, duas assinaturas infravermelho a serem considera- das: a primeira na região de 3µm a 5µm (MIR ou banda II) e a segunda na região de 8µm a 14µm (FIR ou banda III). Na banda de 3µm a 5µm (banda II), preponderam as emissões devido a objetos cujas temperaturas se situam entre 300o C e 600o C, enquanto na banda de 8µm a 14µm (banda III) preponderam as Figura 2– Fluxograma simplificado do mecanismo de detecção para dois emissões de energia produzidas por posicionamentos diferentes ( A e B) do interferômetro objetos cujas temperaturas estão próximas ao meio ambiente, como é o caso da estrutura e da superes- trutura do navio.

EMISSÃO DEVIDO AO FIRMAMENTO (CÉU) E AO MAR

A detecção de navios é feita contra a assinatura do fundo (mar e céu), ou seja, depende do con- traste térmico entre essas duas assinaturas.

O MECANISMO DE DETECÇÃO Figura 3 – Fluxograma de medição infravermelho O mecanismo de detecção exis- c) atmosfera – responsável pela atenu- tente numa câmera infravermelho é ilustra- ação da energia térmica emitida pelo alvo; do pelas figuras 2 e 3. Cada componente do mecanismo de detecção é descrito a seguir: d) sistema ótico – representa o conjunto a) objeto – alvo para o qual estamos de todos os dispositivos óticos existentes interessados em medir sua assinatura; numa câmera infravermelho, incluindo a b) fundo – representa o meio ambiente pupila de entrada; e) dispositivo de análise espacial – pro- que circunda o alvo cuja assinatura será picia que o detector faça uma varredura na colocada em contraste (contraste térmico) imagem, segundo dois eixos; com a do objeto;

RMB3oT/2017 35 PRINCÍPIOS DA ASSINATURA INFRAVERMELHA

f) filtro espectral – permite selecionar a utilizada para navios, mas sim para alvos banda desejada na medição; com um espectro altamente seletivo, como

g) detetor – dispositivo que transforma é o caso em que há emissão de CO2. o sinal ótico incidente (função dos parâ- Para navios, são normalmente obtidas metros de espaço e tempo) em um sinal assinaturas para as bandas II e III. A energia elétrico ou resposta na forma de tensão, que chega ao detector não é a que é emitida corrente ou potência; pelo alvo, devido à atenuação da atmosfera e h) registrador do sinal – permite arma- às características de transmissão dos elemen- zenar os dados relativos à medição; tos óticos contidos numa câmera de detecção. i) dispositivo de tratamento do sinal – A energia detectada corresponde, assim, a permite corresponder a cada valor de tensão uma energia denominada aparente, normal- vídeo e, portanto, a cada valor de tempe- mente expressa em temperatura aparente, ou ratura observada, um nível de luminância; luminância aparente, uma grandeza que, de j) dispositivo de visualização – é, uma maneira geral, pode ser aproximada por: normalmente, uma câmera de TV, onde a imagem infravermelho é transformada em

imagem visual;

l) dispositivo de utilização funcional A assinatura real do navio não pode ser – permite que o sinal, após ter sido de- obtida por medição sem que haja uma de- vidamente tratado, seja utilizado para a elaboração de gráficos e curvas. correlação para levar em conta a atenuação da atmosfera. Esta decorrelação vem, há OBTENÇÃO DA ASSINATURA muitos anos, sendo obtida por meio do sof- INFRAVERMELHA tware Lowtran, desenvolvido pelo Optical Physics Division, Air Force Geophysics La- Conceito de assinatura infravermelha boratory, nos Estados Unidos da América. Assim sendo, não existe uma assinatura A assinatura infravermelha de um alvo infravermelha única do navio, mas sim uma consiste na caracterização e na quantificação assinatura para cada condição ambiental e da energia térmica por ele emitida, havendo aproamento. três tipos de assinatura infravermelha, a saber: a) assinatura espacial – fornece a distri- Importância do conhecimento da buição espacial, ao longo da geometria do assinatura infravermelha de um alvo alvo, da energia térmica por ele emitida, sendo normalmente utilizada para navios; A assinatura infravermelha de um alvo b) Assinatura radiométrica – fornece o consiste na caracterização e quantificação valor total de energia térmica emitida pelo da energia térmica por ele emitida. Traduz, alvo, numa banda considerada larga, como, normalmente, o resultado obtido pela inte- por exemplo, na banda II, que compreende gração da energia distribuída numa banda comprimentos de onda entre 3µm e 5µm; e de frequência, havendo, na região do infra- c) Assinatura espectro radiométrica – vermelho, como mencionado anteriormente, fornece o valor total da energia emitida duas bandas consideradas importantes para pelo alvo numa banda considerada fina, a detecção e o reconhecimento, devido às no entorno de um determinado valor de características de emissão e às condições comprimento de onda. Não é, normalmente, favoráveis de propagação a elas inerentes.

36 RMB3oT/2017 PRINCÍPIOS DA ASSINATURA INFRAVERMELHA

As medições de assinaturas infraverme- mesmo para o navio já construído. A região lhas de navios de guerra têm os seguintes mais significativa é, sem dúvidas, a região objetivos: da chaminé, principalmente considerando na a) obtenção de dados aplicáveis ao direção em que sua cavidade é vista de topo desenvolvimento de autodiretores infra- (assinatura vertical, no caso da maioria dos vermelhos; navios; assinatura lateral, no caso de alguns b) bem conhecer as assinaturas dos na- navios com descarga de gases lateral). vios nacionais e estrangeiros, se possível. As Marinhas mais avançadas vêm, A Marinha francesa, por exemplo, realiza há longo tempo, realizando pesquisa e medições de assinaturas infravermelhas desenvolvimento voltados para a redução dos navios estrangeiros que adentram no da assinatura infravermelha dos seus na- porto de Toulon e, assim, estabelece um vios de guerra – Gaussorges [3], Thorne banco de dados de grande importância de [4] e Gates [2] – e para isto utilizando de natureza tática; e softwares para predição de assinaturas c) permitir, de forma cada vez mais pre- infravermelhas de navios, além do es- cisa e detalhada, a especificação dos dispo- tabelecimento de medições. A estrutura sitivos infravermelhos (infra-red decoys). desses softwares permite: a) obter a distribuição de temperatura ao Procedimentos para melhorar a longo do navio; assinatura infravermelha de navios de b) realizar cálculo da intensidade de guerra energia emitida pelo meio ambiente (ba- ckground); A detecção do navio por sensores in- c) realizar cálculo da transmissão at- fravermelhos é fortemente dependente do mosférica; e contraste térmico entre este e o fundo (mar, d) realizar cálculo para avaliação do céu, terra). Da mesma forma, seu reconhe- contraste térmico entre o navio e o meio cimento também é facilitado pelo referido ambiente, o qual é função da diferença contraste térmico, principalmente incluindo entre a energia térmica total emanada os denominados pontos quentes (hot points). do navio, isto é, aquela refletida, super- Assim sendo, para melhorar a assinatura posta àquela emitida, e aquela emanada infravermelha do navio é necessário obter: do meio ambiente. O contraste térmico a) redução do contraste térmico entre as é um parâmetro indicador da assinatura diferentes regiões do navio; e infravermelha. b) redução das intensidades de energia térmica emitidas pelos pontos quentes, em Importância da realização de medidas particular a chaminé. para a obtenção da assinatura A redução do contraste térmico entre as infravermelha de navios de guerra diferentes regiões do navio exige que sejam realizados estudos para este fim, por ocasião Essa importância pode ser resumida pelos das fases iniciais do projeto, sendo muito três objetivos mencionados abaixo: difícil, ou até mesmo impraticável, obter tal a) propiciar o desenvolvimento dos mé- redução, tratando-se de navios já construídos. todos e das técnicas pertinentes de medição Com relação aos denominados “pontos da assinatura infravermelha e acompanhar os quentes”, por serem localizados, a redução seus respectivos estados da arte, de grande da energia por eles emitida pode ser obtida importância sob o ponto de vista tático;

RMB3oT/2017 37 PRINCÍPIOS DA ASSINATURA INFRAVERMELHA

b) obter dados estratégicos de natureza lizado nesta matéria. As medições foram sigilosa, que somente são disponíveis para realizadas com as condições de tempo quem os obtém por meio da realização de vigentes por ocasião das provas de mar, em medições; três raias da Baía de Guanabara. Aspectos c) especificar dispositivos de defesa in- ligados à confidencialidade impediram fravermelha similares aos chaffseletrônicos que tais medições fossem feitas também (infrared decoys); e para as fragatas classe Niterói, que eram, d) avaliar propostas de decoys, ati- na ocasião, os navios mais modernos de vidade que requer, necessariamente, o complexidade equivalente que, assim, desenvolvimento de estudos visando à pudessem ser comparadas para essas seleção da alternativa mais promissora para duas classes de navios, com o objetivo a proteção do navio. de avaliar as corvetas, já que as fragatas seriam a referência mais moderna de que Medições realizadas para a Corveta dispúnhamos. Inhaúma por ocasião da Avaliação de Movida pelo espírito de não desperdi- Engenharia dos navios da classe çar a oportunidade, a Marinha houve por bem realizar tais medições também para o ex-Contratorpedeiro Espírito Santo, Após a construção das corvetas da classe medições estas que vieram a demonstrar Inhaúma, veio a fase de avaliação operacio- que, obviamente, como já se esperava, as nal que incorporou a denominada Avaliação corvetas da classe Inhaúma são muitíssimo de Engenharia, expressão cunhada na MB menos detectáveis do que um contratorpe- a partir das corvetas da classe Inhaúma, deiro daquela geração, o que, em termos conceituada como sendo a verificação por relativos, não pode ser encarado como meio de provas, medições ou testes da cor- um mérito, por ser óbvio, o que retirou relação entre hipóteses, critérios e cálculos valor da comparação feita. As limitações de projeto e os resultados obtidos, visando: financeiras impediram que fossem feitas – identificar deficiências de equipamen- medições semelhantes para a caracterização tos e sistemas até então não identificados; e da assinatura radar, e, portanto, nenhum – obter dados para aperfeiçoar o repro- valor confiável de seção reta radar pode ser jeto do navio avaliado e eventuais futuros atribuído aos navios da classe. projetos. As medições mostraram que as corvetas A Avaliação Operacional foi voltada da classe Inhaúma, do ponto de vista abso- para três aspectos distintos: a vulnerabi- luto, isto é, sem comparações com outros lidade (discrição e sobrevivência), a mo- navios de mesma geração, apresentam assi- bilidade e o controle ambiental. O grupo natura infravermelha com baixíssima taxa de da discrição incorpora a assinatura radar, indiscrição, em que somente as temperaturas a assinatura infravermelha, a assinatura aparentes (temperatura aparente é aquela magnética e a assinatura acústica. que teria um “corpo negro” para emitir a Com relação à assinatura infraverme- mesma quantidade energia), na região da lha, a Corveta Inhaúma foi objeto de medi- chaminé, apresentam contrastes térmicos significativos em relação às demais regiões ções de seus parâmetros caracterizadores, do navio, embora saibamos que, à época em registrados em documento classificado, que foram feitas as medições, a capacidade razão pela qual não pôde ser disponibi- de resolução térmica dos sensores para de-

38 RMB3oT/2017 PRINCÍPIOS DA ASSINATURA INFRAVERMELHA

tecção já era da ordem de 0,10o C, capazes CONCLUSÃO de rastrear e acompanhar, por satélite, a esteira térmica de um submarino e que as Na época das medições da assinatura Marinhas mais avançadas já desenvolviam infravermelha das corvetas da classe Inhaú- pesquisa e desenvolvimento voltados para ma (1989), o assunto em pauta já era objeto dispositivos de resfriamento da região da de pesquisa e desenvolvimento das Mari- chaminé. O próprio projeto das corvetas da nhas mais avançadas. Após quase 30 anos, classe Inhaúma já admitia venezianas na o estado da arte sobre o assunto, com certe- região da chaminé para o seu resfriamento, za, é muitíssimo diferente e mais avançado. mas sem que se conhecesse a efetividade Ficaremos cada vez mais ultrapassados se deste dispositivo. não nos dermos conta deste fato.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Infravermelho; Magnetismo; Estudo; Corveta;

REFERÊNCIAS

[1] Barboza, Tiudorico Leite. “Da Inhaúma à Barroso – Um processo marcante na história do projeto e da construção naval-militar no País”, Revista Marítima Brasileira, vol. 125, nos 01/03. [2] Gates P. J. “Infrared Signature of Warships”, Journal of Naval Engineers, dezembro/1986. [3] Gaussorge G. La Thermographie Infrarouge – Technique et Documentation Lavoisier, 1984. [4] Thorne R. W. Signature Reduction and Control-Commander. Royal Naval Engineering College, vol. 41, no 1.

RMB3oT/2017 39 ONU APROVA TRATADO DE PROIBIÇÃO DE ARMAS NUCLEARES

LEONAM DOS SANTOS GUIMARÃES* Capitão de Mar e Guerra (RM1-EN)

SUMÁRIO

Introdução Armas nucleares como contrárias aos princípios da humanidade (Preâmbulo) Proibições categóricas (Artigo 1) Um caminho para a renúncia por armas nucleares (Artigos 2-4) Criminalização das armas nucleares (Artigo 5) Reconhecendo direitos, remediando danos (Artigos 6-7) Convocando um novo fórum e mecanismos para estigmatizar as armas nucleares (Artigos 8-12) Arranjos institucionais (Artigos 13-20) O caminho à frente

INTRODUÇÃO meiro instrumento vinculativo multilateral de desarmamento nuclear negociado em 20 iderados por Brasil, México, África do anos, desde o Tratado de Não-Proliferação LSul, Áustria e Nova Zelândia, os países Nuclear (TNP), de 1968. que se reuniram em conferência das Nações “O tratado representa um passo e con- Unidas em Nova York aprovaram, em 7 de tribuição importante para as aspirações co- julho de 2017, o Tratado de Proibição de muns de um mundo sem armas nucleares”, Armas Nucleares (TPAN), sendo este o pri- disse o porta-voz do secretário-geral da

*Doutor em engenharia naval pela Universidade de São Paulo (USP) e mestre em engenharia nuclear pela Univer- sidade de Paris XI. É diretor técnico da Eletrobrás Eletronuclear, membro do Grupo Permanente de Assessoria em Energia Nuclear do Diretor-Geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) e membro do Con- selho de Administração da Associação Nuclear Mundial (WNA). Foi coordenador do Programa de Propulsão Nuclear do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP) e diretor técnico-comercial da Amazul. ONU APROVA TRATADO DE PROIBIÇÃO DE ARMAS NUCLEARES

Organização das Nações Unidas (ONU), nucleares, bem como muitos de seus aliados António Guterres, após sua adoção. que, como Holanda, Bélgica, Alemanha e “Espero que este novo tratado promova Turquia, armazenam armas nucleares em um diálogo inclusivo e uma cooperação seus territórios. A Coreia do Norte também internacional renovada visando alcançar não se juntou às negociações. o objetivo há muito atrasado do desarma- Em uma declaração conjunta divulgada mento nuclear”, acrescentou. no mesmo dia da aprovação do TPAN, as O tratado, que foi aprovado por 122 delegações dos Estados Unidos, do Reino votos a favor e de um contra (Holanda), Unido e da França na ONU afirmaram que com uma abstenção (Cingapura), proíbe a “não participaram da negociação do tratado e gama completa de atividades relacionadas não pretendem assinar, ratificar ou tornar-se com armas nucleares, como desenvolver, parte disso”. Diz ainda essa declaração que testar, produzir, fabricar, adquirir, possuir “esta iniciativa ignora claramente as realida- ou armazenar armas nucleares ou outros des do ambiente de segurança internacional” dispositivos explosivos e que “a adesão ao nucleares, bem como o tratado de proibição uso ou ameaça de uso Nós nos sentimos é incompatível com a dessas armas. O voto emocionados: estamos política de dissuasão contrário da Holanda nuclear, que tem sido se entende por este país respondendo às esperanças essencial para manter a armazenar em seu ter- e sonhos das gerações paz no mundo há mais ritório armas nucleares presentes e futuras de 70 anos”. dos Estados Unidos da Em resposta a América (EUA) sob o Embaixadora Whyte Gómez perguntas sobre esta comando da Organiza- declaração conjunta, ção do Tratado do Atlântico Norte (Otan). a Embaixadora Whyte Gómez lembrou “Nós nos sentimos emocionados por- que quando o TNP foi adotado, há duas que estamos respondendo às esperanças décadas, também não houve, a princípio, e sonhos das gerações presentes e futu- um grande número de adesões. Aberto ras”, disse a Embaixadora Elayne Whyte à assinatura em 1968, o TNP entrou em Gómez, da Costa Rica, que atua como vigor em 1970. Em 1995, o tratado foi presidente da conferência que negociou o prorrogado indefinidamente. Um total de tratado, em atendimento ao mandato con- 191 Estados aderiu, incluindo os cinco ferido pela Assembleia-Geral da ONU. Ela Estados dotados de armas nucleares que disse ainda que, com o tratado, o mundo são membros permanentes do Conselho está “a um passo” para a eliminação total de Segurança da ONU (, França, das armas nucleares. Rússia, Reino Unido e EUA). No início, O tratado estará aberto à assinatura de era inimaginável que esses Estados fossem todos os Estados na sede da ONU, em Nova partes no TNP, observou a embaixadora, Iorque, a partir de 20 de setembro de 2017 “mas o mundo muda e as circunstâncias e entrará em vigor 90 dias depois de ter mudam”. Outros países que também são sido ratificado por pelo menos 50 países. dotados de armas nucleares, como Índia, No entanto, vários países permaneceram Paquistão e Israel, nunca aderiram ao fora das negociações, incluindo os EUA, a TNP. A Coreia do Norte aderiu, mas pos- Rússia e outros Estados dotados de armas teriormente abandonou o tratado.

RMB3oT/2017 41 ONU APROVA TRATADO DE PROIBIÇÃO DE ARMAS NUCLEARES

A embaixadora acrescentou que os ares, como é o caso da América Latina e hibakusha, sobreviventes de bombas nu- do Caribe, pelo Tratado de Tlatelolco, no cleares de Hiroxima e Nagasaki, têm sido sentido de a humanidade alcançar o sonho a força motriz para criação do tratado de de um mundo totalmente livre de armas proibição de armas nucleares. As experi- nucleares. O TPAN nos traz esperança no ências que eles compartilharam “tocam a momento particularmente difícil das rela- alma humana”, disse ela, acrescentando que ções internacionais que vivemos, no qual as negociações foram uma “combinação de líderes mundiais parecem estar dispostos a razão e coração”. “atravessar o Rubicão” nuclear como nunca A comunidade internacional tem agora, estiveram desde a Guerra Fria. O fato de o portanto, um novo marco regulatório, sem Brasil ter sido um dos países que lideraram as deficiências, ambiguidades e assime- a conferência que aprovou o TPAN é mo- trias do TNP. O regime internacional de tivo de orgulho para todos nós. não-proliferação nuclear, que até hoje Apesar de este ser o desenvolvimento foi baseado no TNP, mais significativo na terá que considerar o política nuclear global TPAN, queiram ou não O regime internacional de desde o fim da Guerra os Estados dotados de não-proliferação nuclear Fria, a discussão do armas nucleares e seus Tratado de Proibição aliados. Sem dúvida, as terá que considerar o de Armas Nucleares regras do jogo mudarão, TPAN, queiram ou não os está quase ausente dos ainda que não se possa meios de comunicação claramente prever hoje Estados dotados de armas e das discussões de quais serão os reais im- nucleares e seus aliados. política internacional. pactos dessa mudança O importante é a Os acordos tradi- a curto, médio e longo cionais de controle de prazos. Ainda que ne- “criminalização” das armas nucleares, como nhuma arma venha a armas nucleares o TNP19 e os Trata- ser desativada no futuro dos ABM, Salt I & II, próximo por causa do Start e Novo Start, não TPAN, o custo político de manter os ar- mencionam os custos humanos e ambientais senais nucleares irá certamente aumentar. das armas nucleares. Em contrapartida, o Essa é exatamente a ideia do tratado, ou Tratado de Proibição de Armas Nucleares é seja, constituir um instrumento de pressão o primeiro grande acordo de armas nucleares política, mesmo com os Estados dotados a enquadrar especificamente as armas nucle- de armas nucleares não tendo participado ares como uma ameaça para a humanidade de suas discussões e que no momento não e como contrárias ao direito internacional se vislumbre a adesão de nenhum desses humanitário e de direitos humanos. países ao tratado. O importante, no caso, Como os Tratados de Zonas Livres de é a “criminalização” das armas nucleares, Armas Nucleares (Bangkok – Sudeste da decorrente do TPAN, similarmente ao que Ásia, Pelindaba – África, Rarotonga – Pa- já foi feito pelos tratados de proscrição de cífico Sul e Tlatelolco – América Latina armas químicas e biológicas. e Caribe), o Tratado de Proibição Parcial O TPAN vem se juntar aos tratados que de Testes Nucleares (LTBT) e o Tratado estabelecem zonas livres de armas nucle- de Proibição Total de Testes Nucleares

42 RMB3oT/2017 ONU APROVA TRATADO DE PROIBIÇÃO DE ARMAS NUCLEARES

(CTBT), o TPAN também reconhece os desarmamento tem sido “lento”, e “muitos danos ao meio ambiente, mas vai além países continuam a contar com armas nu- afirmando que armas nucleares trazem cleares em conceitos, doutrinas e políticas grande perigo para o desenvolvimento militares e de segurança”. sustentável, incluindo “desenvolvimento Como resultado, o tratado é enquadrado socioeconômico, economia global, se- como um instrumento que visa estigmati- gurança alimentar e saúde das gerações zar as armas nucleares, estabelecendo um atuais e futuras”. regime internacional de proscrição dessas Daremos a seguir uma visão geral bási- armas de forma a gerar pressão política ca sobre o texto integral do tratado e suas para uma aceleração do desarmamento por contribuições para o direito internacional e meio de “educação para o desarmamento”, o desarmamento nuclear. “conscientização” e “divulgação dos prin- cípios e normas deste tratado”. ARMAS NUCLEARES COMO Vale ressaltar que o preâmbulo esclarece CONTRÁRIAS AOS PRINCÍPIOS que o tratado se aplica exclusivamente às DA HUMANIDADE (Preâmbulo) armas nucleares, reconhecendo o “direito inalienável” dos Estados para usos pacífi- A primeira seção cos da energia nuclear, do preâmbulo do novo derivado do TNP. tratado estabelece uma abordagem humani- As armas nucleares são PROIBIÇÕES tária, expressando eticamente abomináveis aos CATEGÓRICAS preocupação com as princípios da humanidade (Artigo 1) “consequências hu- manitárias catastrófi- As disposições es- cas” de uma detonação nuclear que “não senciais do Artigo 1 do TPAN constituem podem ser adequadamente avaliadas, uma série de proibições categóricas (“nunca transcendendo as fronteiras nacionais” e sob nenhuma circunstância”) contra armas colocam “riscos [para](...) a segurança de nucleares, incluindo: toda a humanidade”. Como tal, “as armas – Artigo 1 (a) – Desenvolvimento, teste, nucleares são eticamente abomináveis aos produção, fabricação, aquisição, posse ou princípios da humanidade”. armazenamento; Isso estabelece a “necessidade con- – Artigo 1 (b) e (c) – Transferência; sequente de eliminar completamente as – Artigo 1 (d) – Usar ou ameaçar usar; armas [nucleares], que continuam a ser a – Artigo 1 (e) e (f) – Ajudar, encorajar única maneira de garantir que elas nunca ou induzir quaisquer dos atos proibidos mais sejam usadas novamente”. De fato, acima, ou procurar assistência de outros o preâmbulo observa que, na primeira re- para praticar atos proibidos; solução da Assembleia-Geral da ONU em – Artigo 1 (g) - Permitir que outros esta- 1946, assim como em outros acordos inter- dos armazenem, instalem ou implementem nacionais, como o TNP, de 1968, os países armas nucleares em seus territórios. do mundo se comprometeram a prosseguir Essas disposições deixam claro que “negociações que levem ao desarmamento todos os membros do tratado não podem, nuclear... sob um controle internacional ri- de qualquer forma, por qualquer motivo, se goroso e efetivo”. Infelizmente, o ritmo do envolver com armas nucleares.

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UM CAMINHO PARA A gais e administrativos apropriados e outras RENÚNCIA POR ARMAS medidas para enfrentar os danos causados NUCLEARES (Artigos 2-4) por armas nucleares e fazer cumprir as proibições”. Isso inclui “a imposição de Embora o tratado tenha sido negociado sanções penais para prevenir e reprimir por Estados que não possuem armas nucle- qualquer atividade proibida (...) realizada ares, ele busca prover condições para per- por pessoas ou em território sob sua juris- mitir que os países que as possuem ou que dição ou controle”. permitem que outros estados as armazenem no seu território possam juntar-se a ele. O RECONHECENDO DIREITOS, tratado oferece dois caminhos: os Estados REMEDIANDO DANOS podem destruir seus estoques antes de ade- (Artigos 6-7) rir a ele ou aderir e, em seguida, iniciar um processo planejado de desarmamento, ou Dado que o processo de negociação do seja, com metas e prazos definidos. tratado envolveu fortemente o testemunho O Artigo 2 exige que todos os Estados dos sobreviventes do uso e de testes de que se juntem ao tratado façam uma decla- armas nucleares, os ativistas da sociedade ração sobre se possuem ou controlam armas civil pressionaram para garantir que o nucleares e se já as eliminaram. O Artigo texto final incluísse fortes provisões sobre 4 oferece aos Estados a oportunidade de a assistência às vítimas e remediação dos aderir ao tratado com armas nucleares ainda ambientes contaminados. em sua posse ou no seu território, desde O Artigo 6.1 exige que todos os mem- que as armas sejam imediatamente remo- bros do tratado que tenham “indivíduos sob vidas de sua condição operacional e que sua jurisdição afetados pelo uso ou teste concordem com um “plano juridicamente de armas nucleares (...) [devem] fornecer vinculante estabelecendo um tempo para adequadamente assistência adaptada a que a eliminação irreversível seja verifica- idade e gênero (...), incluindo cuidados da e aprovada pelos membros do tratado”. médicos, reabilitação e apoio psicológi- Para verificar se as armas nucleares estão co, bem como proporcionar sua inclusão sendo destruídas e que todo material nucle- social e econômica”. Esclarece que isso ar é mantido seguro, evitando o desvio, o deve ser feito “sem discriminação”, dado Artigo 3 exige que todos os membros do que a assistência aos sobreviventes tem tratado adotem acordos de salvaguardas es- sido frequentemente fornecida de forma pecíficos, supervisionados pela Agência In- desigual, prestando-se, por exemplo, mais ternacional de Energia Atômica (AIEA). O assistência aos veteranos militares do que tratado requer que o regime de salvaguardas aos civis afetados, e “de acordo com o seja fortalecido ao longo do tempo e proíbe direito internacional aplicável em matéria o seu enfraquecimento (Artigos 3 e 4). humanitária e de direitos humanos”. O Artigo 6.2 exige que todos os Estados CRIMINALIZAÇÃO DAS ARMAS com áreas contaminadas como resultado NUCLEARES (Artigo 5) de atividades relacionadas a teste ou uso de armas nucleares (...) [devem] “tomar Para garantir que o novo tratado tenha as medidas necessárias e adequadas para efeito, o Artigo 5 exige que seus membros a remediação ambiental”. Houve um de- implementem “todos os procedimentos le- bate considerável, durante a conferência

44 RMB3oT/2017 ONU APROVA TRATADO DE PROIBIÇÃO DE ARMAS NUCLEARES

preparatória do tratado, sobre quem seria tado a se envolverem com suas normas. Ao o responsável último pela mitigação dos convidá-los a prestar assistência às pessoas danos causados pelas armas nucleares. e aos ambientes prejudicados pelas armas Vários Estados queriam que estivesse nucleares como parte de sua ajuda externa, claro que os governos que causaram o teriam que negociar com os membros do problema deveriam ser responsáveis por tratado e, assim, se conscientizar sobre as ajudar aqueles que sofreram dano e limpar consequências catastróficas humanitárias e a contaminação que causaram. No entanto, ambientais das armas nucleares. como um delegado na conferência afirmou durante uma reunião plenária, “se um carro CONVOCANDO UM NOVO me atingir atravessando uma avenida e se FÓRUM E MECANISMOS PARA evadir, não devo esperar que ele chame uma ESTIGMATIZAR AS ARMAS ambulância para me socorrer”. Consistente NUCLEARES (Artigos 8-12) com o direito internacional humanitário e os direitos humanos, e de acordo com o O processo de desarmamento nuclear foi princípio da soberania do Estado, o tratado bloqueado por décadas devido ao impasse prevê que a responsabilidade e o controle nos fóruns multilaterais com mandato para primário da ajuda às vítimas e a remediação negociá-lo. Na prática, os únicos Estados dos ambientes contaminados sejam dos que historicamente promoveram o total Estados afetados. desarmamento nuclear foram a África do No entanto, como o tratado considera as Sul, após a queda do regime do apartheid, armas nucleares como uma ameaça a toda a Ucrânia e o Cazaquistão, após a disso- a humanidade, estabelece que mitigar os lução da União Soviética. O Conselho danos da violência nuclear é dever de todas de Segurança da ONU, a Conferência de as pessoas. Portanto, o Artigo 7 expande Desarmamento e as Conferências de Revi- o círculo de responsabilidade a todos os são do TNP dão margem a que os Estados membros do tratado, que são obrigados a que possuem armas nucleares possam cooperar e fornecer “assistência técnica, bloquear quaisquer tentativas de avanço material e financeira” para ajudar outros nesse sentido. Estados a cumprir suas obrigações. Tam- O TPAN estabelece reuniões bianuais bém encoraja o envolvimento do sistema dos membros do tratado (Artigo 8), bem das Nações Unidas, da Cruz Vermelha e como conferências de revisão de seis em da sociedade civil. seis anos. Essas reuniões permitirão que No entanto, o Artigo 7.6 afirma que os os Estados avaliem o progresso na imple- Estados que aderirem ao tratado mas que mentação e universalização do tratado, usaram ou testaram armas nucleares “têm a bem como possíveis medidas adicionais responsabilidade de prestar assistência ade- de desarmamento. Atendendo ao propósi- quada aos Estados Partes afetados”. Nada to estigmatizante do tratado, o Artigo 12 no tratado pré-exclui os Estados afetados exige que todos seus membros encorajem de buscar reparação dos Estados usuários os Estados fora do seu regime a ele se e testadores por meio de outros meios juntarem, estabelecendo o “objetivo da pacíficos legais, diplomáticos e políticos. adesão universal”. O Artigo 9 estabelece Os defensores do tratado também espe- uma forma de financiar as reuniões dos ram que os artigos 6 e 7 ofereçam oportuni- membros do tratado. O Artigo 10 permite dades para persuadir os Estados fora do tra- que os estados adotem emendas ao tra-

RMB3oT/2017 45 ONU APROVA TRATADO DE PROIBIÇÃO DE ARMAS NUCLEARES

tado para se adaptarem a novos desafios, De forma mais controversa, o Artigo e o Artigo 11 esclarece como os Estados 17 reconhece o “direito de retirada de um resolverão pacificamente as controvérsias Estado (...) se decidir que eventos extra- “relacionadas à interpretação ou aplicação ordinários relacionados com o assunto do presente Tratado”. do tratado comprometeram os interesses supremos de seu país”. Para garantir que ARRANJOS INSTITUCIONAIS isso não seja feito de forma simplista, (Artigos 13-20) um Estado que pretenda sua retirada do tratado deverá fornecer uma justificativa O restante do tratado aborda, em grande fundamentada e aguardar um período de parte, detalhes dos seus aspectos legais, 12 meses. Se o Estado em retirada estiver incluindo como os Estados podem aderir envolvido em um conflito armado, ele (Artigos 13 e 14) e quando entrará em vi- continuará a ser legalmente vinculado ao gor, o que ocorrerá 90 dias após 50 Estados tratado até a guerra acabar. o ratificarem (Artigo 15). Esclarece que os Quando a cláusula de retirada foi de- Estados não podem colocar reservas à assi- batida pela conferência de negociação, a natura no tratado (Artigo 16) e que ele será grande maioria dos Estados era favorável de “duração ilimitada” à exclusão ou mesmo (Artigo 17-1). Esta- à proibição da retirada. belece o secretário- O TPAN não pretende Entretanto, esta possi- -geral da ONU como um mundo sem armas bilidade permaneceu depositário oficial do nucleares no curto prazo. devido à insistência tratado (Artigo 19) e obstinada de alguns que suas versões em Elas representam um Estados, como Argélia, todas as línguas oficiais risco para a segurança e a Bangladesh, Egito, Irã, da ONU (árabe, chinês, Filipinas e Suécia. Tal inglês, francês, rus- prosperidade de fato foi condenado por so e espanhol) “serão toda a humanidade ativistas da sociedade igualmente autênticas” civil que argumenta- (Artigo 20). vam que permitir a retirada enviaria uma Os elementos do tratado foram sub- mensagem contraditória sobre a proibição metidos a um debate significativo. Vários universal e categórica estabelecida pelo Estados lutaram arduamente para garantir tratado. No entanto, a maioria dos trata- que o novo TPAN não prejudicasse o TNP dos internacionais, incluindo aqueles de ou o CTBT. Como resultado, o preâmbulo desarmamento, tem cláusulas de retirada. reafirma o TNP como “a pedra angular do Os termos definidos pelo Artigo 17 tornam regime de desarmamento nuclear e não pro- mais difícil retirar-se do TPAN que do TNP liferação” e a “importância vital” do CTBT. e das convenções que proíbem as armas Isso é consagrado na parte juridicamente químicas e biológicas. vinculativa do tratado pelo seu Artigo 18, que exige que a implementação do tratado O CAMINHO À FRENTE “não prejudique obrigações [em outros] (...) acordos internacionais existentes”, desde Explicando seu apoio ao tratado, um que “essas obrigações sejam consistentes delegado afirmou que “demonstra nossa com o Tratado”. capacidade de mudar o mundo um passo

46 RMB3oT/2017 ONU APROVA TRATADO DE PROIBIÇÃO DE ARMAS NUCLEARES

de cada vez”. Dada a não-participação dos Em suma, conforme os Estados façam países dotados de armas nucleares, maio- sua adesão e efetivamente implementem res responsáveis pela falta de progresso o tratado, ele fará com que a defesa das no desarmamento nuclear, o TPAN não armas nucleares pareça cada vez mais fora pretende um mundo sem armas nucleares do alcance de um consenso moral, ético e no curto prazo. No entanto, estabelece uma jurídico global. norma clara de que as armas nucleares No Brasil, a Constituição Federal, representam um risco para a segurança e no seu artigo 21, inciso XXIII, alínea a prosperidade de toda a humanidade. Ele (a), estabelece, desde 1988, que “toda coloca os danos humanos e ambientais atividade nuclear em território nacional causados pelas armas nucleares no centro somente será admitida para fins pacífi- do debate. Com isso pretende criar pressão cos e mediante aprovação do Congresso política sobre os Estados que têm um pú- Nacional”. Somente outro país, a Nova blico predominantemente antinuclear mas Zelândia, possui dispositivo constitucional dão apoio diplomático para a persistência semelhante. Logo, o TPAN reafirma o de arsenais nucleares, como Alemanha, mandato constitucional brasileiro, bus- Holanda, Noruega, Japão e Austrália. cando universalizá-lo.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; ONU; Tratado; Guerra nuclear; Arma de destruição em massa; Bomba atômica;

RMB3oT/2017 47 DAS FORÇAS ARMADAS E DO PODER JUDICIÁRIO SOB O PRISMA DOS DISCURSOS PRESIDENCIAIS DURANTE O REGIME MILITAR

REIS FRIEDE* Desembargador Federal

SUMÁRIO

Introdução Discursos de João Goulart Dos discursos dos presidentes do regime militar Castello Branco Costa e Silva Médici Geisel Figueiredo Conclusão

INTRODUÇÃO sar os pronunciamentos de posse realizados pelos presidentes da República durante o construção do presente artigo partiu de denominado Regime Militar. A uma premissa: a de que os discursos, Nesse sentido, Fernando Lyra, então notadamente aqueles articulados por oca- deputado federal, na qualidade de líder do sião da assunção do mandato presidencial, antigo Movimento Democrático Brasileiro abarcam, representam e refletem parte da (MDB), em discurso publicado no Diário do história nacional, o que nos inspirou a anali- Congresso Nacional de 2 de abril de 1975,

* Diretor do Centro Cultural da Justiça Federal. Vice-presidente do Tribunal Regional Federal (TRF)/2ª Região. Ex-membro do Ministério Público e professor titular da Universidade Veiga de Almeida e do Mestrado em Desenvolvimento Local do Centro Universitário Augusto Motta (Unisuam). Colaborador costumeiro da RMB. DAS FORÇAS ARMADAS E DO PODER JUDICIÁRIO SOB O PRISMA DOS DISCURSOS PRESIDENCIAIS DURANTE O REGIME MILITAR

afirmou que os discursos, como testemunhos proferidos por João Goulart, peças funda- de uma época, “integram o acervo histórico mentais para a compreensão do desenrolar de qualquer povo civilizado, valendo como histórico a partir de 1964. fonte das mais originais e autênticas para Como amplamente noticiado, João Gou- fixar o grau de desenvolvimento político” lart, vice-presidente, por ocasião da renúncia (BRASIL, 1975, p. 2). do Presidente Jânio Quadros, encontrava-se Tendo em vista o escopo a ser alcança- em viagem oficial à China. Em virtude disso, do pelo texto ora introduzido, a empreita- Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos da limitou-se a identificar, fragmentar e Deputados, assume o poder como substituto analisar, especificamente, o ponto de vista legal, governando o País por alguns dias (de anunciado por cada Presidente (durante 25 de agosto a 8 de setembro de 1961). Ten- o Regime Militar) em relação às Forças do em vista o indisfarçado alinhamento Armadas e ao Poder Judiciário, de modo ideológico de Jango com o comunismo, sua a buscar informações posse foi vetada pe- que possibilitassem los ministros militares verificar a respecti- Tendo em vista o (General Odílio Denis, va trajetória institu- alinhamento ideológico de da Guerra; Brigadeiro cional em momentos Grün Moss, da Aero- pretéritos. Jango com o comunismo, náutica; e Almirante Para tanto, foram sua posse foi vetada Sílvio Heck, da Ma- examinados diversos pelos ministros militares, rinha), deflagrando- discursos presiden- -se uma grave crise ciais, sendo que, em deflagrando-se grave crise político-militar, sendo alguns casos, tendo em político-militar, sendo o impasse solucionado vista a inexistência de por meio da aprova- uma preleção de pos- instaurado pelo Congresso ção, pelo Congresso se, outros, relativos a Nacional o regime Nacional, em 2 de se- momentos posteriores, parlamentarista tembro de 1961, de foram sopesados em uma Emenda Consti- substituição, adotando- tucional instaurando o -se, em qualquer caso, o critério cronológico. regime parlamentarista no Brasil, o que, em Obviamente, como não poderia deixar de tese, garantiria o mandato de Goulart até 31 ser, permitimo-nos, em alguns momentos, de janeiro de 1966. extrair certas inferências dos fragmentos Assim, em 8 de setembro de 1961, Jango textuais transcritos, para, em seguida, con- assume a Presidência da República, em ses- signar a nossa própria observação acerca são solene no Congresso Nacional. Na mes- dos fatos, tudo historicamente relacionado ma data, é empossado o primeiro Gabinete com o tema de fundo abordado no trabalho. Parlamentarista, presidido por Tancredo Neves. Em janeiro de 1963, um plebiscito DISCURSOS DE JOÃO decide pelo retorno do presidencialismo, GOULART tendo João Goulart adquirido plenamente os poderes de Presidente. Para uma perfeita compreensão a res- Quando de seu pronunciamento de pos- peito do que se sucedeu durante o Regime se, Goulart dirige-se, de modo singelo, “às Militar, cumpre analisar alguns discursos Forças Armadas, que permaneceram fiéis

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ao espírito da democracia e devotaram-se brasileiros, todos aqueles que colocam à proteção da ordem jurídica”, bem como acima dos interesses pessoais os inte- ao Judiciário: “Ao Poder Judiciário, desejo resses da coletividade nacional, que é prestar uma homenagem toda especial, ao justamente esse clima de tranquilidade vê-lo cada vez mais prestigiado pela rea- e de confiança que está estimulando os firmação popular de respeito e acatamento nossos irmãos de todos os recantos da às leis” (BONFIM, 2004, p. 263). Pátria no sentido da luta pelo desenvol- Em outra ocasião, quando articulava vimento de nossa economia. diretamente com os militares, Goulart dei- Filio-me, com inabalável convicção, xa transparecer certa deferência às Forças ao número daqueles que estão seguros Armadas. Assim aconteceu, por exemplo, de que a vitória da caminhada que quando de sua visita ao Batalhão da Guarda ora estamos realizando, em busca da Presidencial (Guarnição emancipação econômi- Militar de Brasília), em ca nacional, depende, 10 de janeiro de 1962: O povo brasileiro sempre em grande parte, da Ao agradecer as disciplina e do patrio- palavras que acaba confiou nas suas Forças tismo das nossas For- de me dirigir o Se- Armadas e que nelas ças Armadas. nhor Comandante Aqui, ao vosso desta unidade — o nunca deixou de encontrar, lado, neste instante, brioso Batalhão da nos momentos difíceis sinto-me, felizmente, Guarda Presidencial da nacionalidade, apoio à vontade para vos afir- —, ao ensejo des- mar — e o faço como te almoço, desejo decisivo no sentido da Chefe da Nação — manifestar minha manutenção das instituições que o povo brasileiro particular satisfa- sempre confiou nas ção por este encon- democráticas e aos seus suas Forças Armadas tro, sobretudo por anseios de paz e e que nelas nunca dei- me ser dado parti- de progresso xou de encontrar, nos cipar do convívio momentos difíceis da honroso e amigo João Goulart nacionalidade, apoio da oficialidade que decisivo no sentido da aqui serve. Tenho a manutenção das insti- satisfação de vos dizer, com o orgulho tuições democráticas e aos seus anseios de brasileiro e de patriota, que, à medi- de paz e de progresso. (BRASIL, 1962) da que vou mantendo contato com os chefes e os demais membros de nossas Posteriormente, em 21 de fevereiro de Forças Armadas, mais forte sinto em 1962, na Vila Militar, no Rio de Janeiro, meu espírito a convicção de que a dis- por ocasião das comemorações do 17o ani- ciplina, a ordem e o patriotismo, que são versário da Tomada de Monte Castelo pela o seu verdadeiro apanágio, é que permi- Força Expedicionária Brasileira (FEB), tem, ao Governo e ao povo, o clima de tranquilidade e de confiança que é, de Jango dirige-se novamente aos militares: resto, o único compatível com as nossas Na reverência aos heróis que per- tradições. E sabem todos os patriotas deram ou expuseram a vida naqueles

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grandes episódios, rendo as homena- profissional e a instabilidade de residên- gens do meu apreço cívico, interpre- cia a que vossas funções vos sujeitam, e tando o sentimento unânime do povo por isso há de constituir ponto destacado brasileiro às valorosas Forças Armadas entre os deveres do Governo assegurar a de nossa pátria. [...]. Ninguém tem oficiais e sargentos meios de proporcio- excedido as nossas Forças Armadas narem às suas famílias uma vida tranquila em fidelidade à democracia e no amor e compatível com a elevada missão que e devotamento às causas populares. O lhes é confiada pela sociedade. espírito dos mortos de Prano, Monte Estou convencido de que, nesta or- Castelo, Montese e Fornuovo di Taro dem de ideias, o Governo do Brasil não revive, glorificado, no exemplo dos bra- será insensível aos justos reclamos das vos soldados da democracia que, sob Forças Armadas, depositárias do melhor o mesmo esclarecido comando do seu do nosso patrimônio cívico. E não so- antigo coronel, o então comandante do mente em relação às suas necessidades Sexto Regimento de Infantaria e hoje de aparelhamento material adequado, eminente General de Exército, Segadas especialmente no que diz respeito à Viana, asseguram a permanência de motomecanização e à modernização dos nossas instituições democráticas. seus instrumentos de ação em combate, O exemplo profissional que o soldado como, igualmente, no que se relaciona brasileiro deu de sua bravura e de sua com o aperfeiçoamento do seu material competência, lutando pelo ideal de nossa de comunicações, estou seguro de que filosofia de vida, nos campos da Itália, os recursos imprescindíveis serão postos e adaptando-se, sem dificuldade, ao à disposição dos seus objetivos funda- manejo dos mais novos instrumentos de mentais e inadiáveis. guerra, de par com as responsabilidades Agradeço, em meu nome e no do que nos cabem no cenário dos nossos presidente do Conselho, Ministro Tan- compromissos internacionais, são ele- credo Neves, o calor e a simpatia de mentos que nos fortalecem na convicção que nos cercais na acolhida que nos está de que as Forças Armadas do Brasil sendo dispensada. Agradeço, de modo devem ser dotadas, em permanente espí- particular, ao Senhor Ministro da Guerra rito de aperfeiçoamento, do instrumental o testemunho, isento e autorizado, que imprescindível ao desempenho de sua acaba de transmitir à Nação sobre o tarefa, para que, a qualquer tempo, quan- esforço do Governo em servir ao País, o do convocadas, possam manter as reful- que não constitui mais que o dever pre- gentes tradições que constituem o nosso cípuo dos que procuram desempenhar orgulho e a nossa honra. Quero também com lealdade os mandatos populares. declarar que o Poder Executivo — que se Continuaremos fiéis às imposições do estimula e fortalece com a vossa solida- nosso dever. A identificação, cada vez riedade — jamais poderá ser indiferente mais perfeita, entre as Forças Armadas aos problemas humanos de vossa classe, e os legítimos anseios populares, dá-nos agravados pelo processo inflacionário a certeza de que as reformas de base re- que o atual Governo encontrou em plena clamadas pelo País poderão processar-se e desordenada ascensão. Esse processo se dentro da linha das tradições democrá- exprime na alta do custo de vida, que se ticas e cristãs que desejamos a qualquer torna mais penosa com o deslocamento preço preservar.

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Manifestação como essa não pode dar as palavras proferidas pelo Marechal deixar de representar conforto moral Osório, nos últimos instantes de sua vida: para um homem público, que foi cha- “Tranquilidade, independência, pátria e mado em circunstâncias difíceis a dar liberdade”. Estas palavras permanecem desempenho aos deveres impostos pela cada vez mais vibrantes no espírito de vontade popular e que não teve outra nossas Forças Armadas. Fiel ao exemplo preocupação senão a de poupar o País de Osório e ao exemplo de nossas Forças e as suas instituições dos riscos que os Armadas, tenho sempre presente o signi- ameaçavam, esperando encontrar, com ficado das palavras de Osório, que soube a proteção de Deus, os meios de servir marcar, com sua bravura e seu patriotis- a sua pátria. mo, as fronteiras de nossa pátria, como a Senhores ministros, senhores ofi- dizer às futuras gerações que marcassem, ciais-generais, senhores oficiais. Con- também com patriotismo e coragem, o vido-vos a que levantemos as taças em caminho da independência do Brasil. memória dos nossos Sinto-me, portanto, bravos que tomba- emocionado ao lem- ram nos campos de Apesar das referências brar estas palavras do batalha e pelo futuro elogiosas de Jango, a grande militar e, coe- glorioso das nos- rente com elas, tenho sas Forças Armadas relação entre o Presidente tido a preocupação de (BRASIL, 1962). e as Forças Armadas, a assegurar ao País um bem da verdade, estava clima de tranquilidade No mesmo diapa- e de compreensão pro- são, em 10 de maio definitivamente marcada pício à união calorosa de 1962, no Quartel desde o embate ideológico da família brasileira. dos Dragões da Inde- Tem sido também pendência, no Rio de ocorrido por ocasião da nossa preocupação ser Janeiro, Goulart, por renúncia de Jânio. E fiel a todos os com- ocasião das comemo- pioraria de vez promissos livremente rações do 154o aniver- assumidos pelo Brasil, sário do nascimento do dentro de uma linha de Marechal Manuel Luís Osório, discursou independência. E tem sido ainda nossa para um público de militares: preocupação manter o País nesta cami- É-me profundamente grato participar nhada pela emancipação econômica que da solenidade organizada pelo I Exér- há de levar o povo brasileiro a melhores cito em homenagem ao grande soldado dias e a um respeito cada vez maior pelo do povo, ao grande soldado da lei – o sistema democrático em que vivemos. Marechal Osório. Através desta justa Congratulo-me com todos os gene- homenagem, o Exército reverencia a rais, com todos os oficiais, especialmente memória do patrono de sua gloriosa com aqueles que, abraçando a arma da Cavalaria, nesta data tão significativa, Cavalaria, continuam fiéis ao símbolo de que assinala o aniversário do nascimento patriotismo e de confiança em nosso país, do grande brasileiro. representado pela vida e pelo exemplo do Ao agradecer a saudação do ilustre Marechal Osório. Ao finalizar, levanto comandante do I Exército, desejo recor- um brinde em homenagem a Osório, ao

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homem que, vindo das camadas mais vi- de abril, no qual se irmanaram o Povo vas do povo, transformou-se em soldado, inteiro e as Forças Armadas, na mesma em general, em marechal e, sobretudo, aspiração de restaurar a legalidade, num símbolo a ser seguido por todos revigorar a democracia, restabelecer a os brasileiros. E, neste brinde, presto paz e promover o progresso e a justiça também minha homenagem ao glorioso social. (BRASIL, 1964) Exército nacional. (BRASIL, 1962) Em 15 de abril de 1964, Castello Branco, Apesar dessas referências elogiosas, a agora ao tomar posse perante o Congresso relação entre o Presidente da República Nacional, dedicou especial atenção à fun- e as Forças Armadas, a bem da verdade, ção desempenhada pelas Forças Armadas estava definitivamente marcada desde o na dita Revolução, episódio cujo objetivo, embate ideológico ocorrido por ocasião segundo ele, era tão somente restaurar a de- da renúncia de Jânio. mocracia, que naquele E pioraria de vez. momento encontrava- Os cidadãos, dentre eles, -se profundamente DOS DISCURSOS ameaçada pelo gover- DOS também em expressiva no antecedente: PRESIDENTES atitude, as mulheres Farei o quanto em DO REGIME minhas mãos estiver MILITAR brasileiras, todos, civis e para que se consoli- soldados, ergueram-se num dem os ideais do movi- CASTELLO dos mais belos e unânimes mento cívico da Nação BRANCO brasileira nestes dias impulsos da nossa História memoráveis de abril, A estratégia de contra a desvirtuação do quando se levantou aproximação com as unida, esplêndida de Forças Armadas es- regime coragem e decisão, boçada por Jango, e Castello Branco para restaurar a de- retratada nos três dis- mocracia e libertá-la cursos anteriores, não de quantas fraudes e surtiu efeito. Tendo em vista o movimento distorções que a tornavam irreconhecí- político-militar de 31 de março de 1964, vel. Não através de um golpe de Estado, assume a Presidência o Marechal Castello mas como uma Revolução que, nascida Branco. Eleito pelo Congresso Nacional, em nos lares, ampliada na opinião pública 11 de abril de 1964, para o cargo de Presi- e nas instituições e, decisivamente, dente da República, em seu pronunciamento, apoiada nas Forças Armadas, traduziu a na mesma data, faz referências não só ao firmeza das nossas convicções e profun- movimento em si, mas ao papel das Forças didade das nossas concepções de vida, Armadas em crises institucionais: convicções e concepções que nos vêm [...] espero em Deus corresponder do passado e que deveremos transmitir, às esperanças de meus compatriotas, aprimoradas, às gerações futuras. Foi nesta hora tão decisiva dos destinos do uma Revolução a assegurar o progresso, Brasil, cumprindo plenamente os eleva- sem renegar o passado. Vimos, assim, a dos objetivos do Movimento vitorioso Nação, de pé, a reivindicar a sua liber-

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dade e a sua vontade que, afinal, e nos Eu não conheço o protocolo desta termos previstos pela Constituição, se Casa, mas acredito que as normas aqui afirmou através do Congresso, legítimo adotadas não vão contrariar o meu desejo, representante dos ideais e aspirações todo natural, de responder à saudação do nosso povo. Nossa vocação é a da do Exmo. Sr. Presidente. Ouvi bem a liberdade democrática — Governo da clarividência com que S. Exa caracterizou maioria com a colaboração e o respei- a situação atual. Anotei bem e, sincera- to das minorias. Os cidadãos, dentre mente, as advertências que S. Exa me fez eles, também em expressiva atitude, num plano cívico, chamando a atenção as mulheres brasileiras, todos, civis e para o exercício da justiça na democracia. soldados, ergueram-se num dos mais Todo Presidente da República sempre belos e unânimes impulsos da nossa está às voltas com a legalidade, e, mais História contra a desvirtuação do regi- do que isto, com a defesa da legalidade. me. (BRASIL, 1964) E há quem pense e quem diga que esta defesa está inteiramente garantida quando No mesmo dia 15 de abril de 1964, o dispositivo militar a assegura. Mas, Sr. Castello Branco, ao receber, no Palácio Presidente, Srs. Ministros, tenho a impres- do Planalto, a faixa presidencial, volta a são, como antigo defensor da legalidade, firmar a importância das Forças Armadas, de que há muito o que fazer para assegurar que efetivamente alicerçou a sua chegada as normas jurídicas do País. Penso que ela ao poder: está numa administração que realize com Eu me encontro, neste momento, honestidade e olhando para o futuro. Pen- investido das altas funções de Presidente so que ela está na maneira de considerar da República. Aqui estou colocado pelo o Congresso Nacional. voto soberano do Congresso Nacional; Penso que está na coexistência dos aqui me encontro em virtude da confian- três poderes e que esta coexistência reside ça de bravos e destemidos governadores muito na iniciativa do Poder Executivo de Estado; aqui estou como seguimento e penso, também, que a defesa da legali- de uma conduta das Forças Armadas. dade está garantida quando o Presidente [...]. da República assegura condições para Assumo, neste momento, o comando o funcionamento da justiça no País. efetivo das Forças Armadas do Brasil Fui soldado e defensor da legalidade e, e, nessas condições, eu me dirijo aos muitas vezes, me sentia verdadeiramente meus velhos camaradas de profissão, desolado quando via que ela só podia ser dizendo-lhes que procurarei correspon- mantida com as baionetas não ensarilha- der à confiança em mim depositada, das, mas, colocadas fora dos quartéis, a procurando servir ao povo brasileiro que fim de que o Poder Executivo continu- de mim espera o sagrado cumprimento asse a fazer uma nefasta administração, da minha missão. Era o que eu tinha a a gozar o poder e a não dar à nação as dizer. (BRASIL, 1964) condições de vida necessárias. Procurei, assim, Senhor Presidente, responder às Em 17 de abril de 1964, o Presi- generosas palavras de V. Exa, a acolher dente Castello Branco visita o Supremo as suas advertências e bem me situar na Tribunal Federal (STF), quando, então, concepção de legalidade que eu tenho. faz o seguinte pronunciamento: Muito obrigado (BRASIL, 1964).

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Na ocasião, o Ministro Ribeiro da Civil e ele era o chefe do Estado-Maior Costa, então presidente do STF, também das Forças Armadas. Ele se dirigiu em discursou: seguida ao Hermes e ao Vítor Senhor Presidente, Marechal Humber- Nunes Leal, ou seja, àqueles três que to de Alencar Castello Branco. Excelên- eram os mais visados pela propaganda, cia. A visita cordial que Vossa Excelência e depois sentou-se ao lado do presidente realiza, neste momento, à Alta Corte de do Tribunal. Não falou pessoalmente Justiça Brasileira tem amplo significado, com os demais. Interpretei aquilo como ainda mais acentuando-se pelo fato elo- uma mensagem: “Não tenho nada con- quente que Vossa Excelência timbrou em tra os senhores.” Houve discursos do ressaltar: de se ter empossado no Poder presidente do Supremo e dele, foi uma Executivo e dali, pela primeira vez, sair solenidade simples, informal, embora hoje para a realização desse ato solene. estivéssemos com a capa de ministro. Só isto revela o zelo, o apreço e a Havia jornalistas, e houve publicidade admiração do Chefe de Estado pelas de- dos discursos. mais instituições, a começar por aquela Qual foi o conteúdo dos discursos? cuja missão reside, precisamente, em Houve alguma referência à situação? julgar, em face da Constituição, os atos Não houve, porque foi logo em se- dos demais Poderes. guida aos acontecimentos. O Presidente Castello manifestou sua reverência à Nota-se, pela leitura do último parágrafo Corte Suprema do País, palavras pro- do texto supra, o recado dado pelo Ministro tocolares. Depois houve o discurso do Ribeiro da Costa ao Presidente Castello presidente do Supremo, que não disse Branco: a missão do Poder Judiciário “re- nada, apenas agradeceu a presença dele. side, precisamente, em julgar, em face da Não houve nada de político, que pudesse Constituição, os atos dos demais Poderes”. chamar a atenção. A visita realizada por Castello ao STF O presidente do Tribunal, Ministro foi assim descrita pelo Ministro Evandro Ribeiro da Costa, não aproveitou a Lins e Silva, que à época integrava a com- ocasião para marcar uma certa inde- posição da Corte Suprema, em entrevista pendência do Supremo em relação à concedida a Marly Motta e Verena Alberti: Revolução? Como foi essa visita? Não tocou nesse assunto. Ribeiro da Ele foi fazer a visita protocolar ao Costa, como todos sabem, tinha muitas Supremo, certo dia. Existe lá um salão ligações com os grupos da União Demo- que tem um grupo Luís XV com cinco crática Nacional (UDN), era até ligado à cadeiras de um lado, cinco do outro, e Revolução. Também era filho de general, um sofá de duas pessoas. Ficam então os irmãos eram coronéis, tinha ligações os dez ministros, e o Presidente da militares, tanto que foi surpreendente, República vem e senta ao lado do presi- depois, sua atitude de defesa do Tribunal, dente do Supremo. Quando o Presidente da instituição, sua firmeza em exigir o Castello Branco chegou, estávamos absoluto respeito ao funcionamento da todos de pé, em torno das cadeiras, e Corte e aos seus juízes. Ele teve um papel ele se dirigiu a mim em primeiro lugar: muito importante depois. Esteve à altura “Ministro, como tem passado?” Eu já do momento histórico que se seguiu, o conhecia, porque fui chefe da Casa no desempenho do cargo. Tanto que se

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diz que ele teria mandado um recado ao nos atingir, de que ia respeitar o Tribunal presidente da República, dizendo que se e seus juízes (SILVA, 1997, p. 378-380). tocassem no Tribunal, fecharia o órgão e mandaria a chave. COSTA E SILVA No primeiro momento não houve então um confronto entre o Executivo O Marechal Costa e Silva, ministro e o Supremo? da Guerra durante o Governo Castello Havia sim. Havia ameaças. Os jor- Branco, desincompatibiliza-se do cargo e nais todos reclamavam a nossa cabeça. se candidata às eleições indiretas. Em 3 de [...]. outubro de 1966, é eleito (pelo Congresso Mas indepen- Nacional) para o qua- dentemente da ati- driênio 1967-1971, ten- tude do Ministro Se, como lhe competia do Pedro Aleixo como Ribeiro da Costa, vice. No seu discurso o Judiciário, nesse por dever para com de posse, proferido no momento inicial, o País, a Revolução Palácio do Planalto a não foi de certa adotou, por vezes, severas 15 de março de 1967, forma poupado depois de receber a porque os milita- restrições, nem por faixa presidencial das res se preocupa- isso modificou a nossa mãos do Marechal Cas- ram muito mais tello Branco, Costa e em voltar suas organização institucional, Silva, ao falar sobre as baterias contra pois conservou em pleno origens da Revolução, o Legislativo e o funcionamento esta Casa realça a participação Executivo? das Forças Armadas Em primeiro egrégia, a que atribuiu o no movimento polí- lugar, a atitude do poder de eleger o Presidente tico-militar de 1964, Ribeiro da Costa foi cabendo destacar o se- firme, altiva, digna, da República, e o Poder guinte extrato: e ele defendeu a Judiciário, cujas decisões A Revolução teve instituição o quanto têm sido invariavelmente profundas origens po- pôde; em segun- pulares, num grandio- do lugar, é preciso respeitadas so movimento cívico, reconhecer, houve Costa e Silva que levou às ruas e também a posi­ção às praças homens e do Presidente Cas- mulheres, jovens e ve- tello Branco, que era um homem mais lhos, dispostos a lutar por Deus e pela moderado, menos açodado e com uma Nação, com a solidariedade de todas as compreensão de que devia respeitar a classes sociais, de todos os democra- Corte Suprema do País. [...] Castello tas e o apoio unânime e decisivo das Branco, quando visitou o Supremo Tri- Forças Armadas. bunal Federal, deixou entrever, no seu Revolução, em verdade, e não golpe gesto de cumprimentar aqueles que eram de Estado, que visasse tão somente a visados pela campanha da imprensa, uma substituir um homem por outro ou por mensagem de que não estava pretendendo outra uma facção política.

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Revolução, e não motim militar, pois a indiscutível incapacidade do Judiciário as Forças Armadas, que também vêm daqueles períodos em atuar como a balança do povo, com o povo se irmanaram em da Justiça, com o respectivo e indispensável defesa dos mesmos ideais. [...]. fiel democrático. A solidariedade dos meus camara- Em 30 agosto de 1969, uma doença das do Exército, da Armada e da Força (trombose cerebral) acomete o Presidente Aérea não lhe modificou aqueles atri- Costa e Silva e o impede de exercer as butos: apenas exprimiu a sua aspiração funções presidenciais, ao mesmo tempo em unânime de continuidade do processo que sepulta seu plano de entregar ao País, no revolucionário e da sua defesa. A demo- dia 7 de setembro de 1969, uma nova Carta cracia tem de armar-se para defender-se (a Constituição de 1969), com maiores ins- daqueles que se valem das suas fran- trumentos de defesa do Estado, permitindo quias para destruí-la. [...]. a revogação do Ato Institucional no 5 e de Se, como lhe competia por dever todos os demais outorgados até então. Uma para com o País, a Junta Militar Gover- Revolução adotou, nativa composta pelos por vezes, severas Vejo o plano institucional, ministros da Marinha restrições, nem por destinado a preservar as de Guerra (Augusto Ra- isso modificou a conquistas da Revolução, demaker), do Exército nossa organização (Aurélio Lyra Tavares) institucional, pois vejo o plano constitucional, e da Aeronáutica (Már- conservou em pleno que estrutura o Estado e cio de Souza Mello) funcionamento esta assume o governo em Casa egrégia, a que assegura o funcionamento 1o de setembro de 1969, atribuiu o poder de orgânico dos Poderes conforme previsto no o eleger o Presiden- Médici Ato Institucional n 12, te da República, e de mesma data, perma- o Poder Judiciário, necendo até 30 de outu- cujas decisões têm sido invariavelmente bro de 1969, não havendo discurso de posse. respeitadas (BONFIM, 2004, p. 279- O Ato Institucional no 16, de 14 de 280). outubro de 1969, editado pelos referidos ministros militares, que se encontravam Interessante comentar o momento em no exercício da Presidência, declara a va- que o Presidente empossado afirma que “a cância dos cargos e fixa data para eleição democracia tem de armar-se para defender- e posse do Presidente e do vice-presidente -se daqueles que se valem das suas franquias da República. Costa e Silva falece no Rio para destruí-la”, frase que, a nosso ver, de Janeiro, em 17 de dezembro de 1969. permite extrair duas conclusões imediatas: prima facie, que as Forças Armadas, re- MÉDICI presentadas, no caso, por seu comandante supremo, o Presidente Costa e Silva, funcio- Uma vez eleito pelo Congresso Nacio- navam efetivamente como instrumento de nal, reaberto desde 22 de outubro de 1969, estabilização em momentos de crises, sendo, o General Emílio Garrastazu Médici é em- por assim dizer, as baionetas defensoras da possado na Presidência em 30 de outubro democracia. A segunda inferência traduz do mesmo ano, sendo o Almirante Augusto

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Rademaker o vice. à defesa da democracia e à realização Interessante mencionar que Médici do bem comum (BRASIL, 1969). não alude expressamente ao papel das Forças Armadas no âmbito do movimento Médici, ao vislumbrar a coexistência político-militar de 1964, por ele também de duas ordens jurídicas expressamente chamado de Revolução. Não obstante, reconhecidas no Texto Magno, algo absolu- deixa patente a sua condição de homem tamente incoerente sob o prisma do Direito da caserna, o que equivale dizer que a sua Constitucional, posto que a Constituição é origem militar seguramente influenciaria, uma só, não havendo que se pensar, portan- como efetivamente influenciou, a condu- to, em duplo ordenamento, acaba por reve- ção do governo: lar, a nosso ver, sua verdadeira intenção: Homem da caserna, creio nas virtudes sinalizar, desde a posse, que a exegese a da disciplina, da ordem, da unidade de ser extraída pelo Poder Judiciário a respeito comando. E creio nas messes do planeja- da Lei Maior deveria levar em conta essa mento sistematizado, na convergência de tal dicotomia por ele assentada, qual seja, ações, no estabeleci- o plano institucional (o mento das priorida- imperativo da seguran- des. E, porque assim Desde o início da gestão, ça nacional enquanto o creio, é que tudo Geisel firmou o processo valor destinado a pre- farei por coordenar, servar as conquistas integrar, totalizar de distensão lenta, gradual do regime) e o nível nossos esforços – e segura, cujo objetivo constitucional (referen- tantas vezes supér- te à estrutura do Estado fluos, redundantes, era, como efetivamente e ao funcionamento contraditórios, dis- aconteceu, a reintrodução orgânico dos poderes). persivos – em uma da democracia no País A questão que se mos- tarefa global, regida trou de difícil solução por um grande plano à época foi justamente diretor [...]. conciliar esses dois valores apontados no Homem da lei e do regulamento, discurso de Médici. creio no primado do Direito. E, porque homem da lei, é que pretendo velar pela GEISEL ordem jurídica. E, homem, de pés no chão, sinto que, nesta hora, a ordem Por meio de eleição indireta, Ernesto jurídica se projeta em dois planos. Vejo Geisel, da ala liberal das Forças Armadas, o plano institucional, destinado a pre- passa a exercer o cargo de Presidente da servar as conquistas da Revolução, vejo República em 15 de março de 1974, im- o plano constitucional, que estrutura o primindo, desde o início de sua gestão, o Estado e assegura o funcionamento or- denominado processo de distensão lenta, gânico dos Poderes. Estou convencido gradual e segura, cujo objetivo maior era, de que é indispensável a coexistência como efetivamente aconteceu, a reintrodu- dessas duas ordens jurídicas, expressa- ção da democracia no País. mente reconhecida pela Constituição, Quando do pronunciamento proferido fundada no imperativo da segurança na- em 15 de março de 1974, no Palácio do cional, e coerente enquanto for benéfica Planalto, por conta da assunção do man-

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dato, Geisel não cita as Forças Armadas, esses dois processos aqui apresentados nem menciona o Poder Judiciário. A es- distintamente – o do desenvolvimento sência de seu discurso, que em diversas nacional e o da segurança –, ambos passagens refere-se ao regime e a seus res- integrados nas suas áreas peculiares, pectivos idealizadores, revela o propósito mas, também, integrados entre si maior do movimento político-militar de (BRASIL, 1974). 1964, o qual, segundo o Presidente, seria “um projeto nacional de grandeza para a E, no derradeiro parágrafo do mesmo Pátria, alicerçado no binômio indissolú- discurso endereçado ao Ministério, Gei- vel do desenvolvimento e da segurança” sel afirma: “Quanto às Forças Armadas, (BRASIL, 1974). reservar-me-ei para apresentar minhas di- Já em 19 de março de 1974, quando da retrizes gerais na primeira reunião do Alto primeira reunião ministerial, Geisel refor- Comando, que se realizará nos próximos ça o apego ao binômio desenvolvimento dias” (BRASIL, 1974). e segurança: O trecho anterior, sem sombra de dú- O desenvolvimento de uma Nação é, vida, desponta o poder político ostentado necessariamente, um desenvolvimento pelas Forças Armadas naquela época, mes- integrado, o que não implica, de forma mo diante do novo panorama que se dese- alguma, progresso linear, paralelo, nhava a partir de então, sendo pertinente entre os vários setores, admitindo-se, ponderar que Geisel, ao decidir não tratar ao contrário, defasagens impostas por de assuntos militares na mesma ocasião, fatores conjunturais e pela sempre tivesse o propósito de, reservadamente, limitativa disponibilidade de recursos no âmbito particular das Forças Armadas, e, bem assim, por decisão estratégica ditar-lhes os novos rumos da distensão, de avanço mais rápido, a princípio, em preparando, assim, o terreno que culmi- setores considerados prioritários. Impor- naria com a definitiva saída dos militares ta reconhecer, entretanto, que retardes da cena política, o que aconteceria com o excessivos em qualquer parte da ampla fim do próximo governo. frente da ação governamental acabarão, inevitavelmente, por frear o progresso FIGUEIREDO em todos os outros setores. De forma semelhante, no quadro Posteriormente, uma vez eleito indi- da segurança nacional, o processo de retamente pelo Congresso Nacional, o seu reforço é também essencialmente General João Figueiredo, o último Presi- integrado, de vez que esse processo é dente militar, passa a exercer o cargo em o mesmo do próprio desenvolvimento 15 de março de 1979, nele permanecendo nacional, aplicado apenas em campo até 15 de março de 1985, tendo em vista especializado e mais restrito. O mínimo que a Emenda Constitucional no 8, de 14 de segurança indispensável resulta, pois, de abril de 1977, promulgada por Geisel da interação devidamente balanceada com amparo no Ato Institucional no 5, dos diferentes graus de segurança al- passou a fixar o mandato presidencial em cançados ou desejados, em cada um dos seis anos. Também da ala liberal, Figuei- seus setores componentes. redo assume o governo reafirmando a Cabe salientar, ainda, a estreita concepção de abertura política inaugurada vinculação que se estabelece entre pelo mandatário antecessor. Ao receber a

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faixa presidencial, Figueiredo proferiu, em Nota-se, perfeitamente, o tom concilia- síntese, as seguintes palavras a respeito do dor que permeou o aludido discurso, prova- movimento político-militar de 1964: velmente uma das razões explicáveis para Reafirmo, portanto, os compromissos o fato de Figueiredo, como já havia feito da Revolução de 1964, de assegurar uma Geisel, não ter se dirigido expressamente sociedade livre e democrática. Por todas às Forças Armadas, cujo protagonismo as formas a seu alcance, assim fizeram, começava a se esvaecer. Afinal, naquele nas circunstâncias de seu tempo, os momento, já estava devidamente traçado o Presidentes Castello Branco, Costa e derradeiro rumo a ser dado ao movimento Silva, Emílio Médici e Ernesto Geisel. de 1964, qual seja, o afastamento dos mi- Reafirmo: é meu propósito inabalável litares da trama política. – dentro daqueles princípios – fazer deste Com efeito, em perfeita sintonia com País uma democracia. As reformas do o referido propósito de conciliação na- eminente Presiden- cional, e após amplo te Ernesto Geisel debate, é sancionada prosseguirão até que Sustentarei a por Figueiredo, em possam expressar-se independência dos poderes 28 agosto de 1979, a as muitas facetas Lei no 6.683 (Lei da da opinião pública do Estado e sua harmonia, Anistia), cujo artigo brasileira, purificado fortalecendo, para que 1o, caput, concedeu o processo das influ- atinja sua plenitude, a anistia a todos quan- ências desfigurantes tos, no período com- e comprometedoras Federação sonhada pelos preendido entre 2 de de sua representa- fundadores desta Pátria setembro de 1961 e tividade. Reafir- Figueiredo 15 de agosto de 1979, mo: sustentarei a cometeram crimes po- independência dos líticos ou, conexo com poderes do Estado e sua harmonia, for- estes, crimes eleitorais, aos que tiveram talecendo, para que atinja sua plenitude, seus direitos políticos suspensos e aos ser- a Federação sonhada pelos fundadores vidores da administração direta e indireta, desta Pátria. [...]. de fundações vinculadas ao poder público, Reafirmo o meu gesto: a mão esten- aos servidores dos Poderes Legislativo e dida em conciliação. Para que os brasi- Judiciário, aos militares e aos dirigentes leiros convivam pacificamente. Para que e representantes sindicais punidos com as divergências se discutam e resolvam fundamento em Atos Institucionais e na harmonia e na boa vontade, tão da Complementares. índole de nossa gente. [...]. Não obstante ter silenciado quanto à Preocupada com o bem comum. caserna no discurso de posse, Figueiredo, Vigilante na preservação da ordem logo em 19 de março de 1979, na primeira pública e dos direitos das pessoas e reunião ministerial, refere-se expressamen- da sociedade. Firme na segurança das te às funções das Forças Armadas: instituições. Nossas Forças Armadas, tranquilas Prudente e serena na utilização dos no cumprimento do dever, saberão instrumentos legais existentes para esse garantir-nos o grau de segurança indis- fim (BRASIL, 1979). pensável à presença soberana do País

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no cenário internacional. Não deixarão, nos instrumentos de combate. Porque por outro lado, de assegurar a ordem e a Defesa Nacional exige o máximo de a paz internas, necessárias à participa- eficácia, que só se consegue pela dedi- ção política do povo na vida nacional cação total das pessoas engajadas, pelo (BRASIL, 1979). treinamento constante, pelo domínio dos avanços tecnológicos [...]. Mesmo diante dessa inegável tonalida- Em que consiste a Defesa Nacional? de pacificadora, a década de 80 do século É uma tarefa ciclópica que exige recur- passado experimentaria sérias reações à sos tecnológicos avançados de poder de proposta de abertura política, em curso fogo de transporte e da eletrônica. É um desde Geisel. Grupos de direita radical, papel estratégico que exige a perfeita in- numa completa aversão ao projeto em tegração entre Exército, Marinha e Força trâmite, perpetram odiosos atos de cunho Aérea, na defesa conjunta do território, terrorista, sendo o mais emblemático deles do mar e do espaço aéreo nacionais [...]. o que se deu em 1981, no conhecido Caso As Forças Armadas têm também o Riocentro, quando duas bombas explo- dever de zelar pela segurança interna e diram durante um show comemorativo pela nossa tranquilidade institucional. ao Dia do Trabalho. A ocorrência deste A união, a coesão das Forças Armadas, e de outros atentados reforçam o nosso voltadas para a sua missão profissional, entendimento de que as Forças Armadas, é fator decisivo para a manutenção do naquela quadra, já não ostentavam o mes- equilíbrio político e institucional de mo poder político de antigamente, fato que qualquer país. era do amplo conhecimento dos próprios A História nos mostra que o rompi- militares, sobretudo os liberais, tanto que mento da coesão militar e o desvio das alguns segmentos da caserna (os ditos forças militares para servir a ambições radicais) tentavam a todo custo recuperar de poder pessoal levam a crises violen- terreno e paralisar a inevitável distensão. tas e demoradas, a perdas valiosas de Era o sinal inequívoco de que as próprias vidas e de bens que deixam cicatrizes Forças Armadas não pretendiam mais profundas na convivência de uma prorrogar o exercício do poder. Estava comunidade. esgotado, naquela ocasião, o emprego das Essa ameaça estava presente quando instituições militares como elemento de fizemos a Revolução de 1964. Os fatores estabilização de crise. de controvérsia e divisão foram afastados Como que se estivesse preparando o e foram superadas as ambições pessoais. novo caminho a ser trilhado pelas Forças Prevaleceu, nestes 20 anos, o sentido Armadas a partir de 1985, Figueiredo, da missão institucional; prevaleceu a quando de seu penúltimo discurso em ca- doutrina de apoiar a nossa sociedade no deia nacional de rádio e TV, abordou o tema caminho da democracia. Defesa Nacional, sinteticamente: Antes de 1964, a situação das Forças Não se pode improvisar a Defesa Armadas deixava muito a desejar. O Nacional. É preciso contar com es- armamento era obsoleto, quase todo o truturas permanentes, com alto nível material era importado. Os efetivos do de especialização, flexibilidade para Exército, da Marinha e da Força Aérea renovação constante, tanto nas con- estavam dispostos apenas pelo litoral e cepções estratégicas e táticas como pela fronteira sul do País.

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Nestes 20 anos, fizemos um esfor- tropas terrestres e o poder de fogo por ço sistemático para trazer as Forças unidade são fatores fundamentais para Armadas ao nível compatível com o a execução dessa tarefa. Hoje, a nossa crescimento nacional. Forças Arma- Infantaria, a Cavalaria blindada e a das eficientes e modernas implicam Artilharia dispõem de armamento e despesas. O avanço tecnológico dos mobilidade adequados às suas missões instrumentos de combate exige eleva- específicas [...] (BRASIL, 1984). do nível tecnológico de preparo dos homens para manejá-los. No dia 28 de dezembro de 1984, Figuei- O processo de modernização e equi- redo, despedindo-se em cadeia nacional de pamento das Forças rádio e TV, reconhe- Armadas obedeceu ceu e apontou a quem e obedece a crité- A democracia oferece à cabe conduzir a cena rios rígidos de eco- política: nomia, em vista da sociedade os meios para A democracia, escassez dos recur- o seu aperfeiçoamento, que queremos plena, sos orçamentários, oferece à sociedade sempre aquém das para a solução racional dos os meios para o seu necessidades dos seus próprios problemas e contínuo aperfeiçoa- vários setores da de suas crises. A política, mento, para a solução atividade governa- racional dos seus pró- mental [...]. como arte do diálogo, prios problemas e de A Força Aérea, da argumentação e do suas crises. A política, a Marinha e o Exér- como arte do diálogo, cito precisam, por- compromisso, retoma, nesse da argumentação e do tanto, contar com quadro, a posição que lhe compromisso, reto- a aparelhagem ade- cabe no comando ma, nesse quadro, a quada. É imprescin- posição que lhe cabe dível que cada uma da sociedade no comando da socie- dessas Forças dis- Figueiredo dade [...] (BRASIL, ponha de sistemas 1984). de detecção, como o radar, o sonar etc., apropriados às suas CONCLUSÃO missões específicas. Também é im- prescindível que cada Força conte com De tudo o que foi dito a respeito da armas capazes de causar dano sobre participação das Forças Armadas na vida o adversário; precisa da organização política brasileira no decorrer do século logística adequada, de apoio, abasteci- passado, espera-se, sinceramente, que o mento e administração; é preciso uma frequente emprego das mesmas enquanto estrutura de comando e de estado-maior instrumento de estabilização tenha se exau- para estudo, decisão e execução quanto rido, restando definitivamente sepultado a estratégias e alternativas de ação. nos anais da História. Diante da moldura do A missão específica do Exército atual Estado Democrático de Direito, cremos consiste na defesa do nosso imenso que as Forças Armadas devem permanecer território. Por isso, a modalidade das absolutamente subordinadas aos poderes

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constitucionais, somente atuando nos exatos O processo de democratização que termos da Lei Maior, cuja exegese final há de avalizamos para o País, tanto quanto ser extraída não pelo homem político, mas um processo de transferência do poder, pelo Supremo Tribunal Federal, restando é, pois, um processo de transferência impossível, hodiernamente, que elas sejam de responsabilidade. De assumi-las, a “convidadas”, como acontecia em épocas sociedade não pode furtar-se. passadas, a executar tarefas destinadas à Dentro deste contexto, as Forças tomada (e respectiva entrega) do poder a Armadas estão a serviço de uma parcela determinados atores políticos. muito definida da Segurança: a Defesa Numa verdadeira democracia, cumpre Nacional. Para esta função de Defesa Na- à sociedade, pelo mecanismo do sagrado cional, específica e explícita, impõe-se a direito de voto, e jamais por meio das armas existência de estruturas permanentes e al- de militares, decidir a tamente especializadas, respeito de quem deve Diante da moldura do capazes de renovar- ocupar legitimamente -se constantemente na os poderes Executivo e atual Estado Democrático doutrina e nos meios, Legislativo, residindo, de Direito, cremos que as e de alcançar, assim, o neste aspecto, a impor- máximo de eficácia na tância capital do Poder Forças Armadas devem ação [...]. Judiciário. permanecer absolutamente Nenhuma nação Afinal, como dito subordinadas aos poderes pode prescindir de suas pelo Presidente Fi- Forças Armadas; po- gueiredo em discurso constitucionais, somente rém, as Forças Armadas proferido aos 5 de de- atuando nos exatos termos de qualquer nação ja- zembro de 1984, não mais poderão ser perma- há, efetivamente, so- da Lei Maior nentemente o elemento lução militar para a básico de controle so- desagregação social, a cial. Aceitar uma ou ou- corrupção da vida pública e das relações tra hipótese constituiria erro fatal. Nenhum pessoais, o enfraquecimento dos valores, o poder se manterá apoiado unicamente na individualismo selvagem, a perda do sen- força e, menos ainda, na violência; nenhum timento de fidelidade, o desrespeito à lei, poder se manterá apoiado unicamente na as desigualdades sociais, a deterioração do luz da razão, por mais inspirada que seja. comportamento político, a crise econômica, Ambas as hipóteses se tornarão rapidamen- mazelas que ainda hoje, 30 anos depois, te caricaturas de uma pretensa formulação assolam o Brasil. Conforme disse, ainda, de autoridade. Só o passado comum con- Figueiredo: solidado em valores e tradições capazes No entanto, existirá sempre um de inspirar o sentimento e o orgulho pátrio caminho de superação desses males, à pode legitimar e sustentar uma estrutura de medida que as pessoas e as instituições poder (BRASIL, 1984). assumirem a sua responsabilidade na As urnas, elas sim, são a força e as garantia da estabilidade social que dá baionetas da democracia e da mudança. segurança à Nação. Esta garantia está Usemos, então, a nossa força para provo- mais em suas mãos do que nas mãos das car as transformações e a alternância do Forças Armadas. poder que se fazem necessárias.

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1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Poder Executivo; Poder Militar; Poder Judiciário; Forças Armadas; Poder Nacional; História do Brasil;

REFERÊNCIAS

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64 RMB3oT/2017 DAS FORÇAS ARMADAS E DO PODER JUDICIÁRIO SOB O PRISMA DOS DISCURSOS PRESIDENCIAIS DURANTE O REGIME MILITAR

______. Discurso proferido pelo Presidente Ernesto Geisel quando da transmissão do poder no Palácio do Planalto, em 15 mar. 1974. Disponível em: . Acesso em: 21 fev. 2015. ______. Discurso proferido pelo Presidente Ernesto Geisel em cadeia nacional de rádio e TV, em 1o abr. 1977. Disponível em: . Acesso em: 10 mar. 2015. ______. Discurso proferido pelo Presidente Ernesto Geisel quando da primeira reunião ministe- rial, em 19 mar. 1974. Disponível em: . Acesso em: 21 fev. 2015. ______. Discurso proferido Deputado Federal Fernando Lyra, na qualidade de líder do antigo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), publicado no Diário do Congresso Nacional, em 2 abr. 1975. Disponível em: . Acesso em: 27 fev. 2015. ______. Discurso proferido pelo Presidente João Figueiredo quando do recebimento da faixa presidencial no Palácio do Planalto, em 15 mar. 1979. Disponível em: . Acesso em: 22 fev. 2015. ______. Discurso proferido pelo Presidente João Figueiredo quando da primeira reunião ministe- rial, em 19 mar. 1979. Disponível em: . Acesso em: 22 fev. 2015. ______. Discurso proferido pelo Presidente João Figueiredo no Clube da Aeronáutica, em 5 dez. 1984. Disponível em: . Acesso em: 28 fev. 2015. ______. Discurso proferido pelo Presidente João Figueiredo à nação brasileira, em cadeia nacional de rádio e TV, sobre seu programa na área da defesa nacional, em 13 dez. 1984. Disponível em: . Acesso em: 28 fev. 2015. ______. Discurso proferido pelo Presidente João Figueiredo à nação brasileira em cadeia nacional de rádio e TV, em 28 dez. 1984. Disponível em: . Acesso em: 28 fev. 2015. COSTA, Álvaro Moutinho Ribeiro da. “Inconveniência e inutilidade do aumento dos ministros do Supremo Tribunal Federal”. Correio da Manhã, 20 jan. 1965. Disponível em: . Acesso em: 20 fev. 2015. SILVA, Evandro Lins e. O salão dos passos perdidos: depoimento ao CPDOC; entrevistas e notas de Marly Motta e Verena Alberti. Rio de Janeiro: Nova Fronteira e FGV, 1997.

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O oceano – o maior e mais inexplorado território da Terra – sempre mexeu com o imaginário do homem. Embora por debaixo de tanta água haja muito a ser descoberto, os cientistas são unâni- mes: uma das maiores biodiversidades do mundo está nas profun- dezas dos oceanos.

TÁSSIA BIAZON* Bióloga

SUMÁRIO

Introdução Pesquisa Exploração Biodiversidade Impactos

INTRODUÇÃO lude continental, e se estende nas planícies abissais. Embora o mar profundo não seja s enormes pressões – aumento de 1 contínuo, tem uma profundidade média Aatmosfera (atm) a cada 10 metros – e o de 4 mil metros; a partir dos mil metros a expressivo tamanho – mais de 360 milhões escuridão é total, abaixo dos 2 mil metros de km² de extensão e 1 bilhão de km³ de a temperatura é constante em 4°C e a sa- volume – são os principais desafios que linidade é em torno de 34,7. “Um enorme os cientistas enfrentam para estudar o mar sistema tridimensional. Sem dúvida, o me- profundo, também denominado oceano nos conhecido de todos. E muitos cientistas profundo, que se inicia a partir da quebra chegam à conclusão que nunca haverá a sua da plataforma continental, no chamado ta- compreensão completa”, afirma o professor

* Graduada pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e pela Universidade de Coimbra (Portugal) e pós-graduada na área de Jornalismo Científico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atualmente, desen- volve projeto de divulgação científica junto ao Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (USP). NAS PROFUNDEZAS DOS OCEANOS

José Angel Alvarez Perez, do Centro de enviam via satélite), trarão benefícios signi- Ciências Tecnológicas da Terra e do Mar ficativos aos estudos do oceano profundo”, (CTTMar) da Universidade do Vale do afirma. “Além disso, também é desafiante a Itajaí (Univali), em Itajaí, Santa Catarina. constante necessidade de capacitação pro- Embora os cientistas já tenham explorado fissional, seja para operacionalização dos regiões localizadas a milhares de metros de instrumentos ou para formação de pesqui- profundidade, muitas dificuldades devem sadores que estudam essa região particular ser ultrapassadas para investigar o fundo dos dos oceanos”, complementa. oceanos. “O leito dos oceanos é um local Para o professor Angelo Fraga Bernar- de difícil acesso e compreende um mosaico dino, do Departamento de Oceanografia e de ambientes: talude continental, planícies Ecologia da Universidade Federal do Espírito abissais, fontes hidrotermais, exsudações Santo (Ufes), o maior desafio em estudar frias, montes submarinos, recifes de corais grandes profundidades está no limitado etc.”, diz o professor Paulo Yukio Gomes financiamento, associado à disponibilidade Sumida, do Departamento de Oceanografia de embarcações para esse fim. “Um custo Biológica do Institu- diário de um navio de to Oceanográfico da pesquisa gira em torno Universidade de São O oceano global de 40 mil reais, poden- Paulo (IO-USP). A tí- corresponde a cerca do chegar facilmente a tulo de curiosidade, a de 70% da superfície 60 ou até 100 mil reais profundidade máxima se o pesquisador qui- a que o ser humano já da Terra, e os oceanos ser contratar um navio chegou por meio do profundos correspondem a com Remotely Opera- mergulho autônomo ted Vehicle (ROV) ou (que faz uso de apa- cerca de 80% do volume de submersível”, informa. relhos de respiração água do oceano global Os ROV, que custam subaquática, como o milhões de dólares, são cilindro de oxigênio) foi a pouco mais de veículos submarinos não tripulados, mano- 300 metros – o recorde foi atingido em brados a distância. Segundo ele, não há no 2013, quando o egípcio Ahmed Gamal Gabr Brasil editais de pesquisa que suportem esse chegou a 332,35 metros no Mar Vermelho. tipo de investimento. “Assim, grande parte do Entre os desafios para a realização da conhecimento do mar profundo na margem pesquisa oceanográfica está a necessidade brasileira baseia-se em amostragens feitas por de grandes investimentos em novas tec- programas de caracterização ambiental, asso- nologias, seja aprimorando equipamentos ciados a empresas de óleo e gás”, informa. já disponíveis ou criando novos, segundo o professor Rodrigo Kerr Duarte Pereira, PESQUISA do Laboratório de Estudos dos Oceanos e Clima (Leoc) do Instituto de Oceanografia O oceano global corresponde a cerca de da Universidade Federal do Rio Grande 70% da superfície da Terra, e os oceanos (IO-Furg). “As boias, conhecidas como profundos correspondem a cerca de 80% do Deep Argo (equipamentos autônomos volume de água do oceano global. Assim, para operação em profundidades maiores quando se pergunta o quanto o homem já que 2 mil metros, que armazenam dados sabe sobre o fundo do mar, os pesquisado- e, quando submergem em superfície, os res são categóricos: é difícil mensurar! “A

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Oceanografia é uma ciência relativamente sensores e equipamentos de amostragem nova (~70/80 anos). Hoje o homem deve remota está revolucionando a Oceanogra- conhecer somente 5% das zonas profundas fia”, diz Bernadino. “Satélites obtêm dados do oceano global. Muitos estudos ainda são batimétricos de bacias oceânicas ou mesmo necessários para compreensão dos aspectos dados ecológicos globais importantes, ape- de variabilidade natural e/ou antrópica nas utilizando espectros de luz”, acrescenta. dessas regiões”, relata Kerr. Entre os nomes que já estudaram o fundo A lendária expedição Challenger, rea- dos oceanos, há de se destacar a cartógrafa lizada nos anos de 1870, e que produziu Marie Tharp (1920-2006) e o geólogo Bru- pesquisas a cerca de 5 mil metros de pro- ce C. Heezen (1924-1977), os criadores do fundidade, foi um marco na Oceanografia. primeiro mapa global do fundo do oceano Contudo, devido ao empedimento tecnólo- – que influenciou a aceitação das teorias da gico, até a Segunda Guerra Mundial pouco tectônica de placas e da deriva continental. se conhecia por debaixo de tanta água, O primeiro mapa que eles completaram que ocupa quilômetros de profundidade foi do Atlântico Norte (1959); em seguida e de extensão. Com a Guerra Fria, novas o Atlântico Sul (1961) e depois o Oceano tecnologias foram obtidas, como subma- Índico (1964). Após o falecimento de He- rinos e veículos remotos, que permitiram ezen, em 1977, foi publicado o panorama novas descobertas – a morfologia do fundo do fundo do oceano (World Ocean Floor) oceânico, das cordilheiras e das fossas é pelo Escritório de Pesquisa Naval (ONR, na conhecida graças a investimentos militares sigla em inglês) – o mapa foi pintado pelo e comerciais. “O desenvolvimento de novos austríaco Heinrich C. Berann (1915-1999).

Navio Prof. W. Besnard – o primeiro navio oceanográfico civil brasileiro (Foto: Francisco Luiz Vicentini Neto/IO-USP)

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Para a obtenção de dados oceanográfi- (>70m) e com autonomia de mais de um cos, como nos trabalhos de Tharp e Heezen, mês, já que as regiões profundas podem ser muitos recursos são necessários – recursos remotas e demandar longas viagens. Deve com custos expressivos, já que, depois da ci- ter um longo cabo de aço, ao menos três ência astronômica, a ciência oceanográfica vezes mais longo do que a profundidade da é a mais cara –, o que implica uma carência operação. Deve ter um guincho rápido (pelo de dados do ambiente marinho. “Embora os menos 1 m/s) – as operações de descida e principais equipamentos utilizados em mar subida de equipamentos podem levar mui- profundo estejam custeados em uma faixa tas horas e diminuir muito a capacidade de acima de 500 mil reais, em sua maioria, o amostragem. Posicionamento dinâmico (que maior custo para cruzeiros em águas aber- mantém uma embarcação fixa em uma po- tas é o que estimamos em ‘dias de mar’ do sição geográfica) e sonares multifeixe (que navio, ou seja, quantos dias os navios esta- permitem o mapeamento do fundo oceânico riam disponíveis para determinado estudo. em tempo real e 3D) são aparelhos sofistica- A partir dos ‘dias de mar’ destinados a um dos, mas fundamentais para a operação em cruzeiro oceanográfico, planeja-se de que áreas profundas. Além do sonar multifeixe, forma podemos utilizar este tempo para a observação de parâmetros físicos e quí- melhor atingir os objetivos do estudo”, diz micos se faz com equipamentos eletrônicos Kerr. “Uma viagem ao fundo do mar depen- mergulhados até as profundidades desejadas. de muito do tipo de equipamento utilizado. Em alguns casos, garrafas de fechamento au- Viagens low-tech chegam a custar em torno tomático (garrafas de Niskin) são essenciais de 20-30 mil dólares por dia. As high-tech para coletar água em diferentes níveis de podem chegar até uns 100 mil dólares por profundidade, para depois realizar análises dia”, acrescenta Sumida. a bordo”, informa Perez. A pesquisa em mar profundo é tradicional- mente realizada por na- vios de pesquisa ocea- nográficos associados ou contratados por universi- dades, governo ou insti- tuições privadas como a Petrobras. “Esses navios fornecem a segurança e o apoio para atividades de pesquisa ou industriais em áreas de oceano aber- to, que podem ter rápidas mudanças de condições de mar e de clima”, diz Bernadino. Nem todo navio oceanográfico está capacitado para operar em mar profundo. “O Pesquisa em mar profundo navio deve ser grande (Foto: Grupo de Oceanografia de Altas Latitudes (GOAL))

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O estudo do mar profundo, que utiliza estudos são Estados Unidos, Japão, Ingla- os mesmos instrumentos que em regiões terra, França e Alemanha. marinhas mais rasas, porém com algumas No Brasil, muitos dados do mar pro- adaptações, se dá por mergulhos diretos fundo foram obtidos a profundidades de em submersíveis tripulados ou por robôs 2 mil a 3 mil metros – regiões amostradas guiados remotamente. “Há algum tempo por navios de pesquisa contratados por em- foram desenvolvidos trajes individuais, presas petrolíferas ou associados a univer- mas não são extensivamente utilizados sidades, como o Navio de Pesquisa Alpha para a pesquisa”, diz Sumida. “Os grandes Crucis, da USP. “Não existem no Brasil fundos de sedimento podem ser amostra- navios de pesquisa especializados em dos com instrumentos mais simples (como altas profundidades, mas eles conseguem redes ou dragas), mas é preciso que sejam enviar amostradores ou até submersíveis operados por navios grandes e equipados. tripulados a profundidades de 6 mil metros. Para alguns ambientes, precisamos de fer- Esse é o caso do navio japonês Yokosuka, ramentas de alta tecnologia, como o ROV, que abriga o submersível Shinkai 6500 e o Autonomous Underwater Vehicles (AUV) que pode mergulhar e coletar amostras e submersíveis”, acrescenta o professor. até profundidades de 6.500 metros. Essa “Veículos submarinos têm sido desen- tecnologia é extremamente cara, e poucos volvidos há mais de 30 anos para realizar países têm capacidade ou interesse em coletas de sedimento, rochas e organis- financiá-la”, conta Bernardino. Em 2013, mos, bem como registrar imagens. São Sumida, em parceria com pesquisadores submersíveis tripulados ou controlados japoneses, esteve a bordo do Shinkai 6500, remotamente por pesquisadores a bordo no Atlântico Sul, onde coletou amostras a dos navios, que são guiados para obser- 4.200 metros de profundidade. var, descrever, re- gistrar dados e co- letar amostras que serão analisadas na superfície”, ex- plica. Assim, além de navios especí- ficos, são necessá- rios equipamentos operacionais e uma tripulação expe- riente em operações oceânicas. “Tudo isso é muito caro, o que restringe o número de países que fazem pesquisa em mar profundo”, informa Sumida, ci- tando que os países Submersível Shinkai 6500 durante expedição no Oceano Atlântico referências nesses (Foto: Lamp/IO-USP)

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Em 1960, por meio do submersível recursos pesqueiros, às rotas de comércio e Trieste, o tenente americano Don Walsh comunicação, ao repositório de biodiversi- e o oceanógrafo suíço Jacques Piccard dade, à recreação etc. “É amplo o conheci- (1922-2008) foram os primeiros homens a mento sobre o papel que os oceanos têm na chegar no ponto mais profundo da Terra: regulação climática por meio da absorção a Fossa das Marianas (Challenger Deep), de calor e de dióxido de carbono (CO2) localizada no Oceano Pacífico, a cerca de atmosférico, bem como na produtividade 11 mil metros de profundidade. Em 2012, biológica marinha, que suporta importantes o diretor do filmeTitanic , James Cameron, indústrias pesqueiras ao redor do mundo”, dentro do submersível Deepsea Challenger, diz Bernardino. “No mar profundo, muitas repetiu o feito. E em 2016 noticiou-se a ex- espécies encontram abrigo, alimentação e ploração com ROV na Fossa das Marianas. zonas de reprodução e crescimento, dando Mesmo com tantos continuidade a ciclos fatores limitantes, os biológicos importan- cientistas já descobri- Os cientistas já tes. O leito dos oceanos ram processos inima- descobriram processos fornece recursos mine- gináveis nas regiões rais (óleo, gás e metais) profundas – como os inimagináveis nas regiões que são historicamente ecossistemas das fontes profundas – como os a base da economia hidrotermais – e obti- mundial. Assim, os veram uma boa base ecossistemas das fontes oceanos são vitais para teórica sobre o mar hidrotermais – e obtiveram milhões de espécies, profundo e seu respec- uma boa base teórica sobre entre elas a Homo sa- tivo papel no planeta. piens”, destaca. “Quanto mais o ho- o mar profundo e seu Mesmo com desa- mem procura, mais ele respectivo papel no planeta fios científicos, tecno- encontra novidades”, lógicos e ambientais, diz Perez. “Talvez o o homem já explora desafio seja sensibilizar as fontes de recur- muitos recursos do mar profundo, entre sos sobre a importância de investir nesses eles o petróleo – óleo inflamável, formado a estudos, e isto não é fácil. A maioria dos partir da decomposição, durante milhões de navios oceanográficos tem gestores que anos, de matéria orgânica (plantas, animais lutam para mantê-los na ativa”, alega. Ao marinhos etc.), encontrado apenas em terre- passo que se reconhece o quanto ainda falta no sedimentar. Usado desde a antiguidade, estudar sobre o mar profundo, as pressões o petróleo produz muitos derivados ampla- relacionadas ao uso comercial de seus re- mente utilizados pela sociedade: gasolina, cursos só aumentam. nafta, óleo diesel, asfalto, lubrificante, combustível marítimo, solventes, parafinas, EXPLORAÇÃO plásticos, borrachas etc. Inicialmente, o petróleo foi encontrado Como um todo, os oceanos são impor- em terra, em poços com pouca profundida- tantíssimos para a vida no que se refere à de ou em exsudações na superfície terrestre. regulação climática, aos ciclos de nutrien- Conforme o livro Petróleo em águas pro- tes, à obtenção de energia, à exploração fundas: uma história tecnológica da Pe- de minérios e combustíveis, à produção de trobras na exploração e produção offshore

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(2013), “o primeiro poço exploratório no Além das regiões em terra, segundo o mundo foi aberto na cidade de Balakhani, professor Celso Kazuyuki Morooka, da em Baku, em 1846, com a profundidade de Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM) 21 metros, onde também foi implantada a da Universidade Estadual de Campinas primeira destilaria de petróleo, em 1847”. (Unicamp), há quatro regiões nos oceanos As primeiras explorações de petróleo no que, devido a condições específicas, apre- mar, conhecidas como offshore, ocorreram sentam grande potencial para produção de na última década do século XIX, nas costas petróleo. “Uma é o Golfo do México, entre marítimas da Califórnia. “O poço de petró- o México e os Estados Unidos. Outra fica leo que iniciou as atividades de produção no Mar do Norte, próximo à Noruega e à offshore no Golfo do México foi perfurado Inglaterra. Uma terceira é a região costeira em Caddo Lake, Louisiana, em 1911”, do Brasil, desde o Nordeste ao Sul do País. destaca o livro. Deste modo, a história do E a quarta, e a mais nova de todas, é a costa petróleo offshore é muito recente, se com- oeste da África, que está voltada para o parada à exploração onshore – em terra. continente americano”. Segundo Morooka, Com a evolução tecnológica, a extração essas duas últimas regiões têm um grande de petróleo em mar foi se aprimorando, e potencial no futuro. “A produção brasileira em meados da década de 1980 o petróleo está crescendo, bem como há potencial para já era explorado a profundidades próximas descobrir novos campos”, afirma. a 400 metros. Hoje a exploração já chega O petróleo em mar profundo não come- a milhares de metros – os reservatórios do çou a ser explorado por adivinhação. Estu- pré-sal (descoberto em 2006, na Bacia de dos exploratórios, que utilizam técnicas de Santos, a cerca de 300 km da costa brasi- diversas áreas, permitem obter informações leira) estão a quase 7 mil metros de pro- sobre o fundo oceânico. “É igual ao raio- fundidade a partir do nível do mar, sendo -X, um sinal é emitido, o raio é refletido no cerca de 2 mil metros de água e quase 5 fundo do mar e permite tirar uma imagem mil metros de rochas. Conforme o site da da região. Assim como o médico enxerga Petrobras, o ano de 2016 consolidou o pré- algum problema no raio-X, o geólogo -sal como maior polo produtor de petróleo identifica na imagem se há rocha, areia, sal, do País, superando a produção de 1 milhão petróleo etc.”, compara Morooka. “Identifi- de barris por dia. cando óleo em uma dada área, é furado um A complexidade de extrair matéria- primeiro poço para a confirmação. Em caso -prima dos oceanos aumenta quanto mais positivo, outros poços são perfurados para funda ou longe da costa a extração é rea- avaliar a extensão da jazida e constatar se lizada. Conforme destaca o livro Petróleo ela é economicamente viável”, acrescenta. em águas profundas, a exploração de Autorizada sua extração, dezenas de poços petróleo no mar deve vencer “a velocidade são perfurados na região, o que causará dos ventos, a altura das ondas, as direções impactos. “Fazer uso da matéria-prima que das correntes marinhas, as tempestades, as não está disponível naturalmente produz pressões hidrostáticas decorrentes da colu- impactos, mas esses impactos necessitam na d’água, as baixas temperaturas no fundo ser controlados. Todo poço perfurado tem do mar, a natureza maleável da camada de que ter aprovação do Instituto Brasileiro do sal, as condições estruturais do solo mari- Meio Ambiente e dos Recursos Naturais nho, a composição e o grau de porosidade Renováveis (Ibama). Não é tão simples e das rochas sedimentares, entre outros”. exige fiscalização”, diz o engenheiro naval.

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O professor lembra que, ao extrair o principais regiões onde são encontrados petróleo, vêm água, gás carbônico e gás, depósitos minerais no fundo do mar: em na maioria das vezes todos juntos. “Para zonas profundas (~4.000 m), os nódulos aumentar a produção de petróleo no Bra- polimetálicos; em zonas intermediárias sil, é necessário aumentar a capacidade de (~3.000m), os sulfetos polimetálicos e em processar o gás que vem junto. Eu diria zonas mais rasas (<2.000m), as crostas que esse é o grande gargalo para produzir cobaltíferas – as mais valiosas. o petróleo do pré-sal: a capacidade de tratar Os nódulos polimetálicos, ricos em man- esse petróleo, que também vem com água ganês, níquel, cobre e cobalto, repousam gás carbônico e gás. O gás carbônico não na planície abissal, em áreas relativamente pode ser jogado na atmosfera, então ele é calmas. A área mais rica com esses nódulos injetado na rocha. O gás natural é valioso está no Pacífico, mas se encontram simila- quando está no meu fogão, mas em alto- res no Índico. “No Pacífico Central encon- -mar ele é um prejuízo; contudo, também tra-se a zona de nódulos polimetálicos mais não pode ser jogado fora. As opções são bem estudada e amostrada até hoje (desde injetá-lo na rocha ou criar um sistema via os anos 80), chamada Clarion-Clipperton ductos para que ele possa chegar ao con- Zone – região onde blocos de exploração e tinente. Entretanto, os ductos são muito investigação, regulados por uma autoridade caros, sendo que poucas empresas têm a internacional, foram designados para países capacidade de construí-los. Hoje o grande interessados”, diz Bernardino. Segundo ele, drama está em ter mais ductos. O gargalo estudos têm mostrado a existência de co- da produção de mais petróleo é o problema munidades biológicas únicas na região que logístico e como tratar esse gás natural, poderiam ser impactadas se a mineração pois há distâncias a serem vencidas e o seu fosse iniciada em escala comercial. Desse transporte é muito caro”, explica. modo, a autoridade internacional criou uma Mas o mar profundo não oferece só o série de normas para a futura exploração petróleo como riqueza econômica. Ainda desses recursos, a fim de garantir que os no século passado, em meados dos anos impactos sejam minimizados e que sejam 1970, foram encontradas grandes quanti- mantidas áreas de proteção. “Há regiões dades de metais no Pacífico. “Os estudos onde a exploração de nódulos polimetálicos relacionados a esses depósitos minerais já ocorre, como as Ilhas Cook, no Pacífico”, teve um impulso na década de 70, mas foi acrescenta Millo. colocado na gaveta, e agora ele está sendo Os sulfetos polimetálicos, ricos em retirado da gaveta. A tecnologia do passado ferro, zinco, cobre, prata e ouro, são de- era diferente da atual, e esses elementos pósitos encontrados próximos às regiões eram pouco utilizados, mas hoje eles estão conhecidas como fumarolas ou fontes hi- em muitos produtos industriais. O que drotermais – áreas no fundo do mar onde há no passado não era considerado viável e atividade magmática –, de onde saem jatos interessante, hoje se tornou viável e interes- de água quente em meio às águas geladas. sante”, informa Christian Millo, professor Uma das regiões onde eles são encontrados do Departamento de Oceanografia Física, é na proximidade das Ilhas Galápagos ou Química e Geológica do IO-USP. Atlântico Sul. “Os sulfetos são extraídos A partir dos estudos de mapeamento de fumarolas extintas. Eles são muito in- do fundo marinho, que estão em contínua teressantes, porque, por exemplo, contêm realização, o homem conhece hoje três ouro”, afirma Millo.

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As crostas cobaltíferas, ou também ca exclusiva, o Brasil tem direitos de sobera- crostas de manganês ricas em cobalto, nia para fins de exploração e aproveitamento, formam-se com mecanismos similares aos conservação e gestão dos recursos naturais, de formação de nódulos, mas são mais vivos ou não-vivos, das águas sobrejacentes ricas em cobalto – metal valioso –, além ao leito do mar, do leito do mar e seu subsolo, de conter manganês, níquel, platina, tálio e no que se refere a outras atividades com e telúrio. As crostas não se formam nas vistas à exploração e ao aproveitamento da planícies abissais, mas em afloramentos zona para fins econômicos”. rochosos, a cerca de mil metros, no topo As regiões onde são encontrados os de montanhas submarinas. “O lugar mais depósitos minerais normalmente não fazem próximo do Brasil onde foram encontrados parte de nenhum território – áreas que aca- esses elementos minerais é na Elevação do bam gerando uma disputa geopolítica entre Rio Grande (ERG). O maior interesse nessa nações. Conforme define a Convenção das região está relacionado às crostas, o que não Nações Unidas sobre os Direitos do Mar significa que não possam existir nódulos em (1982), para além das jurisdições nacionais sua parte basal”, explica Millo. o oceano é patrimônio da humanidade. “A Formados, ao longo de milhões de International Seabed Authority (ISA), ór- anos, pelo acúmulo de gão estabelecido pela metais que precipitam Organização das Na- na coluna d’água até Formados, ao longo de ções Unidas (ONU), altas profundidades, os é uma autoridade in- nódulos polimetálicos milhões de anos, os nódulos ternacional que tem e as crostas cobaltíferas polimetálicos e as crostas jurisdição no fundo são alguns dos recursos cobaltíferas são alguns dos do mar e nas águas in- minerais finitos do mar ternacionais, ou seja, profundo. “São com- recursos minerais finitos do áreas além da ZEE. postos principalmente mar profundo Qualquer atividade por ferro e manganês, que seja realizada mas associados a uma nessas áreas deve ter diversidade de outros elementos raros de a permissão da ISA”, explica Millo. grande interesse na indústria high-tech, A ERG, um monte marinho que fica no na produção de telas de celulares, painéis Atlântico Sul, localizado a 3 mil km do li- solares, baterias de carros etc. Ou seja, por toral de Santa Catarina e do Rio Grande do serem elementos essenciais na indústria do Sul, é uma área rica em crostas cobaltíferas futuro e possuírem limitados estoques em (possui 4 mil metros de profundidade e o terra ao redor do mundo, países ricos têm seu topo fica a 800 metros abaixo do nível procurado garantir estoques desses minerais do mar). Como a ERG está situada fora da associados ao fundo marinho – regiões onde plataforma continental, em 2012 o Brasil ocorrem em abundância, primariamente em fez um pedido à ISA para explorar a região. áreas marinhas internacionais, isto é, fora Fruto de uma cooperação entre a de zonas econômicas exclusivas (ZEE)”, USP, a Fundação de Amparo à Pesquisa explica Bernardino. do Estado de São Paulo (Fapesp) e o A ZEE é a área que vai até 200 milhas Natural Environment Research Council náuticas (370 km) a partir da costa territorial. (Nerc), do Reino Unido, o projeto “De- Conforme a Lei 8.617/93, “na zona econômi- pósitos marinhos de ferromanganês: A

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principal fonte de elementos tecnológicos interessante considerar esses recursos (MarineE-thec)” busca levantar questões marinhos”, acrescenta. socioeconômicas na mineração de depó- Pouco se sabe sobre os impactos re- sitos de ferromanganês na ERG. Assim, lativos à exploração desses elementos. muitos pesquisadores estão envolvidos na Contudo, as formas de extração desses caracterização dos ecossistemas presentes minerais diferem e, consequentemente, na região, buscando identificar e quantifi- seus impactos também. “Os nódulos são car o potencial de impactos antropogêni- soltos, sendo colhidos como se fossem cos, bem como mapear a biodiversidade, batatas. Do ponto de vista operacional, tipos de habitat, processos e serviços a dificuldade em coletá-los está ligada à ecossistêmicos. No final de 2016, um profundidade. As crostas estão em contato grupo de cientistas brasileiros, junto com com a rocha muito dura, e tentar tirá-las é pesquisadores ingleses, realizou estudos mais complicado. Os sulfetos talvez sejam em crostas cobaltíferas numa montanha os mais simples, porque são fragmentos submarina próxima às Ilhas Canárias. de chaminés que estão desativadas. Para Em 2017, pesquisadores do IO-USP pre- isso seria necessário um robô submari- tendem fazer o mesmo trabalho na ERG. no que conseguisse quebrar e coletar o Essas pesquisas buscam estudar, na re- fragmento”. gião, os chamados Elementos Terras Raras “Como cientista, eu tenho um olhar que (ETR). “Um dos mais importantes minérios vai além do aspecto econômico. Primeiro, que encontramos hoje, tanto no continente há muitos aspectos ligados ao mecanismo como no oceano, são os ETR”, diz Millo. de formação dos nódulos e das crostas, O fundo do mar possui mais ETR do que que ainda não foram esclarecidos. Mais ou as rochas continentais. O grupo de ETR menos se conhecem quais são os processos inclui um conjunto de 17 elementos quími- de formação, mas ainda não está clara a cos como: lantânio (La), lutécio (Lu), ítrio influência biológica que poderia facilitar (Y) e escândio (Sc). Embora nomes nada a formação desses depósitos”, diz Millo, conhecidos, são elementos que, cada vez frisando que a hipótese de que a concen- mais, estão presentes na vida do homem. tração de metais nos nódulos seria mediada “Eles são usados em muitas tecnologias por microrganismos merece ser estudada atuais que são fundamentais da vida mo- detalhadamente. “Ainda há muito o que derna, como os smartphones e os tablets”, ser descoberto. Mas, se for comprovado explica o pesquisador. que realmente os microrganismos ajudam “Hoje a China tem praticamente um na formação desses metais, em um futuro monopólio da produção dos ETR. Isso poderia haver a possibilidade de ‘cultivar’ significa que ela determina o seu preço”, depósitos polimetálicos”, revela. informa Millo. “Os reservatórios desses “Vai chegar um momento em que vamos elementos nos continentes não são muitos, parar de extrair metais, tanto de regiões oce- e no oceano eles são encontrados em águas ânicas como continentais, e o ser humano irá internacionais ou em águas territoriais produzir de forma artificial os metais de seu de países que não são poderosos, como interesse. Eu gosto de sonhar isso, mesmo as ilhas do Pacífico, com uma economia que seja muito complicado entender como ligada ao turismo, à pesca etc. Então, por o sistema funciona, penso que o ser humano uma série de questões geológicas, econô- precisa ir nessa direção”, analisa o pesquisa- micas e também políticas, tem se tornado dor, refletindo que as riquezas produzidas no

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fundo do mar são findáveis, como o petróleo, nas planícies abissais e é influenciada e que a produção de determinados elementos pela latitude – ao Norte diminui e ao Sul de forma artificial seria um caminho mais aumenta (diversidade favorecida pela An- viável, transformando esses elementos em tártica). “A macrofauna do mar profundo recursos renováveis e causando menos é estimada em mais de 10 milhões de es- impacto ao meio ambiente. “A ideia é, em pécies. Há ainda 90% a 95% dessa fauna vez de concentrar esforços para a extração, que são desconhecidos”, quantifica Perez. concentrar esforços para a produção desses Em meados do século XIX, o natura- minerais em laboratório”, analisa. lista inglês Edward Forbes (1815-1854), “Os nódulos estão lá há milhares, até estudando o Mar Hegeu, estabeleceu uma milhões, de anos. As camadas formam-se teoria de que não havia vida abaixo dos lentamente, um milímetro em milhares 600 metros de profundidade. Ao longo ou milhões de anos. Os nódulos possuem dos anos, expedições para fins econômicos uma história, e o ser realizadas em fundos humano precisa ser oceânicos revelaram sagaz para entendê- É o mar profundo que uma rica fauna no fun- -la. Conhecendo como abriga uma das maiores do do mar. “A Teoria esses metais se estabe- diversidades biológicas do Azóica de Forbes caiu leceram, o homem po- por terra antes do fim deria tentar criá-los em planeta – a maioria das do século XIX, pois laboratório, acelerar o espécies é rara e composta várias expedições ma- processo de formação rinhas demonstraram e, se possível, con- principalmente pela fauna a existência de vida centrar os elementos de pequeno tamanho, há mais de mil metros mais interessantes – já menor do que 1 milímetro de profundidade – a que a concentração dos mais conhecida foi a elementos é na ordem expedição Challenger de 1% da massa do nódulo. E se a gente (1872-1876)”, lembra Perez. conseguisse produzir um nódulo com 5% Entretanto, somente na década de 1960 os da massa total? Será que a natureza pode cientistas constataram a grande diversidade nos ensinar a fazer isso?”, questiona Millo. no mar profundo. “Foi quando iniciou-se o uso das redes com malhas entre 250 e BIODIVERSIDADE 500 micrômetros, permitindo a coleta de amostras da biota menores do que 1 milí- Hoje já se sabe que todos os filos metro. Ou seja, o aumento da estimativa de animais têm representantes marinhos – biodiversidade do mar profundo se deve ao diversidade que é distribuída das zonas estudo de animais muito pequenos que vi- costeiras às profundas, dos polos às zonas vem no sedimento oceânico”, explica Perez. tropicais. Contudo, é o mar profundo que Segundo o professor, nessa fração da biota abriga uma das maiores diversidades estão presentes diversos organismos, inver- biológicas do planeta – a maioria das es- tebrados (nematódeos, anelídeos, moluscos, pécies é rara e composta principalmente crustáceos), esponjas, equinodermos (estre- pela fauna de pequeno tamanho, menor do las, crinoides, ouriços e pepinos do mar), que 1 milímetro. Essa diversidade atinge cnidários (anêmonas e corais), cefalópodes o pico entre 2 mil e 3 mil metros, diminui (polvos e lulas) e peixes.

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devido à extrema escassez de alimentos, o que faz com que a densidade numérica seja baixa. Contudo, se você continuar amostran- do, verá que o número de espécies aumenta a cada amostra, sem mostrar uma tendência a diminuir. Há muitas espécies raras no mar profundo, onde há ambientes especiais, que aumentam sua complexidade estrutural, ge- rando mais espécies”, relata Sumida. As teorias mais recentes apontam que a alta biodiversidade de espécies no mar profundo ocorre em parte pela sua imensa extensão espacial e pela alta diversidade de habitats. “Apesar de aparentemente homogêneo, escuro e pobre em alimento, muitas espécies evoluíram para aproveitar as menores oportunidades de alimento e de habitat que existem, levando a extre- Polvo de mar profundo mas adaptações e especiação ao longo de (Foto: Laboratório de Ecologia e Evolução milhares de anos. Um processo similar às de Mar Profundo - Lamp/IO-USP) florestas tropicais: apesar de não existirem “A explicação para a diversificação de árvores, há uma variedade de espaços no espécies, ainda hipotética, está associada à mar profundo, como poros sedimentares, escassez de alimento. Uma vez depositado corais, fontes hidrotermais, montanhas como matéria orgânica, o alimento, que submarinas e outros diversos habitats que vem da superfície do oceano, sustenta as abrigam espécies únicas”, diz Bernardino. comunidades profundas. Desse modo, a Há locais no oceano profundo com ca- biomassa de organismos bentônicos decai racterísticas específicas, como na planície exponencialmente com a profundidade”, abissal – com mais de 4 mil metros de explica Perez. Ainda, a distribuição dessa profundidade –, onde em alguns pontos há biodiversidade não é homogênea: há zonas Zonas de Mínimo Oxigênio (ZMO). Um com elevada biodiversidade e baixa bio- exemplo são as zonas de ressurgência, massa (como as abissais) e zonas com alta como na costa do Peru/Chile, onde a fau- biomassa e baixa biodiversidade (como as na bentônica é emprobrecida. Há poucos hidrotermais). “Há comunidades específicas locais em que não existe oxigênio, como em montanhas submarinas, dominadas por ao redor das fontes hidrotermais – rochas invertebrados suspensívoros e faunas das que estão em atividade vulcânica e liberam fossas abissais com grande presença de água a cerca de 400°C. Nessas regiões são anfípodes carniceiros”, diz Perez. estabelecidos ecossistemas únicos, onde Embora a diversidade no mar profundo bactérias quimiossintetizantes vivem em seja alta, normalmente as populações en- simbiose com outros organismos. As fon- contradas são pouco abundantes, ou seja, tes hidrotermais, as exsudações frias e as há poucos indivíduos por espécie. “Se você carcaças de baleias são regiões quimiossin- coletar uma amostra no mar profundo, vai tetizantes onde são encontrados organismos encontrar pouquíssimas espécies. Isso é com adaptações ainda mais específicas e

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surpreendentes. “Em zonas hidrotermais, De acordo com Perez, são muitas as a energia química de compostos liberados adaptações dos organismos do mar profun- é utilizada por micróbios associados a ani- do para viverem em condições ambientais mais ou de vida livre, que conseguem usar específicas de pressão, temperatura, oxigê- essa energia para produzir alimento sob a nio, luz, nutrientes, matéria orgânica etc. forma de biomassa ou compostos orgâni- “A bioluminescência é uma regra e não cos. Assim, próximo a esses ecossistemas uma exceção e está presente desde bacté- há organismos especializados para utilizar rias até peixes e lulas. O tecido gelatinoso essa energia abundante, gerando uma maior também é comum, já que diminui o gasto concentração de vida nessas áreas”, infor- energético, importante em um ambiente ma Bernardino. onde a comida é escassa”, diz. “Alguns A vida, seja em terra ou na água, em grupos de invertebrados apresentam formas condições ideais, é dependente de oxigênio, ‘gigantes’, mas outros apresentam formas energia solar e temperatura. No mar pro- ‘anãs’. Acredita-se que ambas as tendências fundo há uma grande limitação orgânica, derivam das adaptações à falta de alimento, pois é uma zona perenemente escura sem já que maiores tamanhos favorecem um produção fotossintética. “Grande parte do menor metabolismo e menores tamanhos alimento que sustenta a vida do mar pro- favorecem a manutenção de populações fundo é produzida em zonas superficiais maiores e mais viáveis”, acrescenta. – onde há produtividade fotossintética As comunidades biológicas nos oce- – e é lentamente transportada por meio anos mudam de acordo com a profun- do afundamento de partículas até o leito didade e com diversas outras variáveis oceânico”, relata Bernardino. Então, como ambientais, pois são adaptadas a condições explicar a manutenção da vida em condi- ótimas para crescimento, alimentação e ções extremamente adversas? Para Sumida, reprodução. “Em altas profundidades, as o homem vê as coisas de um ponto de vista espécies em geral devem possuir adap- antropocêntrico. “Geralmente pensamos tações para lidar com as altas pressões, que o ambiente é extremo, mas apenas o é as baixas temperaturas e a escassez de para os organismos que não evoluíram lá, alimento. Essas três condições favorecem como os humanos. De fato, o ambiente fez grupos de organismos que são adaptados com que houvesse a seleção de organismos para obter alimento rapidamente (alguns capazes de lidar com as altas pressões e a organismos com aparente ‘gigantismo’), falta ou escassez de alimentos”, reflete. ou que podem aproveitar a mínima quan-

Peixe do gênero Spectrunculus fotografado pelo Shinkai 6500 a cerca de 3 mil metros de profundidade (Foto: Japan Agency for Marine-Earth Science and Technology

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tidade de material orgânico que afundou”, passou a ser interesse de muitas nações. explica Bernardino. Essa exploração está em fase incipiente, Sumida diz que os cientistas sabem pois a tecnologia para extração desses mi- mais sobre a distribuição e a composição nerais (nódulos, crostas, sulfetos) ainda não dos habitats do que sobre a biologia das está disponível. Mas existe uma ‘corrida’ espécies que compõem o fundo do mar. dos países para tentarem ‘reservar’ seus “Há mistérios, lendas e muitos conceitos espaços no mar profundo para quando a equivocados sobre o mar profundo. Apesar tecnologia existir”. disso, há organismos que captam a imagi- Para o pesquisador, felizmente existe nação humana, como as lulas gigantes e uma discussão intensa, que envolve órgãos os peixes-diabo – animais que realmente da ONU e Organizações Não Governamen- existem”, revela. tais (ONG) internacionais, a respeito de políticas internacionais para preservação IMPACTOS e uso sustentável do oceano profundo. “Muitos acham ainda temeroso o sucesso Embora pouco conhecidos, os oceanos, dessas políticas, mas, se pensarmos nas há muito tempo, são grandemente impacta- regiões costeiras em geral, a discussão só dos pelo homem com a exploração pesquei- ocorre depois que o impacto já ocorreu. ra, a poluição com deposição de resíduos, No mar profundo há uma chance de se ter interferências com a mineração e a extração alguma antecipação”. de petróleo e de gás, entre outras atividades. De acordo com Bernardino, os impac- “Nos anos 1970 e 1980, utilizavam o mar tos nos oceanos são extremamente variá- profundo para despejo de lixo radioativo. veis. “Normalmente a pesca se concentra Isso cessou, mas o material continua lá”, em zonas de maior produtividade marinha, informa Sumida. “É difícil estimar a exata que são intensamente impactadas por extensão dos impactos, mas podemos afir- arrastos e sobre-exploração de estoques. mar que todos os ecossistemas oceânicos já A poluição urbana está próxima às zonas sofreram, em variado grau, algum tipo de costeiras e aos estuários, onde grande interferência humana”, alega Bernardino. parte encontra-se em lastimável estado Perez faz uma avaliação dos impactos de conservação. A extração de óleo e gás gerais: “Pode-se dizer, com segurança, está cada vez mais se dirigindo a grandes que o homem já deixou rastro em todos os profundidades, o que gera grande preo- estratos de profundidade em várias regiões cupação, pois aumenta a pressão sobre do mar profundo. Eventos de sobrepesca ecossistemas pouquíssimo estudados e foram diagnosticados em regiões profun- distantes do olho humano. Isto é, se houver das (inclusive no Brasil), principalmente um impacto no mar profundo próximo a sobre montanhas submarinas, onde, além uma plataforma a 2 mil metros de pro- das espécies de interesse, reporta-se à des- fundidade, não teremos a menor ideia de truição de ambientes coralinos profundos sua extensão ou seus efeitos”, afirma o praticamente irrecuperáveis. A extração professor. “A presença de microplásticos de petróleo tem sido intensa nas margens nos oceanos também é assustadora. Eles continentais e também tem ocasionalmente já foram encontrados desde zonas costei- gerado impactos, como a recente New Ho- ras até em altas profundidades, inclusive rizon, no Golfo do México. Muito se fala na dentro de organismos de mar profundo, exploração mineral no mar profundo, que indicando que a fauna marinha vem se ali-

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mentando indiretamente desses poluentes tardia, longevidade, descontinuidade de introduzidos pelo homem”, alerta. populações etc. E o quanto essas espécies Segundo Bernardino, a maior ameaça estão ameaçadas? Um exemplo são os aos ecossistemas profundos são a pesca de peixes que podem ser capturados por ope- arrasto e a indústria offshore. “No Brasil, rações comerciais de pesca. “São muitas a extensão do impacto por arrasto em famílias com representantes em águas mais comunidades profundas já foi reportada rasas. Porém as histórias de vida apontam em alguns locais, mas ainda não há uma para atributos únicos que conferem uma ampla visão de seus efeitos. Ou seja, em baixa produtividade e, portanto, pequenas geral se conhecem as áreas de pesca, mas oportunidades de recuperação de biomassa não existem dados que avaliem quantitati- perdida”, diz Perez. vamente seus impactos, nem propostas de As pescas de profundidade são consi- manejo dessa atividade”, diz. “Na indús- deradas a “mineração de recursos vivos”. tria offshore, o Brasil tem enormes áreas Elas podem ser pesca de arrasto de fundo ou licenciadas para produção ao longo da sua semipelágico, pesca de espinhel de fundo e margem continental profunda, ainda que pesca com armadilhas. O desenvolvimento grande parte dessas áreas delimitadas pelo da pesca profunda no mundo, na década governo tenha sequer sido amostrada efe- de 1980, levou à rápida depleção de vários tivamente. É o mesmo que delinear blocos estoques locais. Na última década, os esfor- de exploração na Amazônia sem ter ido ços internacionais para conter ou restringir lá verificar o que existe, mas com uma a atividade foram intensos, e estima-se que diferença importante: na floresta teríamos possam se recuperar, especialmente em re- imediatamente conhecimento de impactos giões onde a proteção é total. “As espécies da atividade, enquanto no mar profundo mais comentadas no Atlântico são as que não possuímos essa exata ideia”, analisa. se pescam sobre as montanhas submarinas, O professor ressalta a preocupação com a como orange roughy (Hoplostetus atlan- possibilidade, mesmo que remota, de aciden- ticus), oreos (várias espécies da família tes em altas profundidades e da sua incrível Oreosomatidae), alfonsinos (Beryx spp.), complexidade logística para remediação. “O merluza negra (Dissostichus eleginoides). acidente da plataforma da BP, no Golfo do Mas há muitas outras, incluindo: camarões- México, foi um terrível exemplo de como -de-profundidade (família Aristeidae), um acidente como aquele pode impactar caranguejos-de-profundidade (Chaceon desde comunidades profundas até zonas spp.) e peixes-rato (muitas espécies da costeiras. Exemplos recentes mostraram o família Macruridae)”, informa Perez. quanto o Brasil está despreparado para gran- “O Hoplostetus atlanticus é o exemplo des acidentes ambientais”, diz Bernardino. clássico, bastante explorado nas montanhas Um deles é o desastre na cidade Mariana, em submarinas do Atlântico e Pacífico e com Minas Gerais, em que dejetos de mineração acúmulos de eventos de sobrepesca, prin- impactaram diversos ecossistemas, inclusive cipalmente na Nova Zelândia e na Austrá- atingindo o Oceano Atlântico. lia. A espécie pode atingir no máximo 70 Em geral, as espécies e os habitats centímetros, mas para isso pode precisar do mar profundo são mais vulneráveis e de 150 anos de vida. Poucos acreditam que menos resilientes do que as espécies e os explorar esse tipo de história de vida possa habitats de zonas menos profundas – por ser sustentável, o que tem movimentado o conta de crescimento lento, maturidade debate internacional para o banimento com-

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pleto da pesca profunda”, aponta Perez. No deste processo engloba tanto aspectos da Brasil, a pesca atual do talude se concentra biologia das espécies marinhas quanto as- no peixe-sapo (Lophius gastrophysus), na pectos econômicos, sociais e políticos”, diz. merluza (Merluccius hubbsi) e no abrótea- Outras informações podem ser extraídas do -de-profundidade (Urophycis mystacea). O artigo “The Western South Atlantic Ocean

professor ressalta: “A pesca profunda tem in a High-CO2 World: Current Measure- que ser muito limitada, em termos de em- ment Capabilities and Perspectives” (2016) barcações, e muito regulamentada, tanto no ou do site da rede de Pesquisa Brasileira em que se refere à taxa de remoção do estoque Acidificação dos Oceanos (BrOA). (% removido da biomassa por ano), que “Hoje, 30% das emanações antrópicas

deve ser muito pequena (<5%), como aos CO2 para a atmosfera são absorvidas pelos cuidados para minimizar a perturbação dos oceanos. Essa absorção ocorre majoritaria- habitats bentônicos”, acrescenta. mente nas regiões polares do globo, devido Para Perez, muitos cientistas afirmam que às baixas temperaturas nas regiões superfi- o pior impacto nos oceanos é aquele que re- ciais. Entretanto, estas águas superficiais, sulta das mudanças globais do planeta, pois após sofrerem processos de modificação está provado que afetará e mistura com outras ambientes profundos. massas de água, são “A acidificação dos O esforço principal é extremamente densas e oceanos deverá afetar a afundam para grandes sobrevivência de corais garantir áreas intocadas, profundidades para profundos e acarretar reservas marinhas preencher o oceano uma possível expansão profundas que sirvam profundo do globo. de ZMO, com grandes Desta forma, o excesso de salvaguarda para os consequências na dis- de CO2 é transportado tribuição de organismos processos e serviços do para regiões de pro- marinhos. Enfim, hoje fundidades intermedi- se contabiliza quantos mar profundo árias, profundas e de serviços o mar profundo fundo”, explica Kerr. presta à humanidade e já se demonstra que E então surge um questionamento: será impactos na superfície têm repercussão em possível restabelecer o que já se perdeu? processos profundos, colocando em risco a O professor é categórico: “Não. O oceano provisão desses serviços. Talvez a preocu- possui uma memória longa. As taxas de pação principal desse impacto é que ele não circulação dos oceanos possuem uma di- é localizado, como a pesca ou a mineração, nâmica muito lenta (da ordem de centenas mas se aplica a todo o oceano”, analisa. a milhares de anos) quando comparada A acidificação dos oceanos também é às taxas de movimento da atmosfera, por apontada como um grave problema pelo exemplo. No caso do efeito do processo de professor Rodrigo Kerr. Tendo em vista acidificação, mesmo que as taxas atuais de

que o CO2 é um gás que reage com a água lançamento de gases de efeito estufa sejam do mar, o efeito da sua adição no oceano estagnadas a zero, com o lançamento e a

resulta no processo conhecido como acidi- absorção atual de CO2 no planeta estima-se ficação dos ceanos – em que as águas estão que o pH das águas tenha um declínio entre se tornando mais ácidas desde o início da 0.3 e 0.4 unidades (as taxas de diminuição Revolução Industrial. “As consequências reportadas desde a Revolução Industrial até

RMB3oT/2017 81 NAS PROFUNDEZAS DOS OCEANOS os dias de hoje encontram-se na ordem de densidade das águas de fundo nas regiões 0.1 unidade de pH). Os efeitos de retroali- formadoras de massas de água, resultante mentação, ou seja, os oceanos emitindo CO2 principalmente do derretimento e despren- para a atmosfera, ainda não são completa- dimento de plataformas de gelo permanente mente compreendidos, o que só agravaria a devido ao aquecimento global, que pode ser problemática atual. Mas sabe-se hoje que acessado no trabalho “Multidecadal freshe- as regiões absorvedoras estão perdendo sua ning and lightening in the deep waters of capacidade de absorção. Assim, em longo the Bransfield Strait, Antarctica” (2016). prazo poderíamos ter uma situação de efeito “Outro resultado identificado pelo grupo, estufa no planeta sendo acentuada (devido que é apresentado no artigo “Carbonate a liberação do CO2 de origem antrópica system properties in the Gerlache Strait, armazenado pelos oceanos)”. Northern Antarctic Peninsula (February 2015): II. Anthropogenic CO2 and Seawater Aci- dification” (2017), é que zonas costeiras do Oceano Austral já apresentam sinais de acidificação na coluna de água devido ao armazenamento de carbo- no antropogênico”, revela. “Acredita-se muito pouco em recuperação, ao menos não na escala de tempo da espécie humana. Mas há iniciativas científi- cas tentando compreender Navio Polar Almirante Maximiano, da Marinha do Brasil, o que se pode fazer, como, em campanha oceanográfica no Oceano Austral (Foto: Grupo de Oceanografia de Altas Latitudes (GOAL)) por exemplo, estimular o crescimento de coral pro- O professor também destaca que o seu fundo”, analisa Perez. Assim, atualmente o grupo de pesquisa identificou um aumento esforço principal é garantir áreas intocadas, da temperatura das águas profundas e de reservas marinhas profundas que sirvam de fundo no Oceano Austral, conforme em salvaguarda para os processos e serviços artigo “Trends in the deep Southern Ocean do mar profundo – o maior ambiente do (1958–2010): Implications for Antarctic planeta, composto por vastas planícies Bottom Water properties and volume ex- abissais, longas cordilheiras submersas, port” (2013). Além disso, identificaram excêntricas formas de vida, que dificilmen- mudanças na salinidade (diminuição) e te o homem conhecerá em sua totalidade.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Estudo de oceano; Ciência do mar; Instituto de Estudos do Mar; Oceonografia;

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LUIZ OCTAVIO DE CASTRO CUNHA*** Arqueólogo Mergulhador

SUMÁRIO

Introdução Histórico Interpretação do achado submarino Análise técnica – disposição atual das quadrículas Noções de restauração do bronze arqueológico Conclusão

INTRODUÇÃO na Praia dos Ingleses, Barra Norte da Ilha de Santa Catarina, os destroços da Nau m setembro de 2002, integrantes da Nuestra Señora del Pilar, embarcação de Eequipe do Projeto de Arqueologia madeira de dimensões consideráveis. Subaquática (PAS)1 – Marcelo Moura, Após a descoberta, ficou provado que a Narbal de Souza Correa e Alexandre Viana, insistência em se formular teorias, adaptar sob orientação deste autor – descobriram técnicas de mergulho avançadas e aplicar

* Peça de artilharia antiga em bronze, de pequenas dimensões, utilizada no convés superior das embarcações. ** Título original do artigo: “A câmara – peça arqueológica (carregador de bronze) – de falconete recuperada no sítio arqueológico submerso PAPI-01-SC, a mais antiga localizada no Brasil – uma abordagem técnico- -interpretativa”. O texto é uma adaptação da dissertação para obtenção do título de mestre em Arqueologia pelo autor. *** Arqueólogo Mergulhador, servidor civil da Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha (DPHDM). Mestre em Arqueologia. Doutorando em Arqueologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. 1 Organização Não Governamental subvencionada pelo governo do Estado de Santa Catarina e autorizada pela Marinha do Brasil e pelo Ministério da Cultura desde fevereiro de 2004, a realizar exploração e remoção da Nau Nuestra Señora del Pilar. O naufrágio histórico havia sido localizado em agosto e setembro de 2002. O trabalho arqueológico no local foi possível graças à Lei Federal no 10.166, de 27 de dezembro de 2000, e à Normam-10 (Norma da Autoridade Marítima), da Diretoria de Portos e Costas (DPC), que regulamentam o trabalho de exploradores e mergulhadores de remoção de peças encontradas no fundo do mar. A CÂMARA DE FALCONETE MAIS ANTIGA LOCALIZADA NO BRASIL – Uma Abordagem Técnico-Interpretativa

metodologias científicas, teorias clássicas mas amostras do armamento naval e outras e inovadoras em Arqueologia Subaquática peças arqueológicas recuperadas do mar. traz resultados palpáveis, duradouros e significativos. HISTÓRICO O desenvolvimento desses projetos científicos contribui para o enriquecimento A cronologia dos trabalhos arqueológi- gradual do patrimônio artístico e cultural cos submarinos será aqui abordada com o submarino brasileiro, bem como vai ao intuito de detalhar com precisão os eventos encontro da tão cobrada e divulgada in- mais importantes que marcaram este proje- clusão social, gerando empregos diretos to científico até o ano de 2006. O período a colaboradores diversos e habitantes histórico estudado comumente entre os locais – pescadores de tainha e artesanais, arqueólogos subaquáticos, principalmente no caso da Praia dos Ingleses –, que hoje no Brasil, estende-se entre 1500 e 1950 – melhor compreendem o objetivo em se padrão americano – ou entre 1500 e 1900 pesquisar sistematicamente o passado de – padrão europeu, convenção dos 100 anos. nossos ancestrais navegadores e a saga O Serviço de Documentação da Marinha2 desses colonizadores oriundos da então passou, a partir de 1996/97, a adotar os dois Europa civilizada. Exemplo disso foi a padrões, em virtude de adição de acervo corrida de canoa açoriana – típica daquela arqueológico doado resgatado no Nordeste, região litorânea – patrocinada pelo PAS em no casco metálico da Corveta Camaquã, dezembro de 2005. A corrida aconteceu na da Marinha do Brasil (MB), afundada em área da descoberta do naufrágio histórico e 1944. A adoção também do padrão ameri- movimentou todas as famílias que sobre- cano, no final do século passado, deveu-se vivem da pesca da tainha, revitalizando as à quantidade considerável de soçobros de técnicas de construção naval e artesanal, já navios afundados durante a Segunda Guer- desaparecidas com o uso diário do bote de ra Mundial, inclusive navios brasileiros. pesca a motor – naquela praia denominado “bote do rio grande”. INTERPRETAÇÃO DO ACHADO Nesse remoto local ao norte da Ilha de SUBMARINO Santa Catarina começou-se a debater com mais frequência, inclusive com a comuni- Todo sítio submerso explorado contém dade local, sobre os prováveis e antigos características diferenciadas, notadamente costumes da guarnição da embarcação quando os vestígios subaquáticos surgem sinistrada no século XVII ou XVIII. Que por meio de escavações metódicas e com habitante mais idoso do local escutara falar a sistemática empregada pela equipe de de achados diferentes naquele canto de mergulhadores. Quando a câmara de bronze praia, entre outros mitos e lendas marítimos surgiu sobre um tabuado de madeira – da região? Mais do que isso, como seria o pranchão – de aproximadamente quatro provável dia a dia de bordo, os trabalhos de metros de comprimento e fragmentado em marinharia, a navegação costeira percorri- sua extremidade, com 12 centímetros de da, a função específica de cada utensílio, os espessura – existindo a probabilidade de se ornamentos recuperados e, por fim, algu- estar mergulhando sobre o convés da popa

2 Hoje denomina-se Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha (DPHDM).

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sucessão de várias leis criadas em todo o mundo para aque- les que pretendem prospectar sítios ar- queológicos, mesmo os situados debaixo d’água” (Rodgers. B., 1996).3 Essa ideia está completamente cor- reta e é aceita não só no Brasil. Qualquer pesquisador ou ex- Figura 1 – Área do sítio submerso (SC) plorador submarino da embarcação sinistrada e de os pranchões de bom senso ou desmantelados estarem dispostos em se- com uma postura ética definida pensaria o quência lateral –, não se poderia imaginar mesmo; porém, infelizmente, a realidade que a câmara do falconete estaria coberta nacional está voltada para a ficção inócua e de rochas – seixos rolados – e rigidamente para a discussão exacerbada de paradigmas fixada entre pedras, rochas, cascalho, areia retrógrados, regionalistas e incoerentes. e outros sedimentos marinhos, que dificul- Esses paradigmas hoje se apresentam em tariam em muito sua lenta remoção. forma de solução pífia e absurda ou em “Num mundo ideal, seria mais adequado artigos literários de qualidade discutível e deixar o sítio como ele está, para deixar nos- calcados em nenhuma experiência prática, sas crianças explorarem o naufrágio como se em comparação com um trabalho de enor- este estivesse sendo visto pela primeira vez, me resistência física no mar, tenacidade para imaginar sobre cada um dos robustos intelectual e complexidade operacional, canhões ou para ficarem maravilhadas com só dominada e compartilhada por Rio de a variedade e as condições dos pequenos Janeiro-Salvador-Recife-Região Sul do botões de latão brilhantes, medalhões ou Brasil. Com certeza absoluta, quatro áreas joias. A realidade é que talvez isto não seja marítimas por excelência e com marcante possível. Sob condições não controladas, herança histórica, náutica e cultural. humanos são coletores naturais; e quanto Devido, provavelmente, a limitação mais pessoas visitarem o sítio, menos ar- físico-financeira e de recursos tecnológi- tefatos (peças arqueológicas) sobrarão, até cos de outros centros urbanos costeiros, que finalmente não sobre nenhum. Isso tem é improvável que outras embarcações de acontecido seguidamente, e é a razão da madeira dos séculos XVI, XVII ou XVIII

3 Bradley Rodgers, Ph.D., conservador chefe e restaurador da Universidade da Carolina do Leste no Programa de Mestrado em História Marítima e Arqueologia Náutica. Seu comentário refere-se à dificuldade de se manter um controle sobre os visitantes indesejáveis nos sítios submersos dos séculos XVI, XVII e XVIII. Ele opina que os seres humanos são coletores naturais que não se contentam em observar. Neste caso, o trabalho submerso dos arqueólogos subaquáticos profissionais graduados em escolas especializadas de Arqueologia Submarina, Náutica ou Marinha é importante e imprescindível para a preservação da cultura marítima.

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sejam localizadas com o rigor científico Sobre a Proteção do Patrimônio Cultural exigido e de acordo com a legislação Subaquático, da Unesco – da qual o Brasil vigente e as últimas leis de naufrágios não é signatário, pois tem sua própria lei – brasileiras publicadas – por exemplo, a de é acreditar no conto infanto-juvenil Vinte no 10.166, de 2000, que modificou com mil léguas submarinas, de Julio Verne. É a propriedade alguns artigos da antiga Lei pseudoideia de uns poucos se contrapondo no 7.542, de 1986. a de muitos outros arqueólogos mais ex- É de bom termo lembrar que existem perientes e conhecidos na mídia nacional. dois ditados populares clássicos no mergu- Aquela vertente está em desacordo com as lho autônomo e técnico, e não só no recrea- metodologias de quase duas gerações de tivo, que jamais devem ser esquecidos e de arqueólogos-mergulhadores no Brasil que serventia a todo mergulhador credenciado, de fato participam do trabalho de campo ou brevetado – como classificam algumas quando submersos. Está também em rota escolas de mergulho, principalmente no de colisão com a legislação de sinistros universo carioca. O primeiro diz: “O mer- marítimos vigente no País desde 2000, gulho não tem plateia” (Romariz Silva, já que as leis brasileiras sobre naufrágios 1980), ou seja, não devem ser produzidos garantem o trabalho de pesquisa científica filmes exibicionistas ou amadorísticos em em Arqueologia. No máximo, aceitar-se- Arqueologia Subaquática. Estas iniciativas -iam teorias arqueológicas em que se pode pessoais, de voluntários ou curiosos, ine- discutir em ambiente acadêmico o que para vitavelmente criarão um confronto ciência a Arqueologia Subaquática operacional, versus oportunismo/ignorância. O segundo especificamente, é irrelevante, secundário ditado, anônimo, prega: “A ganância exa- e sem propósito; o objetivo de tanto es- cerbada leva à morte”. Isso significa que, forço técnico-científico, mesmo orientado no ambiente submarino, o desespero em se pela ciência humana da Arqueologia, é se trazer à superfície ouro, prata, joias ou qual- obter o maior número possível de dados quer outra peça histórica ou arqueológica arqueológicos de cada naufrágio estudado de valor requer treinamento, técnica e muita sistematicamente. Nesse sentido, não cabe paciência. Mesmo para mergulhadores expor uma relação extensa de empecilhos ao profissionais experientes, esse trabalho ar- trabalho submarino, transpondo para a alta- queológico diário torna-se árduo. Sem citar mente especializada arqueologia sob o mar o nomes, fica aqui nossa singela homenagem que é uma discussão da Arqueologia Geral. e nosso respeito sincero aos quatro mergu- Esta forma de tratar a Arqueologia lhadores destemidos que pereceram no mar mais realisticamente é a base do pensa- em atividades arqueológicas subaquáticas, mento de George F. Bass, autor do artigo ou vinculados às mesmas, nos últimos 26 “New tools for undersea archaeology” anos, quando talvez estivessem realizando (“Novas ferramentas para a arqueologia os sonhos de suas profissões, com a sensa- submarina”)4. Esta visão é mais acertada ção única de contentamento em descobrir e ainda quando se trata de um país como explorar um antigo naufrágio de madeira. o Brasil, em que 8.500 quilômetros de Acreditar na vertente da Arqueologia área costeira desafiam os pesquisadores Náutica brasileira que segue a Convenção e exploradores da atualidade. Aceitar a

4 Ph.D., diretor de Arqueologia do Instituto de Arqueologia Náutica no Texas, um dos pioneiros da Arqueologia Submarina nos EUA. Artigo publicado na National Geographic Magazine, 1967.

86 RMB3oT/2017 A CÂMARA DE FALCONETE MAIS ANTIGA LOCALIZADA NO BRASIL – Uma Abordagem Técnico-Interpretativa existência de duas vertentes (da Unesco, entre outros trabalhos, do artigo “Explo- mundial; e da nacional) divergentes é ring a civil war sidewheeleer” (1994), discussão antiga, que remonta ao final sobre o casco misto de madeira e ferro século XIX e início do XX, no início da do Maple Leaf, transporte da Marinha da Arqueologia no Ocidente, coincidente com União Americana. a teoria da Nova Arqueologia defendida por Montelius, Childe, Tonsem e Binford ANÁLISE TÉCNICA – e outras. Estes arqueólogos e pensadores DISPOSIÇÃO ATUAL DAS teórico-metodológicos da Arqueologia QUADRÍCULAS começaram a lutar contra os conceitos retrógrados que determinavam o que era No que concerne à análise da câmara da certo ou errado na pesquisa arqueológica peça em bronze de artilharia antiga, é pos- de então. Ou seja, a teoria utópica de não sível afirmar que sua base apresentava uma se remover nada do sítio submerso leva a pequena protuberância para encaixe – trava duas deduções lógicas: ou seus defensores – no falconete leve fundido, seguindo-se não são arqueólogos profissionais, como outras medições que serão discriminadas se requer hoje de qualquer arqueólogo abaixo e exemplificadas por fotografias. diplomado – bacharel oriundo de entidade 1) Comprimento total – do bocal até a acadêmica conceituada –, ou sequer sabem extremidade da trava, na base da câmara remover tecnicamente artefatos arqueoló- = 26,6 cm. gicos do fundo do mar, de rios, de lagoas e 2) Altura – h – da extremidade da trava de cavernas alagadas e restaurá-los em la- até a haste superior da alça, onde o artilhei- boratório, na sequência lógica do trabalho ro segurava a câmara = 15,1 cm. de campo. Note-se que alguns países que 3) Comprimento do vão da alça – inter- defendem este pensamento possuem cole- no –, onde o artilheiro segurava a câmara ções arqueológicas riquíssimas retiradas = 10 cm. do mar, de rios, lagos, poços ou lagoas; to- 4) Diâmetro do bocal = 8 cm. davia, querem impedir, por meio de regras 5) Diâmetro da base = 12,2 cm. internacionais, que outros países – leia-se 6) Comprimento da trava da base = aqueles com rica herança colonial, cultural 1,2 cm. e material – também possam buscar essas 7) Altura da haste da alça – h – da base relíquias navais e levá-las a museus, em inferior até a haste superior = 9 cm. mostras públicas para toda a população. O 8) Peso da câmara = 11 kg. arqueólogo Lawrence E. Babits5, da East 9) Cronologia de uso deste tipo de fal- Carolina University (ECU)6, é um dos conete nas Marinhas – do século XVI até defensores da corrente mais realistíca do início do século XVIII. trabalho arqueológico, que trabalha não só 10) Peça arqueológica de artilharia com ideais, mas com o objeto dentro de antiga, escavada, localizada, removida seu contexto arqueológico. Babits é autor, tecnicamente e restaurada nos padrões

5 Lawrence E. Babits, Ph.D. Diretor interino do Programa de Mestrado em História Marítima e Arqueologia Náutica. Universidade da Carolina do Leste. 6 East Carolina University – Universidade da Carolina do Leste. Instituição de ensino superior estadunidense lo- calizada na cidade de Greenville, Carolina do Norte, e sede do Programa de Mestrado em História Marítima e Arqueologia Náutica.

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d’água de 500 litros7 e controle dessa fase inicial por parte de membros do PAS, não foram observados numerais gravados ou ranhura profunda. Neste período de mais de um ano em água doce – armazenado –, a peça arqueológica de artilharia antiga foi observada continuamente, inclusive confirmando-se a existência, no momento do afundamento, de uma ou mais bocas de fogo na embarcação histórica sinistrada. Posteriormente à dessalinização inicial por troca de água, foi aplicada uma técnica de imersão em água destilada, posterior- mente filtrada, aquecida por mergulhão até 100º Celsius, em uma corrente de 220 volts, o que tinha por propósito retirar to- dos os sais impregnados no artefato. Esse procedimento durou três meses do ano de Figura 2 – Falconete antes da restauração com 2004. A câmara – carregador – foi posi- químicos e água cionada dentro de um recipiente de vidro científicos da Arqueologia Subaquática pelo com 40 litros de água que podia ser vista autor. Posteriormente, foi acondicionada no de fora para dentro, sendo o procedimento museu local do PAS, na Praia dos Ingleses, acompanhado diariamente por um dos para exposição pública. membros da PAS, por meio de uma ficha de restauro. Quando a água do recipiente NOÇÕES DE RESTAURAÇÃO DO tornava-se turva, ou quando adquiria uma BRONZE ARQUEOLÓGICO coloração marrom-esverdeada, era trocada por água limpa – mais 40 litros –, e assim A câmara do falconete leve de bronze por diante. Na semana final desse tratamen- – objeto ou artefato – em questão sofreu to, a água utilizada no recipiente de vidro um processo lento e gradual de limpeza foi a filtrada. superficial e interna, que durou inicialmente Passada essa fase, iniciou-se a secagem mais de um ano de dessalinização desde ao ar antes dos banhos contínuos de ácido sua remoção do mar. Após a troca de água nítrico – NH28 –, necessários para a remo- mensal – trinta em trinta dias – em caixas ção das cementitas9 ainda existentes em al-

7 Este método é empregado para garantir uma lenta e progressiva dessalinização das peças arqueológicas e his- tóricas que estão no início do tratamento de conservação e restauração. 8 NH2 – fórmula da composição do ácido nítrico, indicado para o tratamento químico de peças arqueológicas de bronze provenientes do meio líquido salgado. 9 Termo técnico utilizado em Arqueologia Subaquática e restaurações para designar cobertura de concreções de extrema dureza, comparada a do cimento. Após longo tempo de imersão no mar, a maioria das peças histó- ricas ou arqueológicas recuperadas adquire esta cobertura de concreções marinhas, que atua também como uma proteção para o que restou do artefato. Neste caso específico do bronze arqueológico, a recuperação do objeto por meio de tratamento químico-mecânico é total.

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Já em 2005, na impermeabilização e na arte final do componente de falconete antigo de bronze (canhão pequeno) foram aplicadas inúmeras coberturas de cera microcristalina14 diluída para bloquear futuras ações destrutivas do oxigênio atmosférico e para a estética15 da peça arqueológica histórica restaurada. Hoje a referida peça encontra-se sob custódia do PAS, assim como outras peças recu- peradas do sítio arqueológico da Praia Figura 3 – Falconete após restauração dos Ingleses, aguardando futura partilha gumas áreas do objeto de bronze10. Optou- para integrar o acervo de antiguidades a -se então, por não mergulhar a câmara em ser utilizado na montagem de um museu ácido diluído em água em solução química especializado sobre a história da embar- de 70% de ácido nítrico para 30% de água cação soçobrada naquele local, ou para doce filtrada11. Os banhos sucessivos diá- sua remoção científica ou, ainda, para se rios com a solução química foram mais ade- juntar ao acervo da DPHDM. quados para este caso específico, com utilização de pequena escova macia de náilon para remover as concreções de difícil localização, juntamente com o martelete12, ponteira de aço, espátula de aço e um obturador odontológico para a cuidadosa remoção mecânica13 das concreções mais espessas. Para neutralizar a ação da solução ácida dos banhos sucessivos, foi usada uma solução de água com sabão neutro, na qual o artefato ficou imerso por cinco dias. Em seguida, a secagem ao ar foi o procedimento correto para este tipo Figura 4 – Falconete do navio N.S. Santanna, de Portugal, de restauração de metais. similar ao do N.S. del Pilar

10 B. Rodgers (1992) aconselha: “Do not delay treatments” (Não retarde os tratamentos). A expressão significa que, no trabalho de conservação e restauração de peças arqueológicas preconizado nos centros científicos mais avançados, não se deve retardar os tratamentos. Devido às características particulares de cada artefato, um ar- mazenamento longo pode causar deterioração permanente nos materiais arqueológicos que serão conservados. 11 A água filtrada utilizada, levada em barris de 40 litros, é sem impurezas e ideal para restauração. É possível usar também água destilada e água deionizada – sem íons – para o mesmo tratamento. 12 Pequeno martelo balanceado com ponta dupla, uma pontiaguda e outra chata ou rombuda. Ideal para restau- rações mecânicas. 13 Remoção mecânica: retirada das concreções marinhas ou cementitas localizadas sobre a superfície da peça arqueológica, cobrindo-a. O trabalho é realizado inicialmente sob água corrente. 14 Cera especial também denominada parafina micro ou parafina refinada. Ideal para impermeabilizar peças de metal, especialmente de bronze mineralizado, cobre e ferro. 15 Estética: aparência final da peça arqueológica restaurada antes de ir para uma reserva técnica ou exposição em museu.

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CONCLUSÃO para o local do naufrágio, e as medições para se determinar o comprimento total A localização exata do leme de sete da embarcação histórica, seu calado, di- metros e espessuras variáveis, construído mensão da quilha, provável altura, boca, de madeira e ferro forjado, da embarcação capacidade de carga, volume cúbico pela sinistrada sobre a área das escavações quantidade de barris transportados, peso submarinas e sua lenta, técnica e cuidadosa do lastro, entre outras investigações sobre remoção do mar pela equipe do Projeto de a estrutura de madeira – esqueleto – da Arqueologia Subaquática resultarão em nau espanhola, novas informações sobre novos estudos avançados, dedicados ao o registro arqueológico serão analisadas estabelecimento de uma cronologia mais em detalhes. Atualmente, sabe-se que foi acurada sobre o afundamento da embar- confirmada, por especialistas espanhóis, cação, cronologia que foi previamente ser espanhola e autêntica a cruz estilizada pesquisada até o final de 2005 e janeiro de gravada no sino de bronze recuperado do sí- 2006 e calculada entre 1683 e 1750. tio arqueológico submerso. Tem-se, assim, um enigma que está sendo pouco a pouco desvendado, sendo a câmara de bronze – o carregador do falconete – uma peça-chave para a interpretação das peças de artilharia antigas que armavam a dita nau. Espera-se que a continuidade deste pro- jeto arqueológico tenha um desfecho condi- zente com a sua importância e com a saga- cidade de seus idealizadores. Que se possa iniciar uma nova prospecção de sinistro histórico baseada neste trabalho científico e nos parâmetros estabelecidos pela equipe de técnicos especializados, mergulhadores pro- fissionais e colaboradores, agora treinados neste primeiro soçobro de baixa profundida- de16, e prosseguir com novas descobertas de peças arqueológicas, reais relíquias navais de uma época esquecida. Emergirão do mar outros materiais arqueológicos inéditos para contribuir para o relato de mais um episódio, não só trágico-marítimo, porém excitante Figura 5 – Leme da embarcação antiga recuperado aos olhos daqueles que buscam na história Desenho: Alexandre Viana naval brasileira as respostas para o desapare- Com a análise da madeira do leme e cimento de antepassados e a herança náutica sua futura conservação em uma piscina de do povoamento do litoral norte da Ilha de fibra coberta, especialmente transportada Santa Catarina e do Sul brasileiro.

16 James Delgado, mestre em Arqueologia Náutica e História Marítima pela Universidade da Carolina do Leste, pu- blicou diversos artigos sobre soçobros pesquisados e escavados a baixa profundidade numa dinâmica costeira, entre os quais “Great Leviathan of the Pacific: The Saga of the gold rush setamship Tennessee” (ECU, 85).

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Cabe ressaltar que, neste trabalho cionários, professores e doutores do setor de pesquisa, também foram localizados de Antropologia biológica do Museu pelo autor, submersos, os restos de um Nacional-UFRJ (Claudia Rodrigues indivíduo jovem de até 18 anos, prova- Carvalho, Adilson Salles e Andersen velmente do sexo masculino, morto no Lyrio), num trabalho inédito de remoção naufrágio espanhol. Os remanescentes do mar, inserido no intrincado contexto da esqueléticos foram identificados por fun- Arqueologia Subaquática.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Arqueologia; Marinha; Mergulho; Pesquisa; His- tória Marítima;

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ISABELLA FRANÇA BARBEITO DE VASCONCELLOS SÜSSEKIND* Advogada

SUMÁRIO

Introdução Do Princípio da Isonomia Das Mulheres nas Forças Armadas Da Mulher na Marinha do Brasil Conclusão

INTRODUÇÃO o restante do nosso ordenamento jurídico, urge a pergunta: como assegurar tratamento presente artigo tem como propósito igualitário de gênero nos meios que histo- O demonstrar o paralelo entre o princí- ricamente sempre foram de participação pio da isonomia, constitucionalmente asse- apenas masculina? gurado, e a crescente participação feminina Desta pergunta chega-se ao segundo no contingente das Forças Armadas, em ponto crucial deste trabalho, abordado por especial na Marinha do Brasil (MB). meio da evolução e inovação legislativa A relevância do tema apresenta-se tanto desta matéria e de reflexões sobre a im- no sentido jurídico, pois, sendo homens e portância social da presença feminina no mulheres iguais perante a Constituição e efetivo da Defesa Nacional.

* Pós-graduada em Direito Lato sensu na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (Emerj). Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Coordenadora da área de Contencioso Estratégico no Escritório Eduardo Sussekind Advogados Associados. MULHERES NA MARINHA DO BRASIL E AFIRMAÇÃO DA ISONOMIA

Assim, far-se-á menção tanto aos dis- Afirma Joaquim Barbosa Gomes2, con- positivos legais e a suas alterações como a ceituando a igualdade formal: “O princípio alguns fatos históricos capazes de ilustrar da igualdade perante a lei consistiria na o desenrolar da questão através dos anos. simples criação de um espaço neutro, onde Dados estatísticos também serão usados as virtudes e as capacidades dos indivíduos para conferir análise mais objetiva ao tema. livremente se poderiam desenvolver. Os pri- vilégios, em sentido inverso, representavam DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA nesta perspectiva a criação pelo homem de espaços e de zonas delimitadas, susceptíveis A partir do século XVIII, com a ascen- de criarem desigualdades artificiais e into- são da burguesia, quando eclodiram as leráveis”. (in LOBATO e SANTOS, p.18) revoluções liberais, quais sejam a Revo- É nesse contexto que é proclamada a lução Norte-Americana e, notadamente, a Declaração de Direitos da Virgínia, em Revolução Francesa, a igualdade de todos 1776, como decorrência da Independência perante a lei surge e ganha ostensivo des- dos Estados Unidos, que dita, em seus taque, aparecendo como reivindicação de artigos 1o e 4o: base do novo regime a ser instaurado. “Art 1o – Todos os homens nascem O art 5o da Constituição Federal1 diz que igualmente livres e independentes, têm “todos são iguais perante a lei, sem distinção direitos certos, essenciais e naturais dos de qualquer natureza”. Assim, observa-se quais não podem, por nenhum contrato, explicitamente a presença do princípio da privar nem despojar sua posteridade: isonomia em nossa Constituição. No Brasil, tais são o direito de gozar a vida e a foi incorporado pela primeira vez na Cons- liberdade com os meios de adquirir e tituição Brasileira de 1934, no artigo 113, possuir propriedades, de procurar obter inciso I: “Todos são iguais perante a lei. a felicidade e a segurança. […] Não haverá privilégios, nem distinções, por Art. 4o Nenhum homem e nenhum motivo de nascimento, sexo, raça, profissões colégio ou associação de homens pode próprias ou dos pais, classe social, riqueza, ter outros títulos para obter vantagens crenças religiosa ou ideias políticas”. ou prestígios, particulares, exclusivos e Tal princípio está doutrinariamente distintos dos da comunidade, a não ser dividido em: igualdade formal e igualdade em consideração de serviços prestados material. A que está expressa na lei e nela ao público, e a este título, não serão nem encontra limites é a chamada de formal. De transmissíveis aos descendentes nem acordo com ela, é possível limitar o legisla- hereditários, a idéia de que um homem dor (não será possível criar outras leis que nasça magistrado, legislador, ou juiz, é violem o princípio da igualdade), limitar absurda e contrária à natureza”. o intérprete da lei (consiste na aplicação da lei de acordo com o princípio) e limitar Já a Igualdade Material cuida de dar efe- o indivíduo (que não poderá apresentar tividade ao que está previsto na lei formal. condutas contrárias à igualdade). É necessária a análise do caso concreto

1 Constituição da República Federativa do Brasil, 1988. 2 GOMES, Joaquim Barbosa. “O debate constitucional sobre as ações afirmativas”. In: LOBATO, Fátima; SAN- TOS, Renato Émerson dos (orgs.). Ações Afirmativas: políticas públicas contra as desigualdades raciais. Rio de Janeiro: DP&A, 2003

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para que, se for o caso, ações afirmativas objetivo, deve basear-se na casuística e no permitam que grupos antes sem acesso ou mérito, e esse foi e é (pois as mudanças estão com difícil acesso a determinados círculos em andamento) um exemplo clássico. São passem a ter as mesmas oportunidades. esclarecedoras suas palavras: “Ademais, isto Isso seria sintetizado na célebre epígrafe: se torna evidente pelo fato de que as distri- “Deve-se tratar os iguais de maneira igual buições devem ser feitas ‘de acordo com o e os desiguais de maneira desigual”. mérito de cada um’, pois todos concordam Essa premissa traz uma questão decisi- que o que é justo com relação à distribuição va para o aplicador da lei que vai além de também o deve ser com o mérito em um cer- situações obviamente idênticas e chega na- to sentido, embora nem todos especifiquem quelas em que interpretação deve ser posta a mesma espécie de mérito” (2004, p. 105). em prática para que se alcance a equidade. Nas Forças Armadas, um dos argumen- Para isso, serão determinadas as carac- tos usados no passado para o alijamento terísticas essenciais para classificar fatos feminino é a diferença de força física. No e situações como iguais e merecedoras do entanto, esse argumento encontra falhas, mesmo tratamento e, do mesmo modo, as pois a força superior masculina é uma não-essenciais, que não devem ser feitas premissa genérica. O desempenho do ser de base. humano, não importa o gênero, é aferível Uma vez classificadas as situações caso a caso. como iguais ou não, haverá fundamento Assim, homens de força média a baixa para o Estado distribuir as benesses aos poderiam participar do mesmo processo cidadãos baseado nos seus critérios dis- em que se excluíam mulheres de força tintivos, escalonando-os. Assim, benesses média a alta, o que fere a isonomia entre semelhantes seriam distribuídas entre os seres humanos. semelhantes, e benesses díspares entre Esse argumento, somado à crescente cidadãos dessemelhantes. participação feminina nos outros setores Destaca-se que é esse o ponto de fusão da sociedade e à mudança de mentalidade entre a lei e a sociologia para este artigo. dos dirigentes militares, permitiu que a Como é sabido, a mulher, em termos ju- barreira da impossibilidade de ingresso rídicos e políticos, por muito tempo foi feminino fosse rompida. considerada “diferente”, e essa diferen- Hoje a questão de gênero não é mais ciação encontrava respaldo na sociedade, óbice para que a aptidão seja avaliada em não sendo vista como “absurda”. Assim, concursos e provas de ingresso em grande como desigual, era “esperada” participação parte dos cargos e postos militares, o que diferente, acesso diferente. ressalta a meritocracia e a efetividade do A mudança legislativa só ocorreu quan- princípio da isonomia. do a sociedade, por meio de movimentos A Constituição reafirma esse princípio feministas e ideais de igualdade, passou a por meio de muitas normas, algumas di- questionar essa diferença. Não foi a lei que retamente determinadoras da igualdade, mudou a sociedade, e sim o contrário. outras buscando a equidade entre os de- Aristóteles afirmava3 que o critério para siguais mediante a concessão de direitos marcar a equidade não pode ser somente sociais fundamentais.

3 ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Trad. Pietro Nasseti. São Paulo: Martin Claret, 2004. p. 214.

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A título de exemplo, assim dispõe o art. 3o: os níveis de tomada de decisão nas Constituem objetivos fundamentais da instituições nacionais, regionais e inter- República Federativa do Brasil: I – cons- nacionais, bem como nos mecanismos truir uma sociedade livre, justa e solidá- destinados à prevenção, gestão e reso- ria;[...] IV – promover o bem de todos, lução de conflitos [...]. sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de Esses dispositivos legais servem para discriminação. demonstrar o esforço positivo, por meio Já o art. 7o, XXX e XXXI, traz exemplos do Legislativo e Executivo, de efetivar a de igualdade material, regras que proíbem igualdade por meio de normas. Como já distinções fundadas em certos fatores, ao mencionado anteriormente, é característico vedarem diferença de salários, de exercício da igualdade formal. de funções e de critérios de admissão por Ocorre que, como já dito, a formali- motivo de sexo, idade, cor ou estado civil dade não traz a efetividade apenas por e qualquer discriminação no tocante a sa- sua existência. A formalidade traz, sim, o lário e critérios de admissão do trabalhador fundamento para que a igualdade material, portador de deficiência. casuística, seja pleiteada, mas o seu alcance Ainda sobre igualdade, mas sob prisma depende de internalização social. internacional, o art. 1o da Declaração Uni- A seguir debater-se-á acerca dessa busca versal dos Direitos Humanos (1948) asse- por maior participação feminina na socie- vera4: “Todos os seres humanos nascem dade, em especial nas Forças Armadas, e a livres e iguais em dignidade e em direitos. evolução da situação até o panorama atual Dotados de razão e de consciência, devem que desconstrói o imaginário coletivo do agir uns para com os outros em espírito de passado, no sentido de inadequação da fraternidade”. mulher com o meio militar, pois a mulher Nesse sentido, o art. 1o da Declaração “deveria ser cuidada”, e não “cuidar” (tra- dos Direitos do Homem e do Cidadão balho da Defesa Nacional). (1789) também traz o mesmo princípio: “Os homens nascem e são livres e iguais DAS MULHERES NAS FORÇAS em direitos. As distinções sociais só podem ARMADAS fundar-se na utilidade comum”. A Resolução no 1.3255, de 2000, do Con- Ao se fazer uma retrospectiva histórica, selho de Segurança da Organização das Na- percebe-se que vários foram os intentos ções Unidas (ONU), por sua vez, abordou a femininos, nas mais diferentes nações, de questão da inserção da mulher em igualdade busca por inserção nas Forças Armadas, de direitos com os homens nas instituições mesmo em épocas em que a carreira militar nacionais, regionais e internacionais geren- oficial era proibida para as mulheres. ciadoras de situações de conflitos: É lógica a conclusão de que, em um O Conselho de Segurança [...] apela meio patriarcal como o de outrora, não se com urgência aos Estados-Membros imaginasse dar legitimidade para que uma para que assegurem uma representação mulher estivesse à frente de um campo de cada ver maior de mulheres em todos batalha, ou comandasse homens.

4 Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789, França, 26 de agosto de 1789. 5 Organização das Nações Unidas, Resolução no 1.325, de 2000.

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Dessa feita, as mulheres que buscaram, do Ministério da Defesa, a participação por mais diversas razões, espaço no meio feminina nas Forças Armadas encontra-se militar por vezes tiveram que se valer de no seguinte patamar: na Marinha, represen- estratagemas. Como exemplo, pode-se citar tam 10% do efetivo da força militar, com a participação de Joana d’Arc na Guerra dos o total de 6.922 mulheres; na Aeronáutica, Cem Anos, contra a Inglaterra (1337-1453), representam 13,78% do efetivo, com o total sob aparência masculina. de 9.322 mulheres; e no Exército, represen- Outro caso ocorreu durante a Guerra de tam 3,2% do efetivo da força militar, com Independência dos Estados Unidos, com o total de 6.009 mulheres. Margaret Corbin tomando o lugar do ma- Com o objetivo de modernizar e am- rido morto em guerra. E, no Brasil, Maria pliar a Defesa Nacional, publicou-se a Es- Quitéria de Jesus Medeiros, considerada tratégia Nacional de Defesa (END)7, que a primeira mulher militar brasileira, em tem como um de seus eixos estruturantes 1823 travestiu-se de homem e se alistou o futuro do serviço militar obrigatório, em no serviço militar para lutar na Guerra da consonância, portanto, com a resolução Independência brasileira, sob a alcunha das Nações Unidas. de Medeiros. Como parte da visão global adotada Já em 1932, Ana Vieira da Silva partici- nesse documento, veio o imperativo de pou clandestinamente da Guerra Constitu- tornar o serviço militar menos segmentado: cionalista em São Paulo, tendo sido incor- “Seu propósito é zelar para que as Forças porada ao Batalhão após o reconhecimento Armadas reproduzam, em sua composição, de seus feitos (LOMBARDI6, p.23). a própria Nação – para que elas não sejam Tem-se que apenas em 1944, de ma- uma parte da Nação, pagas para lutar por neira legal, mulheres brasileiras puderam conta e em benefício das outras partes”. participar das Forças Armadas, por meio Assim, se o objetivo é “reproduzir a de serviço voluntário de enfermaria em hos- própria Nação”, conclui-se que a incorpo- pitais militares em campanha pela Europa. ração militar deve traduzir as diferenças da No que tange à abertura da participa- população nacional, inclusive as sociais e ção feminina em outros países, é possível de gênero, para que o efetivo reflita a plu- constatar o período de Segunda Guerra ralidade existente. Mundial como sendo aquele em que se as A Diretriz no 13 da END dispõe ainda: regras se flexibilizaram a ponto de serem “Desenvolver o repertório de práti- permitidas mulheres nos quadros institu- cas e de capacitações operacionais dos cionais, ainda que de forma tímida e em combatentes, para atender aos requisitos caráter administrativo, ligado às atividades de monitoramento/controle, mobilidade militares secundárias. e presença. Cada homem e mulher a No Brasil, várias décadas depois, apenas serviço das Forças Armadas há de dispor a partir da década de 1980 as mulheres co- de três ordens de meios e de habilitações. meçaram a entrar nas academias militares Em primeiro lugar, cada combatente deve brasileiras. Atualmente, conforme dados contar com meios e habilitações para

6 LOMBARDI, M. R. As Mulheres nas Forças Armadas brasileiras: a Marinha do Brasil (1980-2008). São Paulo: FCC/DPE, 2009, p. 23. 7 Disponível em: http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/credn/ audiencias-publicas/2013/abril/24-04-2013-politica-de-defesa-nacional-pdn-a-estrategia-nacional-de-defesa- -end-e-o-livro-branco-de-defesa-nacional-lbdn/apresentacoes/pdn-end-general-nardi.

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atuar em rede, não só com outros com- res, responsabilidades e remuneração batentes e contingentes de sua própria dos militares de carreira da Marinha, e Força, mas também com combatentes observarão também, no que couber, as e contingentes das outras Forças [...].” demais disposições previstas em leis e regulamentos para esses militares.” Ao continuar a leitura da lei, fica claro que “flexibilidade e adaptabilidade” bem Naquela época, em que pese as mulheres utilizadas serão os instrumentos para poderem acessar a Marinha, sua participa- que sejam atenuadas as formas rígidas e ção se restringia a um corpo específico da tradicionais de comandar e para que haja instituição. adequação às inovações tanto sociais como De igual maneira, como se observa nos legais da atualidade. demais artigos da referida lei, as patentes Na continuidade, abordar-se-á o pro- máximas que poderiam alcançar eram infe- cesso de inserção feminina na Marinha do riores às masculinas (art. 16 da referida lei), Brasil. estando inacessíveis Mais de três mil mulheres se os postos de capitão DA MULHER NA de mar e guerra e al- MARINHA DO inscreveram para disputar mirante. BRASIL as 12 vagas ofertadas. Isso Posteriormente, a Lei 7.622/87 reorgani- A participação demonstra que ocupar um zou o CAFRM e pos- feminina nas Forças posto na carreira militar sibilitou às mulheres Armadas não foi ins- e obter sua formação a ascensão à patente titucionalizada até o de capitão de mar e início de 1980, quando institucional é um sonho guerra e reduziu-se de a Marinha, pioneira- dividido por nove para três anos o mente, por meio da estágio probatório para Lei no 6.807/80, criou muitas mulheres o QAFO. o Corpo Auxiliar Fe- Com a Lei 9.519/97, minino da Reserva da Marinha (CAFRM). extinguiu-se o CAFRM e foi permitida a Até 1988, esse corpo era composto de participação feminina nos quadros gerais, dois quadros, o Quadro Auxiliar Feminino quando se incluiu a possibilidade de as de Oficiais (QAFO) e o Quadro Auxiliar mulheres chegarem ao posto de vice- Feminino de Praças (QAFP), cujos encar- -almirante. Assim prevê seu artigo 9o: gos se davam na seara técnica e administra- Art. 9o – Os oficiais da Marinha, de tiva, sendo o acesso por meio de concurso ambos os sexos, são iguais em direitos e público. Seu caráter inovador e ambíguo é obrigações nos termos da Constituição, notável em seu artigo 10o: observados os valores, princípios e as Art. 10. “Durante o período em que normas nela estabelecidos. estiverem convocadas para o Serviço Ativo, ressalvado o disposto nesta Lei Essa Lei, ainda em vigor, permitiu às e na sua regulamentação, as integran- mulheres, outrora pertencentes a um único tes do Corpo Auxiliar Feminino da Corpo Auxiliar, ingressarem no Corpo de Reserva da Marinha terão as mesmas Intendentes da Marinha (IM), no Corpo honras, direitos, prerrogativas, deve- de Engenheiros da Marinha (EN), nos

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quadros do Corpo de Saúde da Marinha, no Plano Nacional de Políticas para as Mu- nos quadros Técnico e Auxiliar da Armada lheres, promovendo a articulação entre os do Corpo Auxiliar da Marinha, no Corpo órgãos do Ministério responsáveis por essas Auxiliar de Praças e no Quadro de Músicos ações e contribuindo para a articulação da do Corpo de Praças de Fuzileiros Navais. atuação externa do Ministério da Defesa no Hoje, na Marinha, as mulheres têm, de- tocante ao tema. pendendo de sua formação, acesso aos pos- Assim, a depender das políticas desen- tos de oficial-general, até vice-almirante. volvidas pelos órgãos de cúpula de nosso A Força Naval destacou-se também em país, em breve haverá alteração legislativa 2012, ao promover a médica Dalva Maria para que o mais alto posto hierárquico, Carvalho Mendes, do Corpo de Saúde da almirante de esquadra, também esteja Marinha, a contra-almirante, tendo esta disponível para as mulheres, além da par- sido a primeira mulher brasileira a se tornar ticipação de aspirantes do sexo feminino oficial de alta patente nas Forças Armadas nos Corpos da Armada e de Fuzileiros (dados do Ministério da Defesa). Navais e de seu ingresso por meio do Em 2013, grande marco para uma Serviço Militar Voluntário (ALMEIDA, mudança estrutural, foi instaurada pelo 2015, p. 23)8. Ministério da Defesa Mais uma vez, a uma comissão de gê- Marinha promoveu a nero com a finalidade igualdade quando, em de estreitar a igual- Pensar a mulher atuando 2014, abriu a primei- dade entre homens e em todos os postos das ra turma de mulheres mulheres, bem como Forças Armadas é permitir na Escola Naval, no fazer perseverar os Rio de Janeiro, com- direitos femininos nas o acesso a instrumentos que posta por 12 jovens Forças Armadas. A possibilitam o avanço social que passaram por um Comissão de Gênero concorrido processo (CGMD), de caráter de seleção. constitutivo, vinculada ao Gabinete do Para tanto, a Escola Naval passou por Ministro e integrada por representantes reformas estruturais em seus alojamentos, do Estado-Maior Conjunto das Forças banheiros e enfermarias e também incluiu Armadas, da Secretaria-Geral da Escola oficiais femininas no Comando do Corpo Superior de Guerra, do Instituto Pandiá de Aspirantes, para o acompanhamento Calógeras e dos comandos das Forças das aspirantes. Armadas, tem como finalidade sistema- Segundo dados do Ministério da Defe- tizar e promover os direitos das mulheres sa, mais de três mil mulheres se inscreve- nesse contexto. ram para disputar as 12 vagas ofertadas. Após um ano de trabalho, consolidou- Isso demonstra que ocupar um posto na -se, estudando, propondo, acompanhando carreira militar e obter sua formação ins- e avaliando o desenvolvimento das ações titucional é um sonho dividido por muitas previstas no seu próprio Plano de Ação e mulheres e que, agora, já é possível.

8 ALMEIDA, V. de A. “Mulheres nas Forças Armadas brasileiras: situação atual e perspectivas futuras”. Cadernos Aslegis, Brasília, no 51, p. 91-134.

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CONCLUSÃO na medida em que as liberdades não são apenas os fins primordiais do desenvolvi- O legislador, em ações que afirmaram mento, mas também os meios principais, e afirmam a luta por isonomia feminina, pois uma forma de liberdade está relaciona- passou a agir no sentido de que a realidade da à outra e a realização de uma é necessária legal e social caminhem, cada vez mais, de para a realização da outra. forma parelha. Assim, sustenta que a liberdade polí- Como ensina Bandeira de Mello9, “não tica promove a liberdade econômica e a só perante a norma posta se nivelam os liberdade econômica ajuda a promover indivíduos, mas a própria edição dela a segurança econômica, oportunidades sujeita-se ao dever de dispensar tratamento sociais facilitam a participação econômica equânime às pessoas”. e a facilidade econômica ajuda a gerar A lei não deve ser fonte de privilégios ou recursos para os serviços sociais. Uma perseguições, mas instrumento regulador da liberdade fortalece a outra. vida social que necessi- O discurso do de- ta tratar equitativamente senvolvimento como todos os cidadãos. Este A busca de equidade de objetivo elementar da é o conteúdo político- gênero nas FFAA, como Defesa Nacional está -ideológico absorvido no cerne da Estratégia pelo princípio da isono- a própria ideia de serviço Nacional de Defesa, mia e que deve ser tra- militar obrigatório, é documento já citado duzido pelos sistemas neste trabalho, e é uma normativos vigentes. instrumento para afirmar a das formas de garantir- Pensar a mulher unidade da Nação, servindo mos nossa soberania e atuando em todos os de pilar da soberania autonomia política e postos das Forças Ar- econômica. madas é permitir o nacional e de progresso Portanto, a inclusão acesso a instrumentos das mulheres em ali- que possibilitam o avanço social. Ul- nhamento com a demanda de cada Força trapassar tais limitações de acesso é um Armada, com observância de critérios con- sinal de desenvolvimento, pois perceber dizentes com o aprimoramento de suas mis- as dificuldades da restrição de direitos é sões institucionais, mais do que a garantia trilhar novos caminhos para pensar um de efetividade de um direito fundamental, futuro com melhores condições. é uma forma de nosso país desempenhar Amartya Sen10, economista indiano laure- cada vez melhor seu papel de ator global no ado com o Prêmio Nobel de Economia, tra- cenário geopolítico do século XXI. balha a questão das liberdades, entre elas as A busca de equidade de gênero no efetivo de não-discriminação quanto ao sexo, como das FFAA, portanto, como a própria ideia forma de impulsionar o desenvolvimento. de serviço militar obrigatório, é instrumento Segundo ele, ultrapassar os entraves so- para afirmar a unidade da Nação, servindo de ciais constitui o próprio desenvolvimento, pilar da soberania nacional e de progresso.

9 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3a ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 9. 10 SEN, A. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010 p. 20.

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Portanto, ainda que esforços para que que dentro das diferentes oportunidades entre essa adaptação se efetive tenham sido e ain- gêneros haja equidade e, portanto, isonomia. da sejam necessários, muitos são os bônus Para isso, passaram e passam por um processo da diversidade de gênero na composição em que situações até então inéditas são enfren- dos efetivos das Forças Armadas e nessa tadas, mas as quais, como defensores da Lei cada vez menor segmentação de pessoal. e da Ordem, não temem ultrapassar em prol Por fim, conclui-se que as Forças Armadas de nossa ordem constitucional e do equilíbrio brasileiras caminham no sentido de garantir das instituições democráticas.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Corpo Feminino; Serviço Militar;

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALMEIDA, V. de A. “Mulheres nas Forças Armadas Brasileiras: Situação atual e perspectivas futuras”. Cadernos Aslegis, Brasília, n. 51, p. 91-134, jan./abr. 2014. AMARRYA, Sen. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p. 20. ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Trad. Pietro Nasseti. São Paulo: Martin Claret, 2004. CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. DECLARAÇÃO DE DIREITOS DO HOMEM E DO CIDADÃO. França, 26 de agosto de 1789. ESTRATÉGIA NACIONAL DE DEFESA. Acesso disponível em: http://www.defesa.gov.br/arqui- vos/2012/mes07/end.pdf GOMES, Joaquim Barbosa. “O debate constitucional sobre as ações afirmativas”. In: LOBATO, Fátima; SANTOS, Renato Émerson dos (orgs.). Ações Afirmativas: políticas públicas contra as desigualdades raciais. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. LOMBARDI, M. R. As Mulheres nas Forças Armadas Brasileiras: a Marinha do Brasil (1980-2008). São Paulo: FCC/DPE, 2009, p. 23. LOMBARDI, opus cit, p.10. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3a ed. São Paulo: Malheiros, 2003. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS, Resolução no 1.325, de 2000.

RMB3oT/2017 101 ESTRATÉGIA NAVAL BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: a necessidade da Projeção Oceânica*

MAURO GONÇALVES CAMARA** Capitão de Fragata

SUMÁRIO

Introdução Geopolítica e estratégia Mahan x Corbett – um viés de complementaridade Pressupostos clássicos válidos na atualidade Estratégia contemporânea O pensamento estratégico naval brasileiro Conclusão Anexos

INTRODUÇÃO pensamento estratégico dos atores estatais relevantes, bem como a construção de estudo da concepção estratégica dos pensamento estratégico próprio, necessário O Estados é preocupação permanente para a concretização de ações relativas à para as principais potências mundiais há garantia de defesa e segurança, principal- longo tempo. O atual cenário internacional mente no denominado entorno estratégico. e as aspirações políticas nacionais, basea- O presente artigo tem por propósi- das na ambição quanto a maior participação to discutir a estratégia naval brasileira política nos fóruns de discussão internacio- contemporânea neste início de século, nais e seu processo de multipolarização, correlacionando seus pressupostos com tornam imperativo o entendimento do pensamentos estratégicos clássicos válidos

* Resumo atualizado de monografia apresentada no curso de Estado-Maior para Oficiais Superiores em 2013, na Escola de Guerra Naval. ** Mestre em Ciências Navais pela Escola de Guerra Naval. ESTRATÉGIA NAVAL BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: a necessidade da Projeção Oceânica

na atualidade e fundamentos da estratégia Geopolítica é o planejamento da política de contemporânea, procurando identificar, em segurança de um Estado em termos de seus análise preliminar, planos de ação para que fatores geográficos (TOSTA, 1984). o poder naval brasileiro seja dotado de real De acordo com Vesentini (2004), a di- projeção oceânica em médio prazo. mensão espacial da estratégia é a Geoestra- A partir da situação geopolítica brasileira, tégia. Percebe-se, portanto, estreita relação da sua posição no Sistema Internacional (SI), entre a Geopolítica e a Estratégia, a qual das aspirações a maior participação nos fó- deverá prever a concepção teórica e mate- runs decisórios mundiais e, principalmente, rialização dos meios a fim de possibilitar da necessidade de proteção das Linhas de o atendimento dos objetivos geopolíticos Comunicação Marítimas (LCM) de interesse do Estado. Conclui-se que o Brasil deve e dos recursos do mar percebe-se a obriga- possuir planejamento estratégico adequa- toriedade de que a Marinha do Brasil (MB) do à sua posição geopolítica e pretensões possua real capacidade de projeção oceânica. relacionadas à política externa. A Estratégia será profundamente influen- GEOPOLÍTICA E ESTRATÉGIA ciada pelos conceitos geopolíticos do Estado. O espaço e a intenção de utilizá-lo determi- Segundo Clausewitz (1988), estratégia nam o problema, também o delimitando. é o uso dos combates para o propósito Atualmente, com a orientação política da guerra. Já para Robert Osgood (apud de projeção de influência no entorno es- BAYLIS et al, 2005), a estratégia deve tratégico, de proteção da Amazônia Azul ser entendida como nada menos do que o e seus recursos, bem como das LCM, plano geral para a utilização da capacida- torna-se necessário o estabelecimento de de de coerção armada, em conjunto com estratégia marítima e naval adequadas à instrumentos econômicos, diplomáticos e consecução destes objetivos. psicológicos de poder, para apoiar a política Segundo Klare (2001), atualmente, as externa do Estado da forma mais eficaz por guerras por recursos naturais parecem se vias abertas, encobertas ou tácitas. sobrepor ao choque de civilizações, à teoria Entre as assertivas de Clausewitz e da interdependência econômica e a conflitos Osgood, outros aspectos passaram a ser ideológicos. Vários conflitos étnicos e reli- sintetizados no estudo da estratégia como giosos possuem problemas de controle de ciência. Apesar dos fatores que não os de combate terem sido amplamente utilizados ao longo da História, recentemente os mes- mos passaram a adquirir maior relevância para o exercício do poder no SI. Geopolítica, segundo Backheuser, é um dos ramos da política, ciência que tem por objetivo estudar os fundamentos do gover- no do Estado, e supõe que a instabilidade é o princípio fundamental das Relações Internacionais (RI). De acordo com Wei- gert, Geopolítica é a geografia aplicada à política de poder nacional e à sua estratégia Figura 1 – Entorno estratégico (aproximado) de fato na paz e na guerra. Já para Spykman, Fonte: https://isape.wordpress.com/2011/01/

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recursos como causa subjacente, ou seja, não A posse de recursos naturais pode gerar declarada, da mesma forma que inúmeras um conflito internacional, resultando no fronteiras terrestres e marítimas em litígio, envolvimento de várias formas de poder: como o Mar da China Meridional, são áreas diplomático, legal e, eventualmente, mi- com reconhecido potencial de recursos natu- litar (HILL, 1990). Este, portanto, é um rais, sejam energéticos, minerais ou reservas dos aspectos de maior relevância para a de água doce. A importância atribuída aos construção do pensamento estratégico na recursos naturais representa mais do que presente época. um simples retorno ao passado mahaniano, “A Convenção das Nações Unidas levando-se em consideração o crescimento sobre Direito do Mar abre a possibilidade industrial e econômico mundial. de o Brasil estender os limites da sua Pla- Segundo a Política Nacional de Defesa taforma Continental e exercer o direito de (PND), neste século, a busca por fontes de jurisdição sobre os recursos econômicos água doce, de alimentos e de energia, cada em uma área de cerca de 4,5 milhões de vez mais escassas, poderão levar a inge- quilômetros quadrados, região de vital rências em assuntos internos ou a disputas importância para o País, uma verdadeira por espaços não sujeitos à soberania dos Amazônia Azul. Nessa imensa área, Estados, configurando quadros de confli- incluída a camada do pré-sal, estão as to. Com a ocupação dos últimos espaços maiores reservas de petróleo e gás, fontes terrestres, as fronteiras continuarão a ser de energia imprescindíveis para o desen- motivo de litígios internacionais. volvimento do País, além da existência de O petróleo ainda é considerado o mais grande potencial pesqueiro, mineral e de sensível dos recursos naturais. Como as outros recursos naturais. A globalização principais reservas encontram-se em áreas de aumentou a interdependência econômica grande instabilidade, é possível que as gran- dos países e, consequentemente, o fluxo des potências busquem reservas em locais de cargas. No Brasil, o transporte maríti- considerados mais seguros, ou as mantenham mo é responsável por movimentar quase na classificação de reservas estratégicas. todo o comércio exterior” (PND). Chama-se a atenção para o crescimento demográfico mundial e que grande parcela De acordo com os dados da ANP da população dos países emergentes atingi- (2016), o Brasil importou, em 2015, rá o padrão de consumo dos países ricos, o 118,3 milhões de barris de petróleo, sendo que torna mais intensa a demanda por recur- mais de 50 por cento do total oriundos da sos de toda espécie, elevando a importância região do Golfo da Guiné, destacando- do controle das áreas de produção e LCM. -se a Nigéria, cuja exportação ao Brasil Segundo Mahan (apud ALMEIDA, totalizou 62,3 milhões de barris. O Brasil 2009), uma grande quantidade de recursos exportou 268,9 milhões de barris de petró- não explorados em territórios politicamente leo em 2015, com destinos diversificados atrasados e pouco controlados pelos donos (Ásia-Pacífico, Américas e Europa). A nominais apresenta-se como uma tentação produção nacional de petróleo foi de 889,7 e um impulso para a guerra das potências milhões de barris em 2015, sendo 93,4% europeias. Caso efetuemos a atualização deste valor oriundos do mar. O pré-sal desta assertiva de “potências europeias” representou 31,5% da produção nacional para “potências mundiais”, a premissa total. Tais fatos, em conjunção com a forte mahaniana permanece válida. presença de empresas brasileiras no Golfo

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da Guiné, podem gerar interferências que primeiro entendimento da Estratégia Naval demandem a atuação do poder naval bra- clássica. Porém existe a possibilidade de sileiro na região. focar aspectos de complementaridade entre O esforço consciente do Brasil para os fundamentos estabelecidos, sendo viável maior utilização dos oceanos resultará em obter ensinamentos ainda valiosos quanto à maior poder, dependência e vulnerabilidade concepção estratégica de uma Marinha que no mar (HILL, 1990). Tais riquezas e suas se queira fazer respeitada. vias de transporte, por si só, tornam impe- riosa a disponibilidade de uma Marinha O legado de Alfred Thayer Mahan com capacidade de projeção oceânica. Da mesma forma, a questão ambiental Segundo Mahan (apud PARET, 2001), permanece como uma das preocupações da nada pode ser mais prático para um oficial humanidade, podendo ser utilizada como de Marinha do que a formulação dos prin- causa subjacente para a materialização de cípios e métodos pelos quais a guerra pode interesses internacionais em países deten- ser conduzida vantajosamente, como por tores de grande biodiversidade, reservas de meio do estudo da História. recursos naturais e áreas a serem incorpo- Ainda hoje é o autor mais conhecido no radas ao sistema produtivo. âmbito da estratégia marítima, sendo apeli- “A América do Sul é o ambiente dado de “evangelista do poder marítimo”, regional no qual o Brasil se insere. tal a aceitação de suas ideias e influência Buscando aprofundar seus laços de co- internacional alcançada. Transpondo os operação, o País visualiza um entorno princípios da guerra terrestre preconizados estratégico que extrapola a região sul- por Jomini para a aplicação, por analogia, à -americana e inclui o Atlântico Sul e os guerra naval, foi pioneiro na interpretação países lindeiros da África, assim como histórica sistematizada de que o controle do a Antártica. Ao norte, a proximidade do mar é fator determinante para o estabeleci- Mar do Caribe impõe que se dê crescente mento e a manutenção do poder nacional atenção a essa região” (PND). para os Estados que detivessem tal controle. Percebemos também influência clau- Cabe ressaltar que nosso subcontinente é sewitziana em seu pensamento quando região relativamente pacífica e livre de ar- descreve que a guerra era simplesmente mamento nuclear. A interdependência eco- um movimento político, apesar de violento nômica, a vivificação de fronteiras, o forta- e excepcional em caráter, e que o braço ar- lecimento de democracias e instituições e mado aguardava e era subserviente aos inte- a crescente integração regional favorecem resses políticos e ao poder civil do Estado. a priorização de soluções diplomáticas e A visão de que Mahan não teve contato com negociadas em eventuais conflitos. a obra de Clausewitz não parece adequada, pois o autor chega a discuti-lo em Naval MAHAN X CORBETT – UM VIÉS DE Strategy (ALMEIDA, 2009). COMPLEMENTARIDADE O que efetivamente queria Mahan era despertar na classe política dos Estados Muito se debate quanto aos aspectos Unidos da América (EUA) a centralidade opostos entre os pensamentos de Mahan das políticas navais para o desenvolvimen- e Corbett, talvez pelas possibilidades di- to nacional. Considerava que a Marinha dáticas intrínsecas e pela facilidade a um estadunidense tinha uma postura defen-

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siva, voltada para a guerra costeira, sem var o inimigo desse grande recurso, e não pretensões além-fronteiras. Acreditava que é fácil conceber um emprego militar para essa postura era deficiente e equivocada, elas, por mais amplo que seja, que possa indicando que o melhor caminho era a se comparar à proteção e à destruição das ofensiva e a projeção internacional (apud trocas comerciais. ALMEIDA, 2009). Guardadas as devidas Guerras seriam ganhas pelo estrangu- proporções e os objetivos nacionais especí- lamento econômico do inimigo, a partir ficos de cada Estado, há o que aprendermos do mar, e perdidas caso não se impeça o com este postulado mahaniano, pois: próprio estrangulamento. Esta premissa, A estratégia naval tem por objetivo seguida por Corbett, seria atingida apenas a criação, a sustentação e o aumento do com o aniquilamento da Esquadra inimiga, poder naval de um Estado, tanto na paz por meio da batalha decisiva, incorporando quanto na guerra, possuindo especial os princípios jominianos da concentração, interesse e importância para todos os ci- ofensiva e economia de forças à estratégia dadãos de um país livre, mas sobretudo naval (COUTAU-BÉGARIE, 2010). Tal para os que se encontram encarregados contribuição possui valor inestimável para dos assuntos militares e sua relação com a estratégia naval, especialmente quando o exterior (MAHAN, 2000). pensamos em eventuais conflitos armados que envolvam antagonistas possuidores de Mahan, reivindicando ser o primeiro expressivo Poder Naval. pensador a cunhar a expressão Poder Naval, A batalha no mar permanecerá sendo a o definiu como um conjunto de alta comple- preocupação primordial do comandante da xidade, envolvendo o domínio do mar pela cena de ação. Em algumas, os resultados superioridade naval, comércio marítimo, são indefinidos; em outras, decisivos. As posses ultramarinas, acesso a mercados e batalhas ocorrem quando as tensões de- Marinha Mercante de expressão. Mahan, rivadas entre o uso do mar e sua negação verdadeiro pai fundador da estratégia tenham alcançado um ponto de ruptura. naval contemporânea, elevou-se acima do Caso tenha como resultado uma vitória problema imediato da condução da guerra decisiva, sem dúvida afetará todos os outros no mar para propor uma verdadeira visão aspectos do conflito (HILL, 1990). da História, de uma amplitude impressio- Segundo Coutau-Bégarie (2010), ba- nante e raramente igualada (COUTAU- talhas decisivas existem, porém são raras, -BÉGARIE, 2010). pois têm de satisfazer quatro condições: Não obstante as simplificações, os re- adversário mais fraco que aceite a batalha ducionismos e as deficiências de análise ou seja forçado a fazê-lo; perdas suficiente- e metodologia apontadas por inúmeros mente importantes, especialmente na época historiadores, tratar Mahan como mero contemporânea, em virtude do longo tempo apologista da batalha decisiva significa me- necessário à construção de grandes navios; nosprezar a abrangência e, principalmente, a exploração rápida e inteligente da vitória; a pertinência e aplicabilidade de aspectos e a ausência de estratégias alternativas. fundamentais de sua obra. Mesmo Mahan reconhece a dificuldade Para Mahan, se as Marinhas, como da ocorrência de um encontro decisivo e a todos concordam, existem para proteger o possibilidade de relativização do controle comércio, segue-se, inevitavelmente, que do mar. O fato de a batalha decisiva ser na guerra elas devem ter por objetivo pri- rara não é justificativa aceitável para que

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se ignore completamente seu conceito na mundo, as quais passam a enfatizar sua concepção estratégica do poder naval. influência sobre terra, projeção de poder Pode-se, portanto, extrapolar o conceito e operações em águas marrons. de batalha decisiva como uma ação militar Os custos das principais Marinhas do de envergadura da qual decorra desbalance- mundo são reduzidos, e é dada maior ênfase amento ou destruição de capacidade militar a aspectos estratégicos que não os relaciona- que torne inequívoco o desfecho de dado dos à batalha decisiva mahaniana, restando conflito. Mahan não poderia prever ou como única Marinha de alcance global a sistematizar, em pensamento estratégico, Marinha dos EUA (BAYLIS et al, 2005). as consequências decorrentes das novas Destaca-se, neste escopo, a partici- armas e tecnologias. pação de meios navais combatentes em Em termos de estratégia naval, portanto, operações de proteção ao tráfego marítimo as maiores deficiências do pensamento e combate a ameaças como terrorismo, mahaniano foram a de não estabelecer as tráfico de drogas e pessoas, pirataria e diversas gradações do controle do mar, outras atividades ilícitas. A concepção em função de meios e objetivos, e a des- estratégica marítima estadunidense e da consideração pelas operações de projeção Organização do Tratado do Atlântico de poder, não levando em conta a interde- Norte (Otan) assume aspectos relaciona- pendência dos poderes naval e terrestre, dos à segurança marítima e imposição da deficiências estas complementadas no lei no mar como capacidades necessárias pensamento estratégico de Corbett. para uma Força Naval, em conjunto com A percepção de Mahan da necessidade aspectos de segurança coletiva. de bases distantes em pontos de importân- Este novo ponto de vista se alinha com di- cia vital para a operação das Esquadras versos princípios encontrados no pensamen- foi fundamental para o planejamento e a to de Sir Julian Stafford Corbett, expressos consecução do Poder Naval estaduniden- em sua principal obra, Some Principles of se, após o declínio do Império Britânico, Maritime Strategy, em que defende a ideia influenciando o imperialismo norte-ameri- de que a principal função de uma Marinha cano e sua conversão ao “navalismo”. Suas se materializa em sua capacidade de influen- ideias referentes às funções diplomáticas ciar os acontecimentos em terra e proteger da Esquadra, cuja capacidade é superior à o tráfego marítimo (MONTEIRO, 2011). do Exército, pela agilidade, representação Não obstante a ideia difundida da menos agressiva e liberdade jurídica dos plena associação entre os pensamentos mares, também permanecem válidas. de Mahan com os princípios jominianos e de Corbett com os princípios clausewit- O legado de Julian Stafford Corbett zianos, o próprio Corbett afirma que Jo- mini e Clausewitz concordam quanto aos A antiga e tão bem delineada ordem propósitos políticos da guerra, que cada vigente entrou em colapso, sem que se beligerante deve empregar todos os meios tivesse criado uma nova, e hoje tem-se e toda energia na destruição do oponente e que viver sem um inimigo bem definido que certas ações podem ser tolhidas por li- (MOREIRA, 1995). O fim da Guerra mitações políticas impostas. Afirma ainda Fria, ocorrido no final do século passado, que sua obra inicia-se onde se encerram as provocou a reestruturação das estratégias obras de Jomini e Clausewitz, abrangendo marítimas das principais Marinhas do a modernidade para os Estados imperiais,

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para os quais o mar é fator fundamental de forma embrionária, o conceito hodierno (CORBETT, 1936). de interoperabilidade. Pode-se considerar as teorias com A interdependência entre estes poderes abordagem mais complementar do que di- torna imperioso o estabelecimento de ope- vergente, estando Mahan em patamar mais ração conjunta, em que se desenvolvem os ambicioso, pretendendo influenciar o poder esforços de forma articulada para a con- do Estado para o domínio de rotas marítimas, secução dos objetivos estabelecidos pela pontos-chave e, consequentemente, do mun- política. Para a condução da guerra com do, enquanto Corbett busca estabelecer pro- êxito, é fundamental a interoperabilidade cedimentos doutrinários para a utilização do entre Exército e Marinha, por intermédio poder marítimo a serviço do Estado, desde da interdependência das estratégias naval e a sua concepção. Corbett é um estrategista maior, em virtude dos desdobramentos da- naval, e Mahan um geoestrategista global quela estratégia em terra (CORBETT, 1936). cujo pensamento principal é a capacidade Ainda segundo Corbett, a função principal de domínio do mar para grandes potências. da Esquadra é a de ganhar batalhas no mar. Corbett, comentando sobre a principal Além dessa, são elencadas as seguintes tare- obra de Mahan, afirma que pela primeira vez a fas: apoiar ou obstruir o esforço diplomático, História Naval adquiria base filosófica e que, proteger ou destruir o comércio marítimo a partir de grande número de fatos históricos, e promover ou negar operações militares grandes generalizações foram possíveis, ha- em terra. Nota-se estreita correlação com vendo poucos livros que tenham produzido as atribuições modernas das Esquadras, de- tanto efeito na ação, como no pensamento monstrando o amplo entendimento de Corbett político (citado por ALMEIDA, 2009). quanto ao emprego do Poder Naval, que são: a Apesar de admirador confesso de Clau- defesa naval; a diplomacia naval; a segurança sewitz, não concordava com seu conceito marítima, embora esta possua espectro mais de centralidade da batalha na guerra, porém amplo de atribuições; e a projeção de força. se constitui em axioma corbettiano a asser- Ao longo do tempo, Corbett passa a tiva de Clausewitz de que a guerra se trata citar a proteção ou destruição do comércio da continuação da política por outros meios, marítimo como a principal atribuição da ou que a ação militar deva ser encarada Esquadra, em função da interferência com como manifestação da política. os acontecimentos em terra. O domínio do O esforço e a intensidade da guerra de- mar passa a ser um objetivo relativo, exerci- pendem da importância do objetivo para os do na intensidade adequada aos propósitos antagonistas, bem como de suas disposições estabelecidos. Não se pode conquistar o para assumirem os sacrifícios decorrentes. mar como se conquista um território. Portanto, nossas decisões devem se ba- As ideias de Corbett influenciam dire- sear também no valor deste objetivo para tamente no planejamento estratégico de o inimigo, valor este que contribuirá para composição dos meios da Esquadra, para sua disposição ao combate. as operações de conquista, disputa e exer- Um dos principais aspectos de seu pen- cício do controle do mar. Para tal, deveriam samento é a consecução de estratégia que se dividir em: couraçados, destinados ao possibilite a maximização do Poder Nacio- combate, com grande deslocamento e poder nal por meio do esforço coordenado dos de fogo; cruzadores, para patrulhamento e poderes terrestre e naval, constituindo-se escolta, com maior velocidade e manobra- no esforço de guerra do Estado. Percebe-se, bilidade; e flotilha, para atividades costeiras

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e navios auxiliares. Ou seja, os tipos de Analisando a História de maneira impar- navios que devem constituir a Esquadra cial e extraindo conclusões pertinentes, a decorrem da materialização da concepção obra de Corbett obteve recepção favorável estratégica vigente. no meio acadêmico, porém sem alcançar Esta linha de pensamento conferiu a influência obtida por Mahan, à exceção amparo estratégico à construção do Dread- do Reino Unido, onde obteve inúmeros nought, recorde à época em termos de poder adeptos, como Liddell Hart, Eric Grove, de fogo, deslocamento e velocidade, para Geoffrey Till e Colin Gray e influenciou a tarefa de conquista do controle do mar, a concepção estratégica da Marinha Real enquanto as outras unidades se destinariam nas duas guerras mundiais e até os dias ao exercício do controle. de hoje. A concepção estratégica moderna Ampliando a concepção de Mahan, vem acarretando gradativa expansão do Corbett, baseando-se em Clausewitz, pensamento corbettiano para pensadores afirma que, se não há força suficiente para de outros países, como Samuel Huntington um ataque decisivo, podem-se definir e Thomas Barnett (MONTEIRO, 2011). objetivos limitados, a Ressalta-se, ainda, fim de prosseguir com que o contexto atual a guerra ou negociar Em tempo de paz, favorece a interpretação a paz em condições o controle do mar é corbettiana da estraté- menos desfavoráveis. gia naval, em virtude O objetivo da guer- livremente exercido, da maior importância ra naval deverá ser, podendo levar ao erro atribuída às chamadas de maneira direta ou de não se considerar a novas ameaças, além da indireta, a obtenção existência de um único do controle do mar, ou necessidade de conquista poder militar de alcance evitar que o inimigo o ou disputa em tempo global, o estadunidense. possua, ou seja, con- O conceito corbet- trolar as LCM para fins de guerra tiano de Controle do comerciais e militares. Mar permanece válido Segundo Corbett, são as seguintes as nos dias de hoje, materializando-se na formas de operações navais: Métodos proteção das LCM, possuindo caráter mais para a Conquista do Controle (aspiração globalizado, tornando imperativo o estabe- das forças superiores), Métodos para a lecimento de parcerias e cooperação para a Disputa do Controle (tentativa das forças garantia deste controle. inferiorizadas) e Métodos para o Exercí- As ideias de interdependência entre cio do Controle. Quanto ao exercício do forças navais e terrestres, a relevância controle, é interessante observarmos que dos eventos em terra para a resolução dos o mesmo se constitui na finalidade e no conflitos e a consequente importância da objetivo da estratégia naval, sendo a con- projeção de poder norteiam a concepção quista e a disputa meios para que se atinja estratégica de várias Marinhas na atuali- o propósito. Em tempo de paz, o controle dade, como a Marinha britânica. é livremente exercido, podendo levar ao Corbett visualizou dentro do contexto erro de não se considerar a necessidade de marítimo a fluidez entre a ofensiva e a de- conquista ou disputa em tempo de guerra fensiva, sendo infinitas suas combinações ou mesmo crise. a partir do objetivo. Ou seja, não se pode

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atacar sem defender objetivos prioritários a Estratégia Nacional de Defesa (END) e nem defender-se sem atacar objetivos im- Doutrina Básica da Marinha (DBM): portantes do oponente. – a importância das LCM para fins A moderação e a honestidade da obra de comerciais e militares, bem como a neces- Corbett constituem-se em seu maior valor, sidade de proteção do próprio tráfego e ca- fugindo de simplificações e verdades ab- pacidade de destruição do tráfego inimigo; solutas. Seu pensamento permanece atual, – a interdependência entre os poderes pois este grande pensador entende que o naval, terrestre e aéreo e a consequente estudo teórico da estratégia deve ser visto necessidade de interoperabilidade entre as não como um substituto para a capacidade Forças Singulares; de análise e para a experiência, mas como – a necessidade de bases e pontos de um meio de fertilizar ambos. apoio em áreas de interesse, a fim de cum- prir função logística e possibilitar maior PRESSUPOSTOS CLÁSSICOS capacidade de permanência; VÁLIDOS NA ATUALIDADE – a superioridade da função diplomática das Esquadras, em função de sua capaci- Sintetizando o pensamento de ambos os dade de permanência e liberdade jurídica estrategistas citados e levando-se em consi- dos mares; deração a complementaridade de suas obras, – a necessidade de promover ou negar bem como considerando apenas os elemen- operações em terra; tos teóricos, válidos indeterminadamente, – a relativização do conceito de Domí- em oposição aos elementos doutrinários, nio do Mar, o qual adquire gradações em válidos apenas por tempo determinado, função do horizonte temporal, do espaço e constatamos que alguns preceitos gerais do objetivo. A DBM incorpora estes prin- permanecem válidos, sendo observada am- cípios ao elencar e descrever duas tarefas pla gama de correlações destes pensamentos básicas do Poder Naval, o Controle de Área com princípios constantes de documentos Marítima e a Negação do Uso do Mar; e nacionais dos mais diversos níveis, desde – a concepção estratégica e o dimen- o político até o tático, como, por exemplo, sionamento dos meios em função das

Figura 2 – Linhas de Comunicação Marítimas

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capacidades e tarefas a serem executadas interdependência entre acontecimentos no constituindo-se em sistemas para a conquis- mar e em terra e a importância do mar como ta ou disputa do controle e sistemas para o fonte de recursos e via de transporte, para exercício do controle. fins comerciais e militares. Conclui-se que, à luz dos pensamentos Quatro fatores tornam o mar crucial para estratégicos clássicos, um Estado como o o desenvolvimento econômico, industrial e Brasil não pode prescindir de capacidade condução da guerra: cobre 70 por cento da de projeção oceânica e de controlar áreas superfície do globo; 90 por cento do comér- marítimas de interesse, aspectos pertinentes cio mundial é feito pelo mar; as maiores a este trabalho. Deve-se discutir sobre qual cidades e populações urbanas vivem em a capacidade ideal em termos da concepção uma linha de até 200 quilômetros a partir estratégica, os propósitos políticos que de- dos litorais dos diversos continentes; e a ju- mandem seu emprego e a capacidade que risprudência e as convenções internacionais seja exequível sob os aspectos orçamentá- oferecem liberdade dos mares, ou seja, cada rio e tecnológico. Estado pode usar o mar para seus propósitos Por que ler os clássicos da Estratégia de comércio e defesa, sem interferência na Naval? Segundo Jean Guitton, os relemos soberania de outros Estados. para que eles nos façam ter ideias, e nós O uso econômico do mar consiste no homenageamos as ideias que eles jamais transporte comercial, na exploração de tiveram, mas que nós não teríamos tido recursos vivos e do subsolo, resultando que sem eles. o uso do mar é, fundamentalmente, o uso de sua superfície pelas plataformas necessárias ESTRATÉGIA às diversas atividades (HILL, 1990), e para CONTEMPORÂNEA sua plena utilização é necessário o estabe- lecimento de controle de área marítima, Primeiramente, ressalta-se o fato de sendo também vulnerável à negação do que a estratégia marítima contemporânea uso do mar. Portanto, é necessário possuir não apresenta, além da dimensão nuclear, essa capacidade, dimensionando-a a partir mudança de natureza em relação à estraté- de concepção estratégica adequada. gia marítima clássica, sendo as inovações tecnológicas suficientes apenas para multi- A concepção estratégica segundo as plicar o efeito do instrumento naval contra capacidades requeridas terra (COUTAU-BÉGARIE, 2010). Segundo Eric Grove (BAYLIS et al, A concepção estratégica deverá prever a 2005), poder marítimo é a combinação do materialização dos meios que irão compor poder nacional para a realização de comér- o Poder Naval do Estado e seu emprego. cio marítimo internacional e utilização dos As diferentes tecnologias e plataformas recursos oceânicos, com a capacidade de fazem com que a maior parte das Marinhas projetar poder militar para o mar, para os do mundo, em função das limitações orça- propósitos do mar e controle de área, e a mentárias, procure manter suas Esquadras partir do mar, para influenciar eventos em balanceadas. Quando essa limitação é ex- terra por meio de forças navais. trema, procuram se especializar em um tipo Percebe-se nesta definição dois con- específico de emprego, de acordo com suas ceitos fundamentais para o entendimento possibilidades e necessidades vislumbradas da estratégia marítima contemporânea: a (BAYLIS et al, 2005).

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Segundo Tangredi, as Marinhas podem As crescentes aplicações tecnológicas ser classificadas de acordo com seus meios da ciência contemporânea alavancaram o e sistemas disponíveis em: costeiras, oceâ- potencial econômico e militar dos países nicas (superfície), oceânicas (antissubmari- que foram capazes de tomar a dianteira no), litorâneas com capacidade anfíbia, de em termos de produção científica e de mares interiores, de deterrência estratégica, inovação. O poder gerado e acumulado espaciais e de guerra cibernética. por esses países foi indutor da reconfi- Para que uma Marinha seja considerada guração, à conveniência deles, da ordem como de projeção oceânica, é necessária internacional vigente, notadamente no sua composição de acordo com o seguinte último século (MOREIRA, 2012). escopo geral: navios de superfície que ope- rem helicópteros, submarinos de propulsão Estratégia para potências medianas nuclear, navios-aeródromos, aeronaves de patrulha e bombardeio com amplo raio Poder é a capacidade de um Estado de de ação, aeronaves de guerra eletrônica, influenciar acontecimentos. Potências media- mísseis de cruzeiro baseados em terra e nas, como o Brasil, possuem poder suficiente mar, capacidade de guerra antissubmarino, para atuar em defesa de seus interesses, porém aeronaves antissubmarino baseadas em não podem competir com superpotências. navio-aeródromo e aeronaves de patrulha Devem, desta forma, definir claramente o antissubmarino baseadas em terra. que podem e o que não podem fazer, de- Não obstante as críticas que podem terminando aquilo que podem proteger por ser feitas à pertinência dos meios acima si mesmas, e o que necessitam do auxílio elencados, estes podem ser considerados de alguma superpotência. Elemento-chave, como adequados para uma primeira idea- portanto, é o estabelecimento de alianças e lização de Poder Naval com real projeção sua utilização (HILL, 1990). oceânica. Cabe à estratégia naval brasileira, portan- Quanto aos aspectos orçamentários em to, definir meios e prioridades para o atendi- potências medianas, há, indubitavelmente, mento dos objetivos políticos nacionais. A um alto grau de inércia e falta de tradição política externa deverá posicionar o Brasil nos assuntos de Defesa, podendo variar sen- no SI em relação aos objetivos nacionais e sivelmente ao longo do tempo, em resposta ao estabelecimento de rede de cooperação a diversos fatores (HILL, 1990). internacional. O orçamento deverá contem- Conclui-se, portanto, que o dimensio- plar a formação do Poder Naval compatível namento estratégico do Poder Naval deve com as capacidades julgadas necessárias. resultar do seguinte processo: determinação Superpotências, como os EUA, são dos objetivos políticos quanto à envergadu- Estados que controlam as três categorias ra do Poder Nacional; concepção estratégi- de poder existentes (econômico, intelec- ca dos meios, de acordo com as capacidades tual e militar) em tal magnitude que sua requeridas; e adequação orçamentária, aplicação total resulta de forma decisiva a partir da previsão de recebimento de contra qualquer outro que não seja super- recursos dentro do horizonte temporal potência. Potências pequenas são as que se vislumbrado. Não é imaginável, portanto, encontram em baixo da escala hierárquica concepção estratégica válida se não for de poder no SI. Potências medianas são as exequível sob os aspectos financeiros e que se encontram entre a autossuficiência domínio tecnológico autóctone, pois: e a insuficiência (HILL, 1990).

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Potências medianas estendem seus O PENSAMENTO ESTRATÉGICO interesses além da integridade territorial e NAVAL BRASILEIRO independência política, ou seja, vão além da própria sobrevivência como Estados, Almirante Armando Amorim Ferreira incluindo aspirações econômicas e de in- Vidigal – Aspectos relevantes para a fluência internacional. A visão que o Estado Concepção Estratégica Brasileira tem de si mesmo é aspecto fundamental para a sua classificação. Analisando a concepção estratégica do O Brasil é o país mais poderoso da Poder Naval brasileiro a partir da capaci- América do Sul, ocupando posição privi- dade de fazer frente às vulnerabilidades no legiada, considerando-se capaz de prover mar, do alcance geográfico, da capacidade controle da área do Atlântico Sul em de emprego em apoio à política do Estado situação de emergência, e também tem e o aspecto orçamentário, o Almirante Vi- demonstrado julgamento independente digal nos fornece premissas fundamentais em relação a temas relativos aos EUA para a construção de nosso Poder Naval. e à Organização dos Estados America- Para Vidigal (2010), o alcance mínimo nos (OEA), bem como suscetibilidade a que podemos admitir para nosso Poder Na- eventual envolvimento em um conflito val é o das Águas Jurisdicionais Brasileiras global pelos EUA. Este seria o preço a ser (AJB), até 350 milhas náuticas a partir da pago pela aliança com uma superpotência costa, para garantir nosso direito de explorar (HILL, 1990). as riquezas do solo e subsolo da plataforma Para o estabelecimento do sistema de continental além da Zona Econômica Ex- cooperação para a segurança do Atlântico clusiva (ZEE), não sendo concebível nada Sul deverão ser levados em consideração os inferior, pois representaria renúncia ao di- fatores que possam acarretar em excessiva reito de defesa de nossos interesses no mar. dependência de potências alheias à região, Ressalta que não há, para a Marinha dos sob risco de torná-la área tutelada. EUA, a dicotomia entre Marinhas de Águas Potências médias não podem depender Marrons e de Águas Azuis, existindo apenas de sistemas de alianças para se contrapor a a percepção de que é necessário o desen- ameaças por potências de mesmo porte ou volvimento de meios com capacidade de menor, sob risco de deterioração ainda maior operação próximo ao litoral do inimigo, sem das relações e intervencionismo excessivo. arriscar as unidades mais caras e complexas Não há como confiar de maneira absoluta que garantem o domínio das águas azuis. nos fóruns internacionais para a solução Quanto à necessidade de parcerias e co- pacífica dos conflitos (HILL, 1990). ligações, há que se observar a possibilidade O dimensionamento do poder militar de securitização de problemas alheios ao deve levar em consideração o poder de Brasil no Atlântico Sul por parte de Estados Estados de porte semelhante, a fim de dissu- não pertencentes à região. adir conflitos. É interessante ressaltar que o Vidigal enumera os meios necessários incremento excessivo do poder militar pode para a defesa de nossos interesses no mar, vir a causar corrida armamentista em nível baseando-se em um planejamento por regional, a não ser que este incremento se dê capacidades, destacando-se o propósito da em salto tecnológico ou de escala que não projeção oceânica. A disponibilidade de um possa ser acompanhado por outras potências navio-aeródromo (NAe) constitui-se em médias da região. elemento insuperável de uma força naval,

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em virtude de sua ala aérea embarcada, mostrado a experiência, durante eventual além de sua capacidade de nuclear eventual período de crise, a compra de itens como força de intervenção (VIDIGAL, 2010). munição, sobressalentes, suprimentos e ma- Segundo Vidigal (apud VILELA, 2009), terial de reposição para um sistema militar o principal objetivo dos Estados subdesen- importado é sujeita a inaceitáveis injunções volvidos deve ser a dissuasão, que será tão políticas, como atesta o bloqueio sofrido eficiente quanto mais consistente for o Poder pela Argentina nas Malvinas. Nacional, não só no campo militar, mas Ainda que a região do Atlântico Sul também no político e no econômico. caminhe para a estabilidade e a integração, A utilização das Forças Armadas em fa- não podemos desconsiderar a instabilidade vor da diplomacia depende do valor da Força de países lindeiros e rivalidades históricas e da disposição dos governantes para seu em nosso continente. A grande considera- emprego. O problema estratégico nacional ção a ser feita é se o poder político bra- correlato à MB trata-se do dimensionamento sileiro estaria disposto a se afirmar como do Poder Naval. Grandes e poderosos navios potência e ser o fiador da paz na região. certamente darão mais credibilidade ao Poder Naval. Porém aspecto crítico é o orça- Política Nacional e Concepção mentário, devendo a formulação estratégica Estratégica Autóctone decorrer da identificação das aspirações na- cionais e vulnerabilidades estratégicas, para A História mostra claramente que o definição das capacidades necessárias, sendo poder somente é exercido por aqueles que o orçamento consequência deste processo são efetivamente capazes de influenciar (Vidigal, 2010). eventos de relevância no SI. Deve o Brasil, Porém a prática indica que o poder po- portanto, projetar e construir poder militar lítico estabelece o orçamento, restando às coerente com suas aspirações, como o Forças Armadas se adequar ao mesmo. Ad- incremento da influência a ser exercida no vêm duas ações: efetivamente se adequar entorno estratégico: ao orçamento; e efetuar amplo trabalho de O Atlântico Sul faz parte das áreas ma- convencimento das necessidades junto à rítimas estratégicas de maior importância sociedade e ao estamento político. para o emprego do Poder Naval brasileiro. Conclui-se que é necessário o plane- É definido como a região compreendida jamento de Poder Naval com projeção entre o Paralelo 16o N, a costa ocidental oceânica dentro da realidade orçamentária da África, a Antártica, o leste da América brasileira. Ao mesmo tempo em que se do Sul e o leste das Antilhas Menores, deve manter o planejamento daquilo que se incluindo as Águas Jurisdicionais Brasi- estima como ideal, deve-se simultaneamente leiras. (WIEMER, 2012) planejar em prazo mais curto aquilo que seja exequível e atenda ao emprego vislumbrado, Este é o chamado entorno estratégico, ainda que de forma limitada, estabelecendo objeto deste estudo quanto à concepção metas parciais e suas prioridades relativas, estratégica de Defesa e a necessidade da procurando a melhor relação possível entre obtenção de capacidade mínima para esta- o necessário e o desenvolvimento de projetos belecimento de controle de área marítima que contribuam para nossa base tecnológica. e efetiva capacidade de projeção oceânica. Pois, segundo Vidigal (citado por Sob a ótica do conceito hodierno de CUNHA e AMARANTE, 2011), como tem consciência situacional marítima, entendida

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como a efetiva compreensão de tudo o que igual para todas as tarefas do poder naval está associado com o meio ambiente marí- (sendo a dissuasão consequência da credi- timo e decorrentes impactos na proteção, bilidade das outras três), corre-se o risco de segurança, economia e ambiente de um país, sermos medíocres em tudo (END). há que se levar em consideração todos os A aprovação da END, portanto, constituiu fatores inerentes ao nosso entorno estratégi- marco significativo em relação à construção co, pois os eventos e as ameaças porventura de uma concepção estratégica propriamente observadas ou antevistas no mesmo serão os nacional. Deve-se, portanto, adequar o Plano grandes motivadores do emprego do Poder de Articulação e Equipamento da Marinha Naval, caso julgado necessário. Portanto, (Paemb) à realidade, incluindo metas par- deve-se, a partir das necessidades vislum- ciais e estabelecendo prioridades em caso de bradas, estabelecer concepção estratégica sua não-concretização total, possibilitando exequível e adequada a estes propósitos. o surgimento de uma Força de Submarinos Levando-se em consideração o pressu- capaz de exercer o propósito vislumbrado. posto da validade dos ensinamentos clássi- A execução do Paemb é subdividida em cos em sua sistematização entre Conquista, ações de curto prazo, médio prazo e longo Disputa e Exercício do Controle, percebe-se prazo, e sua concretização total demandará que iniciativas relevantes, como o Sistema um incremento orçamentário da ordem de R$ de Gerenciamento da Amazônia Azul (Sis- 7,5 bilhões/ano até 2030 (valores estimados). GAAz) e o programa de construção e aquisi- De acordo com o Plano Estratégico da ção dos navios-patrulha oceânicos (NPaOc) Marinha (PEM), principal documento de e navios-patrulha (NPa), são suficientes para planejamento de longo prazo da Força, é o pleno Exercício do Controle, mas não para estabelecida a sua missão: as operações de Conquista ou Disputa do Preparar e empregar o Poder Naval, a Controle de Área em operação oceânica. fim de contribuir para a defesa da Pátria. “Para dissuadir, é preciso estar pre- Estar pronta para atuar na garantia dos parado para combater. A tecnologia, Poderes Constitucionais e, por iniciativa por mais avançada que seja, jamais será de qualquer destes, da lei e da ordem; alternativa ao combate. Será sempre atuar em ações sob a égide de Organis- instrumento do combate” (END). mos Internacionais e em apoio à política externa do País; e cumprir as atribuições Aspectos orçamentários e planos subsidiárias previstas em lei, com ênfase exequíveis em curto e médio prazos naquelas relacionadas à Amazônia, a fim de contribuir para a salvaguarda dos Segundo a END, a Marinha deve ter interesses nacionais. (MARINHA, 2013). por foco: defesa pró-ativa das plataformas petrolíferas; defesa das instalações móveis Conclui-se que deverá ser atribuída prio- e portuárias, arquipélagos e ilhas oceânicas ridade ao Programa de Desenvolvimento na AJB; prontidão para responder a ameaças de Submarinos (Prosub), a fim de atender por Estado ou forças não convencionais ou à concepção estratégica prioritária. Porém criminosas às vias marítimas de comércio. é imperioso que a MB, desde já, inicie a A reconstrução da Marinha se dará de execução de um programa de médio prazo forma conjunta e desigual, sendo priorizada para que a Esquadra seja dotada de alguma inicialmente a capacidade de negar o uso do capacidade de projeção oceânica, a fim de mar por forças hostis. Caso se atribua peso tornar possível a execução da tarefa de

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Controle de Área Marítima, transformando de múltiplo emprego, 48 aeronaves de potencial em poder efetivo. Pois, segundo interceptação e ataque, oito aeronaves de Brodie, uma esquadra inferior pode afetar alarme aéreo antecipado e oito aeronaves consideravelmente as operações em outras de transporte e reabastecimento embarcadas. partes do mundo, ao conter número consi- Determina também as prioridades da derável de navios inimigos que teriam sido MB a curto prazo, para fortalecimento do mais úteis alhures. Poder Naval: Programa Nuclear da Marinha, De acordo com o Livro Branco de De- Prosub – quatro submarinos convencionais, fesa Nacional (LBDN), são estabelecidas um submarino de propulsão nuclear –, base quatro regras gerais para o orçamento da e estaleiro associados e transferência de tec- Defesa, destacando-se que o orçamento do nologia, Programa de Obtenção de Meios de Ministério da Defesa (MD) contemplará as Superfície (Prosuper) – cinco navios-escolta, prioridades definidas na END. Menciona um navio de apoio logístico e cinco navios- ainda a existência de plano plurianual da -patrulha oceânicos de 1.800 toneladas, União com horizonte temporal de quatro obtenção inicial de 27 navios-patrulha de 500 anos, sujeito a alterações anuais, incluindo toneladas e SisGAAz (MARINHA, 2013). contingenciamentos. Vislumbra-se o grande acréscimo dos Entretanto, em um Estado em que ainda aportes financeiros necessários de maneira existem condições sociais deficientes e me- contínua, ao longo do tempo, tornando tas a serem atingidas, a sociedade exigirá o Paemb exequível apenas na eventual parcela considerável de investimentos em configuração de um cenário extremamente áreas como Saúde e Educação, levando otimista. Há, portanto, que se efetuar a ade- vantagem competitiva na disputa orçamen- quação do dimensionamento da Força Naval tária em relação ao segmento de Defesa. ao orçamento previsto, em cenário realista, Adicionalmente, é inequívoca a dificul- estabelecendo prioridades de execução dade de conscientização e convencimento, daquilo que se julga mais importante sob o em uma sociedade que pouco trato teve ponto de vista estratégico e da exequibilida- com guerras, da necessidade de possuir de orçamentária e que nos traga, de forma capacidade de se defender para poder se gradativa, autonomia tecnológica. desenvolver. É preciso uma transformação Para que a MB seja considerada de pro- na percepção nacional quanto ao assunto. jeção oceânica, a fim de fazer prevalecer os O Paemb relaciona de forma macro os interesses nacionais no entorno estratégico, meios necessários para horizonte temporal deverá possuir as seguintes capacidades: de longo prazo: 20 submarinos conven- possuir escoltas com sistemas de armas e cionais; seis submarinos nucleares, base e sensores eficazes, e que operem helicópte- estaleiro navais associados a submarinos, 2a ros; submarinos como elemento de dissua- Esquadra e 2a Divisão Anfíbia e respectivas são contra a concentração de forças hostis bases, SisGAAz, construção do Núcleo do na região; aeronaves de patrulha e ataque/ Poder Naval – 46 navios-patrulha de 500 interceptação embarcadas; aeronaves de toneladas, 12 navios-patrulha oceânicos de guerra eletrônica embarcadas; aeronaves 1.800 toneladas, quatro navios-patrulha de de alarme aéreo antecipado embarcadas; e 200 toneladas, dois navios-aeródromos, 30 capacidade de guerra antissubmarino por navios-escolta –, quatro navios de propósitos aeronaves e escoltas. múltiplos, cinco navios de apoio logístico, O ideal seria que esta ala aérea embarcada seis helicópteros de ataque, 50 helicópteros operasse a partir de um NAe, porém nosso

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histórico orçamentário levanta sérias dúvidas sileira (FAB) (END). O trânsito de força quanto a nossa capacidade de mantê-lo em naval brasileira no entorno estratégico, operação. A força do NAe advém de sua ala sob ameaça de aviação baseada em terra e aérea, e não do navio propriamente dito. Para o fora do raio de ação dos meios da FAB, no pleno emprego desse conjugado, é necessário caso da indisponibilidade de interceptado- o planejamento conjunto do navio, sensores res, constitui-se na maior vulnerabilidade e aeronaves que irão compor sua ala aérea. vislumbrada, podendo ser mitigada por sis- Deve-se considerar, portanto, o planeja- temas de defesa antiaérea de médio alcance mento da construção ou aquisição de navios e capacidade de defesa de área. de porte menor do que o de um NAe, como O fundamental, qualquer que seja o navios de propósitos múltiplos (NPM) ou caminho trilhado, é o planejamento des- porta-helicópteros. Esses meios, de custo te conjugado como um só elemento. De de aquisição e manutenção consideravel- acordo com o projeto, estes navios podem mente inferiores ao dos NAe, além da ainda possuir capacidade de projetar poder menor complexidade de operação, podem sobre terra, possibilitando a realização de perfeitamente cumprir esta tarefa, ainda que operações anfíbias limitadas, intervenção de forma limitada. em área de interesse, evacuação de não- Somente a operação de ampla e balancea- -combatentes em área hostil, ações huma- da aviação embarcada possibilitaria a classi- nitárias e apoio a operações de paz sob a ficação da MB na categoria de terceiro nível égide de organismos internacionais. na hierarquia de seis níveis proposta por Estas unidades, acompanhadas de escol- Coutau-Bégarie, sendo a expertise da MB ta adequada, seriam balanceadas e dotadas em termos de operações aéreas a utilização de alta capacidade de permanência, a maior de aeronaves de asa rotativa. Dessa forma, virtude do Poder Naval. Quanto aos escol- a ala aérea de nosso poder naval poderia ser tas, além dos projetos de maior ambição, dimensionada com diversos tipos e classes devemos investir em um programa de de helicópteros, que cumpririam as tarefas construção de escoltas de menor porte, a de esclarecimento, patrulha antissubmarino, exemplo das corvetas classe Tamandaré, guerra eletrônica, alarme aéreo antecipado, dotados de sistemas confiáveis e com pa- ataque antissuperfície e antissubmarino, dronização logística, cuja diversidade atual fazendo valer a capacidade industrial em muito contribui para os altos custos de brasileira no setor aeroespacial de defesa, manutenção e baixa disponibilidade dos notadamente em estágio mais avançado que meios de superfície. o da indústria naval de defesa, o que poderia Há que se considerar o planejamento contribuir para a redução de custos e prazos conjunto com o Exército Brasileiro na e da dependência externa. tarefa de Defesa de Costa, com projeto e Quanto à grande deficiência vislumbra- instalação de bases de mísseis terra-mar da, a capacidade de interceptação aérea, ao longo do litoral, além da necessidade da aeronaves de decolagem vertical podem FAB dispor de elementos para a defesa de complementar as deficiências de intercepta- força naval brasileira nas AJB. ção e ataque dos helicópteros. Porém, como Estados alheios à região mantêm insta- já citado, o primeiro elemento de oposição lações de caráter militar em posições estra- tática a eventual NAe inimigo seriam os tégicas no Atlântico Sul e já demonstraram submarinos e a aviação baseada em terra, sua capacidade e vontade de utilização para por meios pertencentes à Força Aérea Bra- fazer valer seus interesses na região.

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O Navio-Doca Multipropósito Bahia quatro unidades, que constituirão o principal meio para o cumprimento das tarefas citadas A END estabelece que a Marinha deverá anteriormente e que substituirão os atuais possuir meios de Fuzileiros Navais em navios-desembarque doca (NDD) e navios de permanente condição de pronto emprego. desembarque de carros de combate (NDCC), A existência de tais meios é também es- construídos nas décadas de 1950 a 1980. sencial para a defesa das instalações navais A MB tem procurado navios do porte e portuárias, dos arquipélagos e das ilhas dos NDD e NDCC e, como a atual situação oceânicas nas AJB, para o transporte de fiscal não indica o início da construção do o1 pessoal e material para a região amazônica NPM, estimado em € 350 milhões, conforme em caso de crise ou conflito, como também proposta da Direction des Constructions Na- para atuar em operações de paz e em ações vales Services (DCNS) em 2012, a Força deu humanitárias em qualquer lugar do mundo, seguimento à obtenção do meio, bem como sob a égide de organismo internacional. de seu projeto, visando à futura construção Em decorrência da END, o Paemb de outras unidades em estaleiro no Brasil. apresentou as necessidades da MB para os Por se tratar de uma aquisição por oportuni- próximos 25 anos, no sentido de adequar a dade, algumas características do navio não po- Força ao prescrito naquele documento. Entre dem ser modificadas. A tabela (resumida) abaixo os projetos descritos, ressalta-se o dos NPM, compara os Requisitos de Estado-Maior (REM) o qual aponta a necessidade da construção de do NPM e as características do NDM Bahia.

Tabela - Requisitos de Estado-Maior (REM) do NPM e características do NDM Bahia

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Observando-se os dados comparativos Nossa política externa preconiza que de forma preliminar, verifica-se que as o Estado deve assumir um protagonismo características do navio atendem, de forma crescente no cenário internacional, enfatiza a geral, ao que foi estabelecido como requi- necessidade de integração regional, redução sitos de um NPM, plena ou parcialmente. do unilateralismo e estabelecimento de uma Dessa forma, o navio possui capacidade governança mundial harmônica. A história de operações aéreas, desembarque, trans- nos ensina que a diplomacia, por si só, não porte de materiais diversos, transferência e será suficiente para a concretização plena recebimento de materiais no mar e no porto, desses ideais. complexo hospitalar de nível 2, entre ou- O foco prioritário para o planejamento tros, chegando-se à conclusão de que é uma de Defesa brasileiro no mar se constitui na plataforma com multiplicidade de tarefas. orientação política de projeção de influên- O navio pode ser considerado como uma cia no entorno estratégico, de proteção da evolução dos antigos NDD/NDCC e, conse- Amazônia Azul e seus recursos e das LCM, quentemente, como o que mais se aproxima tornando necessária a projeção de poder para das características de um NPM, podendo ser além das AJB. Conclui-se que a MB deverá considerado como um navio de propósitos possuir capacidade de projeção oceânica. múltiplos de 1a geração, a ser aperfeiçoado. Torna-se interessante a observação dos A desativação do NAe São Paulo e a preceitos estratégicos clássicos válidos, obtenção do Navio-Doca Multipropósito como ponto de partida para o estudo teórico Bahia talvez representem, ainda que de do problema. A abordagem da comple- forma embrionária, um passo na direção da mentaridade das obras de Alfred Thayer concepção estratégica naval brasileira rudi- Mahan e Julian Stafford Corbett, unindo mentarmente vislumbrada neste trabalho. os aspectos principais de seus pensamen- tos, mostra-se de grande utilidade para a CONCLUSÃO identificação de aspectos pertinentes ao planejamento estratégico contemporâneo. A maior dificuldade da Estratégia Nosso planejamento estratégico deve Contemporânea, talvez, seja a identi- se basear na identificação das capacida- ficação de inimigos e elaboração de des necessárias, priorização das metas a hipóteses de emprego críveis. Portanto, serem alcançadas em função da limitação parece mais adequado o planejamento do orçamentária e continuidade crescente dos Poder Naval por capacidades, tendência projetos que nos tragam autonomia tecno- observada em Marinhas de potências lógica. Potências de médio porte, como relevantes no SI, como a do Reino Unido. o Brasil, devem ter seu pilar estratégico A geopolítica e a política externa dos principal na dissuasão. Desta forma, de- Estados devem influenciar diretamente veremos priorizar o desenvolvimento do suas concepções estratégicas. O Brasil, Prosub, o qual possibilitará o surgimento em função de sua privilegiada posição dos elementos de dissuasão por excelência. geopolítica no Atlântico Sul e de sua po- Outros projetos de grande porte devem ser lítica externa, deve adotar planejamento realizados após sua concretização, sob risco estratégico coerente e eficaz para que da não-concretização de nenhum. sejam atingidos os propósitos estabele- Porém apenas a dissuasão não será sufi- cidos pelos níveis político e diplomático, ciente para gerar capacidade de atuação no respaldando-os. entorno estratégico. Para tal, deve-se possuir

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a capacidade de projeção oceânica, de con- plataformas nacionais, o que trará desen- trolar área marítima e de realizar operações volvimento tecnológico para a indústria de intervenção, ainda que de forma limitada. de Defesa nacional e posicionamento de Somente a operação de ala aérea embarca- aviação baseada em terra, no litoral das da pode tornar adequada essa capacidade, regiões Norte, Nordeste, Sudeste e Sul para porém o histórico orçamentário brasileiro proteção à Força Naval nas AJB. levanta sérias dúvidas de que nosso Poder O essencial, quaisquer que sejam as Naval poderá contar com NAe plenamente decisões sobre o caminho a ser seguido, operacional, em curto ou médio prazo. é efetivamente elevar a transformação de A obtenção de meios como NPM ou nosso amplo potencial latente em capaci- porta-helicópteros torna-se fundamental, dade de poder efetivo, para que o Brasil conjuntamente com projeto de elaboração disponha dessa capacidade, para utilização de sua ala aérea embarcada, baseada em quando e onde se faça necessário.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Estratégia Naval Brasileira;

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ANEXOS

Figura 3 – Recursos Minerais nas Águas Jurisdicionais Brasileiras

RMB3oT/2017 121 ESTRATÉGIA NAVAL BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA: a necessidade da Projeção Oceânica

Figura 4 – Principais bacias petrolíferas brasileiras

Figura 5 – Bases militares da União Europeia no Atlântico Sul Disponível em:

122 RMB3oT/2017 OS DEZ SEGUNDOS DO ALMIRANTE ARLEIGH BURKE*

“A Marinha tem uma tradição e um futuro – e nós olhamos com orgulho e confiança em ambas as direções” (Almirante de Esquadra Arleigh Albert Burke)

ROBINSON FARINAZZO CASAL** Capitão de Fragata (T)

SUMÁRIO Introdução O legado positivo de uma lenda da Marinha

INTRODUÇÃO à prova em situações em que coragem, engenho e tirocínio lhes fossem exigidos o or mais rigorosas que sejam as exi- tempo todo. Na guerra, o mais leve engano Pgências que se façam a um oficial no fica gritantemente perceptível à crítica e à exercício de suas funções em qualquer condenação de todos. Marinha que se analise, as cobranças de A história que será contada a seguir se carreira dirigidas àquele em época de paz enquadra perfeitamente na afirmação acima, nem de longe se comparam às demandas pois narra a vida e a carreira de um oficial dos tempos de guerra ou de crise. Fato é que que, em seus 42 anos a serviço da Marinha existem militares que se sobressaem muito dos Estados Unidos da América (USN), ja- bem na rotina previsível dos quartéis, em mais conheceu tempos amenos. E que provou que erros podem ser mascarados, mas que ser um profissional extremamente valoroso talvez não tivessem tanta sorte se postos nos anos difíceis que seu país enfrentou.

*N.R.: Publicado na Revista Passadiço - 2016.

** Gerente de Aeronaves da Diretoria de Sistemas de Armas da Marinha. Graduado em Administração de Empresas pela Faculdade de Educação Ciências e Artes Dom Bosco de Monte Aprazível (Faeca). OS DEZ SEGUNDOS DO ALMIRANTE ARLEIGH BURKE

Arleigh Albert Burke, um descendente de de marinheiros americanos, que jamais imigrantes suecos, nasceu no interior do Esta- sairiam do anonimato em tempo de paz, dos Unidos da América (EUA), em Boulder, revelassem seus talentos guerreiros. Dentre Colorado (1901), e formou-se em Annapolis eles sobressaíram-se os Almirantes King, em 1923. Teve uma Nimitz, Mitscher, Fle- carreira naval plena tcher, Halsey e Spru- de aprendizado, ser- ance, mas o Capitão de vindo por cinco anos Mar e Guerra Arleigh no encouraçado USS Burke foi, seguramen- Arizona, sendo chefe te, o comandante de da artilharia, oficial contratorpedeiro (ou de torpedos e encar- destróier) mais famoso regado da navegação, de toda a guerra. dentre outras funções. E foi por vontade A essas comissões se própria que Burke, somariam os diversos que até aquela data cargos que exerceu em fatídica se encontrava vários contratorpedei- servindo num monóto- ros na década de 30. no cargo administrati- O início da Segun- vo, seguiu ao encontro da Guerra Mundial na do seu destino, tendo Europa iria encontrá- servido durante toda -lo no comando do a campanha contra os USS Mugford (DD- Almirante Arleigh Burke japoneses no Pacífi- 389). Sob o comando co Sul. Comandando de Burke, o navio um esquadrão de des- sagrou-se campeão tróieres na conquista de tiro, máquinas e Comandando um de Bougainville (nas comunicações. Como esquadrão de destróieres Ilhas Salomão), em inegável prova da novembro de 1943, sua competência e na conquista de ele travaria 22 en- liderança, dizia-se Bougainville ( Ilhas gajamentos contra o na época que aquele Salomão), em novembro inimigo em apenas destróier se enqua- quatro meses. drava perfeitamente de 1943, Arleigh Burke Foi sob sua lide- na clássica definição travaria 22 engajamentos rança que se tornou de “um navio feliz”. lendário o Esquadrão Tão feliz quanto contra o inimigo em apenas de Contratorpedeiros a América que, até quatro meses 23 (Little Beavers), o 1941, se mantinha qual cobrou um pre- próspera e fora da ço alto dos japoneses: guerra. Mas, em 7 de dezembro daquele destruiu um cruzador, nove destróieres, um ano, os japoneses atacaram a base ame- submarino, vários barcos menores e 30 ae- ricana de Pearl Harbour, nas ilhas do ronaves. O lema do Captain Burke era: “Os Havaí, permitindo que toda uma geração contratorpedeiros que fizerem contato com o

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inimigo devem atacar o mesmo sem esperar A Guerra da Coreia (1950-53) vai ordem do comandante de Força”. Por esta encontrá-lo no posto de contra-almirante, época, ele já fazia jus ao apelido pelo qual e ele desempenharia papel relevante (além era conhecido em toda a Marinha: “Burke 31 de ganhar muita experiência em assuntos nós”, em alusão à velocidade (espantosa para estratégicos) nas negociações de trégua os padrões da Segunda Guerra) que obrigava entre as forças das Nações Unidas (ONU) e os navios sob seu comando a manter em o exército da Coreia do Norte (KPA). combate. Amado pelos Volta aos EUA em armamentistas, era o 1954, onde exerceu terror dos maquinistas. diversos cargos, inclu- Em março de 1944, “Burke 31 nós”, amado sive o de comandante Burke é nomeado che- pelos armamentistas, era o da Força de Contrator- fe do Estado-Maior pedeiros do Atlântico. (CEM) da Força Ta- terror dos maquinistas Nesta altura de sua refa 58 (5a Frota de carreira, acontece um Porta-Aviões Ligei- fato que é considerado ros), sob as ordens do cé- perfeitamente meritó- lebre Almirante (aviador rio para alguns, mas naval) Marc Mitscher. redondamente injusto Este arranjo atendia a para outros: Burke foi uma sábia diretiva do promovido diretamente comandante de Ope- de duas para quatro es- rações Navais (Chief trelas, ou seja, ele nunca of Naval Operations – passou pelo posto de CNO), Almirante Ernest vice-almirante. A verda- J. King, segundo o qual de é que esta promoção comandantes de forças relâmpago estava lhe de superfície, como o abrindo as portas para Almirante Spruance, o cargo de comandante deveriam ter como CEM de Operações Navais um oficial aviador, bem (CNO), que assumiu como comandantes de efetivamente em 1955, forças aeronavais teriam praticamente no auge um oficial de superfície da Guerra Fria. como CEM. No início, Se havia dúvidas de nem Burke e nem Mits- alguns almirantes a res- cher ficaram muito sa- Míssil Polaris peito da competência de tisfeitos com este arranjo, Burke para o cargo, elas mas, com o tempo, formaram uma dupla rapidamente desapareceriam em virtude de inseparável e de altíssima sinergia, arquite- suas realizações. Senão, vejamos: tando todos os sucessos da Task Force 58 e – Ele apoiou o brilhante Almirante Hyman enfrentando até os ferozes ataques dos kami- Rickover no desenvolvimento da primeira kazes japoneses. Ambos ainda trabalhariam frota de submarinos nucleares do mundo. juntos, mais uma vez, no pós-guerra, até o – Instituiu o programa de mísseis balís- falecimento de Mitscher, em 1947. ticos lançados de submarinos (uma aposta

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inovadora, mas de alto risco à época, vestir em armas, ficando, assim, assegurado porque poucas pessoas acreditavam ser o equilíbrio. Menos mal. possível miniaturizar eficientemente uma Burke passou à reserva da Marinha em ogiva nuclear ao ponto da mesma caber em 1961, depois de ter servido como CNO um míssil lançado de submarino) – e daí por três turnos nas administrações dos veio o gigantesco Projeto Polaris. presidentes Eisenhower e Kennedy. – Um ponto a favor de sua capacidade de descortino é o fato de que, embora te- O LEGADO POSITIVO DE UMA nha passado toda a sua carreira naval na LENDA DA MARINHA Força de Superfície da USN, Burke soube, como almirante, se apartar de qualquer Muitas das tradições de aguerrimento preferência particular, compreendendo de e agressividade em combate da USN no maneira isenta que investir em submarinos pós-guerra, presumivelmente, se devem era o melhor cami- ao espírito que o Al- nho para a Marinha e mirante Arleigh Burke para os EUA naquele Muitas das tradições lhe infundiu nos anos momento – e isto é de aguerrimento e em que foi CNO. É pensar grande. agressividade em combate bem provável que ele – Como resulta- tenha ajudado bastan- do destas decisões, da USN no pós-guerra, te a moldar o caráter os EUA passaram a presumivelmente, se devem ofensivo da mesma. A contar com uma força necessidade disto se nuclear submersa di- ao espírito que o Almirante explica porque eram fícil de ser detectada Arleigh Burke lhe infundiu os anos de disputa de e indestrutível sob o nos anos em que foi CNO espaço com o bloco ponto de vista de sua comunista, e a Marinha totalidade. norte-americana era a A prova irrefutável da sabedoria e en- linha de frente do Ocidente nesse confronto. genhosidade desta decisão é o fato de que Foi o homem certo para a missão. nunca houve um conflito nuclear entre os Mas ele também tinha um lado profun- EUA e a União das Repúblicas Socialistas damente humano. Dizem que, certa vez, Soviéticas (URSS), vez que, dentre outros em um combate no Pacífico, o então Co- fatores, os soviéticos mandante Burke – um tinham plena ciência de perfeccionista incorrigível que, mesmo que con- e extremamente exigente seguissem destruir boa consigo mesmo – não parte da força nuclear teria ficado satisfeito com de seu oponente base- a própria conduta durante ada em terra e nos céus uma batalha que, apesar em um primeiro golpe, de indiscutivelmente vi- jamais poderiam ga- toriosa para os EUA, no rantir a destruição total seu entender poderia ter das forças nucleares resultado em perdas ainda submersas da USN. Só maiores para o inimigo lhes restou também in- Selo em homenagem a Burke japonês, não fora a demora

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dele próprio em dar a ordem para abrir fogo. Nesse momento, em uma flagrante prova de humildade e capacidade de fazer autocrítica, ele diz a um jovem guarda-marinha que se encontrava próximo: “A diferença entre um oficial brilhante e um medíocre é de apenas dez segundos”. Esse momento raro nos diz muito sobre a personalidade de Burke e o que se espera de um oficial de Marinha. Ao admitir seu erro para um oficial que iniciava a carreira naval, ele mostrou que um chefe militar precisa saber administrar suas fraquezas, que todos somos falíveis e teremos que reconhecer e conviver com estas deficiências. E que de- vemos nos preparar durante toda a trajetória profissional para tomarmos decisões críticas da forma mais correta possível, porque a vida não nos avisa previamente a data e a hora em que elas se farão necessárias. Contratorpedeiro classe Arleigh Burke A existência de uma Marinha pode ser mos nos tornado mais preparados do que medida em séculos. Mas a sua essência, seus na etapa anterior. Somos melhores quan- valores e, principalmente, seu compromisso do reconhecemos que para com o país ao qual ainda falta muito para serve, estes são deci- A diferença entre um oficial sermos apenas bons. didos naqueles meros Mas há algo muito dez segundos em que brilhante e um medíocre é mais importante do sua liderança decide de apenas dez segundos que tudo na história fazer o que é correto. de Burke: conforme Seja na paz ou na guer- Arleigh Burke já foi dito acima, ele ra, porque dificilmente começou a vida como quem decide errado na um filho de imigrantes calma da paz terá capacidade para fazê-lo suecos pobres do interior do estado do na agitação da batalha. Colorado. Com esforço e trabalho duro, Se fica algo de Arleigh Burke para chegou ao posto mais importante da USN nós, integrantes da Marinha do Brasil , é (nos EUA, o comandante de Operações que devemos nos preparar o tempo todo Navais é nomeado pelo Presidente da para o exercício de nossas funções. Isto República). Uma sociedade que oferece se aplica tanto a civis como a militares, estas oportunidades a imigrantes mostra oficiais ou praças. A busca do aperfei- ao mundo que, inobstante seus problemas çoamento deve ser constante e infinita, intrínsecos, acredita no poder e na força da diurna e noturna, e nenhuma oportunida- igualdade entre os homens, estando aberta de de aprendizado pode ser desperdiçada. a todas as línguas, credos e nacionalidades. Devemos fazer com que todos os nossos Os EUA são uma nação onde um homem dias tenham valido a pena por neles ter- vale, acima de tudo, por sua capacidade de

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se dedicar ao bem comum de seus pares, ele amou e serviu tão bem. Ele teve a independentemente de suas origens. graça de ver, no ano de 1988, o batismo O Almirante Arleigh Burke faleceu de uma das melhores classes de contra- em janeiro de 1996, aos 94 anos de torpedeiros de todos os tempos da USN idade, uma vida plena e longa dedicada e que, merecidamente, leva seu nome: os totalmente à Marinha e ao País a quem DDG Arleigh Burke.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: História da Marinha dos EUA; Contratorpedeiro;

128 RMB3oT/2017 MEDICINA DE PRECISÃO: uma breve visão geral

RODOLFO CASTELO BRANCO WADOVSKI* Capitão de Fragata (RM1-FN)

SUMÁRIO

Introdução Dados A participação do indivíduo Aspectos econômicos e sociais Controvérsias Conclusão

INTRODUÇÃO especialmente, as variabilidades genéticas individuais. A MP já é um tópico impor- desenvolvimento da biotecnologia e o tante nas discussões de políticas públicas O aumento do conhecimento sobre a ge- de saúde e de educação, bem como foco de nética humana fundamentam o que passou a análises econômicas, tecnológicas e éticas. ser conhecido como Medicina de Precisão Seu potencial é enorme para melhorar a (MP). A abordagem da MP leva em con- prevenção e o tratamento de doenças (PMI, sideração o estilo de vida, o ambiente e, 2015; AUFFRAY, 2016).

* Instrutor de Estratégia na Escola de Guerra Naval, mestre e doutorando em Administração pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. MEDICINA DE PRECISÃO: uma breve visão geral

A MP está diretamente vinculada ao de saúde, os dados que viabilizam esse entendimento das doenças, seu diagnóstico, ecossistema ainda precisam de uma es- tratamento e prevenção por meio de uma me- truturação em todas as dimensões do seu lhor compreensão da genética, do ambiente gerenciamento, desde a coleta e armaze- e de fatores comportamentais que afetam a nagem até o controle e compartilhamen- saúde. Espera-se que o aumento desse en- to, passando pelos desafios econômicos, tendimento leve a diagnósticos e tratamentos éticos, de privacidade, de segurança e de mais precisos e possibilite estratégias de regulação (ARONSON, 2015). prevenção mais eficazes e o desenvolvimen- to de novas terapias. Duas forças básicas DADOS contribuem para que as expectativas sobre a MP sejam grandes. A primeira é o avanço A Medicina de Precisão necessita de tecnológico, especialmente na genômica, na dados. Basicamente, estes são de três ca- coleta, no armazenamento e na análise de tegorias: genéticos, clínicos e ambientais. dados (big data e cloud Particularmente em computer), no mobile relação aos dados ge- health e nos sensores A Medicina de Precisão néticos, estes são obti- (Internet of Things - constitui-se de um dos por meio de testes IoT). A segunda força ecossistema complexo ainda genéticos, realizados é uma mudança cultu- em laboratórios ou em ral no campo da medi- em formação e precisa centros de pesquisas. cina, particularmente funcionar em sintonia para Esses testes possuem na maior participação dois componentes: um dos indivíduos nos possibilitar o entendimento componente técnico, processos relacionados dos mecanismos das que procura identificar à saúde (PMI, 2015). doenças e os necessários as variantes genéti- Todavia, ainda cas do indivíduo, e será necessário um diagnósticos, medidas de um componente in- tempo significativo prevenção e tratamentos terpretativo, em que para a realização ple- se procura avaliar as na desse potencial. implicações das va- A MP constitui-se de um ecossistema1 riantes identificadas. Tanto a identificação complexo ainda em formação, em que um das variantes quanto a interpretação do teste conjunto de atores, processos, tecnologias dependem de profissionais especializados e e aspectos críticos precisa funcionar em de bases de dados digitais que possibilitem sintonia para possibilitar o entendimento a comparação dos resultados. Aqui fica evi- dos mecanismos das doenças e os neces- dente a importância do acúmulo de dados sários diagnósticos, medidas de prevenção consistentes para a eficácia da MP: quanto e tratamentos. Particularmente, em razão mais dados e interpretações disponíveis, da rápida digitalização das informações melhor a possibilidade de o profissional

1 Um ecossistema é uma rede de entidades (empresas, governos, instituições etc.) que têm seus futuros interligados. Em especial quando a tecnologia da informação domina um mercado, ninguém consegue atuar isoladamente. O conceito de ecossistema vai além da tradicional cadeia de suprimentos e distribuição e permite a identifica- ção de relações entre atores de diferentes indústrias. Ele também mostra a intensidade de dependência entre os diversos atores e auxilia na detecção de relacionamentos vitais (Iansiti & Levien, 2004; Adner, 2006).

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que realizou o teste identificar as variantes serão disponibilizadas. A visualização de e interpretar corretamente o seu resultado. dados pelos participantes do ecossistema Cabe registrar que o genoma sequenciado da MP ainda está em estágio muito inicial no teste pode ser armazenado e reutilizado (ARONSON, 2015). quando necessário. A reutilização é justifi- cável pelo fato de que interpretações podem A PARTICIPAÇÃO DO se modificar à medida que são feitas novas INDIVÍDUO descobertas sobre determinados genes (ARONSON, 2015). Com a evolução da MP, o paciente O aprendizado contínuo requer o arma- está ganhando mais poder de decisão. O zenamento e compartilhamento de todos consentimento pelo paciente para o uso de os dados e conhecimentos adquiridos na seus dados é fundamental. Isso é importante interação com o paciente – não apenas os pelo fato de que o conhecimento genético dados genéticos, mas todas as informa- depende de pesquisa sobre uma grande ções de saúde disponíveis. Laboratórios quantidade de dados. Além dos testes que e centros de pesquisa estão produzindo os clínicos solicitam aos laboratórios, os uma imensa quantidade de dados prove- próprios indivíduos têm à sua disposição niente do sequenciamento de genomas, e a empresas que realizam seu sequencia- tendência para os próximos anos é que os mento e fornecem um laudo, como é o dados disponíveis para pesquisas biológicas caso da 23andMe. O serviço prestado por cresçam exponencialmente, possibilitando esse tipo de empresa é controverso, pois um maior conhecimento dos mecanismos elimina a necessidade de um médico para das doenças, seu diagnóstico, prevenção e orientar o indivíduo quanto ao que fazer tratamento. Entretanto, o gerenciamento em relação ao resultado do teste. No caso desses dados não está seguindo uma lógica da 23andMe, seus serviços passaram por padronizada, o que dificulta o uso das fer- um período de suspensão ordenado pela ramentas de bioinformática (ARONSON, justiça norte-americana, e atualmente o 2015; AUFFREY, 2016). resultado fornecido é limitado. Esse tipo de Os dados e as interpretações armaze- teste genético direto ao consumidor pode nados são disponibilizados por meio de ter impacto nas decisões de estilo de vida, EHRs (Electronic Health Records). EHRs nutrição e condicionamento físico (ARON- deveriam servir como portais para os clíni- SON, 2015; AUFFREY, 2016). cos acessarem todos os tipos de informação dos pacientes (genética, ambiental e clíni- ASPECTOS ECONÔMICOS E ca), facilitando a tomada de decisão para SOCIAIS diagnósticos e tratamentos. EHRs precisa- riam ser capazes de integrar informações A avaliação econômica da MP não é provenientes das mais variada fontes e simples. Os investimentos nos sistemas bancos de dados, tornando desnecessário que viabilizam o desenvolvimento da MP ao clínico saber qual a fonte original da- são de longo prazo. A análise econômica da quela informação. Todavia, trabalhar as MP deve incorporar múltiplas perspectivas, informações genéticas por meio de EHRs incluindo pacientes e seus familiares. No é complexo e ainda não está definido como caso dos atores que custeiam a MP, como é tais sistemas serão construídos, padroniza- o caso dos planos de saúde, sejam públicos dos e comercializados e quais informações ou privados, informações financeiras de

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custo-benefício são fundamentais para re- de doenças. Por outro lado, existe um duzir as atuais incertezas na hora de decidir movimento pelo banimento completo das pela realização ou não de testes genéticos. técnicas de alteração do genoma. Há uma O preço de um teste genético pode ter valor grande polêmica quanto às modificações absoluto muito elevado, mas ele pode ser genéticas que possam ser herdadas por compensador se evitar que no futuro o pa- futuras gerações. Associado a esse debate ciente venha a realizar um tratamento mais ético e social, existe uma regulação muito caro. Dúvidas também decorrem do fato de diversa, tornando a evolução da MP cercada que muitos testes ainda não têm evidências de incertezas (AUFFREY, 2016). de sua utilidade clínica. Entretanto, as expectativas são de que o desenvolvimen- CONTROVÉRSIAS to tecnológico e o compartilhamento de recursos e dados podem colaborar para a As expectativas em relação à MP não redução dos custos (NIH, 2012; PHILLIPS, são unânimes. Por exemplo, Michael 2013; ARONSON, 2015; DAVIS, 2016). Joyner e Nigel Paneth (2015) levantam Do ponto de vista algumas questões. Pri- da indústria farma- meiro, os dados que cêutica, a MP sig- Tecnologia, economia, alimentam os EHRs nifica redução da são de baixa qualida- escala, podendo ser educação, ética, de e precisam ainda vista como um servi- privacidade, segurança incluir vários dados ço premium, em que clínicos. Segundo, há a customização pode e legislação são alguns um marketing tenden- significar mais valor, dos aspectos críticos do cioso sobre MP que mas também um pre- ecossistema de Medicina interessa a algumas ço mais elevado. O instituições que pre- desenvolvimento da de Precisão cisam levantar fun- customização depen- Aronson dos governamentais. de de novas tecno- Terceiro, a MP, cuja logias para que seu natureza é persona- custo seja viável. Provavelmente a MP lizada, deve gerar custos mais elevados terá utilidade em condições particulares, do que medidas preventivas aplicadas à ou seja, em condições e populações espe- população em geral, como imunizações cíficas. De qualquer forma, a avaliação em massa, desincentivo ao fumo e melho- do valor da MP não pode se limitar a uma ria das condições sanitárias. Quarto, as análise apenas financeira (NIH, 2012; promessas da MP parecem ser irrealistas MINVIELLE, 2014). para melhorar a previsão de riscos à saúde, Desafios éticos e sociais emergem com gerar mudanças de comportamento, reduzir o desenvolvimento de técnicas de edição do custos e aumentar ganhos na saúde pública genoma, como é o caso da CRISPR-Cas92. para doenças comuns. Esses autores tam- Por um lado, há os que defendem o apro- bém questionam a capacidade de a genô- fundamento das pesquisas nesse campo mica prever significativamente o risco de argumentando com as potenciais curas doenças e a eficácia das drogas genéticas.

2 Vídeo didático sobre esta técnica de edição genética: https://www.youtube.com/watch?v=jAhjPd4uNFY

132 RMB3oT/2017 MEDICINA DE PRECISÃO: uma breve visão geral

CONCLUSÃO – Os resultados dos testes genéticos são armazenados em bancos de dados, que A MP é composta por um ecossistema servem para pesquisa e também como base complexo ainda incipiente. Médicos, de referência para a interpretação de novos pesquisadores, laboratórios, hospitais, testes. Essas bases de dados vêm crescendo planos de saúde, governos, empresas de exponencialmente, mas seus diversos ban- tecnologia e pacientes colaboram para a cos não são padronizados e sua visualização formação de um “ecossistema de MP”. pelos EHRs ainda é precária. Dentro desse ecossistema, a interpretação – O indivíduo está se tornando mais de todos esses dados gerados é a chave poderoso no que concerne à saúde devido para o sucesso da MP. E a qualidade dos ao acesso a mais informação, que o ajuda dados é essencial para a correta interpre- na hora da tomada de decisão quanto aos tação. Para acelerar a evolução da MP, são tratamentos médicos. Além disso, essa necessárias mudanças na infraestrutura e informação tende a ser de sua propriedade, mecanismos de coleta, armazenamento e o que exige que ele autorize seu uso por compartilhamento de dados. A falta de um terceiros, decisão que levará em conta sistema de gerencia- questões de privaci- mento eficaz de dados dade e segurança. pode ser a causa do A MP trabalha com a – O custo-benefí- reduzido impacto da compreensão de dados cio da MP ainda não é MP até o momento. claro. Aparentemen- Tecnologia, economia, genéticos, ambientais e te, no curto prazo o educação, ética, priva- comportamentais. Seu custo é elevado, mas cidade, segurança e le- as expectativas são de gislação são alguns dos potencial é enorme para o que no longo prazo, aspectos críticos desse diagnóstico, a prevenção e o em razão da evolução ecossistema (ARON- tratamento de doenças tecnológica, a MP SON, 2015). seja compensadora. Com base na breve – O ecossistema revisão bibliográfica apresentada acima, da MP ainda está em formação, mas já é pode-se destacar os seguintes pontos im- possível apontar que o gerenciamento dos portantes para uma compreensão ampla da dados é um aspecto-chave. Medicina de Precisão: Podemos concluir que a MP é um fe- – A MP trabalha com a compreensão nômeno extremamente complexo e que a de dados genéticos, ambientais e compor- estrutura que permitirá a realização plena tamentais. Seu potencial é enorme para o do seu potencial ainda está em estágio diagnóstico, a prevenção e o tratamento embrionário. As relações de atores, tec- de doenças. A evolução tecnológica e nologias, processos e aspectos críticos mudanças culturais são as forças que im- que se influenciam mutuamente dentro pulsionam a MP. do ecossistema da MP ainda não estão – No que concerne aos dados genéticos, compreendidas. Contudo, já é possível a MP os obtém originalmente de testes identificar que um pilar fundamental da MP genéticos, que têm duas componentes: é o gerenciamento de dados, o qual ainda a técnica e a interpretativa. Ambas são não possui uma arquitetura adequada ao fundamentais. seu funcionamento.

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1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ;Medicina; Assistência Médica;

BIBLIOGRAFIA

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134 RMB3oT/2017 A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS*

SERGIO DOS SANTOS SILVA** Capitão de Corveta

SUMÁRIO

Introdução A evolução da propulsão na História A propulsão híbrida Considerações Finais

INTRODUÇÃO função da crescente queda das reservas de petróleo de questões relacionadas à poluição esenvolver belonaves com o objetivo ambiental. Dde obter vantagens táticas no teatro Assim, ao longo da história humana, de operações navais sempre norteou as nações consegue-se identificar diversas transfor- beligerantes a adequar suas formas de pro- mações na área da propulsão e de sistemas pulsão, buscando otimizar algumas caracte- de governo que acompanharam a evolução rísticas da sua força naval, como mobilidade, da mecânica e da automação de suas épo- versatilidade e, principalmente, permanência. cas, bem como possibilitaram o surgimento Esta última característica passou a estar, re- das miríades inovações tecnológicas pre- centemente, atrelada à sustentabilidade, em sentes no mundo atual.

* 3o colocado no Concurso de artigos da Revista Passadiço-2016. ** Comandante do Navio-Patrulha Bocaina. Aperfeiçoado em Máquinas. A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS

barcações aumentaram suas dimensões em termos de comprimento, calado e boca. De maneira análoga, tam- bém cresceu o número de tripulantes, que chegou a 200 com os gregos, os gran- des vitoriosos da principal batalha naval desta era, a Batalha Naval de Salamina1, contando com embarcações aquinhoadas de duas ou três fileiras de remos, que deram nome às embarcações birre- mes e trirremes. Pode-se notar que, para este tipo de navios, preva- A evolução da propulsão lecia a característica da ma- nobrabilidade e velocidade das galeras, que Deste modo, este artigo procura caracte- buscavam sempre a abordagem, invasão do rizar a evolução das formas de propulsão ao navio inimigo e luta individual, onde se res- longo do tempo, concentrando sua atenção salta o surgimento de alguns artefatos navais, nos navios de guerra, pontuando, assim, como o esporão2 e o corvo3, desenvolvidos suas variações táticas e logísticas, além de pelos gregos e romanos. apresentar a atualidade, em termos tecno- lógicos, e suas tendências para o futuro da guerra naval.

A EVOLUÇÃO DA PROPULSÃO NA HISTÓRIA

Navios a remo

O registro histórico de embarcações a remo remonta à era antes de Cristo, e teve sua inserção dentro do cenário da guerra naval pelos egípcios por meio das primeiras galeras, que contavam, inicialmente, com 20 remadores. Gradativamente, estas em- Embarcação a remo

1 A batalha naval de Salamina decretou a manutenção da independência dos gregos contra a investida expansionista dos persas (Segunda Guerra Médica), usando o conhecimento prévio da Baía de Salamina para derrotar o inimigo em maior número. 2 Dispositivo posicionado na proa das embarcações que visava danificar a embarcação inimiga no momento da abordagem. 3 Dispositivo inventado pelo Império Romano que visava facilitar o embarque da sua tropa no navio inimigo.

136 RMB3oT/2017 A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS

Assim, pode-se destacar que esta pro- pulsão à base dos músculos humanos era muito restrita, em função das limitadas velocidades obtidas (cerca de 7 nós) e da extrema dependência da condição do mar e das intempéries climáticas, pois, em mau tempo, estas embarcações tinham que arribar (aproximar-se de terra para evitar danos).

Navios a vela

A interação vela e remo deu origem a Linha de batalha embarcações híbridas, que combinavam estas duas formas de propulsão e, natu- Com efeito, no século XVII, com o ralmente, fez com que os remos fossem desenvolvimento de canhões de maior abolidos no período do Renascimento4, calibre, a tática da abordagem e invasão caracterizando, assim, o surgimento dos da embarcação inimiga foi gradativamente canhões navais e navios com maiores substituída pela linha de batalha, na qual os calado e borda livre. navios formavam grandes linhas, em fila única, e realizavam uma abordagem a uma distância mínima e capaz de gerar danos ao navio inimigo pelo alcance dos seus ca- nhões. Surgiam, assim, os navios de linha, que tinham como principais características a mobilidade e o seu grande poder de fogo. À época, vencia o combate quem se aproximava mais rápido e possuía maior habilidade no emprego dos canhões.

Navios a vapor

O ocaso dos navios de linha a vela5 teve Navio de linha a vela início com a invenção das máquinas a vapor, A utilização do vento proporcionou criadas na Revolução Industrial inglesa. um aumento significativo da velocidade Porém a utilização destes maquinários e também da manobrabilidade, principal- em navios de guerra somente ocorreu em mente com o advento do leme (observando meados de 1810. princípios basilares da hidrodinâmica) e Ressalta-se que estes navios utilizavam com as alterações estruturais que estes as rodas de pás, inicialmente fabricadas em navios sofreram. madeira e posteriormente em metal.

4 O período do Renascimento ocorreu no transcorrer dos séculos XV e XVI, envolvendo principalmente a área da ciência, da cultura e, em especial, da matemática, privilegiando sempre a razão. 5 A transição dos navios de linha para os encouraçados a vapor foi muito lenta, porém tornou-se patente após a Batalha Naval de Hampton Roads, no transcurso da Guerra Civil americana, quando um navio de linha a vela foi facilmente afundado por um navio com blindagem metálica.

RMB3oT/2017 137 A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS

Considera-se esta a maior transição dos Neste mesmo período, em especial no sistemas de propulsão das belonaves, em início do século XX, com o crescimento dos função da substituição dos músculos hu- estudos relacionados à resistência dos mate- manos e do vento pela introdução do vapor, riais e da metalurgia, surgiram os encoura- que demandava a utilização do carvão como çados, que tiveram como ponto de inflexão forma inicial de combustível. e fator motivacional a construção do HMS Não obstante, em meados de 1840, a Dreadnought pela Marinha do Reino Unido. relação entre as principais potências navais, A construção deste navio serviu para fazer França e Inglaterra, era bastante tensa, fato frente à expansão marítima da Alemanha. que as levou a uma grande corrida pelo de- senvolvimento de seus meios navais, época em que a hélice surgiu para substituir defini- tivamente as rodas de pás, bastante frágeis e alvos certos para a esquadra inimiga.

Navio encouraçado com propulsão a vapor

Contava com 18 caldeiras atreladas a turbi- nas a vapor, com capacidade de desenvolver Embarcação híbrida vela/vapor velocidades próximas de 20 nós, e com costado a base de aço (couraças). Neste período embrionário da propulsão a vapor, consegue-se depreender algumas Navios das grandes guerras mudanças técnicas e táticas desta transição, e do pós-guerra como abaixo se lista: – Com a combustão, passou-se a gerar Os navios característicos da Primeira e gases de descarga que podiam ser visualiza- da Segunda Guerra eram, em sua maioria, dos pela força inimiga com maior facilidade. com propulsão a vapor, extremamente – As caldeiras a vapor tinham um alto dependentes de um conjunto de caldeiras, consumo de combustível, o carvão, que, à muitas delas ainda alimentadas a carvão, fato época, por não ser um líquido, era de difícil ar- que dificultava enormemente a logística e mazenamento no navio, demandando, assim, mitigava, sobremaneira, a autonomia destes a formação de uma grande cadeia logística navios no teatro de operações. de fornecimento, limitando, desta forma, a Entretanto, com a evolução dos sistemas autonomia e o raio de ação destes navios. de propulsão e também dos combustíveis, – A enorme gama de máquinas auxiliares, foram inseridos neste contexto os motores necessárias à manutenção do funcionamento de combustão interna e as turbinas a gás. De do navio, tornando, assim, baixos os índices antemão, no que tange aos combustíveis, de confiabilidade e disponibilidade para os que passaram a ser líquidos, tornou-se mais sistemas em tela. fácil a sua armazenagem a bordo por meio

138 RMB3oT/2017 A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS

de tanques e a sua transferência por meio de espacial dos equipamentos motrizes, fato navios-tanque. que possibilitou aumentar o espaço livre Foi no período das grandes guerras que nas praças de máquinas dos navios. o conceito termodinâmico do rendimento Após a Segunda Guerra Mundial, surgiu térmico ganhou maior notoriedade, em fun- a possibilidade de combinar tipos diferentes ção do mesmo estar atrelado à comparação de propulsão, que conseguiam unir a maior entre a potência entregue à propulsão do navio e a energia disponível na queima dos combustíveis. Neste aspecto, consegue-se identificar que as turbinas a vapor, alimentadas a carvão, possuíam rendimento na ordem de

Navio-aeródromo com propulsão nuclear

economia de combustível e eficiência tér- mica dos motores de combustão interna ao grande desempenho que as turbinas Motor de combustão interna modernas proporcionaram em termos de velocidade, quando as mesmas atingiram sua maior evolução. Desta forma, conseguia-se efetuar os deslocamentos dos navios de maneira mais econômica, gastando menos com- bustível, aumentado assim a autonomia destes meios. Já no teatro de operações, esta combinação, através das turbinas, proporcionava aos navios da época um Turbina a gás aumento substancial de velocidade, que facilitava, assim, a assunção de posições táticas previstas e mudanças de postos 10 a 20%. Com o surgimento das turbinas impostas. Em suma, os navios tornavam- a gás, o rendimento otimizou-se a valores -se mais flexíveis. que giravam em torno de 25%; porém foi Assim, com incremento das velocida- com os motores de combustão interna que des desenvolvidas pelos navios, bem como a eficiência, realmente, deu um salto para dos armamentos (por meio da invenção valores próximos de 45% e 55%. dos mísseis e do aumento dos alcances dos Outras características que trouxeram canhões), a guerra naval fez com que as o ocaso do sistema anterior, em especial forças navais se enfrentassem a distâncias dos atrelados ao carvão, foi a diminuição cada vez maiores, fato que influenciou as

RMB3oT/2017 139 A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS

táticas navais vigentes, contribuindo para combustível, as principais Marinhas do o surgimento dos navios-aeródromos, em mundo convergiram para plantas propulso- primeiro plano no fim da Segunda Guerra, ras com altos rendimentos térmicos e baixo e atualmente com navios-aeródromos a consumo de combustível. Entretanto, a sua propulsão nuclear. reserva de velocidade foi mantida, extrema- Em linhas gerais, a propulsão nuclear ca- mente necessária para os momentos mais racteriza um regresso à época das caldeiras, críticos de uma beligerância. porém a forma de aquecimento da água, que Assim, a Marinha norte-americana envere- visa à geração do vapor, é oriunda de uma da para um projeto de modernização da planta reação nuclear conduzida em um reator. propulsora dos navios da classe Arleigh Burke, Obviamente, com a evolução contínua que usará uma forma híbrida, caracterizada da tecnologia, os demais equipamentos pela interação entre a forma convencional foram modernizados, inclusive as turbinas das turbinas a gás e a utilização de motores acionadoras do eixo, as quais são capazes elétricos. Esta interação acontece por meio de prover maiores torques e velocidades atreladas aos navios utilizadores, fato este que disseminou a utilização deste tipo de propulsão em navios-aeródromos de todo o mundo, os quais têm grande deslocamento e também possuem altas demandas de veloci- dade em função da contínua necessidade de vento para lançamento de aeronaves. Outra herança da Segunda Guerra Mun- dial nos navios de superfície, em função da Batalha do Atlântico, que desencadeou uma busca excessiva por dificultar as ações de detecção dos submarinos, foi o surgimento de uma notória evolução da guerra antissub- marino6, a qual elegeu a propulsão baseada na turbina a gás como a mais silenciosa e Planta de propulsão disseminou esta forma de propulsão nos navios-escolta. de um motor elétrico de alta performance, instalado logo após a engrenagem redutora7, A PROPULSÃO HÍBRIDA que consegue manter a propulsão do navio com velocidades de até 15 nós, permitindo, Com as recentes demandas mundiais assim, a parada das quatro turbinas associadas relacionadas às questões ambientais e tam- à mesma engrenagem redutora. bém com a crescente pressão por redução A alimentação deste motor elétrico de custos, em especial no consumo de óleo acontece por meio de um conversor bidi-

6 Principalmente sob ameaça, os navios de guerra adotam a condição de navios silenciosos, em que as bombas, motores elétricos, da propulsão e geradores de energia, notoriamente menos ruidosos, são mantidos em funcionamento, a fim de dificultar o processo de detecção dos submarinos da força inimiga. 7 Engrenagem redutora tem a finalidade de adequar a rotação oriunda da fonte motriz da propulsão (motor de combustão interna, turbina a gás, turbina a vapor etc.) à rotação do eixo do navio, em geral reduzindo esta rotação, prevenindo, assim, o aparecimento de cavitação nos hélices.

140 RMB3oT/2017 A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS

recional elétrico, por meio do fornecimento classe Tide, o qual seguirá critérios de de energia estabilizada oriunda do sistema sustentabilidade e de proteção ambiental de geração de energia, que também conta em consonância com o conceito Mars8, com turbinas a gás. com capacidade de transferir combus- Desta forma, a economia de combustível tível, água doce, comida, munição e ocorre, em sua maioria, especialmente na combustível de aviação. condição de trânsito para a cena de ação, Não obstante, ressalta-se que, neste com velocidades de até 15 nós – situação navio-tanque, a interação com o motor em que a maioria dos navios permanece elétrico ocorre tanto entre motores de por um maior tempo. Importante registrar combustão interna como com turbina que este meio consegue atingir velocidades a gás, obedecendo à mesma linha de de até 30 nós quando utilizando suas quatro raciocínio supracitada para os escoltas turbinas propulsoras. estadunidenses. Ainda sobre estes escoltas, ressalta-se que a utilização de hélice de passo controlá- CONSIDERAÇÕES FINAIS vel (HPC) otimiza sensivelmente o sistema quando utilizando os motores elétricos, Com o descortinar das novas tecnolo- reduzindo a geração de ruídos atrelados à gias e a própria evolução técnica no cam- propulsão, tornando, assim, estes navios po da engenharia, nota-se que os navios mais silenciosos, dificultando sobremaneira acompanharam esta progressão, fazendo o processo de detecção por possíveis subma- surgir belonaves mais confiáveis, flexíveis rinos inimigos. e versáteis. De maneira análoga e seguindo a De maneira análoga, os maquinistas mesma linha de raciocínio, a Marinha do também tiveram que evoluir, tendo de adi- Reino Unido, em especial o seu setor au- cionar ao seu portfólio de conhecimentos xiliar (Royal Fleet Auxiliary - RFA) está questões relacionadas com automação, projetando o seu próximo navio-tanque controle e química (aplicada, principal- mente, nas análises de lubrificantes e com- bustíveis), campos da ciência largamente empregados nas modernas máquinas de nossa atualidade. Entrementes, tem-se por base no corrente artigo não somente a evolução dos navios e seus mecanismos de propulsão e sistema de governo, mas também suas consequências e implicações no campo da tática da guerra naval, muitas vezes pontuada neste artigo por batalhas navais homéricas. Toda esta evolução mostrou a atual tendência da condução da guerra naval Navio-Tanque com suas forças antagônicas localizadas a

8 Military Afloat Reach and Sustainability tankers (Mars) – Navio de apoio logístico sustentável, com casco duplo, a fim de atender às resoluções recentemente emanadas pela Organização Marítima Internacional (IMO).

RMB3oT/2017 141 A EVOLUÇÃO DAS FORMAS DE PROPULSÃO E SUAS IMPLICAÇÕES TÁTICAS

grandes distâncias. Tal fato também se deu permitindo que os navios se adaptem da por conta do notório avanço nos sistemas maneira mais célere possível às exigên- de armas e mísseis. cias do teatro de operações navais. Assim, não se consegue imaginar um Por fim, pontua-se que a tendência crescimento no campo da tática naval sem das Marinhas mais desenvolvidas é passar por uma evolução na propulsão dos enveredar para navios com propulsões navios de superfície, os quais, certamente, combinadas e extremamente flexíveis, serão exigidos ao seu limite em caso de não deixando de observar as questões beligerância naval, reforçando, assim, ambientais e a maior autonomia, princi- a necessidade de sistemas de propulsão palmente no que concerne ao consumo extremamente confiáveis e flexíveis, de óleo combustível.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Propulsão; História Marítima;

REFERÊNCIAS

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142 RMB3oT/2017 PLANEJAMENTO MILITAR E AS ESCOLAS DE PENSAMENTO ESTRATÉGICO DE MINTZBERG*

IGOR DE ASSIS SANDERSON DE QUEIROZ** Capitão de Corveta (RM2-IM)

ANA CAROLINA PIMENTEL DUARTE DA FONSECA*** Doutora em Administração pela Coppead-UFRJ

FLÁVIO SERGIO REZENDE NUNES DE SOUZA**** Capitão de Corveta (IM)

MARCOS JOSÉ ARAÚJO DOS SANTOS***** Capitão de Corveta (IM)

SUMÁRIO

Introdução Fundamentação teórica Considerações Finais

INTRODUÇÃO nos grupos de pesquisa sobre história de negócio, em 1927, na Harvard Business urante a década de 1980, pudemos School, nos Estados Unidos, ganhando mais Dobservar um impressionante movi- consistência a partir de 1950. Nesse sentido, mento de expansão da literatura acerca da podemos considerar a publicação da obra Administração Estratégica. Segundo Jeremy Administrative Action: the Techniques of (2002, apud MACIEL, 2007), o estudo da Organization and Management (NEW- estratégia no meio acadêmico teve origem MAN, 1951) como o marco inicial desta

* A versão preliminar do artigo foi apresentada no VIII Encontro Nacional da Associação Brasileira de Estudos de Defesa, em 2014, em Brasília, com o título: “O moderno processo de planejamento militar e as escolas de pensamento estratégico de Mintzberg: uma análise comparativa.” ** Mestre em Ciências Contábeis pela Faculdade de Administração e Ciências Contábeis da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FACC –UFRJ). *** Professora da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis da Universidade Federal do Rio de Janeiro (FACC –UFRJ). **** Mestre em Administração pela Escola Brasileira de Administração Pública e Empresas (Ebape – FGV) – Encarregado das Seções de Planejamento Estratégico e de Consultoria do Programa Netuno na Diretoria de Administração da Marinha (DAdM). ***** Mestre em Ciências Contábeis pela Faculdade de Administração e Finanças da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FAF-UERJ) – Encarregado da Divisão de Auditoria em Suprimento de Bens e Serviços no Centro de Controle Interno da Marinha (CCIMAR). PLANEJAMENTO MILITAR E AS ESCOLAS DE PENSAMENTO ESTRATÉGICO DE MINTZBERG

disciplina, nos moldes como a concebemos Entretanto, a despeito da origem atualmente (MINTZBERG; AHLSTRAND; comum, observamos diferentes formas LAMPEL, 2000). Por outro lado, para Alday práticas de aplicação de conceitos comuns (2002), os estudos sobre estratégia nos ne- ao PPM e às Escolas de Pensamento Es- gócios tiveram início com o livro Strategic tratégico no mundo corporativo. Management, de Igor Ansoff, em 1965. Sendo assim, o presente artigo tem como Analisando a etimologia do vocábulo principal objetivo descrever os fundamen- “estratégia”, do grego antigo stratègós (em tos do Processo de Planejamento Militar e que stratos significava “exército”, eagos das Escolas de Pensamento Estratégico de significava “condução”), fica evidente Mintzberg e fazer uma análise comparativa que seu conceito se originou de práticas entre estas doutrinas e suas ferramentas, militares utilizadas há milênios. O mais apontando semelhanças e diferenças. notório exemplo disto é o compêndio The A contribuição esperada deste trabalho Art of War, cujos ensinamentos foram é ampliar o debate sobre a temática da Ad- eternizados pelo general chinês Sun Tzu ministração Estratégica, apresentando os por volta do século IV a.C. (GRIFFITH, métodos usados no PPM, pouco conhecidos 1971 apud MINTZBERG; AHLSTRAND; do grande público, mas bem conhecidos e LAMPEL, 2000; ALDAY, 2002). Tam- aceitos no meio militar. bém podemos citar como exemplo os princípios legados em Vom Kriege (“Da FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Guerra”, tradução livre), de von Clau- sewitz (ALDAY, 2002). O método do PPM O Processo de Planejamento Militar (PPM) hodiernamente difundido é uma O Processo de Planejamento Militar é técnica ampla de evidenciação e orien- baseado no método de raciocínio cartesia- tação de ideias, que tem por finalidade no. Proposto originalmente por René Des- auxiliar o Comandante na obtenção de cartes em seu tratado Discours de la Métho- uma solução bem fundamentada para um de (Discurso do Método – tradução livre), Problema Militar (BRASIL, 2006). Por de 1637. O cartesianismo fundamenta-se sua vez, um Problema Militar pode ser em quatro preceitos: evidência, análise, conceituado como a perturbação de uma síntese e enumeração (BRASIL, 2006). situação, antes equilibrada, em que estão A utilização de forma adequada do presentes forças militares antagônicas. A método transmite confiança aos executores solução do problema consiste na interven- das ações, por saberem que o planejamento ção que restabeleça o equilíbrio prévio, ou foi feito de maneira criteriosa, resultando que tenha como consequência a criação em ordens absolutamente claras a serem de um novo cenário mais favorável que o cumpridas. Analogamente, o responsável anterior (BRASIL, 2006). pela solução do problema, no caso do PPM, Em Strategy Safari, Mintzberg, Ahls- o Comandante, terá a segurança de saber que trand e Lampel (2000), descreveram dez todas as condições presentes foram consi- escolas de pensamentos estratégicos, de deradas e as melhores linhas de ação foram natureza prescritiva, descritiva e híbrida adotadas, aliviando a pressão psicológica (da configuração), as quais surgiram em comum em cenários de conflito. períodos distintos do campo da adminis- O método proporciona ainda disciplina tração estratégica. de raciocínio, reduzindo a subjetividade das

144 RMB3oT/2017 PLANEJAMENTO MILITAR E AS ESCOLAS DE PENSAMENTO ESTRATÉGICO DE MINTZBERG

decisões, possibilitando maior rapidez na na campanha (como operações, logística e apreciação dos fatos e facilitando a mútua inteligência por exemplo). São examinados compreensão entre planejador e executores todos os dados e recursos disponíveis, e (BRASIL, 2006). formulam-se as Possibilidades do Inimigo (PI) e as Linhas de Ação (LA), as quais Principais Conceitos do PPM serão confrontadas, de forma a se chegar à Decisão, que é a escolha da melhor LA. Os termos abaixo podem ser conside- Durante a segunda etapa é elaborado rados os principais conceitos utilizados no um documento denominado Diretiva, que PPM (BRASIL, 2006): é um plano detalhado, apresentando como Tarefa – ação específica, cuja redação a decisão do Comandante será executada se inicia por um verbo no infinitivo, que pelos subordinados. Esse plano também cumpre ou contribui para o cumprimento deve prever os instrumentos de controle da missão. Formada por uma ou mais linhas da ação planejada. de ação. Por fim, a terceira etapa consiste no Propósito – finalidade a ser alcançada a monitoramento do andamento das ações partir da execução de determinada tarefa. conforme o planejamento, e a introdução Missão – indica o que deve ser feito, e das correções necessárias para assegurar o para quê. Constitui o somatório de “tarefa” cumprimento da missão. + “propósito”, unidos pela expressão “a fim de”. Teste de “AEA” Possibilidades do Inimigo (PI) – ação que o inimigo é capaz de adotar, compatível Antes de serem implementadas, as LA com os seus recursos e capaz de afetar o devem satisfazer a três condições funda- cumprimento da missão. mentais. A esta verificação denominamos Linha de Ação (LA) – atitude realizá- teste de “AEA”: vel, por meio do qual a missão pode ser Adequabilidade – as ações realizadas cumprida. Abarca “o que” deve ser feito, deverão efetivamente produzir os efeitos e “como fazer”. desejados para a consecução da tarefa a que pertencem. Etapas do PPM Exequibilidade – antes da escolha da LA, devemos verificar se é possível empre- A doutrina divide o PPM em três etapas ender a ação com os recursos disponíveis. básicas: Exame da situação; Desenvol- Aceitabilidade – ainda que sejam ade- vimento do Plano de Ação e Elaboração quadas e exequíveis, temos que avaliar da Diretiva (Depaed); e Controle da Ação também se as consequências das ações a Planejada (BRASIL, 2006). serem adotadas são justificáveis à luz da Na primeira etapa, que é considerada a relação custo-benefício, e aceitáveis quanto base do processo, é reconhecida a existên- aos aspectos morais. cia do problema. Enuncia-se então a missão Como exemplo, podemos citar a LA a ser cumprida para reestabelecer a situação “lançar uma bomba atômica sobre a ci- anterior ou criar outra ainda mais favorável. dade”, componente da tarefa “destruir o O Comandante conta com o auxílio do quartel-general inimigo”. Embora o lan- Estado-Maior, colegiado de especialistas çamento da bomba seja adequado (pois em diversas áreas disciplinares envolvidas vai destruir a cidade inteira, incluindo o

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quartel-general inimigo), e exequível (se Escolas de Natureza Prescritiva tivermos uma bomba atômica disponível), provavelmente esta LA não seria aceitá- Procuram explicar como o as estratégias vel, pois traria consequências ambientais devem ser formuladas. São elas: muito danosas, além de contrariar acordos Escola do Design – Esta apresenta o internacionais e de provocar a morte de desenho da estratégia como um processo de muitos civis. concepção, baseado em avaliações das si- tuações externas e internas da organização. O Processo do PPM Dessa forma, visa o desenvolvimento de um modelo único, individualizado para cada De acordo com o Manual de Planeja- caso, buscando revelar as forças e fraquezas mento Operativo da Marinha – Processo de da organização e evitando as ameaças e Planejamento Militar, Volume I (BRASIL, aproveitando as oportunidades do ambiente 2006), o PPM pode ser representado segun- externo. Aplica os testes de consistência, do o esquema da Figura 1. consonância, vantagem e viabilidade, usa- dos na avaliação e escolha da estratégia. Introduziu a conhecida “Matriz SWOT - Strenghts, Weaknesses, Opportunities and Threats” (For- ças, Fraquezas, Oportunidades e Ameaças – tradução livre), que é a principal ferramenta dessa escola. Cabe ressaltar que a exe- cução da estratégia não é posta em prática por quem a concebeu. Essa escola esta apoiada em al- gumas premissas (LOBATO et al, 2012), dentre elas ressalta-se: – A estratégia deve ser formu- lada por meio de um processo ra- Figura 1 – Processo de Planejamento Militar Fonte: BRASIL (2006) cional, formalizado e controlado, deliberado e não intuitivo; – A responsabilidade pela formulação Escolas Estratégicas de Mintzberg e controle da estratégia é de um indivíduo: o estrategista; Nenhuma das escolas estratégicas visu- – O modelo de formulação da estratégia aliza a estratégia como um todo, tendo em deve ser simples e informal; vista que cada uma delas estabelece suas – As estratégias devem ser únicas, con- soluções de acordo com suas premissas forme as especificidades da organização; (LOBATO et al, 2012). Apresentamos, – As estratégias devem ser explícitas; e resumidamente, as principais caracte- – O processo de design está completo rísticas de cada uma das 10 escolas de quando as estratégias estão prontas para estratégia, classificadas conforme sua serem implementadas. natureza, segundo Mintzberg, Ahlstrand Escola do Planejamento - compartilha e Lampel (2000). de muitas das premissas da escola do de-

146 RMB3oT/2017 PLANEJAMENTO MILITAR E AS ESCOLAS DE PENSAMENTO ESTRATÉGICO DE MINTZBERG sign, porém a concepção da estratégia é um o comprometimento dos colaboradores. processo formal, com uma rígida sequência Nessa escola a estratégia é flexível, e o de etapas a serem seguidas. Neste contexto, líder pode adaptá-la às mudanças ocorridas foi introduzido o conhecido “Sistema de no ambiente. Assim, a estratégia torna-se Planos” do Stanford Research Institute deliberada, pois há um senso de direção (STEWART, 1963, apud MINTZBERG; a ser seguido, e emergente em seus deta- AHLSTRAND; LAMPEL, 2000). O lhes, porque pode ser adaptada durante a executivo principal não formula pessoal- implementação (LOBATO et al, 2012). mente a estratégia, mas sim é responsável Uma crítica que se faz a essa escola é que por aprovar o que foi desenvolvido pelos a estratégia é centralizada em uma única “planejadores” da organização. As estra- pessoa, e consequentemente, a organização tégias devem ser implantadas por meio de é muito dependente deste “líder visionário”. objetivos, programas e planos operacionais, Escola Cognitiva – utiliza o campo em todos os níveis da organização. da psicologia cognitiva, assim busca- Escola do Posicionamento – muito -se entender os processos mentais dos influenciada pelas ideias contidas na obra estrategistas. Essa escola é moldada pela Competitive Strategy (PORTER, 1980). experiência e se divide na ala objetiva, Nessa escola a elaboração da estratégia é orientada para a estruturação do conheci- proveniente da análise da organização no mento, e na ala subjetiva, orientada para a contexto da indústria na qual ela se encontra. interpretação do mundo (LOBATO et al, Assim, defende a existência de estratégias 2012). Uma crítica a essa escola é o fato de genéricas (opostamente à Escola do Design) que as estratégias podem ser perspectivas para alcançar o posicionamento desejado resultantes da percepção “deturpada” da em determinada indústria. Portanto, sua realidade na mente do estrategista, e assim, formação é resultado de um processo formal, apresentar difícil realização. usando cálculos analíticos realizados pelos Escola de Aprendizado – a formulação da planejadores e aprovados pelo estrategista estratégia é um processo de aprendizado cole- principal. É a escola mais antiga de formação tivo ao longo do tempo, os gerentes verificam de estratégia, sendo seus princípios observa- o que funciona e o que não funciona ao longo dos nos escritos supramencionados de Sun do tempo. Desta forma, o papel do líder não é Tzu e von Clausewitz, expressos em termos a formulação de estratégias deliberadas, mas imperativos, descritos como “máximas”. No sim gerenciar a assimilação do aprendizado, o âmbito desta escola, foi criado o famoso que possibilitará que novas estratégias surjam “Modelo de Análise Competitiva de Porter” continuamente. As principais premissas dessa (PORTER, 1980). escola são (LOBATO et al, 2012): – A organização como um todo deve Escolas de Natureza Descritiva estar orientada para o aprendizado, não apenas o líder, mas o sistema coletivo Procuram explicar como as estratégias que aprende; foram de fato formuladas. São elas: – O aprendizado ocorre de maneira Escola Empreendedora – trata a es- emergente, as pessoas podem contribuir tratégia como um processo visionário a para o processo de estratégia da organi- partir da intuição, dos julgamentos e das zação em diversos lugares e de maneiras experiências pessoais do estrategista líder. incomuns. Há diversos estrategistas em O líder promove essa visão para conquistar potencial; e

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– As estratégias surgem como padrões Escola de Natureza Híbrida ocorridos no passado, que se transformam em planos para o futuro, e perspectivas que Essa escola busca combinar as naturezas passam a guiar o comportamento geral. prescritiva e descritiva, e dessa forma possi- Escola de Poder – a estratégia é molda- bilita a integração das ideias que permeiam da pelas relações de poder e política, nos as outras escolas. ambientes interno e externo da organização, Escola de Configuração – a formação e é estabelecida pelos grupos dominantes. da estratégia é tratada como um processo A negociação a favor de certos interesses de transformação. A organização assume se traveste de barganhas e concessões em as diferentes configurações preconcebidas prol do interesse coletivo. As coalizões são pelas outras escolas, de acordo com a situ- transitórias, acompanhando as mudanças ação. A chave para a administração estra- periódicas de distribuição do poder. Desta tégica é a manutenção da estabilidade na forma, as estratégias não perduram por maior parte do tempo, mas reconhecendo períodos significativos. a necessidade periódica de transformação. Escola Cultural – a estratégia assume a Assim, existe equilíbrio em determinadas forma de perspectiva, e é fruto de interação fases de existência da organização, e cria- social, com base nas crenças compartilha- -se uma estratégia para romper o equilíbrio das pelos membros da organização. Nessa e saltar para um estado superior (LOBA- escola o interesse é comum e o sistema é TO et al, 2012). integrador. Devido ao enraizamento gerado De acordo com Corrêa (2007), o Proces- pela cultura organizacional há fortes resis- so de Planejamento Estratégico descrito por tências às mudanças, no entanto, esta carac- Bateman e Snell (1998), Maximiano (2006) terística favorece a estabilidade estratégica. e por Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000) Os indivíduos da organização absorvem apresentam variáveis em comum, que foram essa cultura de modo tácito, por meio de graficamente representadas na Figura 2. um processo de socialização, sem que as razões que levaram à concepção da estra- Metodologia tégia sejam necessariamente explicadas. Escola Ambiental – o ambiente é o Esta pesquisa utilizou procedimentos bi- agente central da formação da estratégia, bliográficos e exploratórios, fundamentando a qual é um processo reativo, em resposta o tema a partir de contribuições de diversos às forças ambientais, a fim de possibilitar autores sobre o assunto (GIL, 2002, p. 45). a continuidade da organização. A liderança Considerando primordialmente o livro é um elemento passivo, que tem a função Strategy Safari de Mintzberg, Ahlstrand e primordial de ler e interpretar o ambiente Lampel (2000) e o Manual de Planejamento para adequar a estratégia às constantes Operativo da Marinha (BRASIL, 2006), mudanças. A escola provém da “teoria da apresentamos as principais características do contingência”, que descreve as relações en- planejamento estratégico e do planejamento tre ambiente e características específicas da militar, e procedemos a análise qualitativa, organização. Por exemplo, a teoria afirma determinando as suas semelhanças, dife- que quanto mais estável o ambiente, mais renças e mútuas influências mais evidentes. formalizada será a estrutura da organização. A análise considerou ainda o conheci- A palavra de ordem desta linha de pensa- mento prático dos autores sobre a aplicação mento é “adaptação”. do PPM na Marinha do Brasil.

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impactante e poli- ticamente correta, ainda que não seja factível ou não re- flita tarefas a serem empreendidas para a consecução dos verdadeiros propó- sitos da organização, acaba atingindo um status organizacio- nal diferenciado. Algumas empre- sas, além da “missão declarada”, possuem uma “missão ope- racional”, mais de- talhada, e destinada Figura 2 – Processo de Planejamento Estratégico ao público interno Fonte: CORRÊA (2007) da empresa, que não teria tanto destaque quanto as frases de efeito normalmente Análise Comparativa apresentadas nos websites corporativos, ou emolduradas nas paredes de recepções e No entendimento dos militares, a de- salas de espera. finição da missão de uma organização No que tange à formalização, as maiores é o primeiro passo na elaboração de um semelhanças são encontradas entre o PPM planejamento estratégico. Porém, temos e a Escola do Planejamento, havendo em observado, nas últimas décadas, que o con- ambos a absoluta necessidade de elabora- ceito de missão tem sido desvirtuado do seu ção de documentos escritos e detalhados, significado original, proveniente do PPM, de forma a comunicar aos executores as apresentado na fundamentação teórica, decisões tomadas pela alta administração, para ser usado como mera ferramenta de reduzindo ao mínimo a possibilidade de marketing. Dessa forma, em vez de trans- interpretações errôneas. Tal como o “Sis- mitir realmente os objetivos estratégicos e tema de Planos”, também a “Diretiva” é as orientações a médio e longo prazo, este composta por planos de diferentes com- termo tem sido usualmente empregado petências (Plano de Inteligência, Plano de traduzido em uma “missão declarada”, Comunicações, Plano de Logística etc.), destinada a um público externo e com abrangendo todos os aspectos relacionados conotação publicitária. ao cumprimento da missão. Tal fato ocorre porque de acordo com É notório, ainda, que tanto o PPM quanto Wildavsky (1973, apud MINTZBERG, a Escola do Planejamento apresentam carac- 2004), “o planejamento não é realmente terísticas em comum, as quais se encontram defendido pelo que faz, mas pelo que sim- presentes também na metodologia do “Ciclo boliza”. Assim, a empresa que expõe publi- PDCA”, apresentado na Figura 3, também camente sua missão de forma mnemônica,

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conhecido como Ciclo de Shewhart ou estratégia deve ser individualizada para o Ciclo de Deming. Desenvolvido na década caso em questão. Podemos traçar então de 1930, tem como objetivo exercer o ge- um paralelo entre a construção de uma renciamento contínuo dos processos em uma “matriz SWOT”, introduzida pela Escola organização, por meio de 4 etapas distintas: do Design, e a fase de “confronto” do PPM, Plan (planejar), Do (executar), Check (veri- quando são analisadas as forças e fraquezas ficar) e Action (ação corretiva). da própria organização e de seus aliados, bem como as possibilidades dos inimigos. Observamos também a influência da Escola do Posi- cionamento no moderno PPM. Embora as estratégias sejam individualizadas para cada caso, elas podem ser decom- postas em conjuntos menores de estratégias preconcebidas, consideradas como sendo ideais para o atingimento de “posições-chaves”, fun- damentais no cumprimento da missão. Neste sentido, constatamos que a crença na eficácia destes pequenos “pacotes estratégicos” é com- partilhada pelos membros da organização militar sem Figura 3 – Ciclo PDCA grandes questionamentos, Fonte: adaptado de Deming (1990) revelando a existência de uma No PPM, verificamos que uma mis- componente da Escola Cultural. são se origina a partir de desequilíbrios Constatamos que a forte hierarquização em cenários anteriormente controlados. da estrutura de uma organização militar não Portanto, como na Escola Ambiental, favorece o surgimento de estratégias nos o ambiente influencia a escolha da níveis basilares, o que dificulta o apareci- estratégia, e o planejamento deve ser mento de novos pensamentos emergentes, flexível o suficiente para se adaptar às característicos da Escola do Aprendizado. perturbações. Ainda, como na Escola do Por fim, a importância do formalismo Poder, a avaliação de que a situação se não encoraja empreendimentos com fun- tornou desfavorável, e da nova realidade damento em insights, como foi observado “mais vantajosa” a ser criada é subjetiva, por Mintzberg, Ahlstrand e Lampel (2000) e decorrente de conjunturas políticas, em relação à Escola de Planejamento, não conforme os grupos dominantes. obstante possamos encontrar na história di- A existência de um processo de escolha versos exemplos de vitórias obtidas graças da Linha de Ação mais adequada ao Pro- a decisões visionárias de lideranças durante blema Militar demonstra, por si só, que a campanhas militares.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS contínuo, ou seja, nenhuma das suas par- tes deve ser considerada como definitiva, Em face do exposto, de maneira geral, sem que o problema tenha sido totalmente podemos afirmar que há mais semelhan- solucionado. Portanto, os processos devem ças do que diferenças entre o moderno ser cíclicos, permitindo o retorno às fases Processo de Planejamento Militar e as anteriores para efetuar novas avaliações ou Escolas de Pensamento Estratégico. As modificações, se necessárias. principais distinções residem nas escolhas Finalmente, observamos que o PPM estratégicas a serem efetuadas na fase de e as Escolas de Pensamento Estratégico definição e implementação da estratégia aplicam várias ferramentas semelhantes, (Do). Nesta fase, enquanto padrões rigida- tal como o emprego do teste de “AEA”, mente estabelecidos devem ser utilizados o qual pode ser comparado com os testes no PPM, as organizações empresariais de consistência, consonância, vantagem e podem eleger, de forma discricionária, as viabilidade, usados na avaliação e escolha suas preferências, conforme a sua estru- da estratégia na Escola de Design. tura, características do mercado em que Sugerimos que sejam efetuados fu- atuam e aproximação filosófica às escolas turamente estudos aprofundados acerca de Mintzberg. das ferramentas utilizadas no Processo de Constatamos que na fase de implemen- Planejamento Militar e da forma de traba- tação, qualquer tipo de planejamento neces- lho em Estado-Maior, a fim de viabilizar sita ser flexível. Neste sentido, é o método adaptações para aproveitamento no mundo que deve se adaptar ao problema, e não o corporativo, bem como nas práticas da contrário. O planejamento deve ainda ser Gestão Pública.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Planejamento Militar; Pensamento; Estratégia;

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JOZIANE PINHEIRO** Capitão de Corveta (S)

SUMÁRIO

Introdução Riscos ocupacionais Gestão de riscos Plano de ação – proposta de implantação de um sistema de gestão de riscos Conclusão Anexo

INTRODUÇÃO O sistema de gestão dos riscos no ambiente de trabalho é a forma como a ste artigo tem o propósito de discutir instituição pode se estruturar para buscar Esobre o conhecimento e o comprome- melhorias no processo de identificação e timento do profissional enfermeiro diante do controle de situações de riscos existen- dos riscos no ambiente de trabalho para tes tanto no ambiente como no comporta- uma prática mais segura e propor medidas mento do profissional enfermeiro. É uma preventivas que visem mitigar a materia- ferramenta que auxiliará na compreensão lização do risco no processo de trabalho. e organização dos processos referentes à

* Adaptação da monografia apresentada em 2016 ao Instituto de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppead), com o título: Gestão de riscos nas organizações hospitalares da Marinha do Brasil – Estratégia para a melhoria da segurança do profissional enfermeiro. ** Serve no Sanatório Naval de Nova Friburgo. SEGURANÇA DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO

segurança do profissional enfermeiro no à qualidade da prestação dos serviços de contexto hospitalar. saúde despertam cada vez mais interesse, A implantação de um sistema de gestão não somente entre os profissionais de saúde, do risco é de suma importância para que mas também entre os gestores da área. o profissional enfermeiro tenha um com- No que se refere aos enfermeiros, que portamento pró-ativo diante das situações durante a graduação aprendem a realizar que podem comprometer a sua saúde e é um cuidado profissional com fundamenta- essencial para o desenvolvimento de uma ção teórica e prática de enfermagem – ci- mentalidade de segurança. ência e arte cuja especificidade é o cuidar Apesar de ser um local destinado ao do ser humano –, estes devem cuidar do atendimento de pacientes para proporcio- outro, mas também estender esse cuidado nar-lhes melhorias no estado de saúde, a si, não se esquecendo da sua própria o hospital apresenta riscos que podem saúde (PINHEIRO, 2012). O profissional comprometer a higidez física dos profis- enfermeiro, além de dedicar grande parte sionais da área. Esses riscos, de naturezas de sua vida cuidando do outro, exerce suas diversas, podem comprometer a saúde dos atividades em local insalubre, onde muitas enfermeiros, que permanecem diariamente vezes coloca sua própria saúde em risco. nesse ambiente, com uma grande demanda Desta forma, é preciso discutir os aspec- de cuidados aos pacientes. tos de segurança relacionados ao trabalho No que tange à segurança do enfermeiro de enfermagem, abordando questões sobre nas unidades de saúde, cabe se questionar: como prevenir os riscos intrínsecos a ele, de até que ponto o profissional enfermeiro tem modo a garantir o bem-estar do profissional conhecimento dos riscos existentes no seu (MAURO, et al. 2004). ambiente de trabalho e o quanto ele está Segundo Marziale e Rodrigues (2002), comprometido com o controle dos riscos os profissionais de enfermagem, no desen- hospitalares? volvimento de suas funções, estão expostos Assim, diante do exposto, há que se a inúmeros riscos ocupacionais causados reconhecer que os gestores devem, além por fatores: 1) físicos – ruídos, vibração, de melhorar os processos, concentrar-se radiação ionizante e não ionizante, tem- em seus recursos humanos e ter em mente peraturas extremas (frio e calor) e pressão que os serviços de saúde são prestados por atmosférica anormal, entre outros; 2) quí- pessoas para pessoas (ARAUJO, 2007). micos – agentes e substâncias químicas, sob Embora o trabalho possa ampliar hori- as formas líquida, gasosa ou de partículas zontes, ser suporte psicológico e promover e poeiras minerais e vegetais comuns nos a saúde, pode também, em virtude das con- processos de trabalho; 3) biológicos – vírus, dições e das atividades exigidas para sua bactérias e parasitas, geralmente associados realização, ser fator de adoecimento para ao trabalho em hospitais, laboratórios e na quem o pratica (MAGNAGO, LISBOA e agricultura e pecuária; 4) ergonômicos e GRIEP, 2009). psicossociais – decorrentes da organização De acordo com Portugal (2010), o risco e gestão do trabalho, como, por exemplo, de um profissional de saúde adquirir do- a utilização de equipamentos, máquinas e enças relacionadas ao trabalho é cerca de mobiliário inadequados, levando a postura 1,5 vezes maior do que o risco a que estão e posições incorretas; locais adaptados com submetidos os demais trabalhadores. Con- más condições de iluminação, ventilação e siderando esse dado, os aspectos ligados de conforto para os trabalhadores; trabalho

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em turnos e noturno; monotonia ou ritmo atividades de modo seguro, conforme de trabalho excessivo, exigências de produ- mostra Araujo (2007) quando indica os tividade, relações de trabalho autoritárias; fatores de sucesso na implementação de falhas no treinamento e supervisão dos tra- Programas de Qualidade em Serviços de balhadores, entre outros; 5) mecânicos e de Saúde (PQSS). Esse autor cita a dimensão acidentes: ligados à proteção das máquinas, dos recursos humanos e afirma que é neces- a arranjo físico, ordem e limpeza do am- sário o comprometimento das empresas em biente de trabalho, sinalização, rotulagem aumentar a segurança no emprego. de produtos e outros que podem levar aos Portanto, estratégias de prevenção efi- acidentes do trabalho. cazes, como ações educativas, orientações Esses riscos presentes no ambiente la- e treinamento, devem ser implementadas, boral devem ser reconhecidos para que as orientando os trabalhadores sobre a pos- situações com possibi- sibilidade da presença lidade de danos à saúde de riscos a que poderão do trabalhador sejam O reconhecimento dos estar expostos e apon- identificadas. O reco- tando consequências nhecimento dos riscos riscos no ambiente laboral para a saúde da não-ob- no ambiente laboral é é uma etapa imprescindível servação das normas uma etapa imprescin- no processo de gestão de de segurança nesses dível no processo de ambientes insalubres. gestão de risco, que risco, que servirá de base Reforça-se que atuar na servirá de base para para execução das ações de área da saúde sem per- execução das ações de cepção das situações de prevenção, eliminação prevenção, eliminação ou risco existentes é um ou controle de riscos. controle de riscos exemplo de conduta A gestão de risco inadequada que expõe significa a aplicação a saúde dos profissio- sistêmica e contínua de políticas, proce- nais desta área de forma desnecessária, dimentos e condutas na avaliação e no uma vez que há medidas de segurança e controle de eventos adversos que afetam a prevenção para minimizar as situações de segurança, a saúde humana, a integridade risco, que são incertas, porém previsíveis. profissional, o meio ambiente e a imagem Além disso, é importante destacar que institucional (FELDMAN, 2009). Nesse os riscos presentes no ambiente de trabalho sentido, pode-se afirmar que a gestão de podem estar relacionados à cultura e função risco no ambiente hospitalar tem a fina- organizacional, decisão e controle, relacio- lidade de controlar e erradicar os riscos namento interpessoal no trabalho, interface de forma que, mesmo na presença destes, trabalho/família, ambiente e equipamento os profissionais estejam preparados para de trabalho, planejamento de tarefas, cargas conviver com situações arriscadas sem e local de trabalho. É de suma importância comprometer sua saúde. realizar discussões sobre a manutenção Desta forma, os gestores precisam da higidez física, pois a maioria das ex- propiciar qualificação nessa área aos pro- posições aos riscos tem como causa um fissionais de enfermagem, para que possam comportamento de risco do trabalhador, reconhecer a importância de um ambiente seja pelo seu desconhecimento, pela falta protegido que possibilite a execução das de atenção ou por pensar que não vai se

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expor e que nada acontecerá. A prática não possibilitando a verificação do sistema de adequada de uma atividade que tenha um gestão que a instituição tem para reduzir a risco inerente, se repetida com frequência, ocorrência de danos aos profissionais de pode resultar em acidente. enfermagem no processo de trabalho. Compreende-se, então, que a gestão de No entanto, gerir uma empresa é mais do risco deve ser parte integrante da boa prática que ter conhecimentos técnicos e teóricos. dos profissionais de enfermagem. Ela é defi- Para desempenhar uma gestão eficaz, é ne- nida como “… a atenção dirigida à ocorrên- cessário saber lidar com a ferramenta mais cia de eventos futuros, cujo exato resultado importante da engrenagem: o ser humano é desconhecido, e com a forma de lidar (ROBBINS et al, 2010). com essa incerteza, isto é, a amplitude de Uma vez que a capacidade de lidar com possíveis resultados. Inclui o planejamento, as situações que envolvem os riscos já é a identificação e a análise de áreas de risco uma necessidade integrada ao conceito de e o desenvolvimento de opções para lidar e saúde (CZERESNIA & FREITAS, 2009), controlar o risco” (WACHTER, 2013). é importante criar estratégias e aplicá-las Quando empregados e gestores incorpo- por meio das ferramentas da qualidade nos ram a mentalidade da segurança, têm como serviços de saúde com o objetivo de evitar a resultado um comportamento de prevenção exposição desnecessária do profissional en- aos riscos. Essa cultura de segurança den- fermeiro aos riscos no ambiente de trabalho. tro das organizações vem ao encontro da Segundo Araujo (2007), para o geren- tendência mundial na gestão de pessoas. ciamento das mudanças, deve-se criar um Atualmente, percebe-se que, para conseguir plano de ação para melhorias utilizando um sistema de gestão de segurança laboral as ferramentas técnicas da qualidade, que eficiente, precisa-se identificar a cultura têm o objetivo de mensurar, analisar e de segurança da organização e alinhá- propor soluções para os problemas en- -la aos objetivos estratégicos, buscando contrados que podem interferir no bom sempre melhorar a qualidade de vida no desempenho dos processos de trabalho. As trabalho por meio do compartilhamento ferramentas da qualidade ajudam a insti- das responsabilidades, bem como da pre- tuição a aumentar seu nível de qualidade ocupação contínua com a segurança de por meio da identificação dos problemas todos os empregados (CAMPOS & DIAS, e, consequentemente, da redução destes. 2012). Adota-se, então, o empoderamento Feldman (2009) refere que, como resposta da segurança no trabalho. às demandas da qualidade, surge a neces- Nessa perspectiva, o entendimento dos sidade de um sistema organizado de gestão riscos ocupacionais inerentes à profissão do risco hospitalar. O gerenciamento de por meio da gestão de risco na instituição risco é um processo inter e transdisciplinar permitirá que sejam implementadas medi- que associa o conhecimento dos vários das preventivas adequadas. Essas medidas profissionais, com intuito de evidenciar, preventivas visam mitigar a ocorrência de notificar e monitorar os fatores de riscos danos envolvidos no processo de trabalho. (FELDMAN, 2009). Considerar o entendimento que os As instituições hospitalares têm enfren- profissionais enfermeiros têm dos riscos tado o desafio de aumentar a satisfação dos em seu ambiente de trabalho, e que são seus profissionais e gerenciar a diversidade inerentes à profissão, permite a análise na força de trabalho para alcançar a satis- do seu comportamento diante dos riscos, fação do cliente externo. Por este motivo,

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a qualidade para o cliente interno tem sido na linha de frente. Hallowell, Schlesinger objeto de crescente interesse na área aca- e Zornitsky (1996), com base em ampla dêmica. O trabalho no ambiente hospitalar revisão de literatura, propuseram alguns abarca atividades muitas vezes penosas e componentes da infraestrutura de trabalho, difíceis para todos os atores envolvidos. dentre os quais: ferramentas (as ferramentas A elevada tensão emocional advinda do necessárias para servir os clientes devem cuidado direto de pessoas fisicamente do- ser oferecidas aos empregados pela em- entes, associada às longas jornadas, pode presa, incluindo informação e sistema de gerar danos à saúde dos profissionais da informação), políticas e procedimentos que área. Este quadro evidencia a preocupação facilitem a tarefa de atender aos usuários constante com o treinamento e a capacita- da instituição de saúde. De acordo com ção de seus funcionários (ARAUJO, 2007), os autores, esses elementos se relacionam pois esses riscos psicossociais, entre outros com a capacidade dos empregados de servir riscos, presentes no ambiente laboral do os clientes (capacitação para o trabalho), profissional enfermeiro, pode comprometer que, por sua vez, está interligada com a a saúde deste profissional que permanece satisfação destes. diuturnamente com os De acordo com pacientes. Araujo (2007), para A situação dos A elevada tensão emocional agregar valor em uma hospitais é paradoxal, advinda do cuidado direto instituição, o programa pois, ao mesmo tem- de gestão da qualidade po em que têm como de pessoas fisicamente deverá adotar uma se- missão salvar vidas e doentes, associada às longas quência de etapas que recuperar a saúde dos são necessárias para a indivíduos enfermos, jornadas, pode gerar danos implementação de um dificilmente têm a pre- à saúde dos profissionais processo de mudança ocupação de promo- da área na organização, se- ver e manter a saúde guindo uma lógica que de seus funcionários permita a orientação (LIMA e ÉSTHER 2001, p. 23), pois o para a satisfação total do cliente, para a cuidado está centrado no paciente. As ins- gerência dos processos e para a melhoria tituições de saúde precisam se organizar, contínua. No processo de busca da quali- desenvolvendo ações com vistas à saúde do dade, o comprometimento da alta gerência cliente interno. Essa mentalidade da saúde é fundamental, estimulando também a do trabalhador deve estar implícita na vida satisfação dos funcionários. dos profissionais de enfermagem. Nessa perspectiva, Araujo (2007) acres- Diversos autores apontam para a impor- centa que o processo de busca da qualidade tância de se oferecer aos funcionários as e o comprometimento da alta gerência, são ferramentas e os instrumentos necessários fundamentais, estimulando o foco perma- para o desempenho de suas atividades. nente no cliente externo e a satisfação dos Além disso, é importante que o ambiente funcionários. O interesse dos altos geren- de trabalho seja organizado, limpo e seguro. tes por qualidade não deve ser um mero A impossibilidade de apresentar resultados exercício intelectual, mas sim um forte aos clientes é uma das principais fontes de comprometimento pessoal manifestado por frustração dos funcionários que atendem meio de estratégias e liderança visionárias.

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Além disso, como as empresas de serviços criar a Comissão Interna de Prevenção de “servem” seus clientes por meio de seus Acidentes (Cipa). A Cipa é composta por funcionários, o foco no cliente e a satisfação representantes do gestor e dos trabalhadores. dos funcionários devem ser vistos como um Esse processo deverá agregar valor objetivo estratégico a ser alcançado quando para a instituição, pois poderá levar o pro- se almeja a prestação de serviços de exce- fissional enfermeiro a mudanças de com- lência. Isso é essencialmente verdadeiro em portamento diante da questão do cuidado organizações de serviços de saúde, devido com a própria saúde, pela concretude da à proximidade física e psicológica entre os mentalidade de cultura de segurança. clientes e os prestadores do serviço. Para Ferruccio (1994) o processo de RISCOS OCUPACIONAIS conscientização se inicia por meio da percepção da nova realidade do ambiente Em 1773, a exposição dos trabalhado- externo e interno da organização. A mudan- res aos riscos no ambiente laboral já era ça, por sua vez, ocorrerá como o resultado descrita por Ramazzini – o pioneiro da da reestruturação da nossa percepção. Se a medicina do trabalho (MENDES, 2005). percepção se modifica, vários outros planos Ramazzini ensinou os caminhos para tratar do processo psicológico também se modifi- das questões referentes à saúde do trabalha- cam, levando as pessoas a verem, sentirem dor, pois acreditava ser importante abordar e pensarem de forma diferente e, conse- os trabalhadores para ter entendimento das quentemente, a agirem de outra maneira. suas práticas e, assim, poder intervir nos Para conhecer os problemas que estão la- riscos ocupacionais, com a preocupação tentes nas organizações e gerenciar melhor de evitá-los ou amenizá-los. o processo de mudança em sua instituição, Considerando os ensinamentos de o gestor precisa diagnosticar os problemas Ramazzini, observa-se que os fatores po- existentes nos diferentes níveis organiza- tenciais de risco no ambiente de trabalho, cionais; utilizar ferramentas de solução de como o hospital, e os eventos adversos problemas; conhecer as metodologias para relacionados especificamente à área de a gestão de um projeto de mudança e saber saúde são frequentes e trazem risco à saúde. lidar com as diferentes dimensões humanas Classicamente, os fatores de risco para da sua equipe de trabalho. a saúde e segurança dos trabalhadores, Diante do exposto, acredita-se que, com presentes ou relacionados ao trabalho, po- a utilização das ferramentas de qualidade no dem ser representados em cinco grandes Processo de Gestão de Riscos (ver Anexo) grupos, como já visto anteriormente: físi- – uma lista de itens pré-convencionada que cos; químicos; biológicos; ergonômicos e pretende analisar, avaliar e controlar os riscos psicossociais; mecânicos e de acidentes. – e Ciclo do PDCA1 (Plan, Do, Check, Ac- Na pesquisa realizada por Costa (2015), tion) – que irá assegurar o contínuo processo os resultados apontaram evidências para da gestão de riscos nas organizações hospi- os fatores de risco ocupacionais dos Dis- talares –, será possível gerenciar os riscos túrbios Osteomusculares Relacionados ao ocupacionais em uma instituição de saúde. Trabalho (Dort), como biomecânicos (er- Para aplicação dessas ferramentas, deve-se gonômicos), psicossociais relacionados à

1 O PDCA foi criado na década de 20 por Walter A. Chewatr, mas foi William Edard Deming quem disseminou seu uso no mundo todo. Disponível em: .

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organização do trabalho e organizacionais. elaborou a Norma Regulamentadora 32 Entre os fatores biomecânicos destacaram- (NR32), que abrange os profissionais de -se as sobrecargas físicas, dinâmicas e saúde. Anteriormente, a NR32 se concen- estáticas, as posturas inadequadas e a repe- trava em assuntos relacionados ao aperfei- titividade. Os fatores organizacionais evi- çoamento e à capacitação do profissional denciaram a invariabilidade e a monotonia em sua atividade, com objetivo de oferecer das tarefas. Já os fatores psicossociais novos conhecimentos técnicos visando foram todos os que geraram sofrimento à melhoria na assistência aos pacientes mental no trabalhador de enfermagem em (NUNES et al, 2010). seu ambiente ocupacional. Como se pode observar, a Norma Regu- O fato de trabalhar em um local com lamentadora é elemento norteador do modo riscos não significa estar em local insegu- como o profissional de saúde deve proceder ro, pois os profissionais podem aplicar as em um ambiente hospitalar na prevenção medidas de segurança, o que é facilitado de riscos ali existentes, para sua própria pelo sistema de gestão de riscos. proteção. As normas listam com proprie- A segurança do profissional é, portan- dade as atividades que oferecem riscos aos to, uma cultura que deve ser intrínseca às enfermeiros em um ambiente hospitalar. organizações hospi- Elas determinam que talares. A implanta- em cada unidade hos- ção da consciência da A segurança do profissional pitalar deva ter uma segurança do próprio estrutura de gestão profissional se faz ne- é uma cultura que deve ser e controle de riscos cessária, além de se intrínseca às organizações ocupacionais, visto estender para toda hospitalares que essa ferramenta a equipe, corrigindo facilita a aplicação de continuamente os fa- estratégia pelo gestor tores que possam contribuir para a melhoria para controlar os riscos e oferecer mais da qualidade de vida dos profissionais. segurança aos profissionais enfermeiros. No Brasil, a preocupação com os riscos Entre os principais fatores que levam à no trabalho dos profissionais de saúde é ocorrência dos riscos ocupacionais estão: uma questão recente, comparando-se com 1) número insuficiente de funcionários, outras profissões. Com o objetivo de dar o que leva a demandas excessivas, pre- mais visibilidade aos trabalhadores sobre judicando a prática de suas funções e a os riscos a que estão sujeitos, em 2001 interação com o ambiente de trabalho foi elaborado pelo Ministério do Trabalho (PEREIRA; MIRANDA; PASSOS, (MT) um manual de procedimentos que 2009); 2) sobrecarga de trabalho, o que dispõe sobre as doenças relacionadas ao pode interferir na qualidade de vida dos trabalho, abordando com maior profundi- trabalhadores (MONTEIRO; BENATTI; dade o tema em questão. O manual também RODRIGUES, 2009); 3) distúrbios mús- orienta sobre os fatores determinantes da culo-esqueléticos, um grande problema saúde do trabalhador e a importância do de saúde pública e um dos mais graves no entendimento dos riscos para aplicação de campo da saúde do trabalhador, causando medidas de segurança (BRASIL, 2001). incapacidade funcional, absenteísmo e No entanto, no que se refere aos profis- afastamentos temporários ou permanen- sionais de saúde, somente em 2005 o MT tes do trabalhador e gerando custos em

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tratamento e indenizações (SOUZA et al, e cometer erros ou atos inseguros, ou então 2011); 4) falta de capacitação profissional, porque no ambiente laboral existem con- que contribui para a ocorrência dos riscos dições inadequadas que comprometem a ocupacionais, evidenciando a necessidade sua segurança. Esses tipos de acidentes são de criação de estratégias para a prevenção passíveis de prevenção pela redução ou eli- de acidentes durante as atividades labo- minação de suas causas ou circunstâncias em rais (BARBOSA; FIGUEIREDO; PAES, que ocorrem. Portanto, verifica-se o quanto 2009); 5) exposição ocupacional, pois, é importante o controle contínuo do risco. por prestarem assistência ininterrupta, É importante que os profissionais te- os trabalhadores de enfermagem são os nham conhecimento de todas as possibili- que mais permanecem em contato físico dades de risco na profissão. O não reconhe- com os pacientes (MULLER et al, 2008), cimento de um risco ocupacional poderá tornando-se expostos a sangue, secreções contribuir para que outro risco se materia- e fluidos corpóreos por incisões, sonda- lize. Um acidente pode ser consequência de gens e cateteres2; 6) mau uso dos Equipa- um risco que não esteja sendo monitorado mentos de Proteção pelo trabalhador. Em Individual (EPI), que geral, há uma preo- favorece a exposição Os acidentes de trabalho, cupação e, portanto, ocupacional (GIOMO como as doenças originárias maior conhecimento et al, 2009: DIAS et sobre o risco bioló- al, 2016); 7) ambien- dos riscos ocupacionais, gico, entretanto os te de trabalho, onde precisam ser entendidos riscos ergonômicos e há condições que po- psicossociais poderão dem alterar a saúde e tratados como eventos fazer com que um ris- do trabalhador, como evitáveis, porém inerentes co, como o biológico, a climatização, que ao trabalho se materialize. exige adaptação da Nessa perspecti- regulação térmica; 8) va, pode-se afirmar exposição a altos níveis de ruídos sonoros que, quando há preocupação com o risco, por tempo prolongado, com consequen- presta-se mais atenção a ele e age-se tes danos ao sistema auditivo e outros com base no que é preciso para evitá-lo comprometimentos, como os distúrbios (GARDNER, 2009). Com a implantação do sono e descanso mental (GRAÇA JÚ- do sistema de gestão de riscos, todos NIOR et al, 2009). os riscos serão valorizados, tanto pelos Os acidentes de trabalho, como as do- profissionais, que passarão a evidenciar enças originárias dos riscos ocupacionais, situações em que eles possam ocorrer, precisam ser entendidos e tratados como quanto pela instituição, no que se refere eventos evitáveis, porém inerentes ao tra- aos aspectos organizacionais. balho, ou mesmo como um ônus do próprio A prevenção das doenças relacionadas desenvolvimento. Eles podem ocorrer por- ao trabalho está associada às medidas de que o profissional poderá estar despreparado proteção e prevenção dos riscos ocupa-

2 O risco de infecção ocorre por meio de ferimento percutâneo (ocasionado por picada de agulha ou corte com objeto agudo) ou contato de membrana, mucosa ou pele (por meio de rachadura de pele ou dermatite) com sangue ou outros fluidos corpóreos potencialmente infectados (SILVA & PINTO, 2012).

160 RMB3oT/2017 SEGURANÇA DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO cionais, pois se compreende que a adoção secundária e terciária, isso significa que o das medidas de segurança poderá impedir profissional não cumpriu algumas das nor- o surgimento das doenças, mesmo quando mas de segurança nem os procedimentos da o trabalhador está executando tarefas que prevenção primária e, consequentemente, apresentam riscos. já tem a sua higidez física comprometida. A prevenção está dividida em primária, secundária e terciária. Em relação à pre- GESTÃO DE RISCOS venção das doenças oriundas do trabalho, para Rogers (2001), a prevenção primária é Após a discussão sobre Riscos Ocupa- realizada antes da ocorrência dos acidentes cionais, será abordada a Gestão de Riscos e e busca eliminar e controlar os riscos com como ela é definida, assim como a definição medidas de proteção específicas. Para de Controle de Riscos. Feldman (2009) Rouquayrol (2003), a prevenção primária define Gestão de Riscos como a aplicação é realizada no indivíduo no período pré- contínua de procedimentos, condutas e re- -patogênico e consiste na promoção à saúde cursos na avaliação e no controle de riscos e na proteção específica. e eventos que podem afetar a segurança, a É importante enfatizar que a prevenção saúde humana, a integridade profissional, primária deverá estar alinhada ao incen- o meio ambiente e, consequentemente, a tivo aos profissionais quanto à aplicação imagem institucional, sendo um processo das medidas de segurança, como o uso transdisciplinar que associa o conhecimen- de equipamentos de proteção individual to de diversas ciências, enquanto a Gestão diante das situações de riscos; atenção à de Riscos é a tomada de decisões relativas limpeza do ambiente e dos equipamentos aos riscos ou a ação para a redução das e acondicionamento adequado destes; consequências ou da probabilidade de organização do ambiente; atenção ao ocorrência. Definidos Gestão e Controle controle no planejamento e na execução de Riscos é mister discorrer sobre o obje- do trabalho, tendo equilíbrio no ritmo e na tivo da ferramenta Gestão de Risco. Ainda forma como trabalha; e atenção quanto às segundo Feldman (2009), esta ferramenta vacinas específicas para os profissionais de tem o propósito de perceber, notificar, tra- saúde, entre outras. tar e monitorar os fatores de riscos em um A prevenção secundária ocorre quando o ambiente hospitalar para prevenir eventos indivíduo já se expôs ao risco. É realizada adversos. Tem como medidas a serem sob a ação do agente patogênico, ao nível tomadas: a informação e a formação do do estado da doença, sendo necessário trabalhador; a prevenção dos riscos aos adotar medidas preventivas de diagnóstico profissionais; a promoção e proteção da precoce, tratamento e limitação da incapa- saúde dos profissionais e a organização do cidade para evitar futuras complicações ou trabalho. Deve, então, se ajustar à percep- chegar ao nível terciário (ROUQUAYROL, ção de riscos por parte dos diferentes su- 2003). Este autor aponta a prevenção ter- jeitos envolvidos, potencializando, assim, o ciária como aquela que requer a adoção de conhecimento, a avaliação e a intervenção medidas para prevenção da incapacidade, na saúde do trabalhador, o que certamente destinadas à reabilitação de sequelas ocor- terá reflexo positivo no atendimento aos ridas após acidentes ou doenças. clientes externos. Em síntese, pode-se concluir que, Um dos elementos importantes neste quando se chega ao estágio de prevenções processo é a comunicação. Pressupõe-se

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que a comunicação é a informação que o lhadores não coloquem a saúde em risco profissional precisa ter sobre os riscos e as durante a execução de suas tarefas. possíveis possibilidades de ocorrer o even- Além disso, o gestor precisa propiciar to. Essa informação precisa se apoiar em qualificação aos profissionais de saúde, de uma caracterização adequada, de modo que modo que possam reconhecer a importância o profissional entenda o que precisa fazer de um ambiente seguro, possibilitando, e o que vai fazer. “Orientações Técnicas assim, a execução das atividades com se- (OT)”, no 1, do Departamento de Saúde gurança. Portanto, estratégias de prevenção Pública de Lisboa, é uma das obras que eficazes, como ações educativas, orientações apontam esses elementos de comunicação e treinamento, devem caminhar junto com (SIMÕES, 2009). Em consonância com os trabalhadores, sempre os orientando sobre Simões (2009), foi possível verificar que a possibilidade da presença de riscos que existe uma inconsistência entre a teoria e a poderão estar expostos. Caso não se obser- prática em relação à adesão às medidas de vem os procedimentos de segurança nesses segurança no ambiente de trabalho. ambientes insalubres, os trabalhadores ficam A Gestão de Riscos, além dos objetivos expostos aos acidentes. já apontados, tem outras atribuições. Como Para o sucesso da gestão na saúde dos tarefa principal, o controle dos riscos deve trabalhadores, é fundamental a implemen- levar ou conduzir os riscos existentes a ní- tação de ações e medidas que visem instruir veis aceitáveis, não permitindo a incidência os profissionais quanto à questão do risco de novos riscos ou eventos. Outra atribui- no ambiente laboral, para que possa reduzir ção é promover a análise de necessidades a ocorrência de danos aos profissionais de e funcionalidades das medidas implantadas enfermagem envolvidos no processo. Desta em uma unidade hospitalar. As ações de forma, é necessário criar a mentalidade e a controle podem ser desde uma mera ação cultura de segurança no ambiente hospitalar. de acompanhamento ou de reavaliação Para Araujo (2007), para que seja periódica até procedimentos para trazer assegurada a qualidade dos serviços, é im- ou conduzir os riscos a nível aceitável, ou prescindível treinar e monitorar adequada- mesmo eliminá-los, como afirma a OT on mente o pessoal da instituição, assim como 1 do Departamento de Saúde Pública de manter um clima de trabalho seguro. Para Lisboa (SIMÕES, 2009). O controle dos implantação de um programa de gestão da riscos pressupõe uma articulação pluridisci- qualidade total, há uma sequência de etapas plinar, devendo integrar os diferentes níveis necessárias para o processo de mudança de abordagem: organizacional, técnica e na organização, seguindo uma lógica que vigilância à saúde. permita a orientação para a satisfação total Conforme explica a literatura que versa do cliente, para a gerência dos processos e sobre o tema, é por meio dos gestores que para a melhoria contínua. as instituições podem proporcionar aos Na busca da qualidade, Araujo (2007) profissionais oportunidade para reflexões, acrescenta que o comprometimento da alta discussões, qualificação e atualização. gerência é fundamental, estimulando o foco Isso pode fazer com que eles se conscien- permanente no cliente externo e a satisfação tizem das adoções de medidas preventivas dos clientes internos. Além disso, como as corretas (FARIAS, 2005). Dessa forma, empresas de serviços “servem” seus clientes permite-se que se estabeleçam medidas externos por meio de seus clientes internos, importantes para assegurar que os traba- o foco no cliente externo e a satisfação dos

162 RMB3oT/2017 SEGURANÇA DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO clientes internos devem ser vistos como um seguro e oportunidades para reflexões, objetivo estratégico a ser alcançado quando discussões e atualizações para que eles se almeja a prestação de serviços de exce- se conscientizem da adoção de medidas lência. Isso é essencialmente verdadeiro em preventivas corretas. organizações de serviços de saúde por causa Enfim, os gestores, de fato, são os prin- da proximidade física e psicológica entre os cipais agentes responsáveis pelas normas, clientes e os prestadores do serviço. ações, medidas e inovações dentro das A avaliação dos riscos ocupacionais nos organizações de saúde, pois, por meio de estabelecimentos de saúde constitui a base sua iniciativa nas tomadas de decisões e do de uma gestão eficaz de segurança e de saú- modelo de seu comportamento, definirão de, indispensável para reduzir os acidentes a mudança da cultura organizacional. Nas de trabalho e as doenças profissionais (MS, decisões quanto ao modelo de estrutura, os 2010) que podem decorrer das condições fatores culturais da instituição é que determi- insalubres e inseguras do ambiente de tra- narão, em grande parte, o nível de mudança balho que não são monitoradas, ou para as dentro de uma organização (ROBBINS, et quais não foram aplicadas estratégias de al, 2010), o que torna fundamental a atenção controle dos riscos, pela inexistência de dos gestores aos seus colaboradores e aos uma gestão destes. ambientes de trabalho, procurando sempre A análise dos riscos ocupacionais dar visibilidade a estes nas medidas tomadas, demanda um conhecimento prévio do pro- evitando riscos à saúde dos funcionários. cesso de trabalho, pois busca identificar o nível de risco existente em cada atividade. PLANO DE AÇÃO – PROPOSTA Após o seu reconhecimento, é necessário DE IMPLANTAÇÃO DE UM analisar de modo mais preciso as condições SISTEMA DE GESTÃO DE que influenciam o profissional nas práticas RISCOS laborais (SOUZA & ARAÚJO, 2009), se- guro de executar suas tarefas e estabelecer Conforme escreve Balestrin (2003, p. condutas adequadas diante do risco que 171), “o gerenciamento de risco exige um poderá encontrar durante o exercício das mapeamento e rigoroso controle dos fluxos atividades no hospital. Esse profissional de atividades dentro dos hospitais, a implan- precisa estar motivado para ter um compor- tação de uma cultura de compartilhamento tamento seguro e consciente com o objetivo de responsabilidades e cooperação entre de amenizar problemas aos quais se expõe equipes”. Como em qualquer implantação diariamente, trabalhando, assim, com segu- de um sistema, existem algumas fases no rança, sem prejuízo à higidez física. processo. Na Gestão de Riscos, essas fases Os gestores, por sua vez, precisam dividem-se em: planejamento estratégico, atentar para que o ambiente hospitalar planejamento tático e plano operacional. apresente o mínimo de riscos ou, caso os Para o gerenciamento das mudanças, apresente, que sejam monitorados, e que de acordo com Araujo (2007), deve-se os funcionários tenham conhecimento fazer um planejamento para melhorias, desses riscos e saibam como proceder apropriando-se de ferramentas de quali- diante deles. De acordo com Farias dade técnica, que se podem utilizar com (2005), é por meio dos gestores que as objetivo de mensurar, analisar e propor instituições podem proporcionar aos soluções para os problemas encontrados, profissionais condições para um trabalho que podem interferir no desempenho dos

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processos de trabalho. As ferramentas A aplicação do processo da ferramenta de gestão proporcionam à instituição de Análise de Riscos é bem mais elucidada no saúde elevar o nível de qualidade de suas Anexo, em que Portugal (2010) apresenta atividades de enfermagem. Essa elevação o sistema de gestão da segurança e saúde de qualidade ocorre por meio da identifica- do trabalho, que poderá ser implantado na ção e do controle de problemas e possíveis instituição, fornecendo as diretrizes para ocorrências de eventos. a análise dos riscos e o controle destes no Para auxiliar o gestor na implantação e ambiente laboral. Com a implantação desse operacionalização de um sistema de Gestão sistema de gestão, o profissional enfermeiro de Riscos existem algumas ferramentas, poderá ter mais consciência dos riscos a que como a Análise de Riscos3 e o Ciclo do estão expostos na execução de suas tarefas. PDCA (PORTUGAL, 2010). É importante Este ciclo – PDCA –, discutido ampla- salientar que esse sistema de Análise de mente por Araujo (2007), é um método Riscos, para certificação da segurança dos amplamente aplicado para o controle eficaz profissionais no trabalho, deve ser contínuo e confiável das atividades de uma organi- e revisto como periodicidade, de forma a zação. O Ciclo PDCA é caracterizado por assegurar o cumprimento de seu objetivo. quatro fases: planejamento – em que são Nesse sentido, sugere-se a aplicação dessas fixados o estabelecimento das metas e a ferramentas com um acompanhamento identificação dos fatores causadores do contínuo do processo, tornando as etapas problema que dificultam o alcance das metas claras e objetivas. previamente convencionadas; fazer – exe- cução das atividades que foram previstas e planejadas dentro do plano de ação; checagem – é a fase do acompanhamento e da avaliação contínua dos resultados obtidos com a execução das tare- fas. É a avaliação dos processos e resultados, confrontando-os com o planejado, com objetivos, especificações e o estado deseja- do, consolidando as informações, eventualmente confeccionando- -as em relatórios específicos; e, finalmente, a ação – tomar as providências estipuladas nas avaliações e nos relatórios sobre os processos. Este Ciclo PDCA, a partir da aplicação das etapas do processo de gestão do risco ocu- Figura 1 – Slide Coppead, ARAUJO, C. (2016) pacional, assegurará o contínuo Fonte: Werkma, 2012, NP, 2008 controle da Gestão de Riscos na

3 Conforme Orientação Técnica no 1- DSP: Análise de Risco é uma ferramenta que contém diversas etapas em que são analisados e controlados os riscos ocupacionais e eventos que podem ocorrer em um ambiente hospitalar.

164 RMB3oT/2017 SEGURANÇA DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO organização hospitalar (PORTUGAL, 2010 CONCLUSÃO & WERKEMA, 2012). Em complemento à proposta da utiliza- A aplicação de um sistema de Gestão ção das ferramentas de qualidade, é de suma de Riscos é de suma importância para importância a criação de uma Comissão In- o controle dos riscos. Ele poderá ser terna de Prevenção de Acidentes (Cipa), que implementado por meio das ferramentas auxiliará o gestor no controle dos riscos ocu- de qualidade – Processo de Gestão do pacionais. Para Araujo (2007), a melhoria Risco e Ciclo do PDCA –, objetivando-se da qualidade dos serviços de saúde somente identificar, analisar, reduzir ou até mesmo é atingida caso seja configurada como um eliminar a probabilidade da materialização objetivo de todos os funcionários e se torne do risco existente no ambiente de traba- parte integrante da cultura organizacional. lho, bem como motivar o profissional a Segundo Feldman (2009), mais do que ter um comportamento proativo diante implantar um programa das situações de riscos de Gestão de Riscos, é e realizar o controle preciso identificar, con- A melhoria da qualidade eficaz e confiável das trolar e avaliar de forma dos serviços de saúde atividades. adequada o processo. Ressalta-se que, para Isso significa que essas somente é atingida caso a aplicação da Análise atividades precisam seja configurada como de Gestão dos Riscos de uma coordenação ocupacionais, é neces- que defina o foco de um objetivo de todos os sário criar uma Cipa, cada uma. Para Welter funcionários e se torne subordinada ao gestor (2014), o sistema de parte integrante da cultura da unidade de saúde. Gestão do Risco no É fundamental que ambiente de trabalho organizacional a instituição aplique o é considerado um ins- sistema de gestão dos trumento satisfatório no sentido de oferecer riscos e desenvolva uma cultura preven- condições seguras para os profissionais, ca- cionista entre os trabalhadores, para que bendo a cada instituição adotar e praticar com estes tenham a mentalidade de segurança eficácia o que preconiza essa ferramenta. no ambiente laboral. Os riscos ocupacionais merecem atenção Este estudo agregou conhecimentos e requerem o comprometimento do profissio- referentes à saúde de quem proporciona nal enfermeiro com sua tarefa, ferramentas cuidados aos pacientes, por apresentar que auxiliem o gestor a reduzir ou eliminar dados importantes relativos a lacunas de e controlar os riscos no ambiente de trabalho informações dos trabalhadores de enfer- e o conhecimento adequado do enfermeiro magem, as quais devem ser abordadas para executar suas tarefas com segurança e na formação e durante todo o tempo de profissionalismo. Enfim, esse conjunto de fa- serviço, buscando atender às medidas de tores e procedimentos precisa ser visto como segurança para que os riscos, mesmo que segurança para o profissional enfermeiro e presentes, não afetem a higidez física e qualidade no cuidado prestado aos pacientes. mental do trabalhador.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Hospital; Orientação; Precaução; Enfermaria; Serviço de Saúde;

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166 RMB3oT/2017 SEGURANÇA DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO

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RMB3oT/2017 167 SEGURANÇA DO PROFISSIONAL ENFERMEIRO

ANEXO

ETAPAS DO PROCESSO DE GESTÃO DE RISCOS

Fonte: Orientação técnica no 1 DSP

168 RMB3oT/2017 PROGRAMA OLÍMPICO DA MARINHA – resultados que vão além do pódio*

DAVID PEIXOTO MANHÃES JUNIOR** Capitão-Tenente (FN)

SUMÁRIO

Introdução O Programa Olímpico da Marinha O esporte nacional Conclusões

INTRODUÇÃO mais de 20% dos brasileiros são pobres ou extremamente pobres. As pessoas que fa- o Brasil, cerca de 10,5 milhões de zem parte desse grupo vivem em condições Npessoas vivem em situação de extre- muito precárias, com pouco ou nenhum ma pobreza [25]. Isso significa dizer que acesso a serviços públicos básicos, como 5,5% da população brasileira é miserável saúde e educação. Fazer parte desse grupo [30]…, 2016). Além destes, outros 28,7 significa estar à margem da realidade dos milhões, ou 15,09% da população nacio- restantes 80% da população – significa ser nal, vivem em situação de pobreza. Isto é, um subcidadão.

* Artigo premiado em 1o lugar da Categoria Oficiais e Civis Assemelhados do Concurso de Artigos Técnicos e Acadêmicos e de Redações das Organizações Militares da Área de Ensino Marinha do Brasil – 2016. ** Serve no 3o Batalhão de Infantaria de Fuzileiros Navais. PROGRAMA OLÍMPICO DA MARINHA – resultados que vão além do pódio

A maior parte desses pobres e extre- O nascimento do Programa Olímpico da mamente pobres se concentra nas regiões Marinha (Prolim) ocorreu no ano de 2008, Norte e Nordeste [29]. É justamente nessas a partir da incorporação de atletas de alto regiões que o Estado brasileiro está menos rendimento como militares da Reserva de presente [5], fato que pode ser entendido 2a Classe da Marinha [19]. Essa iniciativa como uma das causas dessa concentração pioneira da MB [13] logo apresentou bons de pobreza. Nessas regiões, as Forças Ar- resultados. Já em 2011, durante os 5os Jogos madas “são a única presença do Estado” Mundiais Militares do International Military [26]. Muitas vezes, o militar é a única Sports Council (Cism), realizados no Rio forma de Estado que alguns indivíduos de Janeiro, a delegação brasileira conquis- pobres e extremamente pobres conhecem. tou a primeira posição no quadro geral de Esse militar é o exemplo em que alguns medalhas [13]. Para esse inédito resultado desses indivíduos se espelham, como es- os atletas da MB contribuíram com 47 das perança de acesso a tudo aquilo que não 114 medalhas conquistadas pelo Brasil na lhes está disponível. A carreira militar é competição [12]. Reflexos do Programa uma oportunidade de inclusão social para também puderam ser observados nos Jogos esses subcidadãos. Olímpicos de Londres, em 2012, quando Com o objetivo de integrar os pobres e duas atletas da Marinha subiram ao pódio extremamente pobres ao restante da socieda- durante as competições [33]. de, o Governo Federal brasileiro desenvolve Motivado pelos bons resultados apre- alguns programas de inclusão social. Alguns sentados pelo Programa, o comandante da desses programas são de caráter econômico, Marinha decidiu, em 2013, tornar o Prolim como o Bolsa Família. Outros têm por obje- permanente [13]. O Programa é de respon- tivo expandir e ampliar as oportunidades de sabilidade do Comando-Geral do Corpo acesso à educação – é o caso do Programa de Fuzileiros Navais (CGCFN), a quem Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e cabe a “direção do Programa e a criação, Emprego (Pronatec). Existem, ainda, outros a implementação e o encerramento dos programas cujos propósitos são a inclusão projetos modulares que o estruturam” [13]. por meio do esporte. É das oportunidades de Atualmente, às vésperas do início dos Jogos inclusão social proporcionadas pelas Forças Olímpicos do Rio de Janeiro, o programa Armadas, particularmente pela Marinha do conta com cerca de 240 militares, atletas Brasil (MB), que trata este artigo. de alto rendimento em 20 diferentes mo- dalidades [31]. Selecionados com base em O PROGRAMA OLÍMPICO DA seus resultados em competições nacionais MARINHA ou internacionais, esses militares-atletas são incorporados à MB na graduação de “A participação de militares da Ma- terceiro-sargento, após breve período de rinha do Brasil (MB) em competições adaptação à vida militar [23]. esportivas militares e civis alcançou Uma vez parte da equipe Marinha, os patamares de representação nacional atletas “têm direito a soldos; 13o salário; ainda na década de 1920. Nos Jogos locais para treinamento; [...] plano de Olímpicos da Antuérpia, naquele ano, saúde; atendimento médico, odontológico ocorreu a primeira participação do Bra- e fisioterápico; alimentação e alojamento” sil, estando a MB representada por um [19]. Esse investimento permite que o número significativo de militares” [13]. atleta tenha “tranquilidade para treinar e

170 RMB3oT/2017 PROGRAMA OLÍMPICO DA MARINHA – resultados que vão além do pódio

se preparar da melhor maneira possível “Contribuição para o processo de sem preocupações externas” [20]. A meta inclusão social, oferecendo aos jovens do Programa é “contribuir para transfor- de comunidades de baixa renda o aces- mar o Brasil em potência olímpica” [13], so à prática desportiva de qualidade, alinhada à do Comitê Olímpico do Brasil proporcionando-lhes o desenvolvimen- (COB), de ser “top 10 no quadro de me- to físico adequadamente assistido, de dalhas” [19]. modo a permitir a revelação de novos Além da segurança financeira e do talentos para o esporte. Ao completa- suporte de profissionais especializados rem a idade mínima para incorporação proporcionados pelo Programa, as instala- à Marinha, prosseguir no apoio a esses ções de treinamento oferecidas aos atletas jovens [...]” [14]. são de padrão de qualidade internacional [31]. “A estrutura do Centro de Educação Fica claro, então, que o Prolim tem um Física Almirante Adalberto Nunes (Cefan) papel social, ainda que seu foco principal é uma das mais completas da América La- seja a captação de atletas de alto rendimento. tina”, proporcionando “a melhor estrutura esportiva da história” de muitos atletas [24]. O ESPORTE NACIONAL O foco principal do Programa é “a pre- paração dos atletas da MB para integrarem No Brasil, o Ministério do Esporte equipes representativas do Brasil em compe- (ME) é o “responsável por construir uma tições do Cism e representações brasileiras Política Nacional de Esporte” [15]. Dentre nos grandes eventos esportivos das respec- outras atribuições, a esse Ministério cabe tivas modalidades” [13]. Assim, verifica-se o desenvolvimento do esporte de alto ren- que o Prolim não é, em si, um programa de dimento, trabalhando “ações de inclusão inclusão social por meio do esporte. Isso não social por meio do esporte, garantindo significa dizer, contudo, que a Marinha não à população brasileira o acesso gratuito contribua para a inclusão social. à prática esportiva, qualidade de vida e “A MB vem apoiando, desde 2003, desenvolvimento humano” [15]. Para o esporte de base, por meio do Projeto atingir esses propósitos, o ME desenvolve Forças no Esporte, que é decorrente de alguns programas. Para o que se destina parceria entre o Ministério do Esporte, o este trabalho, podem ser destacados o Se- Ministério do Desenvolvimento Social e gundo Tempo e o Projeto Esporte e Lazer Combate à Fome e o Ministério da Defe- da Cidade. sa. Esse Projeto, que é de cunho social, Outros ministérios também atuam no atualmente com 3.100 beneficiários na desenvolvimento do esporte nacional, em MB, tem possibilitado a detecção e o coordenação com o Ministério do Esporte. O aproveitamento de jovens talentos com Programa Forças no Esporte é um exemplo potencial olímpico” [14]. dessa cooperação interministerial, desenvol- vido pelo Ministério da Defesa juntamente Desses mais de 3 mil beneficiados pelo com o Ministério do Esporte e o Ministério Programa Forças no Esporte na MB, alguns do Desenvolvimento Social e Combate à poderão ser identificados como de poten- Fome [14]. Aproximadamente 16 mil crian- cial olímpico e passar ao Prolim, se for o ças e adolescentes, entre 7 a 17 anos, de 74 caso [19]. Esse, aliás, é um dos objetivos cidades, em 25 estados da federação, são do Programa. beneficiados pelo programa [14].

RMB3oT/2017 171 PROGRAMA OLÍMPICO DA MARINHA – resultados que vão além do pódio

“O programa Forças no Esporte Apesar desses investimentos no esporte busca promover a integração social e o nacional, seja no desenvolvimento de atle- desenvolvimento humano por meio da tas de alto rendimento, seja proporcionando prática esportiva. Os esforços empreen- inclusão social por meio do esporte, o fato é didos concentram-se na inclusão social, que o atleta no Brasil ainda carece de apoio, valorização da cidadania, inserção no estrutura para treinamento e patrocínio. trabalho e na realização de atividades “HORTÊNCIA – [...] O esporte é físicas, esportivas e de lazer” [14]. uma atividade que emociona os brasi- leiros e impulsiona o nome do Brasil Os programas e projetos supracitados no exterior. Há muitos anos os atletas são de cunho social e têm o propósito de reclamam da falta de incentivos e promover a inclusão social por meio do patrocínios. Vejo muitas crianças se esporte. Eles não são direcionados a atletas interessarem por esporte, mas que não de alto rendimento. Para o apoio ao esporte têm oportunidades, sobretudo as mais de alto rendimento, o Ministério do Esporte pobres, as mais carentes. Então, o espor- possui a Secretaria Nacional de Esporte de te tem uma contribuição muito grande a Alto Rendimento. oferecer na área social “A Secretaria também” [21]. Nacional de Esporte Os programas e projetos de Alto Rendimento Uma das consequ- (Snear) é responsá- são de cunho social e têm ências desse apoio in- vel pela implantação o propósito de promover a suficiente, ou mesmo de decisões relativas inexistente em alguns aos programas de inclusão social por meio casos, é o tímido his- desenvolvimento do do esporte tórico de conquistas esporte de alto ren- internacionais que o dimento. A Snear esporte nacional pos- faz ainda proposições sobre assuntos da sui. A melhor classificação do Brasil em sua área para compor o Plano Nacional Jogos Olímpicos, por exemplo, foi o 15o de Esporte” [1]. lugar nos Jogos Olímpicos da Antuérpia, em 1920. Nas últimas duas edições dos Essa secretaria possui alguns progra- Jogos, Londres 2012 e Pequim 2008, o mas para o desenvolvimento do esporte Brasil conquistou apenas 17 e 15 medalhas, de alto rendimento no Brasil. Entre esses respectivamente [22]. programas, podem ser citados o Plano Brasil Medalhas e o Bolsa-Atleta, sendo CONCLUSÕES este último o que mais se assemelha ao Prolim. O Bolsa-Atleta destina-se “prio- O acesso a serviços públicos básicos, ritariamente aos atletas praticantes do es- como educação e saúde, não é um direito porte de alto rendimento em modalidades estendido a todos os brasileiros. Cerca olímpicas e paraolímpicas [...]” [8]. Para de 20% da população brasileira vive à os Jogos Olímpicos de 2016, 77% dos margem do que os outros 80% restantes atletas brasileiros serão beneficiados pelo consideram normal. Para diminuir essa Programa, que investirá R$ 80 milhões desigualdade, o Governo Federal desen- neste ano [16]. volve, por meio de seus ministérios, alguns

172 RMB3oT/2017 PROGRAMA OLÍMPICO DA MARINHA – resultados que vão além do pódio

programas de inclusão social. Alguns de baixa renda que não teriam acesso a es- destes utilizam o esporte como meio de sas oportunidades não fosse pelo que a MB inclusão social. tem a lhes oferecer. Se um desses jovens A pesquisa revelou que o contexto atletas demonstra potencial elevado em sua nacional em que o Prolim está inserido modalidade, ele poderá até fazer parte do não é animador para o atleta. Apesar de Prolim no futuro. recentes investimentos recebidos pelo Ao mesmo tempo, o Prolim provê ade- esporte nacional, particularmente o de quado apoio ao esporte de alto rendimento alto rendimento, a falta de instalações de no Brasil, onde tais condições são escassas. treinamento adequadas e de patrocínio As instalações de treinamento, especial- ainda são as razões mais comuns que afas- mente as localizadas no Rio de Janeiro, tam os atletas dos pódios. O que resulta são comparáveis às de melhor qualidade dessa situação é um existentes no mundo. histórico de tímidas Profissionais capacita- participações brasilei- O Programa Olímpico da dos e com experiência ras em competições Marinha (Prolim) contribui em treinamento físico internacionais, como complementam o Pro- os Jogos Olímpicos. simultaneamente para a grama, que oferece É sobre a partici- inclusão social e para o tudo o que o atleta ne- pação da Marinha do cessita para atingir o Brasil no processo de desenvolvimento do esporte seu máximo potencial. inclusão social por de alto rendimento no Os militares-atletas meio do esporte e o Brasil beneficiados pelo Pro- apoio ao esporte de grama passam a ser alto rendimento de que exemplos de superação tratou esse trabalho. Mais especificamente, de dificuldades e de vitória por meio de o artigo demonstrou como o Programa esporte. Esses exemplos são excelentes re- Olímpico da Marinha (Prolim) contribui ferências para outros programas de inclusão simultaneamente para a inclusão social e social, pois contribuem para a motivação para o desenvolvimento do esporte de alto daqueles que hoje buscam melhorar suas rendimento no Brasil. condições de vida por meio do esporte. Ainda que o foco principal do Programa Como visto, o Programa Olímpico da seja o esporte de alto rendimento, o Prolim Marinha não é um programa de inclusão também tem por objetivo a promoção da in- social propriamente dito. Ele é mais do clusão social por meio do esporte. Crianças que isso. O Prolim é um programa cujas e adolescentes, participantes de projetos de conquistas vão além de medalhas e láu- base mantidos pela MB, se beneficiam dos reas. Ele também resgata a esperança em profissionais e das instalações de treina- muitos jovens de um futuro melhor por mento do Programa Olímpico. São jovens meio do esporte.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Esporte; Olimpíadas;

RMB3oT/2017 173 PROGRAMA OLÍMPICO DA MARINHA – resultados que vão além do pódio

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174 RMB3oT/2017 PROGRAMA OLÍMPICO DA MARINHA – resultados que vão além do pódio

[25] MÁXIMO, Welton. Número de brasileiros na extrema pobreza aumenta pela primeira vez em dez anos. Empresa Brasil de Comunicação S/A – EBC, Brasília, nov. 2014. [26] MINISTRO destaca presença das Forças Armadas na Amazônia. Portal Brasil, Brasília, mar. 2015. [27] MOREIRA, Rafael; COSTA, Wellington. Falta de patrocínio faz mesatenistas do AP desistirem de competição em AL. Globo.com, Macapá, jul. 2014. [28] NÚMERO de miseráveis cresce pela primeira vez em 10 anos. Zero Hora, nov. 2014. [29] ONU e IPEA lançam atlas da extrema pobreza no Norte e Nordeste do Brasil. Organização das Nações Unidas, nov. 2015. [30] PROJEÇÃO da população do Brasil e das Unidades da Federação. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2016. [31] REBELLO, Helena. Marinha do Brasil quer ampliar plantel de atletas e mira plano a longo prazo. Globo.com, Rio de Janeiro, maio 2015. [32] SOBRINHO, Adelgício de B. C. Normas constitucionais e constitucionalização simbólica: uma análise da efetividade normativa sob o prisma do subcidadão. Jus Navigandi, Teresina, jun. 2015. [33] TECNODEFESA. Marinha do Brasil e o esporte de alto rendimento. Tecnologia & Defesa, maio 2015. [34] TURATI, Laine. Falta de patrocínio ameaça o vôlei de Campinas. Correio Popular, Campinas, maio 2016.

RMB3oT/2017 175 UM PÍER TESTEMUNHA DA HISTÓRIA: o Espaço Cultural da Marinha

ANDERSON DE RIETI SANTA CLARA DOS SANTOS* Primeiro-Tenente (T)

SUMÁRIO

Introdução O entorno do píer: de zona portuária ao Espaço Cultural da Marinha Um panorama sobre o píer: base de uma história de um século e meio Conclusão

INTRODUÇÃO seguida, parte das instalações da Compa- nhia de Navegação Lloyd Brasileiro, que Este artigo propõe-se a traçar um breve funcionou até a década de 1990 naquela panorama histórico sobre o píer no qual está área, sendo então adquirido pela Marinha assentado o edifício onde hoje funciona o do Brasil (MB). Espaço Cultural da Marinha (ECM). O Contudo, o propósito deste trabalho objetivo é descrever as intervenções rea- não será atendido sem a compreensão do lizadas neste espaço que foi das Docas da contexto espacial onde estão inseridos o Alfândega até o início do século XX e, em ECM e seu píer. Desde 1877, quando foi

*Encarregado da Divisão de Pesquisa Histórica do Departamento de História da Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha. Graduado em licenciatura em História pela Universidade Estadual de Feira de Santana, Especialista em História Militar Brasileira pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro e Mestre em História do Império português pela Universidade Nova de Lisboa. UM PÍER TESTEMUNHA DA HISTÓRIA: o Espaço Cultural da Marinha

inaugurada a área que compreendia o píer Não obstante as atividades portuárias no em questão, esta região passou por uma Rio de Janeiro tenham se iniciado já desde série de transformações condicionadas às o século XVII, decorrentes da ocupação na atividades nela desenvolvidas. Assim, o pequena região entre os morros da Concei- píer foi testemunha destas mudanças desde ção, do Castelo, Santo Antônio e São Bento quando era um importante entreposto comer- (LAMARÃO, 2006: p. 23), a vida na região cial no século XIX até se tornar um local de portuária no Rio de Janeiro teve maior fôle- apoio às atividades de uma companhia de go com a extração de ouro nas lavras e datas navegação da Marinha Mercante durante das Minas Gerais, no século XVIII. quase todo o século XX e chegar, enfim, a Para encurtar a rota de escoamento se constituir num espaço de entretenimento da produção aurífera, abriram-se dois turístico-cultural, com a inauguração do caminhos partindo das minas até o Rio ECM. No entanto, em relação ao seu aspecto de Janeiro. O primeiro, aberto por Garcia arquitetônico e, de algum modo, estrutural, Pereira Pais ainda no final do século XVII, as características essenciais foram mantidas, ligava o Rio de Janeiro às minas seguindo o em virtude do valor histórico e cultural do Rio Paraíba do Sul. O segundo foi desbra- patrimônio em lide. vado no primeiro quartel do século XVIII, Desse modo, o texto se dividirá em duas seguindo pela trilha onde hoje se localiza a partes. A primeira tratará da região onde cidade de Petrópolis e encontrando-se com se localiza o ECM, destacando as inter- o caminho aberto por Rodrigues Pais na venções por que passou esta área tendo em altura do Rio Paraíba, que corre próximo à vista as atividades nela desenvolvidas. Em cidade de Inconfidência (FROTA, 2000: p. seguida, falaremos sobre o píer, desde os 198). Assim, criou-se mais uma alternativa primeiros projetos com o objetivo de rea- para a saída do ouro das lavras mineiras, lizar melhoramentos na região portuária do que se tornou mais viável que os caminhos Rio de Janeiro de meados do século XIX, até então existentes, seja por Paraty, Santos sendo tal espaço um dos objetos dessas ou, ainda, Salvador. A consequência disso modificações, passando pela construção foi a demanda sempre crescente dos portos das Docas da Alfândega e pela utilização na Guanabara, levando o Rio de Janeiro à desta área pela Companhia de Navegação condição de praça comercial com intensa Lloyd Brasileiro até chegar, por fim, às atividade, condição esta que ultrapassou o obras realizadas pela MB para a inaugu- século XVIII. ração do ECM, em 1996. No que tange ainda ao século XVIII, cumpre ressaltar a diversificação das ati- O ENTORNO DO PÍER: DE vidades econômicas nos portos da área ZONA PORTUÁRIA AO ESPAÇO central do Rio de Janeiro. Assim, o então CULTURAL DA MARINHA comércio de escravos realizado na Rua Direita, atual Rua Primeiro de Março, até O Rio de Janeiro foi um dos mais impor- a década de 1780, foi deslocado para o Cais tantes entrepostos comerciais da América do Valongo, conduzindo àquilo que Lama- Portuguesa, principalmente a partir do sécu- rão denomina de “especialização espacial lo XVIII, quando alcançou o status de capital da cidade”, dedicando à área da Gamboa o da colônia lusitana. Tal peso se deveu, em mercado negreiro e ao centro da cidade a muito, à extração aurífera, atividade econô- movimentação de bens de consumo (LA- mica de grande vulto durante o Setecentos. MARÃO, 2006: p. 27).

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No entanto, o maior impacto nas ativi- do Vale do Rio Paraíba, vai adquirindo uma dades portuárias no Rio de Janeiro se fez posição de destaque inconteste. sentir no início do século XIX. A transmi- Diante de tais transformações, entre as gração da corte no início de 1808 ocorreu décadas de 1850 e 1870 vários projetos concomitantemente à abertura dos portos foram elaborados vislumbrando a realiza- às nações amigas. Naquele momento, com ção de melhoramentos na região portuária a liberdade de comércio garantida, boa do Rio de Janeiro. A sistemática de finan- parte dos produtos de outros mercados po- ciamento desses projetos, segundo Mello deria ser comercializada diretamente, sem (2003), passava intermédios (PANTALEÃO, 2003: p. 83). pela constituição de Companhias O tratado de comércio anglo-brasileiro que, a partir de projetos de melhorias e trouxe como consequência um considerá- de infraestrutura urbanas, negociavam vel aumento na movimentação de navios concessões com o Poder Público para na região portuária do Rio de Janeiro, exploração por um determinado período, com a entrada de produtos em sua maio- remunerando os investidores, na época ria ingleses, sendo essa região vitrine de chamados capitalistas, frequentemente mercadorias do reino de além do Canal da pessoas próximas aos estamentos de- Mancha. Exemplo disso são os cerca de cisórios, ou vinculadas a instituições 5 mil navios aportados no Rio de Janeiro financeiras internacionais, como bancos em 1811, de várias nacionalidades, contra e seguradoras (MELLO, 2003: p. 16). os 778 de 1807, quando apenas um destes navios era estrangeiro. Três eram as áreas portuárias objetos Além do aumento das atividades portuá- desses projetos, a saber: 1) a área que com- rias, há que ressaltar também o crescimento preende a atual Praça Mauá e os armazéns demográfico, deixando a marca das 50 do porto, isto é, entre a Prainha e a Gamboa; mil almas até o limiar do século XIX para 2) a área entre o Arsenal de Marinha e o os 135 mil habitantes na década de 1840 Arsenal de Guerra (onde hoje se situa o (LAMARÃO, 2006: p. 38). Isso acarretou Museu Histórico Nacional); e 3) do Arsenal uma drástica mudança social na cidade, de Guerra até a Enseada de Botafogo. cujo centro deixou de ter uma atribuição No tocante à área entre o Arsenal de eminentemente residencial, passando a ser Marinha e o Arsenal de Guerra, em 1851 um espaço cada vez mais dotado de insta- o Ministério da Fazenda, ao aprovar um lações comerciais. Facilitou-se o trajeto de aporte de 400 mil réis, criou uma comissão mercadorias que ocupavam a área portuária presidida pelo Marechal Soares Andréa e central do Rio de Janeiro, na região do formada pelo Tenente-Coronel Engenheiro Mercado e na Rua Direita. Disso resulta a José Gomes Martins, o Chefe de Esquadra relevância de tal espaço para as transações Pedro de Oliveira Teixeira e Fernando Hal- comerciais e o desenvolvimento econômico feld. O propósito era alinhar o cais entre o da região, sendo, assim, preocupação do Arsenal de Marinha e o Arsenal de Guerra, Estado dotar este local com instalações dotando estas duas instalações com docas condizentes com a nova posição da cidade para os seus serviços, além de prever cons- na economia do País. Isso fica ainda mais trução de caldeiras e bacias desde a Praia evidente com o lugar que o café ocupava dos Mineiros, passando pelo Mercado, até na economia brasileira, produto mais ex- o Cais do Mestre Valentim (LAMARÃO, portado à época e que, com a proximidade 2006: p. 58).

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Anos depois, em 1853, o engenheiro No entanto, o projeto apresentado por inglês Charles Neatle apresentou um outro Henry Law foi criticado pelo engenheiro projeto que previa um cais corrido desde o André Rebouças por não ter considerado Arsenal de Marinha até o Arsenal de Guer- o regime de marés com a instalação dos ra, intercalando entre este percurso bacias, quebra-mares e a desproporção do cais dentre as quais a que estava localizada para a armazenagem de mercadorias. Dessa a partir da saída do Arsenal de Marinha maneira, o projeto de Charles Neatle con- em direção ao Trapiche Maxwell, onde tinuou a ser seguido. Contudo, em 1863, poderiam atracar 16 navios para a Alfân- a construção havia desabado, afetando o dega (LAMARÃO, 2006: p. 58). As obras molhe na parte exterior. A partir de então, revelaram-se morosas, em decorrência da o projeto foi tocado pelo engenheiro André ausência de espaço para sua execução. Rebouças. Em 1868, um incêndio afetou Outro engenheiro inglês, Henry Law, o prédio da Alfândega. Um trecho entre foi consultado sobre a possibilidade de o Cais dos Mineiros, que era continuação alargamento do espaço entre o Arsenal de do Arsenal de Marinha e a Alfândega, foi Marinha e a Alfândega. Este engenheiro concluído em 1869. previu demolições na região do Arsenal Já em 1871, assumiu a chefia da de Marinha e da Ponta do Calabouço, no execução do projeto o engenheiro Borja Arsenal de Guerra. Com as pedras oriun- Castro, dando por concluída no ano de das dessa demolição, seriam instalados 1877 a obra entre o Arsenal de Marinha quebra-mares entre o Arsenal de Marinha e o Largo do Paço, incluindo-se as Docas e a Ponta do Calabouço. Além disso, tal da Alfândega. plano previa a construção de 16 pontes Em 1875, foi instituída a Comissão de sobre colunas de ferro na região das Do- Melhoramentos do Rio de Janeiro, com cas da Alfândega para servir como cais a finalidade de prover as transformações para embarque e descarga com auxílio no perímetro urbano central da cidade, de guindastes e carretões sobre trilhos transformações estas que depois seriam (LAMARÃO, 2006: p. 58-59). empreendidas pelo Prefeito Pereira Passos, no período republica- no. Assim, em 1910, houve um desloca- mento das atividades portuárias da cidade para a região onde hoje estão localizados os armazéns do porto do Rio de Janeiro. Isto trouxe um impacto à região das Docas da Alfândega, embora este impacto não fosse imediato. As Docas da Foto 1– Docas da Alfândega, 1893 Alfândega ainda per- Acervo iconográfico da Divisão de Documentos Especiais, maneceram operando Diretoria do Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha (DPHDM) na década de 1910.

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companhia até a década de 1990. A edificação teste- munhou partidas de navios, inclusive de passageiros, e ali aconteceram momentos marcantes na história do País, como a visita do Pre- sidente francês Charles de Gaulle, em 1964, ao antigo Ministério da Marinha. Vale destacar, ainda, que a construção do Elevado da Perimetral, concluída Foto 2 – “Caes dos Mineiros – Visto da Ilha das Cobras – em 1978, impactou a re- Rio de Janeiro (1912)”. Acervo iconográfico da Divisão de Documentos Especiais, DPHDM gião, obscurecendo a área do Lloyd Brasileiro. As di- ficuldades vivenciadas pelo A partir do final da década de 1910, a Lloyd culminaram com a sua falência e Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro extinção na década de 1990. ocupou parte da área das Docas da Alfân- Em 1991, o Ministério da Marinha auto- dega, em especial o prédio onde hoje se rizou a compra de imóveis que pertenciam situa o Tribunal Marítimo (TRIBUNAL ao patrimônio dessa companhia. Dessa MARÍTIMO, 2014: p. 28). Este prédio foi forma, o prédio que até então pertencia ao transferido para a Capitania dos Portos do Lloyd Brasileiro naquela área foi destinado Rio de Janeiro, mas a ocupação efetuada ao Serviço de Documentação da Marinha pelo Lloyd Brasileiro alcança as atuais (SDM). A edificação passou por uma gran- instalações do ECM. Desse modo, a área de obra, e a estrutura até então conhecida da Alfândega deixa de ser um dos impor- deu lugar a um prédio com dimensões tantes polos mer- cantis marítimos da cidade do Rio de Janeiro, ainda que tenha alocado uma organização que foi uma destacada com- panhia que atuou no comércio e no trans- porte marítimos. Por décadas a re- gião abrigou o Lloyd Brasileiro; assim, o espaço onde hoje se localiza o prédio Foto 3 – Chegada do Presidente Charles de Gaulle ao Ministério do ECM permaneceu da Marinha. Ao fundo, identifica-se o prédio do Lloyd Brasileiro. como patrimônio da Acervo iconográfico da Divisão de Documentos Especiais, DPHDM

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Foto 4 – ECM durante demolição do Elevado da Perimetral. Acervo: Divisão de Documentos Especiais, DPHDM apropriadas para abrigar o acervo museo- a construção do Boulevard Olímpico, que lógico do SDM. levaram à interdição do ECM de modo a A partir de então, o ECM esteve apto garantir a integridade dos transeuntes. Na para receber visitantes em seus espaços primeira situação, os visitantes ficaram de exposição, tanto no prédio como nos com a alternativa das visitas aos meios meios navais que funcionam como mu- navais citados e aos espaços adjacentes. seus, quais sejam: o Navio-Museu Bauru, Já no segundo caso, a interdição ocorreu contratorpedeiro de escolta utilizado na entre os anos de 2014 e meados de 2015. A Segunda Guerra Mundial; a Nau dos Des- partir de então, foi garantido o acesso pela cobrimentos, réplica de um tipo de navio Capitania dos Portos, sem comprometer a utilizado na época da expansão portuguesa e segurança dos visitantes, até que as obras usada pelos descobridores portugueses que de construção do Boulevard Olímpico esti- chegaram ao Brasil em 1500; o Submarino- vessem concluídas, o que ocorreu em 2016, -Museu Riachuelo, construído em 1973 na por ocasião dos Jogos Olímpicos. Inglaterra e incorporado à MB em 1977; e o Helicóptero-Museu Sea King. Ali também UM PANORAMA SOBRE O PÍER: estão os meios que partem do ECM para BASE DE UMA HISTÓRIA DE UM realizar os passeios pela Baía de Guanabara: SÉCULO E MEIO o Rebocador Laurindo Pitta, que também é um espaço de memória da participação Como visto acima, as Docas da Alfân- da MB na Primeira Guerra Mundial; e a dega, construído com base no projeto do Escuna Nogueira da Gama, que transporta engenheiro Borja Castro, visou dar maior visitantes com destino à Ilha Fiscal. fôlego às atividades portuárias no Rio de O fluxo de visitantes ao ECM foi inter- Janeiro. O cais, com o píer, foi inaugurado rompido em dois momentos: 1) durante re- em 1877, e hoje está ali localizado o prédio paros em 12 arcos e fundações para garantir do ECM. a segurança do público, ainda em curso; e À época, a construção não era de al- 2) em obras de revitalização da área central venaria. O molhe, ou píer, foi construído da cidade, com a demolição da Perimetral e medindo 280 metros de comprimento e 17

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de largura, com duas muralhas de cais de largura e da seção longitudinal apresenta- arcada sobre uma fundação em estacas de dos na Figura 1. A Foto 5 apresenta o molhe madeiras de lei (LAMARÃO, 2006: p. 60). no período de sua construção. Ressalte-se que esse tipo de fundação Esta cobertura por todo o píer pode ser com base em processo de estaqueamento observada em fragmentos de uma planta de madeira era considerado um avanço se de 1913 desenhada por Vicente de Vicq comparado com as técnicas que o an- tecederam, a exemplo das fundações em vala corrida do período colonial. Segundo Ribeiro, o estaqueado de madeira para a construção no cais das Docas da Alfândega esteve apoiado com um bate-estaca a vapor sob a inspeção de mergulhadores equipa- dos com escafandros de ar compri- mido. A utilização de estacas seguiu um padrão de método construtivo para fundações no século XIX, até o surgimento de estruturas metálicas Figura 1 – “Doca d’Alfândega do Rio de Janeiro no final do século XIX e início do – Systema de reconstrução do molhe na parte que foi abatida” XX (RIBEIRO, 2005: p. 3). Fonte: CASTRO, Borja. Descripção do Porto do Rio de Janeiro As figuras 1 e 2 apresentam os per- e das Docas D’Alfândega. Rio de Janeiro: Imperial Instituto fis do molhe das Docas da Alfândega. Artístico, 1877. Acervo digital da Biblioteca Nacional. Disponível em: Acesso em: 13jun 2017.

Figura 2 – “Doca d’Alfândega do Rio de Janeiro: Planta representando a bacia, os novos guindastes hydráulicos e edificio das machinas e os armazens projetados” Fonte: CASTRO, Borja. Descripção do Porto do Rio de Janeiro e das Docas D’Alfândega. Rio de Janeiro: Imperial Instituto Artístico, 1877. Acervo digital da Biblioteca Nacional. Disponível em: Acesso em: 13jun 2017.

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(Figura 3) e que identifica a área como pertencente às Docas da Alfândega. Chama a atenção que o esquema sobre o prédio em destaque aparece ainda seccionado, com uma pequena ligação entre as se- ções, diferente do observado quando da cessão do prédio à Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro e quando da construção do ECM, ocasiões Foto 5 – Alfandega em construção vista em que os prédios estarão da Ilha das Cobras (molhe em destaque). inteiriços. Além disso, percebe-se que o Fonte: Casa Leuzinger. Alfandega, da Ilha das Cobras. esquema representa o prédio sobre prati- Rio de Janeiro: Cópia fotográfica albuminada. [186-]. camente todo o molhe. Acervo digital da Biblioteca Nacional. Disponível em: momento a edificação sobre o píer passou Acesso em: 13jun 2017. a ser construída com alvenaria, como fica

Figura 3 – Fragmentos da “Planta Cadastral: trecho entre a Praça Mauá e a Ponta do Calabouço”. Fonte: VICQ, Vicente. Planta Cadastral: trecho entre a Praça Mauá e a Ponta do Calabouço. Arquivo Nacional, 1913. Fotografia gentilmente cedida por Marisa Assumpção.

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do prédio sumiram e ali está hoje o local destinado à Área de Pouso de Aero- nave. À frente, houve um recuo, com o decréscimo de uma seção. Mesmo com a fragili- dade apresentada com o tipo de fundação do píer, somente com mais de um século as fundações come- çam a receber um tratamen- to. Uma primeira licitação, realizada em 2004, teve como objeto a recupera- ção de quatro arcos e suas fundações. Em seguida, em Figura 4 – “Docas do Lloyd” (1977) Fonte: CHAPMAN, Grover. Docas do Lloyd (iconográfico) 1 grav : 2007, outra licitação foi água-forte pb ; 34,3 x 43,7. 1977. Acervo digital da Biblioteca Nacional. realizada, dando origem a Disponível em: Acesso em: 13jun 2017. de nove arcos e suas res- demonstrado na Foto 3 e na Figura 4, sendo pectivas fundações. Dois esta uma representação em desenho daquilo anos depois, todo o píer foi recuperado. que seria o então prédio da Companhia Em 2013, realizou-se uma inspeção suba- de Navegação Lloyd Brasileiro, feito por quática, verificando-se a necessidade de Groover Chapman em 1977. O importante recuperação de outros 12 arcos, processo é constatar que a alteração no material do que é objeto de uma nova licitação em construto impacta as bases sobre as quais andamento. As recuperações nesta área são está edificado, acarretando nas futuras in- parte de um movimento de preservação de tervenções no molhe a partir da suas características externas, mesmo com década de 2000. Como já dito, a área do Lloyd Brasileiro passa à responsabili- dade da Marinha do Brasil na dé- cada de 1990. Assim, constrói-se o que hoje é o ECM. As fotos 6 e 7 dão um panorama da edificação em construção. Uma nova edificação então surgiu, com alvenaria, janelas e teto. Se comparadas a Figura 6 e a planta desenhada por Vicente Vicq, percebe-se que o prédio diminuiu em comprimento. Na Foto 6 – Obras no ECM, década de 1990 parte de trás, as últimas sessões Acervo: Divisão de Documentos Especiais, DPHDM

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de passageiros. Em algum momento após a instalação dessa companhia, o píer seria impactado com uma constru- ção, desta vez em alvenaria. A construção do Elevado da Perimetral para privilegiar o modal rodoviário na região obscurece a visão desse Foto 7 – Obras no ECM, década de 1990 patrimônio arquitetônico, Acervo: Divisão de Documentos Especiais, DPHDM acarretando um sensível es- a evidente fragilidade da estrutura interna vaziamento da região central das fundações, o que representa um imenso do Rio de Janeiro. desafio para a Marinha do Brasil de aliar A inauguração do ECM, em 1996, foi passado e presente. uma iniciativa para recolocar a significân- cia que a região teve para a cidade, ainda CONCLUSÃO que no âmbito de um espaço memorial. Com os melhoramentos decorrentes da Viu-se como as modificações ao longo iminência dos Jogos Olímpicos em 2016, de séculos, na região onde hoje se localiza a região volta a ter uma centralidade, desta o ECM, foram realizadas tendo em vista vez turística e cultural. O píer sofreria as as funções atribuídas a este espaço urbano. intervenções a partir de 2004, de modo a Foram-lhe dedicados projetos e obras no acompanhar as constantes modificações no século XIX no sentido de prover tal região entorno do ECM, passando hoje por mais com equipamentos que permitissem a um processo de que resulta uma licitação entrada e saída de mercadorias de maneira em curso para melhor prover esta instalação mais racional, tendo em vista ser relevante de uma estrutura que seja capaz de suportar área de entreposto mercantil. É nesse con- a crescente demanda por entretenimento texto que surge a área do píer. museológico na área. No entanto, com a inauguração da nova A apresentação do projeto conceitual do zona portuária, no início do século XX, a Museu Marítimo à imprensa e à comunida- função de importante local de entreposto de marítima em 2017, notícia alvissareira perde-se, ainda que não de maneira ime- em termos de cultura e memória marítimas, diata. A instalação da Companhia Lloyd torna urgente tais intervenções, para que Brasileiro na região das Docas da Alfân- esta nova construção na renovada zona dega foi um movimento no sentido de portuária esteja bem assentada sobre uma ainda dar fôlego às atividades marítimas, estrutura preservada em termos arquitetôni- tanto no transporte de cargas como no cos, mas com os cuidados de que necessita.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; História marítima do Brasil; História Naval; Museu;

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

FROTA, Guilherme de Andrea. 500 anos de História do Brasil. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exér- cito, 2000. LAMARÃO, Sérgio Tadeu de Niemeyer. Dos trapiches ao porto: um estudo sobre a área portuária do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Secretaria Municipal de Cultura, Turismo e Esportes, De- partamento Geral de Documentação e Informação Cultural, 1991. MELLO, Fernando Fernandes. A Zona Portuária do Rio de Janeiro: antecedentes e perspectivas. Dissertação de mestrado. Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional, UFRJ. Rio de Janeiro, 2003. PANTALEÃO, Olga. “A presença inglesa no Brasil”. In: BARRETO, Célia de Barros [et. al.] O Brasil Monárquico: o processo de emancipação (Tomo II). Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003 (9a ed). RIBEIRO, Nelson Pôrto. “As técnicas construtivas e as intervenções urbanísticas”. In: Anais do XXIII Simpósio Nacional de História. Londrina: UELm 2005. Disponível em: http://anais.anpuh.org/ wp-content/uploads/mp/pdf/ANPUH.S23.0792.pdf. Acesso em 13jun. 2015. TRIBUNAL MARÍTIMO (Brasil). “80 anos do Tribunal Marítimo”. Rio de Janeiro: O Tribunal, 2014, p. 28.

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RENAN ALVES FELIX DA SILVA Aspirante (IM)

SUMÁRIO

Introdução Logística reversa Política nacional de resíduos sólidos Cadeia de fardamento da Marinha do Brasil Problemáticas do descarte indevido das peças do fardamento Logística reversa na cadeia de fardamento Considerações finais

INTRODUÇÃO surgindo ao longo da pesquisa, que levou em conta as normatizações e publicações iante do desconhecimento, por parte da Marinha do Brasil, conhecimentos ex- Ddos aspirantes da Escola Naval, a res- ternos e entrevistas com militares da Força, peito da correta destinação a ser dada aos ao passo que também buscou inserir essa materiais do fardamento que não são mais problemática na nossa conjuntura social, úteis, este estudo começou a ser desenvol- política e econômica. vido a fim de sanar tal questionamento. Constatou-se que as questões relacio- No entanto, inúmeras variáveis foram nadas à poluição do meio ambiente pelo

* Publicado na Revista Villegagnon no 11, de 2016. A LOGÍSTICA REVERSA E O PENSAMENTO SUSTENTÁVEL NA CADEIA DE FARDAMENTO DA MARINHA DO BRASIL

mau gerenciamento de resíduos sólidos No entanto, de acordo com Lacerda têm se tornado latentes nas discussões so- (2002), existe também um fluxo logístico ciais atuais; o problema vem se agravando inverso, do ponto de consumo até o ponto de na maioria dos países devido ao aumento origem, que precisa ser gerenciado; é essa a da população e ao acentuado crescimento área de estudo da “Logística reversa”. urbano. Tais fatos, associados a outros pa- Tal expressão diz respeito a todo o râmetros, como novos costumes, mudanças planejamento de recuperação e de reutili- de hábitos da sociedade e desenvolvimento zação do material descartado pelo consu- industrial e tecnológico, entre outros, “têm midor e a de que forma a instituição pode provocado crescente ampliação no poder reaproveitá-lo, objetivando tanto diminuir aquisitivo per capita, com consequência di- os impactos ambientais e sociais causados reta na quantidade total de resíduos sólidos pelo uso do produto quanto promover a produzidos, particularmente nas cidades” redução de custos/obtenção de recursos (BROLLO; SILVA, 2001, p.2). para a cadeia produtiva. Concomitantemente a essa problemá- Quando relacionada às questões am- tica, a Marinha do Brasil, em seu papel bientais, a importância do fluxo reverso de Força Armada, efetua a padronização está associada à tendência de que, cada vez do uniforme de seus servidores militares. mais, as empresas serão responsabilizadas Levando-se em conta que, com o passar dos por todo o ciclo de vida de seus produtos, anos, cada vez mais o pensamento sustentá- seja por legislações ambientais ou pela pró- vel será discutido e implementado em nossa pria sociedade. Exemplo dessa tendência é sociedade, este artigo visa apresentar o con- a Resolução no 257 do Conselho Nacional ceito de logística reversa, associando-o aos do Meio Ambiente, que, em seu Artigo preceitos da Política Nacional de Resíduos 1o, define que as pilhas e baterias deverão Sólidos; evidenciar as consequências da ser entregues, pelos próprios usuários, aos destinação incorreta dos uniformes pelos estabelecimentos que as comercializam ou militares e demonstrar possíveis vantagens à rede de assistência técnica autorizada para a instituição, tanto econômicas quanto pelas respectivas indústrias, para que esses sociais, da implantação do fluxo logístico materiais sejam repassados aos fabricantes reverso na cadeia de fardamento. ou importadores e para que estes adotem, por sua vez, “procedimentos de reutiliza- LOGÍSTICA REVERSA ção, reciclagem, tratamento ou disposição final ambientalmente adequada” (BRASIL, Segundo a Associação Brasileira de 1999). Pensando nessa tendência, algumas Logística (Abralog), logística pode ser empresas já promovem a logística reversa entendida como: e estrategicamente buscam veicular uma o processo de planejamento, imple- imagem institucional de empresa ecologi- mentação e controle do fluxo e arma- camente correta. zenagem eficientes e de baixo custo de Por outro lado, ao reintroduzir em seus matérias-primas, estoque em processo, processos produtivos os materiais que se- produto acabado e informações relacio- riam rejeitados ao final do processo pelos nadas, desde o ponto de origem até o pon- consumidores, as empresas podem evitar a to de consumo, com o objetivo de atender necessidade de fazer uso de matéria-prima aos requisitos do cliente (ASSOCIAÇÃO nova ou de gastar recursos novamente na BRASILEIRA DE LOGÍSTICA, 2012). produção desses materiais. Dessa forma, a

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logística reversa pode possibilitar a redução –, promovendo a busca de soluções para de custos de produção ao provocar econo- os potenciais problemas relacionados aos mias com o reaproveitamento de materiais resíduos sólidos. que, até então, seriam descartados. Com a aprovação da lei, o cidadão co- No Brasil, as ideias acerca de progresso mum passou a ser responsável não só pela e sustentabilidade foram amplamente dis- correta destinação de seu lixo individual, cutidas em conferências mundiais, como a mas também por rever e repensar seus Rio 92 e a Rio +20 e, mais recentemente, hábitos de consumidor; o setor produtivo, na temática das Olimpíadas. No entanto, a no geral, passou a agregar o dever de logística reversa ganhou maior visibilidade buscar soluções alternativas e ambiental- em nosso país com a criação da Política mente corretas para a confecção de seus Nacional de Resíduos Sólidos, em 2010. produtos, sendo responsável também pela gerência adequada dos rejeitos sólidos e POLÍTICA NACIONAL DE pela reintegração dos mesmos à sua cadeia RESÍDUOS SÓLIDOS produtiva; os governos federal, estaduais e municipais, por sua vez, ficaram encar- Pelo conceito de “responsabilidade es- regados de planejar e estimular ações de tendida”, entendido como a responsabilida- gestão dos resíduos sólidos, promovendo a de que as empresas têm pelos seus produtos conscientização da sociedade e fiscalizando mesmo após terem sido consumidos, Leite o fiel cumprimento das novas regras san- (2012, não paginado) defende que: cionadas com a lei. A ausência da implantação e execu- Dessa forma, tal qual defende Pereira ção de uma logística reversa eficiente (2013), a PNRS impõe novas dinâmicas que garanta essa responsabilidade esten- e medidas e procedimentos de geren- dida ao produto, com os consequentes ciamento adequado, criando normativas danos à vida urbana e ao meio ambiente, para ações públicas e privadas no que diz induz a sociedade à edição de legisla- respeito à questão ambiental. Em relação ções que responsabilizam empresas e aos produtos a serem produzidos, buscam- setores pelo equacionamento do retorno -se, a partir da lei, ações para a redução de seus produtos, garantindo reaprovei- ou a não geração dos resíduos; quanto tamento ou destinação adequada a eles. aos rejeitos, buscam-se a atribuição de responsabilidades a todos os agentes da Nesse sentido, após 21 anos de dis- cadeia e a destinação adequada de tais cussão no Congresso Nacional, foi san- rejeitos, de forma a mitigar as agressões cionada, em agosto de 2010, a Lei no ao meio ambiente. Assim, esta política 12.305/2010 (BRASIL, 2010). Buscando nacional passou também a estimular, de estabelecer as normas para execução da forma indireta, programas de reciclagem Política Nacional de Resíduos Sólidos e de diminuição do consumo de recursos (PNRS) e promover ações relevantes e naturais para a produção de novos pro- articuladas entre as três esferas de poder dutos, estimulando a criação de novos – União, Estados e Municípios –, tal lei sistemas logísticos pela valorização dos objetiva atrair a atenção e delegar res- resíduos sólidos e criando, por exemplo, ponsabilidades tanto para o setor privado novos centros de reciclagem. Explicados, quanto para a sociedade em geral – a cha- então, o conceito de “logística reversa” e a mada “responsabilidade compartilhada” importância dessa ferramenta segundo as

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novas legislações brasileiras, este estudo às necessidades da Força de acordo com a dará ênfase, a partir de agora, à cadeia complexidade e as dificuldades inerentes a de fardamento da MB, explicitando suas todo esse processo. No entanto, com o passar nuances e traçando correspondência entre dos anos, é natural que novas questões sejam os conceitos apresentados. agregadas a essa complexidade; o descarte indevido das peças do fardamento pelos mi- CADEIA DE FARDAMENTO DA litares, em suas particularidades, representa MARINHA DO BRASIL um potencial problema e corresponde a uma dessas novas questões para a instituição. A Marinha mantém, na cidade do Rio de Janeiro, um complexo chamado PROBLEMÁTICAS DO Base de Abastecimento da Marinha no DESCARTE INDEVIDO DAS Rio de Janeiro (BAMRJ), que tem, como PEÇAS DO FARDAMENTO uma de suas finalidades, consolidar, em uma mesma área, depósitos centrais que Após pesquisas nas mais variadas pu- funcionam como centros de distribuição blicações da Marinha – como a SGM 303, (CD) de materiais utilizados nas rotinas com as Normas sobre Gestão de Material administrativas e operacionais desta (BRASIL, 2016) e a SGM 201, com as Força (PASTORE; GUIMARÃES; Normas para a Execução do Abastecimento DIALLO, 2010, p.2). (BRASIL, 2009) – e questionamentos a militares, tanto da ativa quanto da reserva Entre esses mais variados órgãos de remunerada, constatou-se que há uma distribuição há o Depósito de Fardamento lacuna de informações a respeito de qual da Marinha no Rio de Janeiro (DepFMRJ). deve ser o procedimento correto para os Com o propósito de “prover os itens do militares destinarem, individualmente, as símbolo de jurisdição ‘U’ (uniformes) aos fardas que não utilizam mais. militares e às organizações militares da MB, Ao mesmo tempo em que alguns desses contribuindo para a eficácia do abastecimen- militares entrevistados alegaram apenas to” (Missão do DepFMRJ), o DepFMRJ atua acumulá-las em suas residências, outros como elemento central da cadeia de farda- simplesmente descartam o uniforme no mento da MB, contabilizando os uniformes, lixo comum, ou então incineram para ga- controlando o estoque e armazenando e rantir que o uso desviado dos uniformes fornecendo os itens de fardamento. por terceiros não seja possível. Há também No atual fluxo, a cadeia logística adquire os que praticam a doação do material para as peças do fardamento junto às empresas abrigos ou para pessoas carentes, mas que as confeccionam. Funcionando como apenas alguns apresentaram a preocupação órgão de distribuição, o DepFMRJ abastece em descaracterizá-lo. os Postos de Distribuição de Uniformes, Tais atitudes podem incorrer, por nos Distritos Navais, e os Postos de En- exemplo, no comprometimento da segu- comenda de Uniformes, nas mais variadas rança orgânica das organizações militares Organizações Militares; nesses locais, os no momento em que a farda, característica militares adquirem seus uniformes. primária do militar, é usada em tentativas Nesse sistema já estabelecido, os diver- de invasões às organizações por indivídu- sos órgãos dessa cadeia vieram, até então, os se passando por militares. Além disso, provendo responsivamente e atendendo tanto a incineração desse material quanto

190 RMB3oT/2017 A LOGÍSTICA REVERSA E O PENSAMENTO SUSTENTÁVEL NA CADEIA DE FARDAMENTO DA MARINHA DO BRASIL

o descarte em lixo comum relacionam-se partícipe da cadeia logística de distribui- com a poluição do meio ambiente pre- ção e, pelo princípio da Responsabilidade viamente discutida, contribuindo com a Compartilhada, passa a ter compromissos acentuação dos problemas causados pelos para com os resíduos sólidos do final rejeitos sólidos à natureza. dessa cadeia. Portanto, de acordo com as legislações brasileiras, diante dos inúme- LOGÍSTICA REVERSA NA ros problemas trazidos pela geração de CADEIA DE FARDAMENTO resíduos têxteis, pelas possibilidades de destinações inadequadas dadas aos mesmos Quando avaliada a responsabilidade e pela responsabilidade da Marinha para social da Marinha na SGM 107 – Normas com a sociedade, faz-se necessário o uso Gerais para a Administração, um dos prin- de ferramentas capazes não só de reduzir o cípios gerenciais constantes é “a preserva- descarte incorreto das fardas, como também ção da biodiversidade e dos ecossistemas de promover o reaproveitamento de tais naturais, potencializando a capacidade das resíduos. Nesse sentido, a Política Nacional gerações futuras de de Resíduos Sólidos atender suas próprias apresenta, como expli- necessidades” (BRA- citado anteriormente, SIL, 2015, p. 1-12). Na cadeia de fardamento um importante ins- Além disso, quando da Marinha do Brasil, a trumento: a logística tal publicação define logística reversa poderia reversa. as diretrizes do Pro- Na cadeia de far- grama Netuno (pro- ser inserida com o fim damento da Marinha cesso administrativo de complementar o fluxo do Brasil, a logística que visa à aplicação de reversa poderia ser boas gestões e melho- logístico já existente. inserida com o fim de ria contínua), existem Os materiais inservíveis complementar o fluxo regras que avaliam se poderão ser destinados logístico já existente, a OM já possui práti- atuando no sentido cas voltadas para as de forma ecologicamente contrário ao sistema já preocupações ambien- correta estabelecido. Por meio tais ou se já ameniza de estímulos por par- seus impactos no meio te da instituição e da ambiente. Dessa forma, a MB reconhece conscientização acerca das consequências que, em seu papel de instituição social, da destinação incorreta, o militar detentor deve demonstrar interesse pelos problemas da farda doaria, em sua organização de da sociedade como um todo e incentivar origem, os uniformes que já não utiliza as iniciativas que promovam soluções de mais; uma vez concentrados no posto problemas do dia a dia; a degradação do de distribuição/encomenda da OM, tais meio ambiente, por sua vez, é um desses. materiais seriam recolhidos pelo próprio Pela interpretação da Lei no 12.305/2010 DepFMRJ quando fossem entregar novos (BRASIL, 2010), a partir do momento em materiais para a OM. que preconiza o uso de fardas e em que De volta ao DepFMRJ, os materiais disponibiliza aos seus integrantes esses inservíveis poderão ser destinados de forma uniformes, a Marinha do Brasil torna-se ecologicamente correta segundo suas pos-

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sibilidades de transformação, reutilização, pesquisada e constatada sua viabilidade, a reciclagem ou, caso não seja constatada a reciclagem das fardas abrirá a possibilidade viabilidade dessas opções, por incineração para a instituição de transformar os resíduos em usinas licenciadas para tal. têxteis, antes inutilizáveis, em novos teci- dos ou em novos materiais, gerando eco- CONSIDERAÇÕES FINAIS nomias na confecção de novos uniformes ou de novos produtos. Além disso, pode-se De acordo com os conceitos analisados, levar em conta também a reutilização de as legislações vigentes e a tendência de itens específicos, tais como zíperes, botões crescimento da importância do pensamento etc., gerando economia. sustentável, a implantação do fluxo rever- Por conseguinte, neste estudo o autor so na logística da cadeia de fardamento buscou evidenciar uma temática ainda pou- da MB pode trazer inúmeras vantagens à co discutida, mas que provavelmente será instituição. Além de passar a imagem de amplamente debatida num futuro próximo. organização ecologicamente correta tanto A importância de políticas de destinação de para seus servidores quanto para a socieda- material – agora em referência não apenas ao de, tal atitude reforçaria a importância da fardamento, mas de qualquer resíduo sólido, MB e elucidaria sua posição vanguardista, tais como alimentos, materiais eletrônicos preocupada com questões inovadoras. etc. – tende a ser cada vez mais difundida; Ressalta-se que, além das questões é inexorável, portanto, que a Marinha do ambientais e sociais, um importante fator Brasil e, de forma mais abrangente, as For- ligado à logística reversa também estaria ças Armadas, pelos mais variados motivos presente no fluxo reverso do fardamento já citados, promovam o estabelecimento de da Marinha: a redução de custos. Caso seja normas e regras com esse fim.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Logística; Pensamento militar; Uniforme; Abastecimento; Meio Ambiente;

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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RMB3oT/2017 193 O CICLONE MATTHEW E SEUS IMPACTOS NA INDÚSTRIA MARÍTIMA*

RAFAEL CALHEIROS DE SOUZA CABRAL** Aluno da EFOMM

SUMÁRIO

Introdução Ciclones tropicais – definição e formação Sistemas de informação: o auxílio a plataformas e navios Metodologia e pesquisa Resultados Conclusão

INTRODUÇÃO iniciou sua trajetória próximo às Bahamas, América Central, sendo intensificado quan- Oceano Atlântico Norte é uma via do adentrou o Atlântico Norte. O de transporte vital para o comércio A partir do seu desenvolvimento, as em- marítimo por embarcações de longo curso. presas de navegação foram imediatamente Além disso, é internacionalmente conheci- alertadas, graças à tecnologia de previsão do por ser densamente povoado por navios do tempo existente, por meio de sistemas de passageiros. O ciclone tropical Matthew de informações e comunicação, acerca da

*Adaptação do Trabalho de Conclusão de Curso apresentado, em 2017, como exigência para obtenção do título de bacharel em Ciências Náuticas do Curso de Formação de Oficiais de Náutica da Marinha Mercante, ministrado pelo Centro de Instrução Almirante Graça Aranha. Orientador: Henrique Vaicberg. Coorientadores: Vinicius Oliveira e Ana Cristina Pinto de Almeida Palmeira. ** Aluno do 3o ano de Náutica da Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante (EFOMM). O CICLONE MATTHEW E SEUS IMPACTOS NA INDÚSTRIA MARÍTIMA

B e -VTL, (b) -VTL e (c) -VTU, por meio de diagramas de fase cedidos pela Florida State University (FSU), e os impactos causados pelo ciclone tropical Matthew à indústria marítima. O objetivo geral do presente trabalho é classificar o ciclone tropical Matthew quanto a sua natureza por meio dos parâ- metros B, -VTL e -VTU, tendo como foco os impactos à indústria marítima. Como objetivos específicos, pretendemos indicar as características marcantes na formação e trajetória de tal fenômeno meteorológico, mostrar a importância dos sistemas de Figura 1 – National Hurricane Tropycal Ciclone informação à navegação e explicar como Report Fonte: NHC/NOAA se deve proceder caso a embarcação se possibilidade de formação de um ciclone encontre no semicírculo perigoso de um tropical. Originalmente tropical, o ciclone ciclone tropical. passou a apresentar características híbridas e posteriormente extratropicais. No pre- CICLONES TROPICAIS – sente trabalho, serão evidenciados o im- DEFINIÇÃO E FORMAÇÃO pacto causado por ciclones nas operações portuárias e as manobras evasivas a serem É o termo utilizado para classificar os realizadas caso um ciclone tropical possua sistemas de baixa pressão que possuem uma possibilidade de atingir a embarcação. extraordinária interação oceano-atmosfera Para entendimento de todos os dados e circulação ciclônica de vento à superfície apresentados no estudo de caso, foi realiza- com velocidade superior a 64 nós (JARVI- da uma explicação detalhada sobre ciclones NEN et al, 1984). Formam-se sobre águas tropicais, com ênfase em sua formação, sua quentes e intensificam-se por meio da trajetória e seu ciclo de vida. O intuito do evaporação gerada pela ação do vento sobre artigo é compreender todos os mecanismos a superfície do mar e a liberação de calor e razões pelos quais o ciclone Matthew se latente, decaindo sobre águas mais frias intensificou e se desenvolveu pela costa ou sobre áreas continentais (CHARNEY e leste dos Estados Unidos da América ELIASSEN, 1964). (EUA). Além disso, serão explorados os É classificado como um centro de baixa componentes dos sistemas de informação pressão em escala sinótica, de núcleo quen- que auxiliam plataformas e embarcações, te, não associado a sistema frontal, origi- como, por exemplo, o Inmarsart C, extre- nado sobre águas quentes com convecção mamente importante para o funcionamento profunda bem organizada e circulação de do sistema GMDSS, que possui a vital fun- vento à superfície fechada em torno de um ção de avisar os navios acerca dos perigos à centro bem definido. O referido sistema é navegação e fornecer informações concer- classificado quanto à intensidade na escala nentes à segurança da navegação. Por fim, de Saffir Simpson e possui como marcante serão apresentados o modelo proposto por característica ser barotrópico. Tal variação Hart (2003), composto pelos parâmetros (a) proporciona uma acentuada atividade con-

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vectiva em consequência da presença do ar perfície do mar (TSM), geralmente acima quente e úmido, extremamente importante de 27,5ºC, o que é frequente no Oceano para o seu desenvolvimento, visto que ob- Atlântico Tropical Norte, levando em con- tém sua energia da água quente e do calor sideração a distribuição terra/oceano, ou latente de condensação (AHRENS, 2000), seja, o princípio da continentalidade (PAL- que converge na superfície e ascende aos MEN, 1948). Por essa razão, é gerada uma altos níveis, gerando condições favoráveis grande quantidade de vapor ascendente, ao desenvolvimento de sistemas verticais. adicionando umidade à massa de ar. Logo, De acordo com a intensidade do vento, ao atingir a condensação, umidade relati- va=100%, o sistema libera calor latente devido à grande porção de energia acumulada. Além de alta TSM, outro ponto notável para a ocorrên- cia de ciclones tropicais é o aprofundamento dos cavados associados às ondas de leste e ausência do cisalhamento do vento provocado pelas ondas de oeste. Outra particularidade que há de ser ressaltada é a im- portância da Força de Coriolis. Tal força aparente existe devido ao movimento de rotação da Figura 2 – Escala Saffir-Simpson para intensidade de ciclo Terra, que altera o movimento Fonte: NHC/NOAA para a esquerda no Hemisfério os ciclones tropicais podem, ainda, ser Sul (HS) e para a direita no Hemisfério classificados como: Norte (HN). Esta força, somada ao intenso 1) Depressão Tropical – média (inter- gradiente de pressão do sistema, é vital para valo de um minuto) do vento máximo à que o giro ciclônico, no sentido horário no superfície é igual ou inferior a 62 km/h, HS e anti-horário no HN, ocorra. É im- 38 mph, 33 nós ou força 6 a 7 na Escala portante ressaltar que esta força diminui à Beaufort; medida que se aproxima do Equador. Por 2) Tempestade Tropical – média (in- esta razão, não se observa a formação de tervalo de um minuto) do vento máximo ciclones tropicais nos primeiros 5o de lati- à superfície na faixa de 63 a 117 km/h, 39 tude a partir do Equador (WALKER, 1991). a 73mph, 34 a 63 nós ou força 8 a 11 na Além disso, deve-se lembrar de que as Escala Beaufort; e frentes frias, ao se deslocarem das regiões 3) Furacão – média (intervalo de um mi- baroclínicas, caracterizadas por apresen- nuto) do vento máximo à superfície é igual tarem variações de pressão e temperatura ou superior a 118 km/h, 74 mph, 64 nós de latitudes médias em direção às baixas ou superior a força 12 na Escala Beaufort. latitudes, podem criar condições favoráveis Para que se dê a ocorrência do referido para o desenvolvimento de um ciclone fenômeno, deve haver condições propícias, tropical, pois levam consigo áreas de con- como altos valores de temperatura na su- vergência em superfície.

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Ciclo de vida de um ciclone tropical se enfraquecem, chegando ao estágio de decaimento, em que a circulação do ar Inicialmente, a fim de que seja possí- se enfraquece em superfície, tornando-se vel a ocorrência de um ciclone tropical, assimétrica em relação ao centro devido a deve ocorrer a convergência de ventos em valores baixos de TSM, que não conseguem baixos níveis, visto que é fator base para manter o desenvolvimento ciclônico verti- que ciclones se formem. O primeiro está- cal, assim como ao adentrar em uma região gio de seu desenvolvimento é conhecido continental. A intensidade, por conseguinte, como gênese, que consiste na transição de passa a diminuir de modo gradativo devido à uma perturbação em depressão tropical, falta de interação oceano-atmosfera e ao ca- iniciando a formação de uma circulação racterístico fluxo de calor latente. Portanto, a ciclônica com escala de algumas centenas baixa pressão é enfraquecida até desaparecer de quilômetros. Em seguida, há a intensi- ao se integrar ao sistema de latitude média. ficação (estágio maduro), em que ocorre uma forte circulação rotacional, com nu- Derrotas seguidas por um ciclone vens bem dispostas ao redor do centro de tropical baixa pressão em superfície. Há uma forte ascendência de ar, o que a transforma em De modo geral, o ciclone possui uma uma tempestade tropical e, consequente- tendência a sofrer forte influência das mente, em um ciclone tropical. ondas de leste, que são distúrbios que se Uma vez formado, o ciclone tropical propagam de leste para oeste na região tro- tende a se deslocar para oeste, devido à pical, principalmente no Oceano Atlântico circulação dos ventos em baixos níveis Norte, faixa que é foco deste artigo. Essas que geram as ondas de leste (WALKER, ondas são caracterizadas por um cavado de 1991), durante uma semana ou mais, e pressão à superfície. A convecção é propor- então, em alguns casos, pode se curvar cionada, basicamente, devido à região de para o pólo, ou seja, deslocando-se para divergência do vento a oeste e à região de nordeste, contornando o lado oeste dos convergência formada a leste. A força de anticiclones subtropicais. Coriolis exerce vital influência na derrota Porém há de se frisar os casos mais pre- seguida por um ciclone tropical (WALLA- judicais ao ser humano, quando o ciclone CE e HOBBS, 2006), deslocando-o para a se dirige para o continente. Tal fato já esquerda no Hemisfério Sul e para a direita ocorreu algumas vezes e é extremamente no Hemisfério Norte. perigoso, pois causa enormes prejuízos, Possuindo necessariamente uma frente como a destruição de cidades costeiras, fria associada ao sistema, o ciclone extra- deixando milhares de vítimas. Convém tropical é caracterizado como baroclínico, lembrar que países situados na América ou seja, possui gradientes tanto de tempe- Central e na costa do Caribe, como, por ratura como de pressão. Há de se lembrar exemplo, o Haiti, arrasado pelo ciclone também o fato de possuir ventos menos tropical Matthew, sofrem demasiadamente intensos em superfície e, principalmente, a com a temporada de ciclones, o mesmo sua fonte primária de energia, que consiste acontecendo na costa leste dos EUA. na diferença de temperatura entre as massas Felizmente, como um ciclone tropical é de ar, ou seja, a energia obtida quando uma abastecido por vapor d’água quente e úmido, massa de ar frio se aproxima a uma massa ao seguir para altas latitudes esses sistemas de ar quente ou vice-versa.

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Figura 3 – Matthew’s route. Fonte: National Hurricane Tropycal Ciclone Report. NHC/NOAA

Diferenças entre o ciclone tropical e o que há, na realidade, um espectro contí- extratropical nuo em que o ciclone sofre alterações ao longo do tempo, que irão caracterizá-lo Os ciclones tropicais são diferentes dos como tropical, extratropical ou híbrido. As ciclones de latitudes médias quanto à forma peculiaridades dos fenômenos em relação de obtenção da energia que os mantém. ao confinamento da massa de ar quente são Enquanto os ciclones de latitudes médias vitais para o entendimento de tal espectro, retiram sua energia dos gradientes hori- visto que seria como se possuíssemos em zontais de temperatura, a fonte de energia um extremo, um ciclone tropical, com dos ciclones tropicais está na evaporação seu núcleo quente em toda a troposfera, dos oceanos associada à condensação enquanto na extremidade oposta desta reta em nuvens convectivas próximas do seu teríamos o ciclone extratropical e, entre centro (HOLLAND, 1993). Hart e Evans eles, o ciclone híbrido. (2001) sugeriram que os ciclones podem ser classificados, de acordo com a sua área de Fase híbrida formação, ciclo de vida e energia, em dois tipos básicos: extratropicais e tropicais. Há de se dar notável importância à fase Contudo, com o passar dos anos, des- híbrida, que ocorre quando ciclones tropi- cobriu-se que o limite teórico que separa cais adquirem características extratropicais, esses fenômenos não existe. Conforme os como o deslocamento da convecção para a estudos de Evans e Hart, foi descoberto periferia do sistema, gerando uma estrutura

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frontal formada a partir do seu deslocamen- Criado em 1979, o Inmarsat C – Safety to para altas latitudes (fortes gradientes de Net é o principal meio pelo qual as vitais temperatura). Ciclones que estão no pro- informações de previsão do tempo, avisos cesso de transição podem ser chamados de de mau tempo e outras concernentes à ciclones híbridos (PEZZA, 2008). segurança da navegação são transmitidas de estações de terra para navios, de navios SISTEMAS DE INFORMAÇÃO: para estações de terra e de navios para O AUXÍLIO A PLATAFORMAS E navios. Esse meio destaca-se por ser com- NAVIOS ponente vital do sistema GMDSS (Global Maritime Distress Safety System) e de uso Inmarsat C – Safety Net obrigatório para os navios que cumprem a Convenção Solas (Safety of Life at Sea). Graças à crescente e gradativa evo- lução tecnológica, tornou-se possível a constante comunicação entre embarca- ções e estações de terra a fim de propiciar a mobilização de recursos para prestar uma resposta rápida e eficiente a situações de emergência. Além disso, por meio do desenvolvimento dos sistemas de saté- lites, a previsão meteorológica evoluiu muito rapidamente, de modo que hoje em dia é possível prever a formação de ciclones tropicais com alta probabilidade

de acerto e considerável antecedência. Figura 4 – Fonte:http://www.psicompany.com/ Em relação à indústria marítima, esta furuno-felcom15-satc/ vital informação proporciona não somen- te que milhares de embarcações evitem os locais em que esses sis- temas possuem a chance de se formar, mas tam- bém a evacuação de plataformas de produção e extração de pe- tróleo que têm sua localidade pertencente a possível derrota a ser desenvolvi- da pelo fenôme- Figura 5 – Inmarsat coverage map no atmosférico. Fonte: http://www.inmarsat.com/services/safety/inmarsat-c/

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O equipamento é composto, basica- meio do Safety Net, em conjunto com o mente, de uma antena omnidirecional, Ocean Prediction Center (OCP), o Natio- um transceptor e do Dedicated Distress nal Hurricane Center (NHC) e o Honolulu Button (DDB), responsável por emitir o Forecast Office (HFO). alerta de emergência. Todos os modernos terminais Inmarsat C são integrados ao Enhanced Group Call: Safety Net e Global Navigational Satellite Services Fleet Net (GNSS), o que proporciona atualização e acompanhamento automático da posição O Enhanced Group Call (EGC) é um no terminal, sendo utilizado para adquirir sistema de transmissão de Maritime Sa- vitais informações do navio, como posi- fety Information (MSI) e informações ção, rumo e velocidade. relativas a operações SAR para terminais Inmarsat C que suportam dois serviços Operações Search and Rescue extremamente importantes para a comu- nicação marítima: Safety Net e Fleet Net. O envio de um alerta de emergência De acordo com a Convenção Solas (1974), desempenha papel crucial para o sucesso o Safety Net, que é um serviço utilizado do sistema. Infelizmente, há casos em para recepção de MSI e informações SAR, que embarcações não conseguem evitar é equipamento obrigatório dos navios. As áreas em que pode haver mar grosso ou mensagens provenientes de tal serviço uma tempestade tropical e podem vir a en- podem ser direcionadas a todos os navios frentar uma situação que coloque em risco presentes em determinada faixa do oceano, a sua segurança. Nesse caso, deve ser em uma específica Navarea/Metarea ou em pressionado o DDB por cinco segundos; uma área costeira. então, automaticamente, o alerta de emer- A recepção de mensagens em casos de gência contendo informações capitais do urgência e emergência irá disparar alarmes navio, como sua identificação, posição e visuais e auditivos nos terminais, e tais rumo e a hora da emissão do alarme, será mensagens irão automaticamente aparecer transmitido por meio do sistema Inmarsat nos terminais que cumprem a Solas. A C até a LES (Land Earth Station), onde é fim de receber avisos referentes à costa, recebido e retransmitido para um MRCC os terminais devem ser configurados para (Maritime Rescue Co-ordination Centre), tal prática. No entanto, todos os navios no que inicia a comunicação com o navio a interior das áreas a que forem enviadas fim de organizar operações SAR (Search as MSI irão recebê-las automaticamente. and Rescue). Outro importante serviço comercial A fim de prevenir que embarcações en- largamente utilizado pelas companhias frentem situações de demasiado perigo em de navegação é o Fleet Net, que funciona que necessitem de operações SAR, é feita de maneira parecida com o Safety Net, diariamente, segundo o National Oceanic permitindo o envio de informações para Atmospheric and Admnistration (NOAA), terminais móveis pré-designados. Toda- ampla divulgação de informações relevan- via, para receber mensagens EGC Fleet tes referentes à formação de ciclones tropi- Net o navio deve possuir um Enhaced cais, com destaque para o National Weather Data ID (ENID), que deve ser baixado Service (NWS), responsável por divulgar para o terminal por meio de um comando avisos à navegação e de mau tempo por de pesquisa.

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Manobras evasivas de furacões o semicírculo esquerdo é o semicírculo navegável (Figura 6). No Hemisfério Apesar do notório desenvolvimento Sul, onde a circulação ciclônica se dá no tecnológico em relação à previsão de fe- sentido horário e o sistema se desloca na nômenos meteorológicos, como ciclones direção oeste, o semicírculo perigoso é o tropicais, extratropicais, tempestades tro- da esquerda e o semicírculo navegável é o picais e ciclones híbridos, há alguns casos da direita (Figura 7). em que o sistema se origina de maneira tão rápida que a embarcação não recebe o aviso a tempo,ou seja, se vê obrigada a manobrar a fim de evitar que seja atingida por um fenômeno capaz de destruí-la completamente. Em um furacão, sua cir- culação ciclônica influen- cia em uma área circular que pode ser subdividida em semicírculo perigoso e semicírculo navegável. A primeira preocupação do navegante é determinar em qual semicírculo o navio se encontra, a fim de tomar as devidas providências. No semicírculo peri- Figura 6 – Manobras Evasivas na Área da Tormenta no Hemisfério Norte goso, o vento presente na Fonte: https://sites.google.com/site/catalaocml/home/manobrar-mau-tempo área é a adição do vento ciclônico com o fluxo do vento planetário paralelo à trajetória, ou seja, o somatório de duas componentes para a mesma direção (LOBO, 2015). Já no semicírculo navegável sempre há uma componente oposta à corrente de vento principal, o que resulta em um vento resul- tante inferior. No Hemisfério Norte, a cir- culação em torno do centro é no sentido anti-horário e o sistema se desloca na direção oeste; o Figura 7 – Manobras Evasivas na Área da Tormenta no Hemisfério Sul semicírculo perigoso é o se- Fonte: https://sites.google.com/site/catalaocml/home/ micírculo da direita, enquanto manobrar-mau-tempo

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O navegante deve evitar, sempre que 4) semicírculo navegável – direita (HS): possível, navegar no semicírculo perigoso, tomar o vento pela alheta de bombordo e uma vez que este apresenta maior risco de navegar a maior distância possível. sofrer influências do ciclone, como, por exemplo, marulhos, ventos intensos e ma- METODOLOGIA E PESQUISA res tempestuosos. Para indicar o semicírcu- lo em que o navio se encontra, observou-se No presente trabalho foram utilizados que o vento é o meio que oferece o maior parâmetros a) B e -VTL e b) -VTL e -VTU grau de precisão. (HART, 2003), gerados a partir da base de No Hemisfério Norte, ao se identificar dados ECMWF ERA-Interim Reanalysis das que o vento está rondando para a direita 12 horas do dia 28 de setembro a zero hora de (sentido horário), o navegante estará no 9 de outubro, provenientes da Universidade semicírculo perigoso, assim como, se o da Flórida (FSU), que foram primordiais vento ronda para a esquerda (sentido anti- para a análise do Ciclone Tropical Matthew -horário), o navio estará no semicírculo quanto à sua classificação. A fim de avaliar navegável. seus impactos na indústria marítima, foi No Hemisfério Sul, verifica-se o oposto: realizada uma pesquisa acerca dos prejuízos se é notado que o vento ronda para a esquer- causados por fechamento de portos, mudança da (sentido anti-horário), o navio estará no de portos de destino dos navios e interrupção semicírculo perigoso, porém, se o vento de operações de carga e descarga. ronda para a direita (no sentido horário), o navio estará no semicírculo navegável. Parâmetros As manobras evasivas são, pois, meios utilizados para que o navegante consiga Parâmetro B – Simetria Métrica do afastar-se da trajetória de um ciclone ou Ciclone sair do interior do semicírculo perigoso do mesmo (Figura 8). Caso a embarcação seja O parâmetro B mede o cisalhamento do alcançada por uma tormenta, o oficial de vento em diferentes níveis. Por meio da serviço deverá manter a calma e executar determinação de seu valor conseguimos algumas manobras para que consiga sair identificar quão inclinado está um ciclone, da área de risco sem sofrer avarias mate- ou seja, se mantém a sua estrutura primor- riais ou de pessoal. São listadas abaixo dialmente vertical ou não. algumas das principais manobras evasivas, É importante perceber as diferenças a fim de exemplificar os procedimentos quanto aos valores de tais parâmetros no que que acontecem na prática de se evitar uma concerne aos ciclones tropicais, extratropi- área que ofereça riscos à embarcação. cais e híbridos. Um ciclone tropical possui 1) semicírculo perigoso – direita (HN): um pequeno valor de B, que pode ser bem tomar o vento pela bochecha de boreste, próximo de zero, enquanto um ciclone extra- navegando com velocidade máxima. tropical em desenvolvimento tem um grande 2) semicírculo perigoso – esquerda valor positivo de B. Os últimos estágios de (HS): tomar o vento pela bochecha de bom- um ciclone extratropical também apresentam bordo, navegando com velocidade máxima. pequenos valores de B, uma vez que, ocor- 3) semicírculo navegável – esquerda rida a oclusão do sistema, há a elevação de (HN): tomar o vento pela alheta de boreste ar quente e mistura, gerando um centro com e navegar a maior distância possível. menor temperatura e mais homogêneo.

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Figura 8 – Manobras Evasivas no Hemisfério Norte e Hemisfério Sul Fonte: https://sites.google.com/site/catalaocml/home/manobrar-mau-tempo ciclone nos arredores de sua região principal VTL e -VTU – Ventos térmicos através de seu desenvolvimento vertical. De acordo com Hirschberg e Fritsch (1993), O vento térmico é a diferença entre o todos os ciclones podem apresentar núcleos vento geostrófico entre dois níveis atmosfé- quente e frio ao mesmo tempo, dependendo ricos. Estes parâmetros são essenciais para da camada atmosférica examinada.VTL con- uma análise precisa da natureza térmica do siste no vento térmico a baixos níveis, entre

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900 e 600 hPa, enquanto VTU consiste no Diagramas de Fase do Ciclone vento térmico de altos níveis, que possui sua pressão variando entre 600 hPa e 300 hPa. Serão apresentados dois tipos diferentes Quando os valores de -VTL são po- de diagramas de fase, a fim de classificar sitivos, significa que há uma camada de o ciclone tropical Matthew como tropical, núcleo quente; por outro lado, os valores extratropical ou híbrido. Em diagrama negativos indicam uma camada de núcleo de fase, Hart (2003), ao realizar a análise frio. Num ciclone tropical de núcleo quen- de mais de 17 mil ciclones entre 1980 e te, por exemplo o ciclone tropical Matthew 1999, por meio dos dados de reanálise do em sua origem, os parâmetros -VTL e NCEP/NCAR com 2,5° x 2,5° de resolução -VTU são obrigatoriamente positivos e espacial, definiu e sumarizou as principais -VTL possui um maior valor. Contraria- categorias de ciclones ocorridos. mente, para um ciclone extratropical de O diagrama é a análise dos parâmetros núcleo frio, Matthew em sua fase final, B e -VTL (Figura 9) ou seja, a avaliação da -VTL e -VTU são necessariamente negati- natureza frontal e da estrutura térmica do nú- vos e -VTU tem maior valor. Em ciclones cleo em baixos níveis (900 hPa a 600 hPa). híbridos, ou ciclones em zona de transição, A Figura 10 consiste na análise dos pa- -VTL e -VTU podem ter sinais de mesmo râmetros -VTL e -VTU, em que é abordada valor ou opostos. a avaliação da estrutura térmica do ciclone

Figura 9 – Diagramas de fase com os parâmetros (a) B e -VTL (b) –VTL e -VTU sumarizando as principais categorias de ciclones. Fonte: Hart (2003)

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Figura 10 – Diagramas de fase com os parâmetros (a) B e -VTL (b) –VTL e -VTU sumarizando as principais categorias de ciclones. Fonte: Hart (2003) ao longo de toda a troposfera (900 hPa a A análise dos diagramas de fase 300 hPa). Cada ponto presente no estudo propostos por Hart (2003) a partir dos de caso do ciclone tropical Matthew cor- indicadores objetivos, definidos na Meto- responde a diferentes dias. dologia e Pesquisa, possibilita interpretar as características do ciclone tropical e RESULTADOS classificá-lo quanto a sua natureza. Os diagramas de fase do ciclone Matthew, Análises quanto à classificação desde sua origem até sua dissipação, estão contidos nas Figuras 11 e 12. O primeiro A fim de corroborar os dados supraci- relaciona a simetria térmica (B) e o vento tados acerca do ciclone tropical Matthew, térmico (-VTL) entre 900 e 600 hPa. O foi realizado um estudo de caso com o pro- segundo relaciona o vento térmico em toda pósito de observar as suas características a extensão vertical avaliada, definindo o quanto a sua formação e seus impactos vento térmico entre 900 e 600 hPa e entre na indústria marítima mundial. Depois 600 e 300 hPa (-VTL e -VTU ). do ciclone tropical Sandy, que ocorreu Nas Figuras 11 e 12 é possível inferir em 2012, o ciclone tropical Matthew foi que inicialmente, no dia 28 de setembro, o o primeiro ciclone a atingir a categoria 5 ciclone apresenta núcleo quente entre 900 na escala de Saffir-Simpson e também a hPa e 600 hPa, o que o caracteriza como ocorrer mais próximo da costa americana, ciclone tropical. Apresenta uma forma bas- sendo o responsável por prejuízos econô- tante simétrica, com um valor de B entre 10 micos de ordem de US$ 15 bilhões (New e 20 metros, com uma leve característica York Times, 2016). frontal (valores positivos de -VTL).

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micos, tanto em altos níveis, entre 600hPa e 300hPa, quanto em baixos níveis, entre 900 hPa e 600hPa. O ciclone passa a se intensificar de ma- neira gradual e atinge o seu pico de intensi- dade de 145 nós a zero hora UTC do dia 1o de outubro, localizado aproximadamente ao Figura 11 – (a) Diagrama de Fase relacionando os parâmetros -VTL e -VTU norte de Punta Gallinas, obtidos através de análise do GFS (1,0º) e (b) “Zoom” no diagrama de fase (a) Colômbia. Tal magnitu- para melhor entendimento da evolução do ciclone. Fonte: FSU de do ciclone Matthew fez com que este su- perasse o ciclone Ivan, tornando-se o ciclone de categoria 5 mais intenso da bacia atlântica. Após o ciclone atingir seu pico, como ilustrado na Figura 13, permaneceu entre os dias 1o e 2 com características pareci- das, se enfraqueceu, Figura 12 – (a) Diagrama de Fase relacionando os parâmetros -VTL e -VTU obtidos através de análise do GFS (1,0º) e (b) “Zoom” no diagrama de fase (a) mas seguiu constante. para melhor entendimento da evolução do ciclone. Fonte: FSU A partir do final do dia 2, recomeçou um No dia 29 de setembro, enquanto passa- processo de intensifi- va próximo a Barbados, foi observado que o cação, apresentando um elevado valor de ciclone apresentou um núcleo ligeiramente seus ventos térmicos, VTU e -VTL. O dia frio, com o índice B negativo, evidenciando 4, apesar de não apresentar grandes va- uma forma ligeiramente assimétrica. Con- riações quanto à estrutura ou intensidade tudo, a partir da entrada no mar do Caribe, do furacão, foi o dia mais mortal deste, onde o ciclone foi abastecido com bastante que deixou mais de 500 mortos ao fazer vapor úmido, passando a ter núcleo quente landfall no Haiti. durante praticamente todo o seu desenvol- O ciclone seguiu sua derrota rumo ao vimento, enquadrou-se no espaço caracte- norte da costa oeste do Haiti e, devido a rístico dos ciclones tropicais. Ao continuar uma cadeia de montanhas existentes na pelas quentes águas do Caribe, o ciclone região, o ciclone se enfraquece, atingindo tropical Matthew começa a se intensificar, a categoria 3. Pode- se observar na Figura apresentando grandes valores de ventos tér- 13 que, devido às montanhas, a circulação

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Figura 13 – Gráfico Ciclone Matthew Intensidade (nós)X Dias (hora UTC). Fonte: NHC/NOAA

em baixos níveis diminui, por isso apre- aferidos valores negativos de B. Em 8 de senta valor de -VTL negativos. Ainda outubro, o ciclone realizou landfall na sim, o ciclone é extremamente destrutivo Carolina do Sul, apresentando, segundo ao atingir Cuba a zero hora UTC de 5 de os gráficos propostos por Hart (2003), outubro. características de um ciclone híbrido. No Após Cuba, o ciclone mantém valores dia seguinte o ciclone sofreu uma transi- constantes tanto de B como VTU e -VTL ção extratropical, representada no gráfico durante o dia 6. Porém, a partir das 18 horas como um valor negativo de -VTU e valor UTC, passa por um novo período de intensi- altamente positivo do índice B, ratificando ficação com desenvolvimento vertical cons- sua classificação como ciclone híbrido. tante, corroborado por valores de B entre 0 e Após 9 de outubro o ciclone se enfraquece, -10. Em 7 de outubro, assumiu a categoria 3 até desaparecer completamente no dia 10, de acordo com a escala Saffir-Simpson e atin- na bacia do Atlântico Norte. giu a Ilha de Bahamas com elevados valores de ventos térmicos. Posteriormente, seguiu Impactos na indústria marítima rumo à costa leste dos Estados Unidos. O ciclone desenvolveu sua trajetória pela O ciclone tropical Matthew acarre- Estado da Flórida e, a partir do dia 7, passou tou, indubitavelmente, severos impactos a apresentar características de um ciclone aos países por onde passou. Segundo a extratropical, à medida que se dirigia para Impact Forecasting, o prejuízo causado as latitudes médias, uma vez que foram pela tormenta foi de US$ 2.6 bilhões a

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Cuba, US$ 1.9 bilhões ao Haiti e US$10 Acts of God (Atos de Deus), relacionada a bilhões aos Estados Unidos. Em relação danos originados direta e exclusivamente à indústria marítima, os prejuízos não por causas naturais, sem a intervenção ocorreram por causa dos naufrágios de humana e que não pudessem ser evitados embarcações ou plataformas, mas sim ou solucionados de modo seguro por devido à não-execução de operações de qualquer providência tomada. O acidente carga e descarga, mudança de rotas de ou dano deve, obrigatoriamente, ser cau- navios, atrasos e cancelamentos de via- sado pela violência da natureza. Por isso, gens visando a segurança da navegação os prejuízos sofridos foram pagos pelos e a salvaguarda da vida humana no mar. embarcadores. Por determinação da Guarda Costeira dos Quanto às empresas de navios de EUA (USCG – United States Coast Guard), passageiros, as chamadas cruisers lines, os portos de Porto Canaveral, Miami, Mia- também sofreram um grande impacto nas mi River, Everglades e Palm Beach foram suas operações devido ao Matthew. Com- completamente fechados, assim como ter- panhias de navegação renomadas, como minais de contêineres no Estado da Flórida, Royal Caribean, Princess Cruises, Disney a fim de prevenir Cruise e Car- que embarcações nival Cruises, sofressem fortes tiveram de alte- rajadas de ven- rar suas derro- to provenientes tas e a duração da aproximação de suas viagens. do ciclone Mat- Alguns clientes thew. O fecha- que já haviam mento dos portos comprado pas- e terminais obri- sagens optaram gou armadores e por não viajar, Figura 14 – Carnival Elation Cruise. Fonte: http://www. transportadores a cruisetimetables.com/pictures/carnival-elation-cruise-ship.jpg gerando preju- alterar o porto de ízo para as em- destino, o que, por sua vez, modificou com- presas, e pediram o dinheiro de volta a fim pletamente a logística de entrega da carga de evitarem se expor ao risco de enfrentar e,consequentemente, acarretou prejuízos um ciclone tropical. financeiros. O caso do navio Carnival Elation (Fi- No caso dos portos americanos cujas gura 14), por exemplo, foi extremamente operações tiveram de ser interrompidas, crítico, uma vez que já se encontrava os prejuízos derivados de danos a cargas navegando em mar aberto, no meio de que ficaram expostas a rajadas de ventos sua viagem de cinco dias pelo Oceano intensas, o atraso de sua entrega e qualquer Atlântico Norte, quando o ciclone tropical outra despesa extraordinária relacionada intensificou-se e se dirigiu para seus portos à ocorrência do ciclone não foram repas- de destino. A empresa optou, então, por sados ao transportador, já que os EUA não atracar em Half Moon Cay e Nassau, possuem o Estatuto Cogsa (Carriage of nas Bahamas, locais que eram prováveis Goods by Sea Act). na derrota, navegar um dia a mais e atracar O referido estatuto determina que tais em Key West, na Flórida, onde ficou por fenômenos se enquadram na categoria de mais um dia.

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CONCLUSÃO No que concerne ao prejuízo material causado pelo ciclone, observou-se que, Portanto, a partir dos dados expostos du- apesar do grande desenvolvimento da frota rante o artigo científico, pode-se compreen- da Marinha Mercante mundial, as embar- der a magnitude do ciclone tropical Matthew cações continuam sujeitas à interrupção e seus impactos na indústria marítima. Foi de suas operações devido a fenômenos de um caso de ciclogênese predominantemente magnitude e poder de destruição como os tropical que apresentou características híbri- do ciclone Matthew. Atestou-se também das durante determinados dias, corroboradas a importância do uso dos sistemas de in- pelo estudo de caso. A faixa de latitudes formação, com ênfase no Safety Net, na ultrapassou os 30º N e levou à conclusão de comunicação ship to ship e ship to shore de que não se pode enquadrar um ciclone em avisos de mau tempo e segurança à navega- uma categoria de exclusivamente tropical ção, cruciais para que as embarcações que ou extratropical, já que, frequentemente, são já se encontravam no mar durante o desen- poucos os ciclones que se mantêm da mesma volvimento do ciclone, como, por exemplo, forma durante todo o seu ciclo de vida. o navio Carnival Elation, pudessem traçar O método utilizado para classificar e uma nova derrota evitando cruzar o semi- avaliar o ciclone tropical Matthew segundo círculo perigoso do ciclone Matthew, o que os parâmetros V,-VTU e -VTL nos diagra- colocaria em risco a embarcação. mas de fase desempenhou um papel vital Dessa forma, chegou-se à conclusão para a compreensão desse fenômeno. O uso de que os objetivos gerais e específicos dessa ferramenta proporcionou a previsão do presente artigo científico foram atin- da trajetória e intensidade dos ciclones. gidos. A partir do diagrama de fase, o Ao agrupar um conjunto de informações, ciclone tropical Matthew foi devidamente os diagramas de fase tornam mais simples classificado quanto a sua natureza, e seus a interpretação, que seria muito mais impactos na indústria marítima foram de- complexa caso os dados tivessem de ser vidamente examinados. Os procedimentos compreendidos separadamente. de manobra, caso a embarcação se encontre Em relação a manobras evasivas, não foi no semicírculo perigoso de um ciclone encontrado nenhum relato de embarcação tropical, foram explicados, e foi exposto que tenha realizado manobras dispostas no o funcionamento e a importância dos sis- presente trabalho. temas de informação à navegação.

1 CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO: ; Ciclone; Furacão;

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A RMB expressa o pesar às famílias pelo falecimento dos seguintes colaboradores e assinantes:

VA Sergio Tavares Doherty  30/03/1936 † 10/02/2017 VA Fernando Manoel Fontes Diégues  09/03/1939 † 30/06/2017 CA Odyr Marques Buarque de Gusmão  08/05/1929 † 24/05/2017 CA (IM) Jair Marques Pimentel  18/04/1931 † 17/07/2017 CMG Heraldo Messeder de Souza  24/03/1930 † 14/07/2017 CMG (IM) José Américo Magalhães Pessôa  28/10/1938 † 30/06/2017 CMG (FN) Gil Cordeiro Dias Ferreira  06/09/1946 † 09/06/2017 CMG (EN) Ylk Amadeo Bolognani  08/01/1946 † 19/04/2017 CMG Charles Augusto Pinto  07/08/1948 † 18/06/2017 CMG Ricardo Otavio Samça Pelegrini  01/01/1961 † 01/06/2017 CF Newton Coutinho do Nascimento  27/06/1938 † 08/07/2017 CC (FN) José Raimundo de Jesus Silva  17/07/1930 † 21/06/2017 SO Severino Santana da Costa  17/07/1937 † 24/06/2017

Nascido no Rio de Janeiro, filho de Carlos Armando Doherty e de Helyette Tavares Doherty. Promoções: a 2oTen em 30/12/1956; a 1oTen em 03/01/1959; a CT em 12/01/1961; a CC em 01/11/1965; a CF em 30/11/1970; a CMG em 31/08/1977; a CAlte em 31/03/1984 e a VAlte em 31/07/1988. Foi transferido para a reser- va remunerada em 30/04/1992. Em sua carreira exerceu quatro coman- dos: Navio Varredor Juruena; Corveta Mearim, Navio de Transporte de Tropas Custódio de Mello e Escola Naval. Exerceu três direções: Centro de In- teligência da Marinha; Diretoria de En- SERGIO TAVARES DOHERTY sino da Marinha e Diretoria de Portos Vice-Almirante e Costas. NECROLÓGIO

Comissões: Escola Naval; Centro de Em reconhecimento aos seus serviços, Instrução Almirante Wandenkolk; Na- recebeu inúmeras referências elogiosas vio-Escola Duque de Caxias, Centro de e as seguintes condecorações: Ordem do Armamento da Marinha; Comando em Mérito da Defesa – Comendador; Ordem Chefe da Esquadra, Navio-Aeródromo do Mérito Naval – Grande Oficial; Ordem Ligeiro Minas Gerais, Cruzador-Li- do Mérito Militar – Comendador; Ordem geiro Barros, Diretoria do Pessoal da do Mérito Aeronáutico – Comendador; Marinha; Comissão Naval Brasileira Ordem de Rio Branco – Oficial; Madalha em Washington; Estado-Maior da Ar- Militar e Passador Platina – 4o Decênio; mada; Comando da Flotilha do Ama- Medalha Mérito Tamandaré; Medalha zonas; Comando do 4o Distrito Naval; Mérito Marinheiro – 2 Âncoras; Medalha Comando do 1o Distrito Naval; Escola do Pacificador; Medalha do Mérito San- de Guerra Naval; Gabinete do Minis- tos Dumont; ES-IC Espanha – Ordem de tro da Marinha – Rio; Comissão Naval Isabel a Católica e AR-MN Argentina – Brasileira na Europa; Comando da For- Ordem de Maio no Mérito Naval. ça de Apoio Logístico, Comando do 7o À família do Almirante Sergio Tava- Distrito Naval e Gabinete do Ministro res Doherty, o pesar da Revista Marítima da Marinha – Brasília. Brasileira.

DOHERTY

As lembranças que tenho do Doherty cumpria seus diversos compromissos e são muitas, e todas muito favoráveis. ainda era “o estudante a ser batido” na Estive mais perto dele quando cursou competição acadêmica. Armamento e eu era o encarregado do cur- Pós-curso, foi aplicar seus novos conhe- so e seu instrutor. Discretamente aplicado, cimentos no Cruzador Barroso, na Divisão foi o suficiente para que terminasse o curso F, considerada o setor de maior importân- em primeiro lugar, apesar de ter alguns cia do armamento de um navio de guerra. colegas de curso muito bons estudantes a Apesar dessa capacidade profissio- ponto de ameaçar as suas notas, mas não nal, Doherty gostava mesmo era da o suficiente. “linha da DPC”, por onde transitou nos Além de bom estudante, Doherty era postos superiores. bom atleta em piscina; nadava livre em Devido a essas performances, Doherty várias distâncias e jogava water polo de- é um tipo inesquecível entre os que divi- fendendo as cores de clube carioca. di afazeres na Marinha. Saudade de um E o que mais me impressionava companheiro especial... era que Doherty, na época do curso de Armamento, treinava o water polo Luiz Edmundo Brígido Bittencourt com afinco praticamente todos os dias, Vice-Almirante (Refo)

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Exerceu duas direções: Escola de Guerra Naval e Diretoria de Hidrografia e Navegação. Comissões: Colégio Naval; Escola Naval; Centro de Instrução Almirante Wandenkolk; Navio de Transporte de Tropa Custódio de Mello; Contratorpe- deiro Bocaina; Navio Hidrográfico Ca- nopus; Navio Oceanográfico Almirante Saldanha; Diretoria de Hidrografia e Na- vegação; Adido Naval em Portugal e Es- panha; Serviço de Sinalização Náutica do Nordeste; Adido Naval na França e Itá- lia; Estado-Maior da Armada; Gabinete do Comandante da Marinha – Brasília; Secretaria da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar e Diretoria de FERNANDO MANOEL FONTES Informática da Marinha. DIEGUES Em reconhecimento aos seus serviços, Vice-Almirante recebeu inúmeras referências elogiosas e as seguintes condecorações: Ordem do Nascido em Alagoas, filho de Manoel Mérito da Defesa – Grande Oficial; Or- Diegues Junior e de Zaira Fontes Diegues. dem do Mérito Naval – Grande Oficial; Promoções: a 2o Ten em 12/12/1959; a 1o Ordem do Mérito Militar – Comendador; Ten em 12/04/1961; a CT em 13/07/1963; a Ordem do Mérito Aeronáutico – Oficial; CC em 08/08/1969; a CF em 31/08/1976; Ordem de Rio Branco – Grande Oficial; a CMG em 25/12/1983; a CAlte em Medalha Militar e Passador Platina – 4o 31/07/1989 e a VAlte em 31/07/1994. Foi Decênio; Medalha Mérito Tamandaré; transferido para a reserva remunerada em Medalha Mérito Marinheiro – 3 Âncoras; 12/03/1998. Medalha do Pacificador e Medalha do Em sua carreira exerceu três comandos: Mérito Santos Dumont. Navio Oceanográfico Almirante Câmara; À família do Almirante Fernando Ma- Navio de Apoio Oceanográfico Barão de noel Fontes Diegues, o pesar da Revista Teffé e Comando do 5o Distrito Naval. Marítima Brasileira.

VICE-ALMIRANTE (REF) FERNANDO MANOEL FONTES DIÉGUES

Tenho a impressão de nossa amizade A cultura geral, a capacidade científica, haver iniciado por admirarmos o Almi- a habilidade em explicar com palavras rante Paulo de Castro Moreira da Silva. simples complexos fenômenos oceanográ-

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ficos, a formação marinheira, enfim, tudo como “presente” dos países ricos aos em isso colaborou para nossa aproximação, desenvolvimento, em contraposição à ciên- que durou toda uma vida. cia cultivada (cultivated science), medida Ambos éramos hidrógrafos. Mas, desde eloquente, salutar e fértil sugerida por ele cedo, o Diégues, talvez como herança do pai a ser adotada pelos países desenvolvidos – antropólogo e escritor1 –, preocupava-se em relação aos demais, estimulando-lhes, também com relações humanas e cedo pro- assim, genuínas perspectivas de cresci- curou formar-se em Sociologia. Começava, mento. O trabalho mereceu manifestações desta forma, a despontar-lhe na mente o elogiosas por parte de integrantes de várias interesse em conhecer a história e a evo- delegações estrangeiras e até mesmo de lução das sociedades e, ao mesmo tempo, algumas nações desenvolvidas. dedicar-se a sua especialidade na Marinha. Mais tarde, comandou o Navio Ocea- Assim sempre o vi e o admirava por essa nográfico Almirante Câmara. Tive a feli- feliz convivência de aspectos aparentemente cidade de recebê-lo de suas mãos, em Rio antagônicos a lhe ornar o espírito. Grande (RS), com múltiplos detalhes, em Mais tarde, fomos fazer o curso de plena campanha oceanográfica, com toda Oceanografia no Instituto Hidrográfico a capacidade operativa em funcionamento. da Marinha de Portugal, em Lisboa. Retornou à Europa para, desta vez em Tivemos excepcional professor de Ocea- Paris, fazer o Curso Superior de Guerra Inter- nografia Física2. Bebíamos e escrevíamos forças, na vetusta e tradicional École Militaire. seus ensinamentos. Organizamos notas A Marinha lhe deu outro comando. de aula. Com uma diferença: as dele, Desta vez, o Navio de Apoio Oceanográfico enriquecidas, transformaram-se, tempos Barão de Teffé, e com todo êxito, nos mares depois, no livro-texto Oceanografia, do gelados, realizou uma operação antártica. Curso de Aperfeiçoamento de Hidrografia Dirigiu a Escola de Guerra Naval e para Oficiais. As minhas continuaram a comandou o 5o Distrito Naval, marcando, ser apenas notas de aula num já muito nessas duas comissões, as características envelhecido caderno... invejáveis de sua personalidade. Nos tempos da Diretoria de Hidrografia Nossos destinos se cruzaram mais uma e Navegação (DHN), ainda na Ilha Fiscal, vez quando dele recebi a DHN, a nossa Frederico Bentes, Hugo Bernardi e eu “Repartição Hydrographica”, com o mes- vivíamos dizendo que “naquela cabeça, só mo cuidado com que, no passado, me havia existem ideias e coisas boas!”, tal a admi- entregue o Almirante Câmara. ração pelo querido amigo. Dali seguiu para Genebra, Suíça, no- Por várias vezes ele integrou a dele- meado conselheiro militar da Delegação gação brasileira na Comissão Oceano- Brasileira junto à Organização das Nações gráfica Intergovernamental, da Unesco. Unidas. Mais uma vez, fruto da sua imensa Certa feita, ao fazer parte de um grupo cultura e das qualidades peculiares de seu específico da Comissão sobre ensino e caráter, fez-se distinguido amigo do chefe assistência mútua, preparou um artigo da Delegação, Embaixador Celso Lafer. no idioma inglês em que, criticamente, Com grande e constante atividade inte- denunciava a ciência dada (given science) lectual, veio a publicar A Revolução Brasí-

1 Manuel Diégues Junior, autor, dentre outros livros, de Etnias e Culturas no Brasil. 2 Daniel Augusto Rodrigues, oficial da Marinha portuguesa, professor e pesquisador da Universidade de Lisboa.

214 RMB3oT/2017 NECROLÓGIO lica, centrada em José Bonifácio de Andrada conheço –, mãe de Carlos Manoel, diretor e Silva, o Patriarca da Independência. de televisão, e Pedro Henrique, cirurgião. Se tivesse de ressaltar algumas de suas Sem nunca haver abandonado os hábitos inúmeras qualidades, não hesitaria em exaltar de ler, estudar, pesquisar e escrever, chegou a integridade, a cultura geral e profissional, ao fim de sua riquíssima jornada, marcando, a serenidade, a simplicidade, o equilíbrio, a na Marinha, luminosa esteira e, em nossos temperança e, claro, o espírito marinheiro. corações, imensa saudade. Na querida família, já imortalizada pelos netos, deixa Edy – sua insuperável Marcos Augusto Leal de Azevedo companheira e o maior exemplo de fé que Almirante de Esquadra (Refo)

QUERIDO AMIGO DIÉGUES

Conheci o Diégues antes de ingressar corveta, fragata e mar e guerra, o Diégues na Marinha, quando, no verão de 1953, sempre me impressionou pela sua retidão passávamos férias em Teresópolis, enquan- de caráter, cultura, bondade, estabilidade to aguardávamos nossa apresentação ao emocional, discrição e modéstia (nunca Colégio Naval. Éramos então dois jovens o vi falar mal de alguém), tudo isto per- de 14 anos, ansiosos e felizes, cheios de meado por uma sólida estrutura moral e entusiasmo para envergar os uniformes da religiosa, herdada de seus pais, o antro- Marinha e com planos para conquistar os pólogo e escritor Manuel Diégues Júnior, mares e conhecer o mundo. renomado autor de vários livros, e a doce Durante os dois anos de Colégio Naval, Dona Zaira, mãe de todos nós e dos seus consolidamos nossos laços de amizade, irmãos, Cacá (cineasta internacional) e alimentados pelo relacionamento nasci- Madalena Diégues. do entre nossas queridas mães, Zaira e Aos sábados, a casa do Diégues, na Lisette, no convívio de fins de semana Rua da Matriz, em Botafogo, passava a em que ficavam hospedadas no Grande ser a base de operações dos aspirantes Hotel de Angra . para o planejamento das festas de fim de Em 1956, fomos juntos para a Escola semana. Como tenentes, fomos funcional- Naval, passando a dividir um camarote mente separados, eu para cursar Aviação com Meireles (já falecido) e Carvalho Naval, o Carvalho Rocha para o Curso de Rocha. Merece ser mencionado que, Submarinos, o Meireles para o Arsenal de durante todo o período escolar, o Meire- Marinha do Rio de Janeiro e o Diégues les, banda da Turma Dedo, dormia reli- seguindo sua vocação para a Diretoria de giosamente todas as noites, logo após o Hidrografia e Navegação (DHN). silêncio, enquanto eu, Carvalho Rocha e Embora servindo em setores operacio- o Diégues virávamos as noites estudando nais diferentes, e posteriormente com am- antes das provas. bos na reserva, nossa amizade continuou a Desde aquela época, e posteriormente mesma, nos encontros festivos da Turma como aspirante e guarda-marinha, na Dedo, em datas especiais e em reuniões Viagem de Instrução, e como tenente, realizadas, sempre que possível.

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Almoço dos 100 Dias de 1958. Da esquerda para a direita: Aspirantes Diégues, Roberto, Meireles, Fernando e Lynch.

Não poderia terminar este necrológio cultura profissional e pessoal, além de sobre meu irmão Diégues sem mencionar várias realizações permeadas pelo sucesso a nossa querida Edy, amiga, companheira, de suas qualidades e seus traços pessoais, mãe-avó e esposa devotada, com seu amor em que se destacariam sua serenidade, e apoio de todas as horas. simplicidade e modéstia natural e espon- Na sua vida intelectual, merecem, ain- tânea, e seu equilíbrio emocional e sua da, ser ressaltadas sua passagem exitosa e temperança, com uma habilidade natural inovadora na direção da Escola de Guerra de explicar e solucionar, com palavras Naval e como aluno no Curso Superior simples, complexos problemas. de Guerra das Interforças Francesas em Assim, não foi surpresa quando, mereci- Paris e suas atuações como conselheiro damente, foi escolhido pelo Almirantado e militar da Delegação Brasileira junto promovido a contra-almirante, e posterior- à ONU e, no Setor Operativo, como mente a vice-almirante. comandante do 5o Distrito Naval e, final- A Marinha e seus amigos vão sentir, e mente, em sua casa e sua especialidade, muito, a sua falta, amigo Diégues. como diretor da DHN. Em todas estas comissões, deixou mar- Pedro Augusto Bittencourt Lynch cas indeléveis de sua extensa e profunda Capitão de Mar e Guerra (Refo)

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CARO AMIGO DIÉGUES

Apreciei o amigo desde cedo, mas comum, falou-me do livro sobre a Inde- lembro mais do tempo da Escola, quando, pendência que estava sendo escrito por por vezes, conversávamos sobre o País Diégues. Tinha notícias sobre a finalização – venturas e desventuras do final dos 60, do livro e depois fui lê-lo com a maior após o getulismo. atenção. É ótimo em todos os aspectos e A Nação nos preocupava e, obviamente, representa, como alguns se manifestaram, não conseguíamos antever como teríamos es- como obra de referência sobre a Indepen- tabilidade política e desenvolvimento social. dência do Brasil. Didi, como sempre o chamava, era mais Nos encontros mensais sempre faláva- responsável do que eu, pois não sabia, na mos sobre tudo, mas o cinema, a literatura ocasião, da influência que recebera do seu e a política nacional era o que mais abor- ambiente familiar. O afastamento dos meus dávamos. Ele comentava sempre o que pais, desde os 16 anos, não me dera maturi- apreciara na Revista Marítima e eu o ex- dade suficiente para melhor analisar o cenário plorava seguidamente para que escrevesse nacional. Diégues era, de certa forma, al- para nossa Marinha. guém que me induzia a pensar como cidadão. Atendeu-me algumas vezes, mesmo quan- A convivência aumentou entre nós na do a sua vida não passava por mares calmos. Viagem de Guardas-Marinha em 1959, Dizia-me que precisava de inspiração pois jogávamos xadrez ao cair da tarde, para desenvolver temas e ideias que pudes- no convés que era reservado para recre- sem ser úteis à MB. E assim foi nos anos ação, e trocávamos ideias sobre o futuro 2000, quando escreveu sobre o Ato Terro- – nosso e da Nação. Lembro claramente rista de 11 de setembro; Brasil e o cenário da reprimenda que me fez quando – por estratégico; Geopolítica da Crise; Atlântico brincadeira – fiz menção ao movimento Sul – Segurança e Defesa; e A estratégia da separatista Norte-Sul. Ficou zangado e Independência. No século XX havia escrito creio que foi a única vez que o vi daquela para a RMB em mais seis oportunidades. forma, desanuviado logo depois pelas mi- Didi era alegre e comunicativo com seus nhas desculpas, explicando-lhe ter sido uma amigos. Sorria - à sua maneira, mormente brincadeira. Mesmo assim ele me censurou com as brincadeiras do Cerqueira, do Gil, dizendo não ser aquele assunto motivo de do Parente, sua turma do Colégio Santo Iná- infantibilidade irresponsável. Concordei cio que frequentava os almoços do Piraquê. com ele, e nunca mais tocamos no assunto. Aqueles do Santo Inácio tinham sido alunos Nossas vidas pessoais e profissionais mais destacados, desde 1954 até 1959: Cruz nos afastaram, e nos breves encontros que Santos, Frazão, Pereira, Parente. tivemos pelos eventos da Turma Dedo, não Didi tinha o dom da ponderação, da retomamos nossas antigas conversas. ternura, da calma, da palavra amiga, da Só refizemos contato quando já está- alegria contida, da tristeza reservada. vamos na Reserva, ele almirante e eu na Este era, sim, Diégues – um homem que Revista Marítima. faz falta... Passamos a conviver nos almoços mensais dos amigos no Piraquê. Mais Milton Sergio Silva Corrêa ainda quando Cerqueira, nosso bom amigo Capitão de Mar e Guerra (Refo)

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ná; Esquadrão de Minagem e Varredura e Força de Contratorpedeiros. Exerceu a direção do Centro de Instru- ção Almirante Wandenkolk. Comissões: Escola Naval, Contratorpe- deiro Greenhalgh, Contratorpedeiro Acre, Comissão Naval Brasileira em Washing- ton, Comando em Chefe da Esquadra, Comando da Flotilha de Contratorpedei- ros, Contratorpedeiro Pará, Comando da Força de Cruzadores e Contratorpedeiros, Contratorpedeiro Paraíba (Imediato), Es- tado-Maior da Armada, Escritório de Mu- dança dos Orgãos da Marinha Brasileira em Brasília, Gabinete Militar da Presidên- cia de República, Escola de Guerra Naval, Escritório do Adido Naval em Paris e Haia (Adido), Comando de Operações Navais ODYR MARQUES BUARQUE DE GUSMÃO (SubChefe) e Escola Superior de Guerra. Contra-Almirante Em reconhecimento aos seus serviços, recebeu inúmeras referências elogiosas Nascido no Rio de Janeiro, filho de e as seguintes condecorações: Ordem do Nelson Buarque de Gusmão e de Ivonette Mérito Naval – Cavaleiro; Ordem do Mé- Marques de Gusmão. rito Militar – Cavaleiro; Ordem do Mérito Promoções: a 2o Ten em 07/04/1953; a Aeronáutico – Cavaleiro; Ordem de Rio 1o Ten em 07/10/1954; a CT em 07/04/1957; Branco – Oficial; Medalha Militar e Pas- a CC em 07/05/1962; a CF em 16/09/1966; sador Ouro – 3o Decênio; Medalha Mérito a CMG em 21/05/1971 e a CAlte em Tamandaré; Medalha Mérito Marinheiro – 31/07/1978. Foi transferido para a reserva 4 Âncoras; Medalha do Pacificador; Me- remunerada em 25/03/1983. dalha Mérito Santos Dumont e FR-NM Em sua carreira exerceu cinco coman- França – Ordem Nacional do Mérito. dos: Contratorpedeiro de Escolta Bocai- À família do Almirante Odyr Marques na; Centro de Adestramento Almirante Buarque de Gusmão, o pesar da Revista Marques de Leão; Contratorpedeiro Para- Marítima Brasileira.

ALMIRANTE ODYR

A primeira vez que encontrei o Almirante Fragata (FN) Clinton, os quais compunham a Odyr foi quando eu era ajudante de ordens do Subchefia da Marinha no referido Gabinete. ministro da Marinha e ele, capitão de fragata, Todos os quatro oficiais eram considerados na fazia parte do gabinete militar do Presidente época, em 1967, oficiais do mais alto gabarito Costa e Silva. Ele era um dos três oficiais dos respectivos quadros, tanto que os três da da Armada, junto com o Capitão de Mar e Armada alcançaram o almirantado. Guerra Pedro Thedim Barreto e o Capitão de A presença desses quatro oficiais ofere- Fragata Fernando Freitas, além do Capitão de cia ao Almirante Rademaker, ministro da

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Marinha, o respaldo e a tranquilidade para Além do formidável marinheiro que lidar com os problemas complexos junto ele era, inclusive ostentando a medalha de ao Presidente da República. quatro âncoras, a sua figura como pessoa Em 1988, voltei a encontrar o já Almi- humana era muito especial. Na atual fase rante Odyr, desta vez como comandante da em que vivemos no Brasil, onde permeiam Força de Contratorpedeiros e sendo eu o a falta de ética e moral, além do alto grau de comandante do CT Alagoas. Foi neste con- corrupção, atingindo os mais altos cargos nos vívio que pude observar mais de perto as qua- governos, atuais e passados, deixando entre lidades deste extraordinário oficial e chefe, nós uma sensação de impunidade, resta-nos especialmente quando ele embarcou por três como conforto lembrarmos de chefes navais vezes no meu navio, fazendo-o capitânia da como Almirante Odyr, extremamente éticos, Força e eu, consequentemente, seu capitão de de moral inatacável e exemplos de honesti- bandeira. Das muitas características que pude dade não só no campo financeiro, mas em apreciar, uma delas foi o amor enorme que todas as suas atividades de vida. Tudo o ele possuía pela Marinha. Dizia ele que se que ele representou para nós nos conforta, por acaso fosse sorteado em alguma loteria, transmitindo a esperança de que nem tudo passaria todo o prêmio para a Marinha, para está perdido. Sua figura era simples, correta que fosse aplicado em seus navios. nos mínimos detalhes, até mesmo humilde, Seu conhecimento como oficial de Ma- não se vangloriando de feitos passados, numa rinha, especialmente relativo às atividades carreira extremamente invejável. No seu final no mar, era completo. Seu passado como na Marinha, teve de renunciar à carreira por marinheiro embarcado lhe conferia uma vi- uma razão maior, que envolvia a saúde de vência que lhe permitia desbravar todos os familiar. Este problema sobrepujava o amor mistérios que o mar esconde. Basta recordar pela Força, obrigando-o a dela abdicar, o que um pouco de sua carreira, especialmente em nos deixa mais um exemplo da grande mostra contratorpedeiros onde serviu: Greenhalg, de amor, neste caso exposto pela família. Acre, Bocaina (comando), Paraíba (ime- Almirante Odyr, descanse em paz. Sua diato) e Paraná (comando). missão foi plenamente cumprida, deixando Tudo isto criava em nós, comandantes para os mais modernos um legado que hon- dos contratorpedeiros, subordinados a ele, ra todos os oficiais de Marinha do presente. o respeito aliado à admiração, o que nos proporcionava uma enorme confiança em José Alberto Accioly Fragelli nosso comandante de Força. Almirante de Esquadra (Refo)

CARO ALMIRANTE ODYR

Tive o prazer de conhecer o Almirante Com a definição do almirante e tendo Odyr quando assumi o comando do CT Mar- recebido informações muito precisas e reais cílio Dias. Disse-me que precisava ter mais do meu antecessor, o querido amigo Har- um navio na Força de Contratorpedeiros, eu greaves, antevi o problema a ser resolvido. teria que me esforçar para recuperá-lo e sabia O Comando da Força me apoiava e a das dificuldades que seriam encontradas. E prontificação do sonar avariado pelo abal- disse mais: ajudaria tanto quanto possível, roamento do navio mercante americano mas que estaria envolvido com as operações estava na mão do Tenente Edilander Santos, dos navios prontos e, desse modo, nem sem- depois vice-almirante, recém-cursado em pre estaria presente no Marcílio. Eletrônica. No primeiro dia em que pisei a

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bordo, foi ouvido o primeiro pong. Sim, não com saudades do Marcílio. Respondi que sim, foi ping, e sim um sinal rouco e feio. Mas mas que tinha sofrido bastante porque operara era o único sinal mais expressivo emitido com muitas restrições. Ele pediu-me desculpas desde o abalroamento. dizendo que reconhecia não ter proporcionado O Almirante Odyr felicitou-me e augu- tudo que desejava ao Marcílio. Mostrava sua rou que continuasse, enquanto ele teria que humildade e sua grandeza. Mostrava o caráter se dedicar aos outros navios irmãos. do homem que se importava com a instituição. Após alguns meses, as pequenas comissões O nosso relacionamento aumentou bas- do D-25 traziam algum alento, quando o tante, e muitas vezes tive o privilégio de almirante obteve os recursos financeiros para contar com suas observações sobre a RMB o período de reparos e o sonar voltou a ser o e sobre a Marinha. melhor da América Latina, fruto do esforço Ouvi dele constantes incentivos, e era contínuo e competente do ótimo Edilander. patente a sua dedicação aos assuntos navais. A tripulação correspondeu ao incentivo Durante muitos anos, dedicou-se a mostrar que o Almirante Odyr nos proporcionou, e à Marinha e ao País a nossa participação na quando terminamos o reparo do navio, ele Segunda Guerra Mundial. Organizava reuni- estava pronto para concorrer às estrelas de ões e debates enaltecendo os ex-combatentes, Melhor Desempenho. resgatando episódios e personalidades que O companheiro do Cruzador Barroso, deviam ser do conhecimento dos brasileiros. Tenente Annaruma, recebeu o comando do O Almirante Odyr não buscava reco- Marcílio e logo depois demonstrou que lhe nhecimentos pessoais nem vantagens, seu entregamos um excelente navio. Também o esforço era dirigido à instituição e aos que, Almirante Odyr passou o comando ao Almi- a seu julgamento, mereciam ter divulgação rante Serpa, com aquele navio que ele não pôde de sua atuação como militares. contar entre os prontos a operar sem restrições. Passaram-se os anos e nos encontramos na Milton Sergio Silva Corrêa RMB, quando ele me perguntou se eu estava Capitão de Mar e Guerra (Refo)

Nascido no Rio de Janeiro, filho de Josué de Farias Pimentel e de Aracy Mar- ques Pimentel. Promoções: a 2oTen em 10/01/1956; a 1oTen em 10/07/1957; a CT em 24/09/1959; a CC em 12/06/1963; a CF em 01/12/1969; a CMG em 30/04/1977 e a CAlte em 31/03/1984. Foi transferido para a reserva remunerada em 20/03/1987. Exerceu duas direções: Centro de Con- trole de Estoque da Marinha e Serviço de Auditoria da Marinha. Comissões: Diretoria de Hidrografia e Navegação, Navio Hidrográfico José Bonifácio, Cruzador Barroso, Hospital Naval Marcílio Dias, Comando da Flotilha JAIR MARQUES PIMENTEL de Contratorpedeiros, Centro de Controle Contra-Almirante (IM) de Estoque de Sobressalentes para Navios

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(Vice-Diretor), Comissão Naval Brasilei- to Naval – Comendador; Ordem do Mérito ra em Washington, Secretaria-Geral da Militar – Comendador; Ordem do Mérito Marinha, Diretoria de Administração da Aeronáutico – Oficial; Medalha Militar e Marinha (Vice-Diretor), Gabinete do Mi- Passador Ouro – 3o Decênio; Medalha Mé- nistro da Marinha, Escola de Guerra Naval rito Tamandaré; Medalha do Pacificador e e Escola Superior de Guerra. Medalha Mérito Santos Dumont. Em reconhecimento aos seus serviços, À família do Almirante Jair Marques recebeu inúmeras referências elogiosas e as Pimentel, o pesar da Revista Marítima seguintes condecorações: Ordem do Méri- Brasileira.

MEU AMIGO PIMENTEL

Natural do Rio de Janeiro, morou na transmitir um clima de descontração e Paraíba durante a sua infância. A família alegria a todos com quem servia. por parte do pai era natural de Guarabira, Gostava de futebol. Sendo um fanático interior daquele estado. Seu avô, fazendeiro torcedor do Vasco, presenteava com uma “coronel” do interior e pessoa influente na camisa do seu time do coração todos os região, teve um museu na cidade erguido netos recém-nascidos. No Leblon, tinha em sua homenagem. Seu pai, agrônomo, uma rede de vôlei onde reunia os amigos foi responsável pela Escola de Agronomia para jogar e antes de ir para o Gatão – bar localizada em Guarabira. Jair teve dois onde se ouviam, entre um chope e outro, irmãos (já falecidos) e uma irmã. “as maiores mentiras da semana”. Com pouco mais de dez anos, ele veio Conheceu Lúcia na pequena cidade de para o Rio, ficando na casa de uma tia, a Pinheiral, no interior do Estado do Rio, e fim de cursar o então Ginasial, no Colé- com ela casou-se. Tiveram seis filhos e gio Pedro II. Em 1950, influenciado por 14 netos que eram paparicados pelo vovô. um colega de turma, fez concurso para o O filho mais velho, Eduardo, que nasceu Colégio Naval, que seria inaugurado em quando Jair servia no Colégio Naval, é Angra dos Reis, tendo sido aprovado para engenheiro de sistemas. O segundo filho, o 2o ano. Devido ao atraso nas obras no Ricardo, é da Polícia Federal. Seguiram- Colégio Naval, a sua turma iniciou o curso -se quatro meninas: Ana Lúcia, analista de tendo aulas na Escola Naval até julho de sistemas e residente em Brasília; Vera Lú- 1951. Com a prontificação da obras, foi cia, médica, que reside em Natal; Cláudia transferido para Angra dos Reis em agosto Lúcia, auditora da Receita Federal, também de 1951, onde permaneceu até dezembro do moradora de Brasília; e Luciane, que traba- mesmo ano. Em 1952 foi transferido para lha São Paulo, no Ministério da Economia. a Escola Naval, para o Curso Prévio, tendo Para equilibrar o orçamento doméstico e concluído com brilhantismo, em dezembro sustentar a numerosa família, foi professor de 1954, o Curso de Intendência. por um período, à noite, na Universidade Sua carreira distinguiu-se por comissões Veiga de Almeida. Quando passou para a sempre marcadas por um desempenho reserva, foi convidado, em julho de 1988, muito bom, confirmando as qualidades que para ser o financeiro do Estaleiro Ilha S/A, demonstrava desde os tempos de aspirante. na Ilha do Governador, onde permaneceu Era exigente no serviço, mas procurava até janeiro de 2013, o que permitiu que

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realizasse seu grande sonho de adquirir, na onde colegas, amigos e familiares foram Barra da Tijuca, uma casa suficientemente prestar as últimas despedidas. Uma cerimô- grande para receber todos os filhos e netos nia militar, com toque de presença, toque nas datas especiais. Era apaixonado pela de silêncio, marcha fúnebre e salvas de tiro, Lúcia e, inconformado com sua perda, emocionou todos que lá compareceram. Foi repetia frequentemente que o “homem não cremado, e suas cinzas espalhadas, como as nasceu para ser viúvo”. da Lúcia, na Praça de Pinheiral. Em 17 de junho último, mesmo ele sain- Com certeza está deixando muitas do pouco devido a dificuldade para andar, saudades entre nós que tivemos o prazer consegui levá-lo ao churrasco da turma no de conhecê-lo. Piraquê. Estava muito alegre por ter ido. Faleceu no dia 17 de julho e foi velado no Haroldo Rodrigues da Cunha Fonseca Cemitério São Francisco Xavier, no Caju, Capitão de Mar e Guerra ( Refo-IM )

Em sua carreira exerceu três coman- dos: Corveta Ipiranga, Contratorpedeiro Mariz e Barros, Base Aérea Naval de São Pedro da Aldeia. Comissões: Navio-Escola Almirante Saldanha, Comando da Força de Contrator- pedeiros, Contratorpedeiro Araguaia, Re- bocador de Alto Mar Tritão, Comando do 3o Distrito Naval, Comando da Flotilha de Contratorpedeiros, Comando do 1o Esqua- drão de Contratorpedeiros, Rebocador de Alto Mar Triunfo, Comando do 2o Distrito Naval, Curso de Especialização em Máqui- na para Oficiais, Contratorpedeiro Bebe- ribe, Navio de Transporte de Tropas Cus- tódio de Mello, Cruzador Ligeiro Taman- daré, Subdiretoria de Engenharia Naval, Escola de Guerra Naval, Estado-Maior da Armada, Comando de Operações Navais e HERALDO MESSEDER DE SOUZA Diretoria de Engenharia Naval. Capitão de Mar e Guerra (Refo) Em reconhecimento aos seus serviços, recebeu inúmeras referências elogiosas Nascido no Rio de Janeiro, filho de Iri- e as seguintes condecorações: Ordem do neu Vieira de Souza e de Sylvia Messeder Mérito Naval – Comendador; Medalha de Souza. Militar e Passador Platina – 4o Decênio; Promoções: 2oTen em 24/04/1953; Medalha Mérito Tamandaré; Medalha 1oTen em 07/10/1954; CT em 07/04/1957; Mérito Marinheiro – 2 Âncoras e Medalha CC em 08/06/1962; CF em 16/09/1966 e do Mérito Santos Dumont. CMG em 21/05/1971. Foi transferido para À família do Comandante Heraldo Mes- a reserva remunerada em 17/01/1978. seder, o pesar da Revista Marítima Brasileira.

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CAPITÃO DE MAR E GUERRA HERALDO MESSEDER DE SOUZA

Por ter sido seu último Diretor em vida, junto com alguns outros engenheiros que cumpre-me agradecer os relevantes servi- também haviam passado no concurso. Fo- ços prestados pelo Sr. Capitão de Mar e mos conduzidos à presença de um Oficial Guerra Heraldo MESSEDER de Souza à e, mesmo não conhecendo eu muito sobre Marinha do Brasil e a Engenharia da Ma- as coisas da Marinha, logo notei se tratar de rinha, em impressionantes e raríssimos 71 alguém importante na organização daquela anos de dedicação a nossa Força. Mais de Diretoria: ele ostentava nos ombros de seu sete décadas vivenciando, diuturnamente, uniforme impecavelmente branco, uma pla- o serviço naval, quer na Ativa, quer re- tina azul marinho com quatro “tracinhos” convocado na Reserva Remunerada, quer, dourados, que eu não sabia exatamente o mais recentemente, após ter atingido a que significavam, mas que eram bem mais idade limite de setenta anos, no exercício que os um ou dois “tracinhos” dos jovens de Função de Confiança de Assessoramen- militares com quem eu havia cruzado no to. Foi a longa caminhada de vida de um caminho para a sala. Maquinista de talento, que se iniciou com Pois esse Oficial, que tinha o nome o ingresso na Escola Naval em 1946, e que MESSEDER escrito em letras maiúsculas passou por importantes comandos, como o brancas numa plaqueta preta presa na lapela da Corveta Ipiranga, do Contratorpedeiro do bolso direito, levantou-se de imediato Mariz e Barros e da Base Aeronaval de para receber a mim e a meus colegas, que São Pedro da Aldeia. Apenas na Direto- adentrávamos em sua sala. Fitou-nos por ria de Engenharia Naval (DEN) e na sua alguns momentos com alguma seriedade e antecessora, a Diretoria de Engenharia da disse, com tom grave: “Vocês são os novos Marinha (a DEM com M), o Comandante engenheiros, não é?”. Claro que nós res- MESSEDER trabalhou cerca de quarenta pondemos “sim”, sorrindo com um pouco e quatro anos, convivendo com várias ge- de orgulho, mas o Oficial apenas continuou rações de Engenheiros Navais. fitando-nos com seriedade. Após alguns Eu, em particular, apenas conheci o segundos de um silêncio que foi, pelo Capitão de Mar e Guerra Heraldo MES- menos para mim, um tanto constrangedor, SEDER de Souza em março de 1984, e o Oficial disse: “Vocês vão conhecer nesta foi nessa época que começou a minha casa como é a Marinha”, e, num tom de admiração pelo Oficial brilhante e pela voz que considerei um tanto ameaçador, pessoa boníssima. continuou: “Pois eu sei como irei receber Havia eu passado no concurso para vocês. Vou receber vocês... à bala”. ingressar na MB, no antigo Corpo de En- Hoje confesso, sem nenhuma vergonha, genheiros e Técnicos Navais (CETN), e, que a entonação por ele dada a essa última naquele ano, o estágio técnico-profissional parte da frase assustou-me um pouco. Ele a que os engenheiros eram submetidos seria continuou e abriu a gaveta de sua mesa efetuado antes mesmo do início do Curso para pegar qualquer coisa lá dentro, o que de Adaptação ao Oficialato. Fui designado assustou-me ainda mais: seria um revólver para estagiar na DEN e lá me apresentei, ou uma pistola para ele cumprir a ameaça? ainda em roupas civis e com cabelo grande, Mas em ato contínuo ele estendeu o braço

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em nossa direção, com aquilo que havia retirado da gaveta, e abriu a mão, dizendo: “Tem de laranja, framboesa, morango e tem até umas de uva... Podem escolher...”. Obviamente, a tensão da situação esvaiu- -se e ali, com o dulçor das balas por ele ofertadas, começou a minha admiração por aquele Oficial que, apesar de sério e com- penetrado, tinha um fino e inteligente senso de humor. Foi assim que conheci o CMG Messeder, naquele março de 1984, e essa re- cepção que ele proporcionou-me é, até hoje, marcante para mim, tendo eu feito questão de relatá-la em formatura, estando ele presente, quando assumi a Direção da DEN. Digo que não foram poucas as vezes que, desde então, me vali da competência e sabedoria do Chefe Messeder, quer fosse eu jovem Tenente, Oficial Superior ou mesmo Oficial-General. Ele sempre tinha tempo e paciência para fazer inteligentes análises das complexas situações que não apenas eu, mas todos da DEN, lhe trazíamos, em chefes, pares e subordinados, que pude busca de aconselhamento. E nas poucas presenciar nesses trinta e três anos que vezes que ele não conseguia produzir, de com ele tive a felicidade de conviver: pronto, conselhos lúcidos, ele estudava o presenciei a questão que faziam nossos problema, às vezes por dias, e em certo mo- Aviadores Navais para que ele participasse mento, inesperadamente para nós, aparecia da comemorações anuais do Aniversário junto a nossas mesas, para nos dizer que da Aviação Naval na BAeNSPA da qual tinha refletido e buscado referências sobre ele era antigo Comandante; presenciei a a situação que lhe havíamos apresentado e frequência de inúmeros Oficiais Maqui- então, com toda serenidade, nos devolvia nistas da Reserva à “Farofa do Foguista” uma sugestão sempre bem formulada e que ele anualmente organizava na DEN justificada, e que quase sempre, era aceita para celebrar o Dia dos Maquinistas; por nós. Esse era o Comandante Messeder presenciei as festas por seus aniversários com quem convivi: seu caráter agregador, que, espontaneamente, eram organizadas sua competência profissional e sua gentile- pela tripulação da DEN e por antigos pares za fizeram dele um líder natural para todos e subordinados. Enfim, demonstrações que com ele trabalharam nesses 71 anos de carinho que ele logrou conquistar em de serviço, e que, mesmo às vezes dele virtude dos 71 anos dedicados à Marinha. se afastando pelos naturais caminhos da Dedicação essa que, a título de exemplo, vida, sempre fizeram questão de render-lhe já em 1999, havia lhe rendido a Medalha homenagens diversas. Prêmio de Ouro, por contar com mais de E não foram poucas as demonstrações 50 anos laborados no Serviço Público de carinho e respeito, dadas por antigos Militar. Eu mesmo decidi que, no Dia do

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Maquinista deste ano de 2017, reinau- atual período de Direção da DEN. Mais que gurarei o auditório da DEN com o nome isso, posso afirmar que o mesmo sentimento de “Auditório CMG HERALDO MES- de saudade é sentido por todos aqueles que SEDER DE SOUZA”. Seus 71 anos de com ele conviveram e que, principalmente dedicação não serão esquecidos. nas últimas semanas de sua vida, com ele Por fim, posso dizer que já sinto sauda- tanto se preocuparam. des dos cordiais “Bom Dia” e “Boa Noite” com que ele, perfeito seguidor da etiqueta Ivan Taveira Martins naval, fazia questão de saudar-me, tanto Contra-Almirante (EN) quando fui Vice-Diretor, quanto no meu Diretor de Engenharia Naval

Ladário e Centro de Instrução Almirante Milcíades Portela Alves. Comissões: Batalhão de Comando da Divisão Anfíbia, Comandante da Cia de Comando; Base Fluvial de Ladário, Co- mando Naval de Ladário; Comando do 6o Distrito Naval; Comissão Brasileira em Washington; Comando Geral do CFN – Chefe do Departamento de Estudo e Pes- quisa; Batalhão de Transporte Motorizado – Imediato da Cia-Com; Secretaria de As- sessoramento da Defesa Nacional – Esta- do-Maior; Centro de Instrução do Corpo de Fuzileiros Navais; Escola de Guerra Naval; Núcleo da 1a Divisão de Fuzileiros Navais; Guarnição do Quartel-General do CFN; Batalhão de Comando do Coman- do-Geral do CFN; Batalhão Paissandu GIL CORDEIRO DIAS FERREIRA – Comandante da Cia de Comando; Ba- Capitão de Mar e Guerra (FN) talhão de Manutenção e Abastecimento; Comando Naval de Brasília; Secretaria Nascido no Rio de Janeiro, filho de de Assuntos Estratégicos da Presidência Juarez Galvão Ferreira e de Maria Luiza da República – Adjunto na Divisão de Cordeiro Dias. Mobilização, Estado-Maior, Adjunto na Promoções: a 2oTen em 13/09/1968; 5a Subchefia; Comando do Sexto Distrito a 1oTen em 30/06/1970; a CT em Naval; NE Custódio de Mello; Núcleo da 31/08/1973; a CC em 31/08/1979; a CF 1a Divisão de Fuzileiros Navais; Comando em 25/12/1984; e a CMG em 30/04/1990. Naval de Brasília; Gabinete do Ministro Foi transferido para a reserva remunerada da Marinha; Escola de Aperfeiçoamento em 19/04/1996. de Oficiais no Exército; Cia de Comando Em sua carreira exerceu dois coman- e Serviço do Comando da FFE – Adjunto dos: Grupamento de Fuzileiros Navais de do Grupo de Desenvolvimento de Tática;

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Comando do Primeiro Distrito Naval; Es- – "Forjando combatentes anfíbios" – 1o critório do Adido Naval na Inglaterra. trimestre de 1995; Em reconhecimento aos seus servi- – "Nosso esquadrão anfíbio" – 3o tri- ços, recebeu inúmeras referências elo- mestre de 1996; giosas e as seguintes condecorações: – "Haverá uma cavalaria anfíbia?" – 1o Medalha do Pacificador; Medalha Mé- trimestre de 1997; rito Tamandaré; Medalha Militar e Pas- – "Um distrito para os Fuzileiros?" – 1o sador de Ouro – 3o Decênio e Ordem do trimestre de 1998; Mérito Naval – Oficial. – "Grupamentos de FN de Ladário e de Vale ressaltar que o CMG Gil publicou Belém" – 4o trimestre de 2012; na RMB 12 artigos de valioso conteúdo: – "Princípio da Guerra – sem meu com- – "A Royal Navy e os Royal Marines passo" – 1o trimestre de 2013; em 1986" – 3o trimestre de 1987; – "Do fim do mescla ao comandante- – "De velas e caravelas" – 3o trimestre -aluno fuzileiro" – 1o trimestre de 2014; de 1993; – "O dia em que o Urutu afundou" – 4o – "Operações Ninfa – 22 anos" – 1o tri- trimestre de 2014. mestre de 1994; À família do Comandante Gil Cordeiro – "O emprego de grupamentos opera- Dias Ferreira, o agradecimento pela con- tivos de fuzileiros navais em conflitos de tribuição e o pesar da Revista Marítima baixa intensidade" – 3o trimestre de 1994; Brasileira.

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Esta seção destina-se a divulgar ideias e pensamentos e incentivar de- bates, abrindo espaço ao leitor para comentários, adendos esclarecedores e observações sobre artigos publicados. As cartas deverão ser enviadas à Revista Marítima Brasileira, que, a seu critério, poderá publicá-las parcial ou integralmente. Contamos com sua colaboração para realizar nosso pro- pósito, que é o de dinamizar a RMB, tornando-a um eficiente veículo em be- nefício de uma Marinha mais forte e atuante. Sua participação é importante.

Recebemos do Coronel (Refo) Nylson (MT), no posto de capitão-tenente. Com a Reis Boiteux, do Exército Brasileiro, a evolução do conflito, a Marinha brasileira correspondência abaixo transcrita sobre passou a cooperar efetivamente com a a vida profissional do Almirante Norton Força Naval Norte-Americana na defesa do Demaria Boiteux, seu tio, nascido em 8 Atlântico Sul, empregando todos os meios de fevereiro de 1907 e falecido em 10 de flutuantes disponíveis. Mesmo assim, ha- novembro de 1969. via necessidade de navios de guerra para “O Almirante Norton Demaria Boiteux pequenas tarefas, a fim de levar embarca- é filho do Almirante Lucas Alexandre ções que seriam incorporadas ao comboio Boiteux e de Diamantina Demaria Boiteux. Rio-Trinidad, quando da sua passagem ao Teve os seguintes irmãos: Nelson Demaria largo do litoral da Bahia. Boiteux (general), Yan Demaria Boiteux Foram indicados para essa tarefa os (almirante), Ruyter Demaria Boiteux (ge- monitores Parnaíba e Paraguassu, que neral), Bayard Demaria Boiteux (professor) estavam na Base Naval de Ladário. A e Colbert Demaria Boiteux (capitão de mar Norton Demaria Boiteux foi confiada a e guerra) – todos da ilustre estirpe militar tarefa de trazê-los de Mato Grosso (MT) de Santa Catarina (SC), perfazendo essa até Salvador (BA), cumprindo a rota Rio família 21 militares, sendo dois da Guarda Paraguai-Estuário do Prata-Oceano Atlân- Nacional de SC, nove da Marinha de Guer- tico e Salvador, final da missão. É bom ra e dez do Exército Nacional. lembrar que procurou-se, ainda em Ladário, Em 1942, estando o Brasil em guerra adaptar com os recursos locais os monitores contra a Alemanha a Itália e o Japão, Parnaíba e Paraguassu, que eram navios de Boiteux servia na Base Naval de Ladário fundo chato aptos para navegação fluvial, a CARTAS DOS LEITORES

fim de enfrentarem as condições adversas de e achou-a grave, comunicando o fato ao alto-mar. Boiteux iria exercer as funções de comandante do navio. Este, sem avaliar imediato e oficial de Máquinas doParnaíba . melhor as possibilidades de salvamento da A travessia Ládario-Salvador transcorreu embarcação, decidiu pelo abandono. sem incidentes, embora tivesse sido muito Começou a faina de arriar os escaleres trabalhosa e cheia de perigos, por serem os e as balsas. Mesmo assim, o imediato não monitores navios frágeis em mar grosso. se conformou com a solução. Contando Já estando em Salvador, num dia de com a cooperação de um marinheiro mais mar tormentoso saiu o pequeno Parnaíba ousado, auxiliar de máquinas, enfrentou co- escoltando alguns navios até encontrar o rajosamente o fogo, e ambos conseguiram comboio principal, que passava ao largo do cortar, com o risco das próprias vidas, o litoral da Bahia. O mar estava demasiado suprimento de óleo, ficando relativamente violento para aquele navio de fundo chato, fácil controlar e extinguir o incêndio. Logo feito para navegar em águas mansas. Os após, a situação a bordo se normalizou, com vagalhões varriam o convés de bordo a a volta da tripulação que se encontrava nos bordo. A tripulação permanecia em estado escaleres e nas balsas. de alerta em virtude das péssimas condi- Desta forma, o Parnaíba retomou a sua ções do tempo. Um avião da Força Aérea rota, a fim de regressar à sua base em Salva- Brasileira (FAB) que fazia a cobertura do dor. Como o uso do rádio era até então proi- monitor teve a impressão de que o Parnaí- bido, por medida de segurança, o Comando ba, com aquela tormenta, estava afundando Naval só tomou conhecimento da primeira e comunicou o fato ao Comando Naval do mensagem expedida pelo avião da FAB que Leste (2o Distrito Naval – Salvador). julgou estar o Parnaíba enfrentando sérias Enquanto isso, um drama se desenro- dificuldades e que parecia a tripulação haver lava a bordo: vazamento num maçarico e abandonado o navio – o que era verdadei- incêndio na seção de caldeiras. O imediato, ro – em virtude do incêndio que lavrava a Comandante Boiteux, examinou a situação bordo. De imediato, outro avião foi envia- do e avistou, na área indicada, escaleres e balsas abandonadas. Então informou ime- diatamente a Salva- dor: ‘Parnaíba afun- dado’. Esta mensagem recebida pela FAB foi logo retransmiti- da para o Comando Naval, que ordenou ao Rebocador Muniz Freire zarpar para o local com a missão ‘re- colher sobreviventes’. O Parnaíba (U-17) é o mais antigo navio da Marinha do Brasil em operação. Construído pelo Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro e incorporado à armada Não havia sinal em novembro de 1938, participou da Segunda Guerra Mundial. Foi modernizado algum do Parnaíba. em 1998 na Base Fluvial de Ladário (MS), onde se encontra atualmente. Foram trocadas men-

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sagens com um blimp americano (dirigível) mais breve possível para o Recife. A ideia que patrulhava o Atlântico Sul e ele infor- inicial era de se constituir o GT Vermelho mou: ‘Dentro de um raio de 60 milhas não 12.2 com o Cruzador Tamandaré e quatro há vestígios de naufrágio’. contratorpedeiros e, posteriormente, enviar Rádios cifrados chegavam a cada mo- outro cruzador e mais escoltas tão logo mento no Comando Naval a fim de inteirar estivessem prontos. Tal decisão começou a Marinha do que estava acontecendo a se desfazer quando o estado do material quando, inesperadamente, foi decifrada a flutuante foi apresentado. Com diversos seguinte mensagem: “Monitor Parnaíba problemas técnicos de toda ordem e mais pt estou regressando por minhas pró- a falta de pessoal para guarnecer os navios prias máquinas pt”. A posição informada (o fato ocorreu em pleno sábado de Car- mostrava que o monitor já se encontrava, naval), o GT inicial foi reduzido a um GT praticamente, na entrada da Baía de Todos composto dos contratorpedeiros Paraná os Santos, motivo pelo qual estavam utili- (onde seguiu o comandante do GT, o Con- zando o rádio, até então mudo. tra-Almirante Norton Demaria Boiteux) Boiteux e seu dedicado auxiliar tinham e Pernambuco. O GT, assim composto, salvado um navio da gloriosa Marinha seguiu para Recife, o destino final, por ser brasileira! o porto mais próximo da área em conflito, O Almirante Boiteux teve outras bri- onde os lagosteiros franceses atuavam. O lhantes passagens profissionais ao longo de GT ficou alguns dias na expectativa do sua carreira. Vamos destacar, dentre elas, confronto com os navios franceses, os con- a mais significativa, que foi a sua atuação tratorpedeiros Tartu e Paul Gaufeny, que na chamada Guerra da Lagosta. Tratou-se estavam assegurando a cobertura para três de um contencioso entre o Governo do ou quatro pesqueiros. Nessa expectativa, Brasil e o da França e que se desenrolou o GT aguardava ordem superior para o entre 1961 e 1963, nas águas territoriais cumprimento da missão. Felizmente para brasileiras da Região Nordeste. ambas as partes (Brasil e França), nesse Essa guerra ficou assim conhecida por- meio tempo as conversações diplomáticas que franceses tripulando um bom número e a interferência dos Estados Unidos con- de barcos lagosteiros invadiram nossas correram para evitar o iminente conflito e, águas, particularmente no Nordeste, para como decorrência, a declaração de guerra. nelas realizar a pesca predatória do apre- A retirada dos pesqueiros e dos navios de ciado crustáceo, contrariando a legislação guerra franceses foi o sinal do regresso aos brasileira vigente à época, que proibia aque- seus portos de origem. Um irônico e bem la atividade. Várias negociações, por via di- humorado sinal de ‘boa viagem’ emitido plomática, foram tratadas com a França no do Contratorpedeiro Paraná, juntamente sentido de não permitir a invasão das nossas com o afastamento do Paul Gaufeny da águas pelos navios pesqueiros franceses. A área de operações, marcou o fim daqueles França não levou em consideração nossos momentos de apreensão vividos e apenas argumentos, preferindo apelar para uma suportados pelas guarnições dos nossos ação em força, apoiando a pesca predatória navios de guerra graças à liderança corajosa com navios de guerra da Marinha francesa. do Almirante Boiteux, que agiu com pru- Sob a denominação de Operação La- dência e firmeza, infelizmente atitudes só gosta, um Grupo-Tarefa (GT) da Marinha testemunhadas pelos que lá tiveram a honra brasileira deveria ser formado e enviado o de estarem sob o seu comando.

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Em 1963, recebeu a missão do ministro vários trechos de seu discurso. Esse quadro da Marinha para comandar a Força de Cru- está fixado no Memorial do Patriarca da zadores e Contratorpedeiros, que iria a San- Independência, em Santos. tos (SP) para participar das comemorações O Almirante Boiteux, ao longo de sua alusivas ao bicentenário de nascimento do carreira, foi respeitado e admirado pela de- Patriarca da Independência, José Bonifácio terminação de seus atos, querido e admira- de Andrada e Silva, representando a Mari- do pelos superiores, pares e subordinados. nha do Brasil como orador oficial. Nessa O Almirante Norton Demaria Boiteux ocasião pronunciou uma aplaudida oração. veio a falecer no Rio de Janeiro em 1968, Ainda hoje, num quadro de 80 centímetros cercado pelo carinho e pela admiração da de altura por 65 de largura, estão exibidos Marinha brasileira.”

PENSAMENTO MILITAR BRASILEIRO

Recebemos do Capitão de Mar e Guerra A carta do CMG Lustoza foi encaminha- (Refo) Paulo Marcos Gomes Lustoza a se- da, por deferência e respeito ao missivista e, guinte correspondência: ainda mais ao General, que honrou a RMB “Prezados membros do Corpo Editorial com seu artigo. Foi recebida resposta do da RMB. General Castro que, a seguir, publicamos: Solicito a V. Sas. a publicação da carta “Muito obrigado pela mensagem que abaixo: encaminhou anexo o ponto de vista do O ilustre General de Exército Paulo CMG (Refo) Lustoza. Cesar de Castro, que nos brindou com É muito interessante para este autor tomar esclarecedor artigo sobre o Pensamento conhecimento de reflexões daqueles que o Militar Brasileiro (RMB abr/jun 2017), honraram com a leitura de seus artigos. revela que um colega no Curso de Política Concordo quando se afirma que duran- e Estratégia Marítimas (C-PEM) dissera te muitos anos os trabalhos de militares que este pensamento não existe. Com a não têm ultrapassado as publicações das devida vênia, não me pareceu ser uma crí- próprias forças armadas, o que torna o tica mordaz ou mesmo erro grosseiro do público leitor quase que limitado aos pró- referido oficial, apenas uma constatação prios militares. trivial de que o pensamento nacional não Tenho observado, neste século, incur- costuma incluir a nossa cultura militar na sões frequentes de gerações militares mais cultura do povo, ficando restrita apenas ao jovens no meio acadêmico nacional, o que âmbito militar, não ocasionando o efeito me leva a pensar que, ainda que em escala desejado na sociedade dita civil. O tema, pouco satisfatória, os temas ligados à se- muito bem abordado, fica sempre restrito gurança e à defesa nacionais já merecem às publicações que circulam mormente acolhida por alguns pensadores civis. no meio militar que formam o pensamen- Quanto à frase ‘não existe!’, posso lhe di- to militar brasileiro, ou seja, ele existe zer que muito me estimulou a demonstrar a apenas entre os militares e poucos civis, existência do pensamento militar brasileiro. embora publicações, como a RMB, sejam Renovo meu agradecimento pela men- divulgadas em várias organizações e em sagem e pela oportunidade de acessar bibliotecas públicas e privadas nacionais reflexões de um de seus leitores. e estrangeiras.” ‘Tudo pela Pátria!’”

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As histórias aqui contadas reproduzem, com respeitoso humor, o que se conta nas conversas alegres das praças-d’armas e dos conveses. Guardadas certas liberdades, todas elas, na sua essência, são verídicas e por isso caracterizam várias fases da vida na Marinha. São válidas, também, histórias vividas em outras Marinhas. Contamos com sua colaboração. Se desejar, apenas apresente o caso por carta, ou por e-mail (internet: [email protected] e intranet: dphdm-083@dphdoc).

POESIAS NAVAIS E PATRIÓTICAS

A RMB recebeu do Suboficial (Refo) Sebastião da Cruz o livro Poesias Navais e Patrió- ticas, de sua autoria, com poemas dedicados aos marinheiros e fuzileiros navais. O livro agora fará parte do acervo da Biblioteca da Marinha. Publicamos abaixo dois poemas entre os 64 que integram a obra.

QUERIDA MARINHA

Marinha de tradições, Do silêncio à alvorada, Navega nos sete mares, Todo dia, noite adentro, A ti dou meu coração, Serás sempre adorada, E te elevo mil cantares. Tão tocante como o vento.

Com apitos ou cornetas, Os navios e marinheiros, Sejam sinos ou bandeiras, Todos juntos a lutar, Afiadas baionetas, Do vibrante fuzileiro Ressoantes canhoneiras. Ao marujo em alto-mar. O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

SULISTA

Sob o frio sereno A riqueza cresce farta Ou ao véu da cerração. Em um lar de vencedores, O sulista trata o feno E a alegria cresce inata E revolve o seu chão. A verter os seus sabores.

O trabalho é sua vida A frieza do inverno Que dedica com prazer, Não impede a labuta, Seu progresso está na lida Manda o ócio pro inferno Que opera sem temer. Enfrentando o que se avulta.

O CALOURO “TENENTE”

O Período de Adaptação dos novos sentido, ao que ele respondeu: “É no Rio aspirantes da Escola Naval, em 1971, co- de Janeiro, Glênio. Tem mulher bonita meçou com uma grande novidade. Havia que não acaba mais. Passei 15 dias lá em um calouro que era segundo-tenente do Copacabana e vou voltar”. Exército. E este calouro, diziam, tentara Resumindo, fiz o vestibular para a EN enquadrar os veteranos adaptadores, o e fui aprovado; ele, infelizmente, não. Mas que não correspondia à verdade. Era uma antes eu tinha requerido estágio de serviço inverídica mensagem que circulara pelo como oficial R2 e tinha sido designado para “telefone sem fio” – aquela que passa de o 3o Grupo de Obuses 155, em Cachoeira do ouvido em ouvido, de boca em boca, e é Sul. Lá servindo há mais de quatro meses, ampliada à medida que circula, podendo ge- tinha até esquecido do resultado das provas rar problemas sérios decorrentes da fofoca, quando recebi um telegrama informando que é sempre maléfica, afetando as relações data e hora de comparecimento à Delegacia humanas e gerando prejuízos. No caso, de da Capitania dos Portos de Porto Alegre imediato, colocou o calouro em evidência para apanhar documento de apresentação e, ampliada, gerou uma das muitas histórias ao Hospital Naval de Florianópolis (HNFL) componentes do folclore naval. para os devidos exames de saúde. Este calouro era eu! No ano de 1970, Qual não foi a minha surpresa quando estudava Engenharia Civil na Universidade constatei que só eu me apresentei para os Federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul, respectivos exames. Tinha sido o único quando um colega da faculdade e também aprovado nos três estados do Sul. Maior do Núcleo de Preparação de Oficiais da surpresa ainda quando a abreugrafia apre- Reserva (NPOR) do Regimento Malet me sentou “mancha no pulmão”. “O jovem convidou para fazer o concurso da Escola candidato está reprovado no exame de Naval (EN) e também da Academia Mi- saúde”, disse-me o capitão-tenente médi- litar das Agulhas Negras (Aman). Para a co. Inconformado, pois nunca tinha tido academia, tudo bem, éramos oficiais R2, qualquer doença pulmonar, questionei se mas para a Escola Naval não fazia muito poderia trazer nova “chapa” do pulmão

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no dia seguinte, feita em clínica particu- problema que eu tinha decorado. Devo lar. Bingo! Não tinha mancha alguma, o ter acertado mais alguns caraminguás problema era a idade do equipamento do que somaram os cinco pontos necessários HNFL ou trote do médico. para a aprovação. Hoje a considero como É digno de nota um fato importantíssimo a terceira manifestação do destino, fato nessa trajetória e que não pode ser esqueci- confirmado ao rever minhas provas, solici- do, pois dá um colorido muito especial ao tadas ao superintendente de Ensino, quando destino que estava traçado sem eu o saber. servi na EN em 1991. Lá estava o problema Quando comecei a estudar os conteúdos corretamente resolvido. específicos de Matemática, Português, Fí- Decidido a conhecer o Rio de Janeiro e a sica, Inglês e Química, constatei que pouco Marinha, acertei com o coronel comandante sabia sobre Química. Mesmo assim, resolvi do 3o Grupo de Obuses 155 para segurar a enfrentar o desafio que se apresentava aos minha vaga de segundo-tenente R2 para meus 19 anos de idade. Bons tempos! que eu voltasse caso não desse certo. Chegando a Porto Alegre, onde seriam Concordou, estabelecendo um prazo para as provas, num colégio atrás do Palácio Pi- “enviar um rádio” informando a decisão. ratini que não recordo o nome, perguntei ao Como o dinheiro era pouco, viajei 28 meu amigo e conterrâneo Carlos Alberto, horas de ônibus. Ao dar a meu pai a notícia que estava no 3o ano de Engenharia Civil, de que estava indo para o Rio de Janeiro se ele não tinha algum livro de Química e que iria ingressar na Marinha, recebi Inorgânica para eu dar uma olhada antes como resposta: “As pontes se queimaram”. da prova. “Vá até a Rua da Praia, Livraria Surpreso, não entendi, mas depois compre- Globo. Lá tem todos os livros que você endi que não mais poderia contar com o possa imaginar”, respondeu ele. Fui, e lá seu apoio, pois tinha causado uma grande ocorreu a primeira manifestação do destino. frustração nos sonhos que ele tinha para o Ao questionar um atendente sobre livros filho homem mais velho. de Química, indicou-me ele a estante, e A chegada à Escola Naval me deixou ao estender a mão sem antes ler a testada, bastante apreensivo, pois como militar puxei um livro: “Química Geral – Escola teria que me apresentar fardado, pois eu Naval”. Sério, levei um susto. Paguei e fui estava na ativa. Era o que constava no devorar o livro para a prova do dia seguinte. RDE. Como trocar de roupa num banheiro Como eu disse anteriormente, o Palácio da Rodoviária Novo Rio, imundo naquela Piratini, do governo gaúcho, ficava um pou- época? Vou à paisana! co longe do apartamento do conterrâneo, Fui muito bem recebido pelo aspirante onde eu estava hospedado, e então resolvi do 3o ano, o Paes, que veio da tolda dos sair cedo e caminhar até o local das provas. aspirantes até a sala de estado da EN e me Ao iniciar a caminhada, abri aleatoriamente conduziu para o meu primeiro contato com o livro numa página de exercícios resolvi- o imediato do Corpo de Aspirantes (Imca), dos que me chamou muito a atenção: Leis o Capitão de Fragata Wangler. de Faraday. O exercício resolvido versava Encaminhado para o alojamento do 1o sobre a deposição de camada de ouro sobre ano e designado meu beliche e armário, co- uma moeda por meio da eletrólise. Decorei mecei a desfazer a mala com meus poucos o problema. Era a segunda manifestação do pertences e preparava-me para pendurar destino. Ao abrir a prova, a última questão, a túnica de segundo-tenente quando uma valendo quatro pontos, era exatamente o voz bradou: “Calouro folgado, paga 10!”.

RMB3oT/2017 233 O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

Inicialmente não entendi. Havia outros Depois de algum tempo, veio a palavra calouros no recinto que imediatamente final: cumpriram a ordem, e eu fiquei olhando – Segundo-Tenente Daniel (era o meu para aquele baixinho enfezado e disse alto e nome de guerra no EB), falei sobre o seu caso em bom som: “Se alguém tem que pagar 10 com o almirante da Escola Naval e obtive a aqui é você. Sou segundo-tenente do Exér- orientação de que em 24 horas você deverá cito Brasileiro e exijo respeito!”. Concomi- tomar uma decisão. Fica, e senta praça como tantemente, abri o armário e deixei aparecer aspirante, se for aprovado nos testes físicos, e o meu uniforme. Os demais veteranos que enviamos uma mensagem para o seu quartel tinham subido, sedentos, atrás dos calouros em Cachoeira do Sul, ou então vista o seu uni- recém-chegados sumiram como num passe forme e regresse à sua Organização Militar. de mágica. “O calouro é tenente! O calouro Confesso que não sei qual tipo de é tenente! O calouro é tenente!”, ouvia- neurônio, o racional ou o irracional, que -se escada abaixo. Confesso que fiquei me fez responder de pronto: “Vou ficar, assustado, pois a turma da retaguarda ao Comandante. Pode ‘enviar o rádio’ para o baixinho era forte, mal-encarada e deixou Coronel Paulo Viana, do 3o GO 155”. claro que retaliação viria por ter humilhado Estes são os fatos que marcaram o meu o “chefe de dia”. “Estou ferrado. Vou pôr destino, aos quais só tenho a agradecer, pois meu uniforme e voltar ao Imca, dar uma tudo o que tenho devo à Marinha do Brasil, parte de ocorrência (PO) nesses petulantes principalmente o conhecimento adquirido; agressivos e voltar para o meu Rio Grande as córneas que me mantiveram na ativa até amado, meu quartel de artilharia e minha capitão de mar e guerra; a satisfação de per- namorada”, pensei. tencer à querida Turma Esperança daquele Estava eu me preparando quando a ano de 1971, em que sonhávamos com um boa alma do Aspirante Paes apareceu no Brasil potência; e a lucidez de escrever alojamento do 1o ano e me aconselhou a estas linhas em que relato uma situação não dar PO nos veteranos e a conversar sui generis que ocorreu há mais de 45 anos com o Comandante Wangler sobre a mi- e que acredito ser inédita, razão pela qual nha real situação. Levou-me até o Imca, é uma das tantas interessantes “histórias a quem mostrei minha identidade de verídicas de Marinha”. segundo-tenente R2, em estágio de serviço Quanto ao título, agradeço ao Almirante temporário de dois anos. Participei a ele Nigro, que o sugeriu e que não se cansa que minha túnica estava no armário. Meio de contar este “causo” naval – na versão perplexo, ele pediu para que eu não vestisse ampliada, diga-se. A bem da verdade, re- o uniforme, pois iria causar um desconforto solvi deixar a história escrita em sua real maior e ele teria que consultar o coman- dimensão. Sem mágoa ou ressentimento dante do Corpo de Aspirantes, que estava em relação a qualquer veterano, por mais de férias. Lembro que ele disse que eu não irritantes e toscos que tenham sido, a eles poderia ser rebaixado e argumentou: se agradeço: Obrigado por me ajudarem a ser eu ganhava como segundo-tenente e tinha forte e decidido. Afinal, mares calmos não carta-patente de segundo-tenente, como fazem o bom marinheiro. seria passar a receber soldo de aspirante do 1o ano? “Acho melhor você voltar para Glênio Fernando Daniel o Sul”, comentou entredentes... Capitão de Mar e Guerra (Refo)

234 RMB3oT/2017 DOAÇÕES À DPHDM JUNHO A AGOSTO DE 2017

BIBLIOTECA DA MARINHA

DOADORES

Almirante de Esquadra Ilques Barbosa Junior Vice-Almirante Renato Rodrigues de Aguiar Freire Vice-Almirante Glauco Castilho Dall’Antonia Vice-Almirante (RM1) Domingos Sávio Almeida Nogueira Vice-Almirante (RM1) José Carlos Mathias Contra-Almirante (RM1) Ricardo Albegaria Claro Contra-Almirante Paulo Guilherme Brandão Padilha (falecido) Contra-Almirante Odyr Marques Buarque de Gusmão (falecido) Capitão de Mar e Guerra Olavo Manoel dos Reis Guimarães Capitão de Mar e Guerra (CD) Antônio Jatobá Lins Filho Capitão de Mar e Guerra (T) Regina Boanerges Siqueira Capitão de Mar e Guerra (RM1) William Carmo Cesar Capitão de Mar e Guerra (RM1) Francisco Dantas da Almeida Filho Capitão de Fragata (T) Patricia Imbroizi Ajus Capitão de Corveta (T) Leniza de Faria Lima Glad

Sra. Marcia Bissani (Petrobras) Prof. Paulo Knauss (MHN) Sr. Luiz Felipe Faustino

Centro Cultural dos Correios Centro de Estudos de Pessoal e Forte Duque de Caxias (CEP/FDC) Petrobras Diretoria-Geral do Pessoal da Marinha

LIVROS E PERIÓDICOS RECEBIDOS

ALEMANHA Naval Forces, v. 38, n. 1; n. 2, 2017

CHILE Revista de Marina, n. 5, v. 132, n. 133, 2016; n. 6, v. 132, n. 133, 2016 Revista de Marina, n. 956 jan/fev, v. 132, n. 134, 2017

ESPANHA Revista General de Marina, Tomo 271 Out/Nov/Dez, 2016; 272 Abr, 2016; 272 Jan/Fev, 2017 Cuadernos de pensamento naval, n. 21, 2o semestre, 2016 DOAÇÕES E PERIÓDICOS RECEBIDOS

ESTADOS UNIDOS Naval War College Review Autumn, v. 69, n. 4, 2016; Winter, v. 70, n. 1, 2017

ITÁLIA Rivista Marittima, v. 149, n. 9 Out, n. 10 Nov, n. 11 Dez, n. 4 Glossário, 2016 Rivista Marittima, v. 150, n. 1 Jan; n. 2 Fev; n. 3 Mar; n. 4 Abr, 2017

PORTUGAL Anais do Clube Millitar Naval, vol. 146 Jul/Dez, 2016 Revista de Marinha, v. 79, n. 994 Nov/Dez, 2016 Revista da Armada, v. 46, n. 515 Fev; 516 Mar; 517 Abr; 518 Mai, 2017

BRASIL Cadernos do CHDD, v. 13, n. 25, 2o semestre, 2014; v. 15, n. 28 1o Semestre, 2016; v. 15, n. 29, 2o Semestre, 2016 O corujão, 2015 Ideias em destaque, n. 48 jul/dez, 2016 Infocirm, Abr, 2017 Informativo Marítimo DPC, v. 25, n. 1 Ago/Fev, 2016/2017 Navigator, v.13, n.25 Jun, 2017 (2 ex.) Nomar, v. 53, n. 897 Jan, n. 898 Fev, n. 900 Abr, 2016 Revista do Clube Naval, v. 124, n. 377 Jan/Fev/Mar, 2016; n. 380 Out/Nov/Dez, 2016; n. 378 Abr/Mai/Jun, 2016; n. 379 Jul/Ago/Set, 2016; n. 380 Out/Nov/Dez, 2016 Revista da Escola de Guerra Naval, v. 20, n. 2 Jul/dez, 2014 Revista de Historia Naval, Suplemento 24, v. 33, n. 135, 2016 Revista de Historia Naval, v. 34, n. 135, 2016 Revista de Historia Naval, v. 35, n. 136, 2017; Suplemento 25, v. 35, n. 136, 2017 Revista do Ministério Público Militar, n. 24, 2014) Revista Mare Nostrum, v. 18, n. 76 Jul, 2017) Revista militar de Ciência e Tecnologia, v. 33, n. 1, 1o/2o semestre, 2016 Tecnologia e Defesa, v. 34 n. 148 , 2017; v. 34, n. 149, 2017 Tecnologia Militar, v. 39, n. 1 Mar, 2017 Unificar Revista do Sindicato Nacional dos Oficiais da Marinha Mercante (SINDMAR), n. 42 Nov, 2015; Ed. Especial n.42 Nov, 2015; n. 43 Jun, 2016; Ed. Especial Jul/Ago, 2016; n. 45 Nov, 2016; Especial n. 46 Mar, 2017 e n. 47 Jun, 2017 Amazônia – estradas d’águas. 2014 Dos Andes ao atlântico: uma viagem pelo rio Amazonas. 2013 O anel do capitão Shepherd. 2016 Anuário brasileiro de Aviação Geral 2011. 2011 A arte de Sansão C. Pereira. 2011 Arquivos e coleções privados CEDOC/FUNARTE guia geral. 2016 Casa de cinema de Porto Alegre: Ilha das Flores, DVD. Cidades. 2016 Ciências militares em foco. 2010 A colonização Portuguesa da Guiné 1880 – 1960. 2017

236 RMB3oT/2017 DOAÇÕES E PERIÓDICOS RECEBIDOS

O comércio do açúcar. 2012 Comunicação Social na Marinha. 2011 Comunicação e controvérsias na Perspectiva da Comunicação Integrada. 2015 Currículo: limites e possibilidades. 2010 Desenhos, memória e testemunho. 2012 A descoberta do petróleo no Brasil. 2010 Efemérides fluminenses: acontecências o passado, hoje, 2017 Esponjas das ilhas oceânicas brasileiras. 2011 Estação Rádio da Marinha em Brasília 50 anos. 2010 Estratégias marítimas no século XXI: a contribuição do Almirante Castex. 2015 Estrela de David no Cruzeiro do Sul. 2015, com DVD Estudos fronteiriços. 2010 Exu iluminado. 2011 A fome tem solução. 2012 Geologia do Brasil. 2012 Guia de museus de cultura militar do Brasil. 2010 GRAU: viages del gran Almirante Grau como marino mercante. 2012 História da odontologia da Marinha do Brasil. 2017 História da chuva. 2015 (2 ex.) A história da Soamar-Rio 1979-2006. 2010 História geral da aeronáutica brasileira jan1956/dez1966, v.5. 2014 Herança espiritual judaica: brasilidades. 2015 Ilha de Manoel Gonçalves vida e morte. 2016 Ilusões do amor. 2010 Indisciplinares. 2016 Os Jesuítas e o Rio de Janeiro: a saga dos jesuítas na construção da história do Rio de Janeiro. 2015 Kalma Murtinho figurinos. 2014 O líder – coach: líderes criando líderes. 2014 Luiz Carlos Mendes Ripper: poesia e subversão. 2015 Luz na escuridão. 2010 Marina de guerra del Perú la odisseia Amazônica 1864. 2014 Marinha do Brasil protegendo nossas riquezas, cuidando da nossa gente. 2017 (2 ex.) A Marinha portuguesa na grande guerra. 2015 Memória a dois. 2015 Memória da cidade: história e patrimônio urbano no Brasil. 2011 Memórias do Rio: o Arquivo Geral da cidade do Rio de Janeiro em sua trajetória republi- cana. 2011 Minha Nova York. 2011 O Mosteiro de São Bento da Bahia. 2011 Música. 2016 Música e poder simbólico: a banda da armada como paradigma nacional. 2010 Mulheres a bordo: 30 anos da mulher militar na Marinha. 2012 Patrimônio Arqueológico Subaquático na Marinha do Brasil. 2015 A Petrobras na Amazônia a riqueza que vem do Solimões. 2010

RMB3oT/2017 237 DOAÇÕES E PERIÓDICOS RECEBIDOS

Petróleo e seus derivados. 2012 Poesias de viagens. 2013 Prevenção e Combate ao terrorismo internacional. 2010 A produção do pensamento militar brasileiro contemporâneo pela Escola Superior de Guerra: 1989-2006. 2012 Programa: O profissional militar do século XXI. 2011 Puc Rio 70 anos. 2010 Quem faz o Círio. 2010 O Rio de Ernesto Nazareth. 2016 Sarmento Rodrigues. 2015 O segredo que poucos conhecem: o mistério do Cruzador Bahia. 2016 Sétimo comando aéreo regional 30 anos 1983 – 2013. 2013 Sítio arqueológico cais do Valongo. 2014 Subsídios da gíria falares que no mar se entendem A/Z. 2013 Stanisláviski: vida, obra e sistema. 2015 O teatro do estudante do Brasil de Paschoal Carlos Magno. 2016 Teatro seleto Chico de Assis, vol.1/2. 2014 Tesouros do Museu de Marinha. 2012 e 2013 Theodoro Sampaio nos sertões e nas cidades. 2010 Tra-la-lá vida e obra de Lamartine Babo. 2014 Uma história das guerras navais. 2013 Um mensageiro através do tempo, 2014 Um olhar sobre o Brasil: a fotografia na construção da imagem da nação. 2012 Um tempo para amar. 2011 Viagem ao Brasil de Franz Joseph Frühbeck. 2017

238 RMB3oT/2017 ACONTECEU HÁ CEM ANOS

Esta seção tem o propósito de trazer aos leitores lembranças e notícias do que sucedia em nossa Marinha, no País e noutras partes do mundo há um século. Serão sempre fatos devidamente reportados pela Revista Marítima Brasileira. Com vistas à preservação da originalidade dos artigos, observaremos a grafia então utilizada.

CURSO DE ORGANISAÇÃO NAVAL Conferencia inaugural de 1917 – Missão da Escola Naval de Guerra Eduardo de Brito e Cunha (RMB, jul/ago 1917, p. 5)

Srs. Commandantes. sidade de formula official que É com legitima e justificada desfigura a verdadeira substan- emoção que o menos avisado e o cia das cousas, que tem esta casa menos experiente dos professores tanto aqui, como no estrangeiro, desta Escola vem merecer pela o titulo de Escola. O seu verda- primeira vez a distincta honra de deiro aspecto interno dar-lhe-ia vos dirigir a palavra, no inicio do direito, em rigor, a um menos anno lectivo de 2017. banal tratamento. Logo ás primeiras phrases se Quando se ensinam as scien- lhe deparam difficuldades, pois cias exactas, comprehende-se bem não é sem relutancia, sem uma a indiscutivel linha divisoria, o razoavel hesitação que elle em- ascendente que separa mestres e prega essas palavras não de todo alumnos. Aqui, porem, nos cursos apropriadas ao nosso caso: – pro- basicos, sobretudo, que formam fessores... ano lectivo... escola. a parte principal dos estudos da É somente por uma convenien- Escola Naval de Guerra, o que cia formalista, por uma neces- deve existir é uma livre troca de ACONTECEU HÁ CEM ANOS idéas, uma esforçada collabora- Conselho colectivo guiado por ção, uma cooperação consciente e alguns especialistas parece ser voluntariosa, entre membros da este estabelecimento. Escola, no mesma classe, porque nenhum de sentido pedagogico usual mór- nós, embora a um ou outro distin- mente n’aquelle que lhe dá a ga titulo em demasia generoso de raça latina, isso não, porque si professor, nenhum de nós se pode- toda nossa pedagogia precisa de rá vangloriar de conhecer satis- uma reforma que lhe corrija os factoriamente a sciencia da guer- excessos dogmaticos e sobretudo ra, que a nosso ver tem mais de mnemonicos, si todos os nossos arte que de sciencia, mais tem de professores precisam saber que convenção ou de variedade ima- estão errados os processos que só ginosa do que de leis immutaveis, conduzem ao exercicio da memo- mais depende da experiencia que ria e que tolhem a iniciativa, o dos livros, embora não os dispen- desenvolvimento da imaginação se, embora taes principios ou leis e das qualidades individuaes dos existam, máo grado a má vontade seus alumnos, não devemos ser dos intolerantes que a todos nós nós outros os imitadores destes accusam de explorarmos uma fal- velhos processos condemnados, sa sciencia... que fazem dos alumnos os gramo- Não, Senhores, não é falsa a phones de seus lentes que criam sciencia da guerra ao serviço do por toda a parte a aristocracia direito, como não é falsa a cirur- da memoria e que por toda parte gia em face da medicina. dissolvem a nata da iniciativa, a Não foram falsos Joffre, Beatty, nata do carater nacional. Petais, Jelicoe, Cradock... Não, senhores, justamente numa Não são falsos os que dão a classe que tem por alicerce o carac- vida pela patria. ter, não se pode fazer vingar os gri- É aqui que os futuros chefes lhões da memoria e do dogma. da marinha, os futuros arautos Entretanto, tudo deve ter seus da sua conducta e do seu renome limites. Qual seria o resultado veem solemnemente sellar o pac- pratico dos nossos trabalhos si to da harmonia dos esforços para ao fim de um prolongado esforço um fim commum, porque antes de intelectual ficasse cada um com a tudo devem pensar que marinha sua idéa, cultivasse cada qual o desunida é marinha morta, que seu ponto de vista, numa cegueira uma classe militar dividida nas intencional aos esforços e ás idéas palavras e nos actos é um contra- dos seus pares? senso inconcebivel, que efficiencia Que vantagem adviria para militar e solidariedade mutua a marinha do augmento do cul- são expressões indissoluveis. tivo intelectual de cada official,

240 RMB3oT/2017 ACONTECEU HÁ CEM ANOS si essas mentalidades tomassem que cada um possa em liberdade rumos diversos? Não differe nes- expor suas idéas, que essas idéas te ponto a cooperação intellectual sejam criticadas com verdadeira da mecanica applicada. Forças honestidade profissional, que cada iguaes exercidas em sentidos op- um reconhecendo a evidencia dos postos sobre um mesmo ponto dão seus erros cêda o terreno onde elle resultado nullo. Quão importa deve ser cedido e em consequencia que maior ou menor seja a força fique um residuo de verdades acei- physica de cada homem si todos tas e de procedimentos admittidos. elles são dispostos de modo a se Este residuo de verdades acei- annullarem os esforços? tas e de procedimentos admit- Logo, “desenvolver apenas as tidos forma a doutrina. Logo a qualidades intellectuaes dos offi- doutrina tem por base a iniciati- ciaes de marinha” não póde ser va, a imaginação, a liberdade de a verdadeira e unica missão da pensamento e tem por fim a coor- Escola Naval de Guerra. Melhor denação intelligente dos esforços. seria fechal-a. Melhor seria a ig- Nasce da autonomia da intelli- norancia bem intencionada e co- gencia mas curva-se á necessida- ordenada em sincera cooperação, de do objectivo commum, unica do que o talento que se compraz escravidão que reconhece, porque na futilidade da prosapia e que marinha é esforço collectivo para desconhece as sutilezas encanta- um unico fim. doras do trabalho do team, que Para firmar doutrina já vimos desconhece a alegria da coorde- ser necessario acatamento ás opi- nação e da cooperação para um niões de outrem, tenacidade em ideal supremo e commum. defender as suas, quando acerta- Na lucta que iniciaes apparece- das, mas imparcialidade em reco- -vos pois o constante contraste das nhecer os erros e vontade de coo- cousas humanas, a necessidade de perar com a energia do sentimento aceitar uma sensata linha inter- para o objectivo. mediaria entre procedimentos ex- D’ahi a exigencia de intelligen- tremados, procedimentos estes que cia e de alma, de espirito lucido e se revelam pelas duas palavras: de caracter perfeito. Em resumo: iniciativa e cooperação. Sem ini- 1o – A missão da Escola Naval ciativa, estariamos no regimem col- de Guerra é a instituição de uma legial; sem cooperação, cahiriamos doutrina. na anarchia dos esforços. 2o – A condição para conseguíl- Como, então, desenvolver a ini- -a é dupla: 1a Moralidade e 2a In- ciativa sem prejuizos para a coo- telligencia. peração? Todos vós já conheceis Occupemo-nos, pois, em pri- a resposta a essa pergunta. Basta meiro lugar da Missão da Escola,

RMB3oT/2017 241 ACONTECEU HÁ CEM ANOS isto é, da doutrina, e em segundo das a minutos, contados arithmeti- lugar da condição para alcançal- camente, dosadas physicamente são -a, isto é, do factor moral unido apenas o meio de nos pormos em ao factor intellectual. paz com o formalismo pedagogico. (...) Vindes cultivar a verdade e não Não esperae porem da Escola o o formalismo. Entretanto, sem so- milagre da perfeição. Ella vos dará lidariedade, sem cooperação, sem conhecimentos basicos no maximo, coordenação, sem methodo, não certa orientação solida que cada ha resultado; si não soubermos qual competirá por si desenvolver dominar os moveis que tendem a posteriormente. A sua obra maxi- supplantar o interesse da gran- ma é a liga, é o pacto moral que se de causa da classe, na poeira dos firma, é o habito de trabalhar bem pequenos sentimentos pequenos, em collectividade, cousa tão desco- – não será o estudo desconnexo nhecida em geral. e individual que Alguns existem elevando a pessôa dentre vós, cuja Guardai pois esta phrase: de cada um conse- dedicação indivi- – Para o alto commando guirá destacal-a e dual á estrategia, importa mais o verdadeiro libertal-a da vul- á organisação, á caracter que a sciencia garidade de uma historia, é conhe- classe que, sem cida de todos nós isto, intimamen- e até do paiz. te se desaggregará e que só pelo Seria pois redundante e mesmo mutuo apoio dos seus membros impertinente que vos pretendesse- chegará á grandeza e a infundir mos abrir os olhos em assumpto o respeito que as multidões só de- que já vos é tão familiar. dicam á evidencia da força e ao A competencia de todos deve brilho da verdade. ser utilisada para o augmento da Guardai pois esta phrase: – Para efficiencia do grupo. o alto commando importa mais o A Escola Naval de Guerra quer verdadeiro caracter que a sciencia. fazer obra util. Prelecções marca- Rio, Abril de 1917.

O EM ESTADO DE GUERRA (RMB, set/out 1917, p. 155)

Só quem fosse cégo, inconscien- do que ella, em futuro já de nós te, ou vilmente trahidor aos sa- mui proximo, viesse a ser calcada grados interesses e altos destinos pelo humilhante e assolador tacão de nossa Pátria, pouco se lhe dan- dos modernos Hunos, e, retalha-

242 RMB3oT/2017 ACONTECEU HÁ CEM ANOS da pelo pesado sabre teutão, pas- Não nos sendo isso licito, seja- sasse d’ahi em diante, por seculos, -nos ao menos permittido con- talvez, sem conta, a estorcer-se signar aqui nestas curtas e de- flagellada pelo aviltante chicote sataviadas palavras, escriptas á prussiano, poderia deixar de rece- ultima hora, já á sahida desta ber com indizivel jubilo a decreta- Revista, a immensa satisfação ção do estado de guerra que nos foi que nos assoberba por vermos o imposto pela incommensuravel in- nosso caro Brazil, esta grande sania do governo allemão, e altiva patria de nossos paes e de nossos e patrioticamente aceito pelo que filhos, formada de arma ao hom- tão sabiamente nos está dirigindo. bro ao lado dos intransigentes e A este proposito, e abrindo aqui gloriosos paladinos da Liberda- ligeiro parenthesis, chamamos a de, do Direito e da Justiça. attenção de todos os nossos cama- radas e de quantos tenham qual- Origens e Consequencias da quer parcella de responsabilidade Grande Guerra no encaminhamento do nosso fu- Conferencia realizada no Club turo, para a belissima conferencia Naval, em 28 de agosto de 1917 sobre as Origens e Consequencias da grande Guerra que adiante J’ai souvent ressenti une dou- reproduzimos. Reputamol-a tão leur profonde en pensant à cette opportuna e de tal importancia, nation allemande qui est si esti- que não trepidariamos, si para mable dans chaque individu et si tanto tivessemos autoridade, em misérable dans son ensemble. La comparaison du peuple al- mandal-a imprimir em avulso ás lemand avec les autres peuples centenas de milhar na quantida- éveille des sentiments douloureux de necessaria para divulgal-a por auxquels j’ai cherché à échapper todos os recantos do Brazil. par tous les moyens possibles. Voltando ao que diziamos, ape- Goethe nas accrescentaremos que, si a na- (Entretiens avec Echerman) tureza desta Revista o permitisse, e de louvores carecesse quem tão En prévision de ma mort, je fais nobremente cumpre seus deveres, cette confession, que je méprise la seria o caso de batermos caloro- nation allemande à cause de sa sas palmas ao Congresso Nacio- bêtise infinie, et que je rougis de lui appartenir. nal e ao Exmo. Sr. Presidente da Schopenhauer, Memorabilien Republica, sem esquecer os seus dignos Secretarios de Estado, en- Les Prussiens?... la nature les a tre os quaes força é salientar nes- faits bétes, la science les a rendus ta emergencia a tersa figura do méchants. seu illustre Ministro do Exterior. Henri Heine

RMB3oT/2017 243 ACONTECEU HÁ CEM ANOS

Senhores: gens e as causas do phenomeno O thema “Origens e consequen- politico e social que se está proces- cias da grande guerra” é vasto de sando na Europa, e cujos effeitos mais, é transcendente de mais, se projectam sobre todos os angu- para que eu me proponha, nos los do mundo habitado. estreitos limites deste trabalho, Inutil seria determos o nosso a expôr idéas novas e conceitos espirito na simples observação novos, que se nos affigurassem dos factos e dos acontecimentos impressionantes na palpitação de que a guerra tem precipitado; alguma originalidade. nem nos é licito, sem uma cau- Já sobre elle fallaram e escre- telosa penetração na intimidade veram os mais altos factores do historica, estabelecer premissas e pensamento nacional, e, só a ho- phantasiar conclusões, armados nestidade dos meus propositos, apenas das impressões colhidas que é o em que consiste o merito a tona d’aquelles acontecimen- dos meus conceitos, justifica o tos – simples factores subsidia- enredar-me na urdidura de tão rios do complexo problema cuja complicada trama. solução buscamos. Ha na marinha brazileira um Não ha genio humano capaz de nucleo de officiaes (mais numero- apreciar um phenomeno qualquer, so do que fôra licito suppor) que, ainda o mais elementar, de ordem absorvidos inteiramente pelos ar- physica, politica, moral ou religio- duos misteres da sua profissão, sa, precisando as suas causas ou deslembrados, talvez pela escas- instituindo os seus principios re- sez de tempo, das investigações á guladores, só com a observação da ella estranhas, ou dominados por phase final do seu processo. um lastimavel desinteresse pelas Quem quer que assim agisse questões politicas e sociaes que incidiria fatalmente no erro vul- não affectam immediatamente gar dos pontos de vista, quando a vida nacional, attribuem aos conseguisse escapar á influen- interesses de uma das potencias cia de outras causas porventura belligerantes a causa da presente mais perturbadoras. guerra. A esses camaradas meus A leitura que ides ouvir é uma destino a exposição que ides ou- synthese imperfeita e incompleta vir e que conduzem á uma con- de factos historicos, da documen- clusão diversa. tação official exposta ao julga- Espectadores, e, talvez ama- mento universal pelos governos nhã, comparsas da grande trage- dos paizes belligerantes, e de nu- dia que ha trez annos emociona merosas publicações feitas nestes o mundo, sentimos a empolgante ultimos trez annos, em pamphle- necessidade de conhecer as ori- tos e em livros, por escriptores da

244 RMB3oT/2017 ACONTECEU HÁ CEM ANOS mais alta respeitabilidade, es- e nobres tradições deste paiz; foi trangeiros e nacionaes. esse arguto e corajoso espirito o Entre estes releva destacar o primeiro a romper o silencio com- nome do emerito professor Dr. promettedor em que se deixam fi- Sá Vianna, pensador profundo, car os mais autorisados órgãos amante apaixonado da justiça, do pensamento brazileiro no co- cuja vida privada como publica, meço da crise européa. é um molde perfeito das velhas (…)

DEFESA NACIONAL (RMB, set/out 1917, p. 185) Conferencia realisada pelo Capitão-Tenente Antonio Bardy, na séde da Associação dos Empregados do Commercio*

Só para me desobrigar, pelo Não, Senhores! Felizmente, não cumprimento, da tarefa que me se enquadram no meu feitio sim- impuz, aqui me acho agora, pe- ples, nem se ajustam ao tempe- rante vós, meus dignos patricios, ramento brazileiro, por demais a fim de, con- pacifico, as exacer- jugando minha bações e os destem- pobre ideia á Sê bem vindo, ó tú que, peros guerreiros. dos illustres ca- procurando preparar-te Agora que, leva- maradas que, dos pelo determi- antes de mim, já para a guerra, te queres nismo das razões vos tem dirigido preparar para a defesa fortes, acorreis á a palavra, falar- do que te pertence: a tua caserna, á busca -vos tambem so- Patria! E, nella, o teu de instrucção mi- bre assumptos re- Estado! E, nelle, a tua litar; agora que a ferentes á defesa adversidade vem nacional. cidade, a tua villa, a tua irmanando todos Não vos pa- aldeia! E, nella, com tudo o os Brazileiros e reça, meus Se- que te é caro, a tua casa, o impondo-lhes, in- nhores, que para teu amor, a tua tradicção differentemente, aqui vim armado as mesmas preoc- em guerra, e pos- cupações; é agora suido da veleidade de innocular- que acho prudente apresentar-me, -vos exagerações mavorticas, ou na esperança de ser de vós ouvido. empolgar-vos a razão com as mi- Como uma sentinella que, posta- nhas suggestões mystificadoras. da, por dever de officio, á porta da

*Publicada por ordem superior.

RMB3oT/2017 245 ACONTECEU HÁ CEM ANOS caserna, dirigisse aos voluntarios, É um flagello; e sobre se é um fla- ainda hesitantes, algumas pala- gello, não ha controversia. vras de animação, repassadas de Mas, esse flagello inevitavel, a boa fé, assim vol-as dirijo eu, humi- que, na phrase de Gustavo Le Bon, limo sentinella da minha Patria. se deve a formação e a cohesão da E a cada um de vós, que de alma nacional; esse flagello, que mim se acercar, direi: activa a circulação das vias ferreas Sê bem vindo, ó tú que, procu- e desenvolve extraordinariamente rando preparar-te para a guerra, a industria metalurgica e a mari- te queres preparar para a defesa nha mercante; esse flagello (pesa- do que te pertence: a tua Patria! E, -me sabel-o) sempre foi e ainda é o nella, o teu Estado! E, nelle, a tua officio instinctivo dos homens. cidade, a tua villa, a tua aldeia! E, A guerra actual veio mostrar, nella, com tudo o que te é caro, a tua em que pese á humanidade, que o casa, o teu amor, a tua tradicção. fragil esmalte, feito dos tratados, “O teu ninho de affectos, que representam a mais elevada A casa onde nasceu teu pae e concepção do genio humano, era onde teus netos ainda por demais quebradiço Te fechariam, morto, o escure- para impedir que, nos homens, cido olhar”! desandasse a corda mental que se O desejo de defenderes a tua lhes vinha imprimindo, atravez Patria é, portanto, uma amplia- de tantos seculos de civilisação. ção do de defenderes a tua casa: Hoje, n’esta lucta, que corróe as é uma propagação que te vem por entranhas da terra e conflagra as espheras concentricas. alturas do céu, se encontram, de Sempre que te lembra a guer- parceria com o canhão moderno ra, só concebes a imagem da tua (que se poderia dizer dirigido por cabana, á luz de uma lente que, uma consciencia organica) os mais ampliando-lhe desmesuradamen- primitivos engenhos de guerra. te os contornos, a transforma na A guerra existe; e, na guerra, é imagem da tua patria. preciso, a todo preço, matar. Se circumvagas o olhar pela É que, infelizmente, por ser este immensidão d’esta grande ter- o destino dos homens, os factores ra, de prompto conclues ser ella psycologicos das luctas guerreiras náu demasiado grande para uma agem, ás mais das vezes, á reve- grande tormenta. lia da razão, explorando, confor- Perguntar-me-eis, então, todos: me diz Le Bon na sua Psycologia Que é a guerra? Dize-nos a nós que, Politica, o instincto natural que, preparando-nos para os mistéres em toda a escala animal, leva os della, nos dispomos a enfrental-a. fortes a destruirem os fracos. E eu vos direi, por minha vez: (…)

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REVISTA DE REVISTAS

JULHO/AGOSTO – 1917 tos opinam que uma flotilha nu- merosa de submarinos de poucas O SUBMARINO IDEAL – Com toneladas (cerca de 500 ts.) ainda esta epigraphe, o “Scientific Ame- que disponham de pouca marcha rican” publicou recentemente um e suas qualidades marinheiras se- resumo de considerações sobre os jam um tanto deficientes, desem- submarinos. Presumindo que tal penham melhor serviço do que um assumpto é no presente momen- reduzido numero de submarinos to de grande opportunidade e de de deslocamento duplo, por exem- interesse geral, extractamos por plo, e dotados de maior raio de nossa vez os principaes conceitos acção, susceptiveis de desenvolver contidos na alludida publicação. maior velocidade, de maior po- No que concerne aos navios de der offensivo etc., e capazes, além combate a antiga controversia disso de seguir e acompanhar os entre os partidarios de poucas e navios de combate e de auxiliar a poderosas unidades ou muitas esquadra, lançando-se ao ataque e pequenas, póde considerar-se dos navios inimigos. como resolvida em favor das pri- Pode affirmar-se que o chama- meiras. Actualmente reclamam-se do principio de conciliação é o 42.000 toneladas para os couraça- que tem de se levar em conta para dos de esquadra (dreadnoughts), não incorrer em exagerações. Em 35.000 para os cruzadores de ba- um submarino deve-se conciliar talha e 7.000 para os exploradores do melhor modo possivel, muitas (scouts) e cerca de 1.200 para os e muitas differentes e ás vezes até contra-torpedeiros, devendo além condições antagonicas. E esta cir- disso, todos esses typos de navios, cumstancia é a que devem ter em com excepção dos couraçados de vista ao formular as bases para a combate, poder desenvolver uma obtenção de um bom submarino. velocidade de cerca de 35’. Sobre Porque de nada serve que os offi- isto, repetimos, não ha mais du- ciaes navegantes indiquem as con- vida, nem vacillação, pois é as- dições que devem reunir seus na- sumpto considerado resolvido. vios desde que não é possivel para Entretanto já não occorre o mes- os officiaes technicos constructo- mo com os navios submarinos. A res, satisfazel-as. E esta impos- controversia entre os navios de su- sibilidade manifesta-se seja por perficie resurgiu ao apparecer este augmento ou diminuição excessi- novo typo de navios sem que esta va na tonelagem ou deslocamento. questão possa dizer que tenha sido É d’ahi que após muitas tentativas definitivamente encerrada. -Mui e experiencias chegou-se a conside-

RMB3oT/2017 247 ACONTECEU HÁ CEM ANOS rar que na actualidade, o typo de se referem às qualidades defensi- submarino mais conveniente para vas, que hoje estão supplantadas a marinha dos Estados Unidos é pelo crescente poder offensivo dos o de um navio de um deslocamen- navios couraçados. Assim, a me- to comprehendido entre 750 e 900 nos que qualquer modificação se toneladas, com um comprimen- apresente no actual estado de cou- to variavel entre 225 e 250 pés, sas, é de presumir que venha a ser estimando-se que um submarino adoptado nas futuras construcções deste typo possa desenvolver na- o plano de protecção já praticado vegando na superficie, uma veloci- nos Estados Unidos, e que consis- dade de cerca de 17 a 19 nós e de te em couraçar somente as partes 14 quando submerso. vitaes do navio com placas de 35 (…) a 45 centimetros de espessura, dei- xando as outras desprotegidas. O NAVIO DE LINHA DO D’este modo se irá approximando FUTURO – Dos Anais do Club Mi- o couraçado d’aquelle typo, ha pou- litar Naval, extrahimos o seguinte: cos annos ainda considerado como A Revista General de Marina simples fantasia e que deslocava publica um artigo traduzido do 33.000 tons. para comportar um “The Engineer”, em que se apre- armamento de peças de 460 m/m. ciam as condições a que devem obe- O problema da construcção decer os futuros navios de linha. O do navio de linha, já sufficiente- autor do artigo em questão começa mente complicado pela neces- por reconhecer que, apezar de não sidade de attender a evolução se ter travado ainda qualquer das suas caracteristicas espe- combate decisivo, tem-se dado, ciaes, mais se complicou desde todavia, os necessarios encontros que se poude constatar durante para que todas as diversas espe- a guerra russo-japoneza, que a cies de navios tenham sido con- mais poderosa unidade naval é venientemente experimentadas, o destruida por explosão subma- que permitte formular desde já o rina. De então para cá pensou-se criterio com que serão concebidos em conjurar o novo perigo com os novos couraçados. o emprego d’uma desenvolvida A transformação do navio de compartimentagem e anteparas linha não se tem feito nos ultimos longitudinaes blindadas. annos por um processo evolutivo, Este systema deu em parte os mas, sim, como diz o autor, d’uma resultados esperados, segundo maneira inteiramente revoluciona- affirma o autor, que para demons- ria. Todas as suas caracteristicas trar se serve dos exemplos conhe- têm tido notavel desenvolvimento, cidos do Jean Bart, Marlborough fazendo apenas excepção as que e Westfalen, outros navios de cons-

248 RMB3oT/2017 ACONTECEU HÁ CEM ANOS trucção antiga, como também é que o apparecimento d’aquelle typo sabido, que tem sido afundados de navio veio modificar as opera- com um só ataque de torpedo. ções navaes, quer no campo tac- Acontece, porem, que, assim tico, quer no campo estrategico. como a potencia da artilharia tem O submarino deixou de ser um crescido notavelmente nos ultimos perigo remoto e casual e contra annos, é tambem de suppor que a elle não bastam nem as densas potencia destructiva dos torpedos cortinas de destroyers nem redes cresça na mesma proporção – o protectoras do costado, atravez que não é difficil de admittir dado das quaes o navio de linha não por um lado os progressos que pode ser attingido. Com succes- elles têm feito ultimamente e pelo sivos aperfeiçoamentos introduzi- outro o augmento da tonelagem dos nas machinas de combustão que se tem dado aos torpedeiros internas os submarinos poderão e submarinos – e que em breve a alcançar um desenvolvimento que proteccção interior, hoje reputada os distanciará consideravelmente sufficiente, já não chegue para dos actuaes e assim poderão ad- resistir aos ataques dos torpedos quirir mais efficazes qualidades mais poderosos, que certamente de ataque e comportar armas de não deixarão de apparecer. maior poder destruidor. Referindo-se ao submarino que, O couraçado precisa, pois, de no dizer do autor, se mostrou in- ser dotado de elementos de defesa ferior ao que d’elle disseram sir contra os novos provaveis ataques Percy Scott e outras autoridades, que tem a soffrer. o que lhe parece tambem certo é (...)

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Esta seção tem por propósito levar ao conhecimento dos leitores matérias que tratam de assuntos de interesse marítimo, contidas em publicações recebidas pela Revista Marítima Brasileira e pela Biblioteca da Marinha. As publicações, do Brasil e do exterior, são incorporadas ao acervo da Biblioteca, situada à Rua Mayrink Veiga, 28 – Centro – RJ, para eventuais consultas.

SUMÁRIO (Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)

ADMINISTRAÇÃO ENTREVISTA Entrevista do comandante da Marinha do Brasil (251)

FORÇAS ARMADAS SUBMARINO Propulsão convencional para submarinos (257) Sistemas de gerenciamento de combate submarino (258) VEÍCULO AÉREO NÃO-TRIPULADO Robótica aérea no Brasil (259)

HISTÓRIA HISTÓRIA DOS EUA Captura do vapor confederado Florida pelo vapor de guerra Wachusetts no porto da Bahia (259) REVISTA DE REVISTAS ENTREVISTA COM O COMANDANTE DA MARINHA DO BRASIL (Plano Brasil, Brasil, 2/8/2017)

O jornalista Roberto Lopes, da coluna INSIDER – Diante dessa necessidade, não Insider do site Plano Brasil, entrevis- teria sido melhor poupar a Corveta Frontin tou, em agosto último, o comandante da da baixa? Marinha do Brasil (MB), Almirante de CM – Devido às nossas restrições financei- Esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira. ras e à relação custo/benefício, não havia Em encontro de cerca de duas horas, em como ficar com aFrontin . Autorizei a baixa Brasília, o Almirante falou especialmente [em setembro de 2015] com tristeza. Coman- sobre questões relacionadas aos recentes dei esse navio, mas não havia alternativa. cortes no orçamento da Marinha e sobre os rumos que pretende imprimir à Força. Eis INSIDER – A renovação da nossa força de os principais trechos da entrevista: escoltas não exigiria a aquisição urgente, por meio de compras de oportunidade, de O APROVEITAMENTO DOS navios que estão sendo disponibilizados por ESCOLTAS JÁ EXISTENTES outras Marinhas? CM – Quais Marinhas? Se for para comprar INSIDER – Nós podemos entender que a as Maestrale, da Marinha italiana, que são Marinha está preparando a volta à ativa da da mesma época das nossas Niterói, eu pre- Fragata Defensora e das corvetas Júlio de firo ficar com as Niterói, que representam Noronha e Jaceguai, para só aí desprogra- um projeto muito bom. mar os navios que estão mais cansados, das classes Niterói e Greenhalgh? INSIDER – Mas e os navios que serão, COMANDANTE DA MARINHA (CM) em breve, disponibilizados pela Marinha – Desprogramar por quê? Uma fragata da Coreia do Sul? A nossa Marinha tem como a Niterói, mesmo que não tenha o prevenção em relação aos navios asiáticos? seu armamento principal completamente CM – Duas das nossas aquisições mais ativo, ainda serve, perfeitamente, para recentes foram feitas na China: a Estação atuar como navio-patrulha no Golfo da Almirante Ferraz, para a Antártida, e o na- Guiné. Não pretendo mais autorizar a vio Vital de Oliveira [hidroceanográfico], baixa de nenhum dos nossos escoltas. então não é o caso de se falar em prevenção. Meus sucessores que façam isso. Vamos Mas é preciso saber se os escoltas fabrica- cuidando desses navios [uma informação dos na Coreia do Sul há 20 ou 25 anos ainda por escrito entregue pelo diretor do Centro são mesmo bons navios. No ano passado, de Comunicação Social da Marinha expli- os coreanos nos ofereceram um navio que citou que três classe Niterói e a Corveta era caro e a metade do tamanho do nosso Barroso serão modernizados em breve] e Bahia [referência à proposta de venda de aproveitando os maiores para a patrulha um navio-doca classe Makassar, apresen- oceânica, que considero muito importante tada pelo grupo Posco Daewoo ao então e uma preocupação não apenas nossa, mas diretor do Arsenal de Marinha do Rio de de todas as Marinhas do mundo. Janeiro, Almirante Mário Ferreira Botelho].

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INSIDER – A Força está atenta ao fato de INSIDER – E, falando mais uma vez sobre que as limitações da Esquadra exigem um o pouco dinheiro de que a Força dispõe para esforço muito grande dos três navios classe tocar as suas prioridades: como o senhor Amazonas? Eles não estão sendo emprega- vai fazer para implementar o SisGAAZ dos à exaustão? E o desgaste disso? [cobertura radárica das regiões marítimas CM – Estamos muito atentos a isso, mas é conhecida por Sistema de Gerenciamento preciso dizer que os navios da classe Ama- da Amazônia Azul]? zonas são unidades robustas, projetadas e CM – Nós vamos desmembrar o SisGAAZ, construídas para navegar muito mesmo, e começar a fazer um sítio de cada vez, de serem muito exigidas. forma a viabilizar o programa.

INSIDER – Uma boa compra feita pelo ESTÁGIO ATUAL DO PROCESSO Almirante [Julio Soares de] Moura Neto… DE OBTENÇÃO DAS CORVETAS CM – Uma excelente compra feita pelo CLASSE TAMANDARÉ Moura Neto. INSIDER – Em que ponto está o processo INSIDER – Ainda falando sobre as deman- de obtenção das corvetas classe Tamandaré? das para a Esquadra nesse cenário de recur- CM – Estamos preparando a emissão de sos escassos, não seria o caso de a Marinha, um Request for Proposal e esperamos para poupar os seus barcos, retirar-se da receber as propostas das empresas que Força-Tarefa Marítima da Unifil, no Líbano? retirarem o documento no decorrer desse CM – Não, não. Nossa presença no Líbano segundo semestre e no início do próximo é utilíssima para dar experiência e motiva- ano. [Na tarde de 3 de agosto, a coluna ção às nossas tripulações. Além disso, os INSIDER recebeu um esclarecimento custos dessa participação são compartilha- do Centro de Comunicação Social da dos entre a Marinha e a Organização das Marinha sobre o assunto. O texto diz que Nações Unidas. as empresas interessadas na construção

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das corvetas “receberam chamamento INSIDER – E quantas serão selecionadas e público para tomarem conhecimento que chamadas a propor uma final and best offer? a Força deu início ao projeto das corvetas CM – Três. classe Tamandaré e para que possam comprovar capacidade de construir na- INSIDER – A Marinha já previu o quanto vios de alta complexidade. As empresas gastará na fabricação das quatro Tamandaré? receberam também documento contendo CM – Já, claro. Precisaremos investir as principais orientações e características R$ 612 milhões, anualmente, pelo período e assinaram um termo de confidencia- de oito anos. lidade. O Request for Proposal (RFP) ainda será emitido, finalizando o modelo INSIDER – E a Marinha terá esse dinheiro? de negócio”.] CM – Não sei [risos], vamos fazer todo o esforço para ter! Mas deixe que eu te diga: até bem pouco tempo, o que a Força tinha para gastar na rotina opera- cional e nos seus projetos até o fim deste ano era R$ 1,8 bilhão. Agora, com os últi- mos cortes, INSIDER – Não foi um erro fazer um “cha- essa previsão já baixou para R$ 1,1 bilhão. mamento público”, abrindo o RFP para 20 empresas? Não teria sido mais prático e, so- INSIDER – O senhor não acha que a previ- bretudo, mais rápido convidar apenas alguns são de custo da corveta classe Tamandaré fornecedores que a Marinha sabe que estão no patamar dos 450 milhões de dólares é habilitados para uma iniciativa desse tipo algo muito elevado? [fornecimento de navios de 2.750 toneladas]? CM – É. E por isso estamos reduzindo essa CM – Não. Sem o “chamamento público” previsão para alguma coisa em torno dos correríamos sempre o risco de expor o nos- 350 milhões de dólares. so processo de obtenção a uma contestação judicial, por parte de alguma empresa que INSIDER – Um valor ainda alto, mas, afinal não foi inicialmente convidada a participar de contas, trata-se de um navio que, apesar da licitação. de ser classificado como corveta, tem o porte, 2.750 toneladas, de uma fragata leve. INSIDER – Quantas propostas de corveta o Ou estou enganado? senhor acha que a Marinha receberá? CM – Não, está certo. O porte é mesmo de CM – Oito ou nove. uma fragata.

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INSIDER – E esses valores que o senhor bilizar a construção de um navio-patrulha mencionou referem-se a navios sendo oceânico, por exemplo. construídos no Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro? INSIDER – Como os previstos no Prosuper? CM – Isso. Ou lá, ou em algum estaleiro do CM – Isso. Nordeste. O Vard, de Pernambuco, que é do grupo Fincantieri, e o Atlântico Sul, que tam- INSIDER – A propósito, o senhor ainda bém está se aliando a um parceiro estrangeiro, tem alguma expectativa sobre a liberação já demonstraram interesse no programa. do Prosuper, que foi entregue à Presidên- cia da República no primeiro governo da INSIDER – Não sabia dessa parceria en- Presidenta Dilma? volvendo o Atlântico Sul. CM – Eu já nem falo mais no Prosuper CM – Com um sócio europeu, não sei se quando vou ao Palácio do Planalto. Sou com a Navantia. muito bem recebido pelo Presidente Temer, e tenho sempre o ministro da Defesa do INSIDER – Ou até ser construído nas nosso lado; é um grande aliado, mas não instalações do Complexo Industrial Naval vejo como retomar o Prosuper na atual de Itaguaí… conjuntura. CM – Pelos nossos estudos, Itaguaí pode- ria, sim, construir navios de superfície até INSIDER – O senhor tem conversado com o porte de uma corveta. Exigiria alguns o Ministro Henrique Meirelles [da Fazen- investimentos, mas não é muito. Mas isso, da], não tem? naturalmente, é assunto para o futuro, não CM – Sim, tenho estado com ele. Mas a para esse lote de corvetas que estamos gente chega lá e o quadro que ele desenha começando a providenciar. é tão ruim…

AS ARTICULAÇÕES DOS O CASO DA DESPROGRAMAÇÃO INTERESSES DA MARINHA NO DO SÃO PAULO ÂMBITO DO GOVERNO INSIDER – Nesse cenário, é de espantar INSIDER – Fico sempre um pouco irritado que ainda haja gente que lamente o senhor com o aparente desinteresse das entidades ter desprogramado o porta-aviões São Pau- governamentais e daquelas que falam em lo, poupando a Marinha de um gasto de 800 nome da construção naval brasileira com os milhões de dólares, que era o preço que os programas claramente urgentes da Marinha franceses pediam pela reforma do navio. do Brasil. Por exemplo: o BNDES não pode CM – Que 800 milhões? Nos últimos ajudar mais a Marinha? tempos esse custo já havia subido para CM – Pode, mas é preciso medir muito bem 1,5 bilhão. esses passos, porque estamos falando de empréstimos, que precisarão ser devolvi- INSIDER – Um e meio bilhão de dólares?! dos. Estamos em contato com o BNDES e Para um programa de resultados incertos… também imaginando que talvez possamos Aliás, os franceses não gostaram de a captar algum dinheiro com o Fundo da Marinha ter chegado à conclusão de que Marinha Mercante. Outro empréstimo… os resultados da reforma deviam ser con- Mas que seria muito bem-vindo para via- siderados de risco, incertos.

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CM – Eles sabiam que eram incertos. Preci- INSIDER – Nesse cenário de diminuição saríamos de vapor superaquecido para fazer das aeronaves de caça aptas a operar a disparar a catapulta do convés de voo, e a bordo de porta-aviões, justamente porque já troca da motorização [de vapor para diesel] não temos mais o nosso navio-aeródromo, não nos garantia isso. Eles sabiam. não seria o caso de rever também os gastos que estamos tendo com a conversão de qua- INSIDER – E por que precisamos de três tro aeronaves Trader, nos Estados Unidos, anos para completar a desprogramação do para a versão COD/AAR [Carrier Onboard São Paulo? Três anos não é muito tempo? Delivery/ Air-to-Air Refueling]? CM – Não, não é. O São Paulo é um navio CM – Você tem razão, e nós investigamos do qual a Marinha se orgulha muito. Ainda a possibilidade de interromper também esse realizamos eventos nele, e a Diretoria de programa, mas ele já está quase com 80% Engenharia Naval tem o seu pessoal técni- do seu custo quitado, e chegamos à conclu- co estudando os detalhes construtivos do são de que a relação custo/benefício, que navio para, eventualmente, usarmos esse poderia envolver contestações judiciais, conhecimento quando formos construir o recomendava continuarmos com o processo nosso porta-aviões. de obtenção dos aviões.

INSIDER – A propósito, como ficou aque- INSIDER – A Marinha não recebeu uma le entendimento, da época do Almirante oferta de caças F-18 usados da Marinha dos Moura Neto, entre as Marinhas do Brasil Estados Unidos? e da China, para, eventualmente, estabele- CM – Eu nunca recebi oferta de aviões, só cermos uma cooperação na construção de de helicópteros. porta-aviões? CM – Aquilo não avançou. Os chineses INSIDER – E agora a Marinha ainda vai enveredaram por uma opção de projeto que receber a Aviação de Patrulha da FAB… não nos interessa, e a cooperação parou. CM – Pois é, essa é uma informação que vem circulando, mas que precisa ser colo- O DILEMA DA AVIAÇÃO NAVAL cada nos seus devidos termos. Realmente DE ASA FIXA a FAB nos procurou sobre a questão da Aviação de Patrulha, mas não para nos INSIDER – Falar sobre o porta-aviões repassar as aeronaves, e sim para pedir que nos remete à questão da Aviação Naval de alguns especialistas da Marinha passem Asa Fixa. Agora já se fala de uma possí- a integrar as tripulações dos aviões P-3, vel redução do número de aeronaves A-4 particularmente nos postos de sonar e de Skyhawk, na Marinha conhecidas como radar. A FAB acredita que nossa experi- AF-1, que serão modernizadas, mudança ência nessas atividades de rastreamento que deixaria o lote modernizado com seis e monitoramento ajudaria a aperfeiçoar a monopostos e três biposto. capacidade dos seus militares e que a inte- CM – Não, não, menos do que isso, três gração dos profissionais das duas Forças se- bipostos e três ou quatro monopostos só. ria uma experiência enriquecedora para nós Estamos conversando com a Embraer, que também. Eu concordei, ainda mais porque sempre é muito compreensiva conosco. Ali- eles planejam transferir os P-3 para a Base ás, gosto muito do Jackson Schneider [pre- Aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, sidente da Embraer Defesa & Segurança]. onde está a maior parte do nosso pessoal.

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INSIDER – Esses aviões vão, então, trocar e é preciso avaliar bem o que ele nos exigirá Salvador pelo Rio… em termos de operação e manutenção [este CM – Isso. De qualquer forma, o importan- colunista encontrou alguns colaboradores te é termos os P-3 operando a contento, e, diretos de Leal Ferreira otimistas com felizmente, os P-3 estão voando muito bem. a possibilidade de a Marinha anunciar a compra do HMS Ocean]. A OFERTA DO PORTA-HELICÓPTEROS OCEAN A MANUTENÇÃO DO MORAL AO BRASIL NA FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA INSIDER – O fato de a coluna ter noticiado com exclusividade, ainda no fim de março, a INSIDER – Por falar em expectativas, como oferta do porta-helicópteros HMS Ocean à é que o senhor lida com as expectativas do MB trouxe algum problema para o senhor? pessoal da Força de Minagem e Varredura,

O Comandante Leal Ferreira presenteia o editor da coluna com um livro sobre a Marinha do Brasil

CM – Nenhum. A única coisa é que eu que opera navios muito antigos e espera pela fiquei sabendo do custo do navio pela renovação dos seus meios há anos? sua coluna [risos]. Aliás, já houve caso CM – Antes de mais nada, tenho orgulho de em que uma observação feita pelo senhor dizer que os militares da Força de Minagem na coluna nos ajudou aqui no Gabinete e Varredura sabem, perfeitamente, a impor- a refletir sobre determinada situação e tância que eles tem. E que se hoje não há, tomar uma posição. ainda, perspectivas da aquisição de novos meios, eles virão certamente, até porque, INSIDER – O Ocean vem para o Brasil? para a nova base de submarinos de Itaguaí CM – Isso ainda não é possível dizer. Fare- funcionar em total segurança, precisaremos mos mais uma inspeção no navio este mês, ter ali uma unidade de contramedidas de

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minagem, com embarcações modernas e pacidade de guerra de minas na MB, que prontas para atuar. Isso já está estabelecido, envolve não apenas os meios navais, mas é um horizonte que eles conhecem… também toda a infraestrutura logística afeta a esse ramo da guerra naval”.] INSIDER – Por que a Marinha não com- prou unidades da classe Lerici, italiana, que A QUESTÃO DA AUTOESTIMA não são tão caras quanto os navios moder- nizados oferecidos pela SAAB, da Suécia? INSIDER – O senhor se referiu ao orgulho CM – Esses navios são todos muito caros. que sente com a noção de responsabilidade Os da classe Lerici não nos foram ofere- do pessoal da Força de Minagem e Varre- cidos; os da Suécia, sim. Os suecos esti- dura. Essa questão do moral alto é uma das veram aqui conversando comigo. Quando suas preocupações… tivermos uma janela de recursos essas duas CM – Talvez a minha maior preocupação. classes serão, certamente, examinadas. Quero que o nosso tripulante, embarcado [Um esclarecimento obtido pelo Centro de ou em terra, possa dizer de forma total- Comunicação Social junto ao Comando de mente consciente “Eu sou importante, Operações Navais acerca dos navios mi- eu estou contribuindo para a manutenção neiros informou: “A MB interagiu com as dos padrões operacionais da Força e para Marinhas da Holanda, Itália e Suécia, que a manutenção das tradições da Marinha”, disponibilizaram alguns navios existentes, que são, em última análise, a própria De- todos da década de 80, que necessitarão fesa do País. sofrer modernização para atender aos requisitos da MB. Mantemos o interesse INSIDER – O senhor tem um índice de na obtenção dos meios disponibilizados evasão de oficiais muito alto, em função, pelas Marinhas amigas, em particular os por exemplo, das dificuldades salariais? da Suécia e da Itália. Entretanto, qualquer CM – Não, felizmente. iniciativa de obtenção desses meios está INSIDER – Nem no recrutamento de condicionada à disponibilidade orçamen- médicos? tária para a sua execução. No momento, CM – A tarefa de completar as vagas de mé- o Comando de Operações Navais realiza dicos é sempre um pouco mais difícil, mas estudo técnico para a recuperação da ca- estamos conseguindo fazer isso também.

PROPULSÃO CONVENCIONAL PARA SUBMARINOS Peter Donaldson* (Naval Forces, no IV/2017, Vol. XXXVIII, p. 12-15)

“No que diz respeito a submarinos não- se estabeleceu como aquele que prolonga o -nucleares, não há prospecto de rival para alcance do submarino e sua endurance em o motor a diesel”, afirma o autor deste baixas velocidades. artigo, que trata da propulsão independente Novas tecnologias de baterias e evo- do ar (AIP – Air Independent Propulsion). luções nas células combustíveis AIP vêm Segundo ele, esse modelo de propulsão já competindo com sistemas antigos, tornando

*Colaborador regular da Naval Forces.

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as escolhas diante das forças navais mais O autor conclui que as várias opções complexas. O artigo aborda diversas opções de tecnologias AIP existentes indicam existentes, passando pela francesa DCNS, que o sistema que dominará as escolhas pelas alemãs Thyssenkrupp e HDW, pela futuras ainda não está definido, apesar de sueca SAAB e pela opção japonesa da GS as células combustíveis serem as líderes Yuasa de baterias full lítio. no quesito endurance.

SISTEMAS DE GERENCIAMENTO DE COMBATE SUBMARINO Matthew Carls* (Naval Forces, no IV/2017, Vol. XXXVIII, p. 16-18)

O sistema de gerenciamento de combate de armas em quadro tático comum para o (CMS – Combat Management System) é comandante do navio e sua tripulação. fator central na capacidade tática de um Este artigo aborda as recentes evoluções submarino. Ele é o cérebro que integra nessa área, tais como designs e arquiteturas sensores, Comando, Comunicações, Com- de computadores, apresentando suas novas putadores e Inteligência (C4I) e sistemas capacidades e algumas empresas provedoras.

* Analista sênior da empresa de análises de defesa Avascent.

258 RMB3oT/2017 REVISTA DE REVISTAS ROBÓTICA AÉREA NO BRASIL AS FORÇAS ARMADAS E OS VANTS Ivan Plavetz (Tecnologia & Defesa, ano 34, no 148, p. 26-36)

Este artigo apresenta extensa análise da projetos mais complexos dos que até evolução e do uso, no Brasil, de drones, então existiam (alvos aéreos rudimenta- tipo de aeronave tecnicamente conhecida res); o uso desses drones pelo Exército; como veículo aéreo não tripulado (Vant) e como na Marinha do Brasil esses ou aeronave remotamente pilotada (ARP). sistemas vêm sendo empregados como O texto descreve vários tipos de sistemas ferramentas táticas. existentes no País e, em seções separadas, a Em seção separadamente encartada, o evolução, os tipos, o emprego e as doutrinas autor apresenta particularidades e conhe- que cada Força Armada adota para o uso cimentos básicos que permitem o entendi- de seus Vant. mento do assunto abordado por pessoas que Assim, aborda: o pioneirismo da Força não detenham quaisquer conhecimentos Aérea, que, na década de 1980, executou prévios sobre o tema.

CAPTURA DO VAPOR CONFEDERADO FLORIDA PELO VAPOR DE GUERRA DA UNIÃO WACHUSETTS NO PORTO DA BAHIA Secretário Ignácio de Avellar Barboza da Silva (Cadernos do CHDD, Fundação Alexandre Gusmão, ano 15, número 29, Segundo semestre 2016, p. 222-281)

O Centro de História e Documentação São reproduzidos ainda ofícios trocados Diplomática reproduz, nas páginas indica- entre o citado chefe da Legação e o secretá- das, ofícios despachados ao longo dos anos rio de Estado dos Estados Unidos, William de 1864 e 1865 pelo chefe interino da Le- H. Seward, entre eles o que apresenta a gação Imperial do Brasil em Washington, “justa reclamação do governo imperial”. Secretário Barboza da Silva. Esses docu- Nele, o governo federal dos EUA de- mentos tratam do apresamento do corsário veria se declarar surpreendido pelo ato confederado Florida pelo vapor federal insólito do comandante do Wachusetts, Wachusetts no porto da Bahia. Segundo foi reprovando-o e condenando-o; demitir noticiado à época, o Florida foi capturado e imediatamente o mesmo comandante, ins- levado à revelia para Hampton Roads, nos taurando o competente processo; e proceder Estados Unidos da América (EUA). a salva de 21 tiros por embarcação de guer- O episódio, que possui versões con- ra dos EUA no porto da capital da Bahia, flitantes dependendo do noticiário que com içamento do pavilhão brasileiro em se consulta, conforme afirma Barboza seu mastro de honra. Era ainda reclamada, da Silva em um de seus ofícios, causou como reparação ao “evidentemente ilegal problemas diplomáticos entre o governo e nulo” apresamento do Florida, a plena imperial brasileiro e o dos EUA, cujo liberdade à tripulação e a entrega do vapor Presidente era Lincoln. ao governo de Sua Majestade o Imperador.

RMB3oT/2017 259 NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Esta seção destina-se a registrar e divulgar eventos importantes da Marinha do Brasil e de outras Marinhas, incluída a Mercante, dar aos leitores informações sobre a atualidade e permitir a pesqui- sadores visualizarem peculiaridades da Marinha. Colaborações serão bem-vindas, se possível ilustradas com fotografias.

SUMÁRIO (Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)

ADMINISTRAÇÃO COMEMORAÇÃO Arquivo da Marinha comemora 110 anos (264) Fragata Constituição participa do centenário da 1a Guerra Mundial (265) CONDECORAÇÃO Fuzileiros Navais são agraciados com Medalha das Nações Unidas (265) Militares da MB recebem a Peacekeeping Medal das Nações Unidas (266) DOAÇÃO Doação de obra à DPHDM (267) INAUGURAÇÃO Inaugurada área de lazer da Agência Fluvial de Eirunepé (267) MOSTRA DE DESARMAMENTO NPa Parati despede-se do serviço ativo da Armada (268) POSSE Assunção de cargos por almirantes (269) Posse do Diretor-Geral do Pessoal da Marinha (269) PRÊMIO 11o Concurso de artigos para a Revista da Aviação Naval (275) Concurso da revista Passadiço (275) PROMOÇÃO Promoção de almirantes (276) NOTICIÁRIO MARÍTIMO

VISITAÇÃO NAsH Carlos Chagas recebe visita de ribeirinha nascida a bordo (276)

APOIO ARSENAL Rebocador-Museu Laurindo Pitta doca no AMRJ (276) LOGÍSTICA Comboio logístico regressa a Ladário (277) MANUTENÇÃO Companhias brasileira e holandesa associam-se para serviços de O&G, infraestrutura e logística (278)

ARTES MILITARES JOGO DE GUERRA Jogo de Guerra Trilateral/2017 (278)

ATIVIDADES MARINHEIRAS BUSCA E SALVAMENTO CFAOC resgata família no Rio Negro (279) DelLaguna apoia resgate de náufragos (279) SALVAMENTO MB realiza resgates no Pantanal (280) SOCORRO CPSC e DelItajaí prestam apoio em Rio do Sul (280) NAsH Doutor Montenegro atende criança (281)

CIÊNCIA E TECNOLOGIA (C&T) ENERGIA SOLAR AMRJ expõe barco solar (281)

COMUNICAÇÕES INTERNET NavegaReserv@ (282)

CONGRESSOS CONGRESSO 1o Congresso Internacional de Contramedidas de Minagem (282) ENCONTRO III Encontro de presidentes de Soamar (283) EXPOSIÇÃO Parceria MB/AquaRio promove exposições e desconto em ingressos (284) REUNIÃO 1a Junta de Inteligência Trifronteiriça (285) Marinha participa da 69a Reunião Anual da SBPC (286)

RMB3oT/2017 261 NOTICIÁRIO MARÍTIMO

SIMPÓSIO II Simpósio Nacional de História Militar (288) MB participa do 3o IMSS 2017 (289) PAINEL AMRJ e DPHDM realizam painel sobre construção de monitores (289)

EDUCAÇÃO CURSO Oficial da MB participa de curso da ONU na China (290) ESCOLA NAVAL 51a Navamaer integra academias militares (291) ESPORTE CBVela inaugura sede e cria Hall da Fama (292) MB assina convênio com a Confederação Brasileira de Vela (293) MB incorpora novos atletas ao Prolim (294) Resultados esportivos (295) FORMAÇÃO CIAW e ITA assinam Acordo de Cooperação Acadêmica e Técnica (298)

FORÇAS ARMADAS AERONAVE Concluída mais uma etapa do programa de obtenção das aeronaves KC-2 (299) EsqdHU-2 recebe aeronave C-SAR (300) HS-1 homologa MAG 7,62 mm em aeronave SH-16 (301) COMANDO DA MARINHA Comando da Marinha terá nova sede em Brasília (301) CORPO DE FUZILEIROS NAVAIS CFN recebe novos CLAnf (302) EXERCÍCIO MILITAR BtlVtrAnf e NDCC Almirante Saboia realizam exercício com CLAnf (303) Caças da MB participam de exercício em MS (304) GAT-FN participa de exercício entre São Tomé e Príncipe e Portugal (304) OPERAÇÃO 4o DN divulga resultados da Operação Asurini (305) 6o DN realiza OpRib Pré-Fronteira Sul II (306) Esquadrão VF-1 participa da Operação Pré-Fronteira Sul II (307) Operação Acrux VIII (309) Operação Fraterno XXXV (309) Operação Missilex 2017 (310) OPERAÇÃO AÉREA NDM Bahia coordena primeiro voo simultâneo (311) PATRULHA NAVAL CPRJ participa de operação na Baía de Guanabara (312) MB apoia repressão a delitos transfronteiriços no Rio Paraná (312)

262 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO

PODER MARÍTIMO PLATAFORMA CONTINENTAL CLPC – Perito brasileiro é reeleito (313) Leplac – O Brasil além das 200 milhas (314)

PSICOSSOCIAL AJUDA HUMANITÁRIA MB apoia Defesa Civil na enchente do Rio Uruguai (315) ASSISTÊNCIA SOCIAL CPAP realiza ação de prevenção aos acidentes de escalpelamento (316) NAsH Tenente Maximiano realiza ações de assistência hospitalar (316) NAsH Tenente Maximiano realiza ações de assistência hospitalar nos rios Paraguai e Cuiabá (317) NAsH Tenente Maximiano realiza mais de 1.500 procedimentos de saúde (317) LANÇAMENTO DE LIVRO Lançamento do livro Patrimônio Arqueológico Subaquático na Marinha do Brasil (318) Ministério da Defesa lança “Livro Verde” (319)

RMB3oT/2017 263 NOTICIÁRIO MARÍTIMO ARQUIVO DA MARINHA COMEMORA 110 ANOS

O Arquivo da Marinha completa este mais se destacaram na MB; “Obras Raras”, ano 110 anos de existência. Hoje integran- com documentos únicos e inéditos; e os te da Diretoria do Patrimônio Histórico e “Fundos”, constituídos por papéis que Documentação da Marinha (DPHDM), o registram as atividades administrativas órgão tem sua sede em prédio na Ilha das da Marinha, legislação, assentamentos Cobras, cidade do Rio de Janeiro. Para do pessoal, além de registros em suportes celebrar este aniversário, a DPHDM orga- especiais, como fotografias, gravuras, nizou dois painéis fotográficos contando a microfilmes, CD, DVD e fitas de vídeo, história do Arquivo, que ficaram expostos todos de relevância histórica. aos visitantes do local de 21 de agosto a 29 O órgão reúne acervo com mais de 30 de setembro último. milhões de registros, sendo responsável, O Arquivo incorporou-se à área cultural ainda, por acompanhar e implementar a po- da Marinha por meio do Decreto no 6.510, lítica nacional de arquivos no âmbito da MB,

Arquivo da Marinha na década de 50 de 11 de junho de 1907. Nessa data, foi constituindo-se em uma das mais importan- criada a Diretoria da Biblioteca, Museu e tes fontes de pesquisa do País. O Arquivo Arquivo da Marinha. Atualmente o Arqui- está situado na Praça Barão de Ladário s/n, vo possui em seu acervo documentos que Ilha das Cobras e funciona de segunda a datam do século XVIII aos dias atuais, sexta, de 8h30 às 16 horas. Outras informa- cabendo ressaltar os seguintes conjuntos: ções: telefones (21) 2104-5517/2104-5488 e “Personalidades”, composto por registros Retelma 8110-5488 ou pelo e-mail dphdm. pessoais de militares e autoridades que [email protected].

264 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO FRAGATA CONSTITUIÇÃO PARTICIPA DO CENTENÁRIO DA 1a GUERRA MUNDIAL

A Fragata Constituição atra- cou, em 17 de junho último, na Base Naval de Brest, na França, para participar das comemorações alusivas ao centenário da Primeira Guerra Mundial. Entre os eventos protocolares cumpridos, destaca- ram-se a visita ao comandante em chefe para o Atlântico da Marinha Nacional da França, Vice-Almi- rante de Esquadra Emmanuel de Oliveira, e a visita ao gabinete do prefeito de Brest, François Cuillan- dre, ambas em 21 de junho. No dia 22, o comandante do Contingente da Fragata Constituição durante a parada militar navio, Capitão de Fragata Neyder Camillo de Barros, e uma representação de da Alemanha; Arlington, dos Estados Uni- 28 militares da tripulação participaram da dos; Primauguet, da França; James Joyce, cerimônia militar no monumento erguido da Irlanda; e Richmond, do Reino Unido. pelos norte-americanos na cidade de Brest A Constituição desatracou de Brest em em homenagem ao marcante acontecimento 26 de junho e iniciou seu regresso ao Brasil, na história mundial. Ao final da cerimônia, com paradas logísticas previstas em Las houve desfile militar. No dia seguinte, foi re- Palmas, na Espanha, e Fortaleza (CE). A alizada parada naval na baía da cidade, com a fragata chegou ao Rio de Janeiro em 23 de participação, além da Constituição, de mais julho, após mais de dois meses em comissão. cinco navios de Marinhas amigas: Lübeck, (Fonte: www.mar.mil.br)

FUZILEIROS NAVAIS SÃO AGRACIADOS COM MEDALHA DAS NAÇÕES UNIDAS

Os militares componentes do 26o Con- ção no Haiti (Minustah). Estiveram presen- tingente do Grupamento Operativo de Fu- tes ainda, o embaixador do Brasil no Haiti, zileiros Navais no Haiti foram agraciados, Fernando de Mello Vidal, e o comandante em 23 de agosto último, com a Medalha das do Componente Militar da missão, General Nações Unidas. A cerimônia de entrega, de Divisão Ajax Porto Pinheiro. realizada no Haiti, foi presidida pela di- A tradicional cerimônia, denominada de plomata norte-americana Susan Page, atual Medal Parade (Parada da Medalha), tem representante especial para Lei e Justiça como propósito agraciar os mantenedores do Secretário-Geral das Nações Unidas na da paz que atuam em missões de paz pelo Missão das Nações Unidas para Estabiliza- mundo sob a égide da Organização das

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Nações Unidas. Nessa edição, a Medal Parade foi realizada no Ba- talhão Brasileiro de Força de Paz, sendo prestigiada por representan- tes civis e militares dos diversos países que atuaram na missão. Os 181 militares da Marinha do Brasil que integram o 26o Con- tingente foram agraciados com a Medalha das Nações Unidas re- ferente à Missão de Estabilização no Haiti. As cores verde, azul e branco da medalha representam a potencialidade econômica do Fuzileiros Navais cantam o Hino do Haiti país caribenho e sua flora, seu mar e a paz auferida, respectivamente. Unidas ao estabelecer a Minustah, em Nos discursos proferidos pela diplomata 2004. Eles reiteraram o desempenho do Susan Page e pelo General Ajax, foram Brasil ao atuar no comando do componente ressaltados o profissionalismo das tropas militar da missão e exaltaram o prestígio brasileiras e seu trabalho essencial para que o país e seus militares desfrutam no o cumprimento dos objetivos delineados cenário internacional. pelo Conselho de Segurança das Nações (Fonte: www.mar.mil.br)

MILITARES DA MB RECEBEM A PEACEKEEPING MEDAL DAS NAÇÕES UNIDAS

Foi realizada, em 11 de agosto último, os militares que cumpriram os requisitos a cerimônia de imposição da United Na- de elegibilidade estabelecidos por aquela tions Peacekeeping Medal aos militares missão de paz. integrantes do A solenidade 13o Contingen- foi presidida pelo te Brasileiro da Head of Mission Força Interina da and Force Com- Organização das mander, Major- Nações Unidas -General Michael no Líbano (FTM- Beary, do Exér- -Unifil). O evento cito Irlandês, e ocorreu a bordo contou com a da Fragata União, presença do mi- navio capitânia da nistro conselheiro Força-Tarefa Ma- da Embaixada do rítima da Unifil, Brasil no Líbano, e teve como pro- Head of Mission and Force Commander, Major-General Michael Henrique Ferra- pósito agraciar Beary inspeciona o 13o Contingente Brasileiro da Unifil ro; do comandan-

266 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO

te da FTM-Unifil, Contra-Almirante Sergio marítima, com o propósito de prevenir a Chaves Junior; do comandante da Marinha entrada, por via marítima, de armas não libanesa, Contra-Almirante Majed Alwan, autorizadas em território libanês e apoiar a além de diversas personalidades civis e mili- qualificação dos militares daquela Marinha, tares locais e de países integrantes da missão. contribuindo, assim, para a estabilidade na A FTM-Unifil foi criada em 15 de região do Oriente Médio. outubro de 2006, em atendimento à Reso- Sob o comando da Marinha brasileira lução 1.701 do Conselho de Segurança das desde fevereiro de 2011, a FTM-Unifil Nações Unidas, por solicitação do governo possui um estado-maior multinacional e libanês, tendo a peculiaridade de ser a única sete navios de seis diferentes nacionalida- Força-Tarefa Marítima componente de uma des: Alemanha, Bangladesh, Brasil, Grécia, missão de paz da ONU. Tem como missão Indonésia e Turquia. a execução de operações de interdição (Fonte: www.mar.mil.br)

DOAÇÃO DE OBRA À DPHDM

A Diretoria do Patrimô- nio Histórico e Documenta- ção da Marinha (DPHDM) recebeu, em agosto último, doação da pintura a óleo sobre madeira “R 25 Almi- rante Guillobel”, de autoria de Oscar Tecidio. A doação foi feita pelo Almirante de Esquadra (Refo) João Afon- so do Prado Maia de Faria. A obra apresenta o rebo- cador da classe Almirante Guilhem em 1935, próximo à Ilha da Trindade, locali- zada no Oceano Atlântico, a cerca de 1.200 km a leste da sede do município de Vitória (ES). R 25 Almirante Guillobel

INAUGURADA ÁREA DE LAZER DA AGÊNCIA FLUVIAL DE EIRUNEPÉ

Foi inaugurada, em 30 de maio último, a presidida pelo comandante do 9o Distrito Na- área de lazer Recanto do Marinheiro, em Ei- val, Vice-Almirante Luís Antônio Rodrigues runepé (AM). A cerimônia de inauguração foi Hecht, em visita às organizações militares do

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Sistema de Segurança do Tráfego Aquaviário (SSTA). O espaço foi idealizado para que os militares da Agência Fluvial de Eirune- pé e seus familiares possam se confraternizar e receber visitas de autoridades civis e militares da região. (Fonte: www.mar.mil.br) Área de lazer da agência

NPa PARATI DESPEDE-SE DO SERVIÇO ATIVO DA ARMADA

Em cerimônia presidida pelo chefe do dade homônima localizada no litoral do Rio Estado-Maior da Armada, Almirante de de Janeiro (RJ). Foi construído no Arsenal Esquadra Luiz Guilherme Sá de Gusmão, de Marinha do Rio de Janeiro, na Ilha das o Navio-Patrulha (NPa) Parati despediu-se, Cobras, seguindo o projeto da classe Cape, em 30 de agosto último, do serviço ativo da da Guarda Costeira dos Estados Unidos Armada. A Mostra de Desarmamento, que da América, tendo sido financiado por aconteceu na Base Naval de Val-de-Cães, fundos do Foreign Military Sales. Teve sua em Belém (PA), quilha batida em é a cerimônia que 23 de outubro de encerra ou inter- 1968 e foi lan- rompe a vida mi- çado ao mar em litar de um navio 19 de outubro da Armada, por de 1970, sendo motivo de bai- incorporado à xa definitiva ou Armada em 29 temporária. de julho de 1971. Durante 46 Em 29 de anos de serviços julho de 2017, prestados à Ma- comemorou 46 rinha do Brasil anos de incor- (MB), o Parati Mostra de Desarmamento do Navio-Patrulha Parati poração, tendo participou de im- atingido as mar- portantes comissões no Brasil e no exterior, cas de 3.080 dias de mar e 179.960 milhas como a Caribex, que visa contribuir para a náuticas navegadas. Está subordinado ao ação de presença e estreitamento do rela- Comando do 4o Distrito Naval (Belém- cionamento com os países visitados no Ca- -PA) e integra o Comando do Grupamento ribe, e a Ribeirex, que tem o propósito de de Patrulha Naval do Norte, tendo como adestrar tripulações dos navios e tropas de área de atuação o litoral dos estados do fuzileiros navais em operações ribeirinhas. Pará, Maranhão, Piauí, Amapá e também O NPa Parati é o segundo navio da MB os rios da Amazônia. a ostentar esse nome, em homenagem à ci- (Fonte: www.mar.mil.br)

268 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO ASSUNÇÃO DE CARGOS POR ALMIRANTES

– Contra-Almirante Newton Calvoso Operacional e de Operações do Comando Pinto Homem, adido Naval nos Estados de Operações Navais, em 21/8; Unidos da América e no Canadá, em 12/7; – Contra-Almirante Ralph Dias da – Vice-Almirante Marcos Silva Ro- Silveira Costa, comandante do Centro drigues, vice-chefe do Estado-Maior da de Instrução Almirante Alexandrino, Armada, em 13/7; em 22/8; – Vice-Almirante Edervaldo Teixeira – Contra-Almirante Carlos Eduardo de Abreu Filho, comandante do 4o Distrito Machado dos Santos Dantas, chefe do Naval, em 26/7; Estado-Maior do Comando em Chefe da – Contra-Almirante Amaury Calheiros Esquadra, em 25/8; Boite Junior, superintendente de Manuten- – Contra-Almirante Henrique Renato ção da Diretoria de Gestão de Programas Baptista de Souza, comandante do Cen- da Marinha, em 1/8; tro de Instrução Almirante Wandenkolk, – Contra-Almirante Sérgio Nathan em 28/8; Marinho Goldstein, comandante do 7o – Contra-Almirante Paulo Cesar Distrito Naval, em 2/8; Demby Corrêa, subchefe de Organiza- – Vice-Almirante Alipio Jorge Rodri- ção do Comando de Operações Navais, gues da Silva, comandante em chefe da em 29/8; Esquadra, em 7/8; – Contra-Almirante Sergio Ricardo – Contra-Almirante Amintas da Silva Segovia Barbosa, diretor do Pessoal Civil Viamonte, chefe do Estado-Maior do Co- da Marinha, em 31/8; mando do 1o Distrito Naval, em 9/8; – Contra-Almirante Paulo César Colme- – Contra-Almirante Alexandre Rabello nero Lopes, comandante da 1a Divisão da de Faria, comandante da Força de Super- Esquadra, em 14/9; fície, em 10/8; – Almirante de Esquadra Ilques Barbosa – Almirante de Esquadra Celso Luiz Junior, chefe do Esatdo-Maior da Armada, Nazareth, diretor-geral do Pessoal da Ma- em 15/9; e rinha, em 18/8; – Contra-Almirante Valter Citavicius – Contra-Almirante Wladmilson Bor- Filho, diretor de Assistência Social da ges de Aguiar, subchefe de Inteligência Marinha, em 19/09.

POSSE DO DIRETOR-GERAL DO PESSOAL DA MARINHA

Foi realizada, em 18 de agosto último, a AGRADECIMENTO E DESPEDIDA cerimônia de transmissão do cargo de dire- DO ALMIRANTE ILQUES tor-geral do Pessoal da Marinha, presidida pelo comandante da Marinha Almirante de “Após dois anos e oito meses de na- Esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira. vegação, a Diretoria-Geral de Pessoal da Assumiu o Almirante de Esquadra Celso Marinha (DGPM) está demandando águas Luiz Nazareth, em substituição ao Almi- abrigadas, para o embarque do Almirante rante de Esquadra Ilques Barbosa Junior de Esquadra Celso Luiz Nazareth, diretor-

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Cerimônia de posse do DGPM

-geral de Pessoal da Marinha nomeado. pois os êxitos alcançados envolvem a con- Aprestada, a DGPM tem como previsto tribuição para o aprimoramento de matrizes pairar sob máquinas e, na brevidade possí- estratégicas relacionadas à capacitação das vel, continuar o apoio ao bom combate em tripulações dos meios navais, aeronavais e andamento nos espaços oceânicos e nas de fuzileiros navais da invicta Marinha de extensas hidrovias do nosso Brasil. Tamandaré, assim como o fortalecimento A bordo, além das informações adicio- do bem-estar da Família Naval. nais, que ultimam a passagem do timão De início, como primeiro ponto da desse Órgão de Direção Setorial (ODS), carta ao Almirante de Esquadra Eduardo constatamos que devemos – pronto – re- Bacellar Leal Ferreira, comandante da Ma- tornar para a área de operações, onde o rinha, agradeço as orientações, a paciência chefe do Estado-Maior da Armada e os com as minhas imperfeições e o relaciona- outros ODS, liderados pelo comandante mento pautado em fidalguia naval. Renovo da Marinha, permanecem defendendo os a minha lealdade e crença nos destinos da nossos interesses. Marinha e do Brasil. Ao longo dessa singradura constato, que Agradeço os exemplos e apoios do foram decisivas, para os eventuais êxitos Almirante de Esquadra Alfredo Karam e alcançados, a distinção e a excelência da do Almirante de Esquadra Mauro Cesar fidalguia naval e a magnitude e amplitude Rodrigues Pereira, ex-ministros da Mari- do apoio e aprendizados recebidos pelo nha; do Almirante de Esquadra Roberto diretor-geral do Pessoal da Marinha. de Guimarães Carvalho, ex-comandante da Assim, especialmente na Era do Conhe- Marinha; e do então comandante da Ma- cimento, quero expressar a minha gratidão, rinha, Almirante de Esquadra Julio Soares

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de Moura Neto, a indicação e as diretrizes honra ter a oportunidade de desfrutar bons iniciais para exercer a honrosa Direção- momentos de ordem profissional e pessoal. -Geral do Pessoal da Marinha. A uma tripulação que não poupa esforços Agradeço aos ministros do Superior para bem cumprir sua missão, determino Tribunal Militar as orientações, demons- içar, na adriça de boreste: Bravo Zulu e trações de apreço e, especialmente, o apoio Alfa Delta 28. por meio de palestras em organizações Às Voluntárias Cisne Branco, que, em militares de formação de pessoal da MB. todo o Brasil, contribuem para o bem-estar Aos diletos amigos membros do Al- da Família Naval e o cumprimento da mis- mirantado, atuais e aqueles que também são da MB, um agradecimento especial. tiveram a honra de compor este excelso À Sociedade Amigos da Marinha e à colegiado, agradeço o irrestrito apoio e Comunidade Marítima, outro agradecimen- as pertinentes contribuições apresentadas to, pela distinção e pelo constante apoio às durante a elaboração dos nossos trabalhos. iniciativas da Diretoria-Geral de Pessoal Aos insignes chefes navais de ontem, da Marinha. hoje e de sempre, estimados pares e subor- Ao Tribunal de Contas da União, aos dinados, agradeço os importantes auxílios à Tribunais Regionais Federais, ao Minis- navegação, caracterizados pelos exemplos tério Público Militar e ao Ministério Pú- de profissionalismo e de busca constante blico Federal, agradeço a oportunidade do pelo aprimoramento moral. contraditório, que, seguramente, permitiu Aos irmãos de armas do Ministério da o aprimoramento da gestão do Pessoal na Defesa e dos também invictos Exército Marinha do Brasil. Da mesma maneira, Brasileiro e Força Aérea Brasileira, além agradeço à Advocacia-Geral da União pela de agradecer a colaboração, destaco o sadio permanente parceria nos assuntos jurídicos espírito de corpo observado em diversas e administrativos de interesse da DGPM. ocasiões. Como sempre, um privilégio estar À Academia Brasileira de Ciências e entre bravos. à Academia Brasileira de Letras, agra- Agradeço a excelência do apoio, ami- deço as orientações, principalmente na zade e profissionalismo observados nos identificação de iniciativas destinadas prezados almirantes que, durante nossa ao aprimoramento do Sistema de Ensino navegação, exerceram a direção da Di- Naval e do Sistema de Saúde da Marinha. retoria do Pessoal Militar da Marinha, Nesse contexto, também agradeço ao Diretoria de Ensino da Marinha, Diretoria Instituto Tecnológico da Aeronáutica, à de Saúde da Marinha, Diretoria de Pessoal Universidade Federal do Rio de Janeiro, à Civil da Marinha e Diretoria de Assistência Universidade Federal Fluminense, à Pon- Social da Marinha, assim como a Fundação tifícia Universidade Católica e à Sociedade Amarcílio e o Abrigo do Marinheiro e as Beneficente Israelita Brasileira – Hospital suas respectivas e aguerridas tripulações. Albert Einstein. Da valente tripulação da DGPM, lide- Aos integrantes da vela do Programa rada por excelentes chefes de Gabinete, Olímpico da Marinha, agradeço a posição destaco o espírito de praça-d'armas, o sempre a barlavento, nas inúmeras e vito- apoio, sobretudo em momentos difíceis, riosas parcerias. o elevado profissionalismo e o sempre Ao Almirante de Esquadra Celso Luiz oportuno e correto assessoramento – um Nazareth, a quem tenho a honra de passar agradecimento especial. Sem dúvida, uma o timão da DGPM, desejo continuado êxito

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em sua brilhante carreira e felicidades, ex- – implementação do Programa de Ges- tensivas a sua distinta família. Boas águas! tão de Pessoal, com valorização à merito- Finalmente, diante da oportunidade de cracia e incentivo à participação da Força aprimoramento – atender ao maior patrimô- de Trabalho da MB; nio da nossa Marinha –, agradeço a Deus, – aperfeiçoamento na coordenação do aos espíritos superiores e a minha família preparo do pessoal e gestão de conheci- pelas constantes orientações ao longo desta mento do Prosub e do Programa Nuclear singradura, rogando que permaneçam na da Marinha; vigilância nesse marinheiro iniciante nas – atualização da sistemática de avaliação lides do bem.” de oficiais e praças, na busca pela distinção dos melhores talentos e no incentivo ao AGRADECIMENTO E BOAS-VINDAS contínuo aperfeiçoamento individual; DO COMANDANTE DA MARINHA – aprimoramento nos processos de cap- tação dos oficiais e praças temporários, pos- “Após um período de, aproximadamen- sibilitando melhor seleção para o Serviço te, dois anos e oito meses de singular dedi- Militar Voluntário de jovens formados em cação e intensos trabalhos, o Almirante de instituições de ensino civis que apresentam Esquadra Ilques Barbosa Junior transmite, alta capacitação técnica e notório saber; na presente data, o cargo de Diretor-Geral – elaboração dos estudos e propostas de do Pessoal da Marinha. mudanças da legislação para possibilitar o Valendo-se de elevado espírito empreen- embarque de militares do sexo feminino dedor, inabalável persistência na obtenção em navios e em tropa, bem como permitir a de resultados e permanente preocupação e essas jovens optar pelos corpos da Armada cuidado com o ser humano, o Almirante e de Fuzileiros Navais na Escola Naval; Ilques promoveu importantes e oportunos – criação do Plano de Capacitação para aprimoramentos e modernizações no Setor Servidores Civis da Marinha; e do Pessoal, todos fundamentados em minu- – modernização do Sistema de Saúde ciosos estudos e análises. Naval com o aprimoramento da gestão, Sempre atento às aspirações dos mili- visando ao melhor aproveitamento dos tares e servidores civis, dedicou-se, com recursos alocados, a continuação da re- afinco, a desenvolver novos canais de vitalização do Hospital Naval Marcílio comunicação da Força com seu pessoal, Dias, o intercâmbio de conhecimentos a buscar melhores práticas e soluções com outros hospitais de excelência e a inovadoras de sucesso em outras Marinhas execução do projeto-piloto de Serviço de e a estimular iniciativas internas voltadas Medicina Integrada na Policlínica Naval ao aperfeiçoamento das carreiras e à efi- Nossa Senhora da Glória. ciência de gestão. Prezado Almirante Ilques, no momento Suas elevadas qualidades pessoais e em que Vossa Excelência se despede da profissionais, notadamente a liderança, Diretoria-Geral do Pessoal da Marinha, cortesia, singular inteligência e ponderação, externo minha admiração pelo inestimável foram determinantes para as conquistas legado deixado, por seu jeito conciliador alcançadas no Programa Estratégico e amigo e pela coragem e determinação ‘Marinha 2030 – Pessoal: nosso maior em bem conduzir e implementar virtuosas patrimônio’, entre as quais tenho o dever e mudanças no seu setor. Agradeço sua leal- a satisfação de registrar: dade e seu comprometimento e expresso a

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satisfação em continuar dispondo de sua diversas Organizações Militares, tenho valorosa assessoria no distinto cargo que absoluta convicção da grandeza dos desa- assumirá em breve, de chefe do Estado- fios que enfrentarei e da complexidade das -Maior da Armada. Desejo-lhe muitas atividades concernentes ao gerenciamento felicidades nesta nova etapa de sua vida, de vidas e anseios das pessoas. extensivas à sua esposa Leoniza e às suas Contudo, confiante e seguro estou, pelas filhas Larissa e Christina. experiências adquiridas ao longo de mais de Bravo Zulu! Bons ventos e mares tran- 43 anos de serviço vividos na nossa querida quilos!” Marinha do Brasil e pelos belos exemplos Ao Almirante de Esquadra Celso Luiz recebidos de profissionalismo e correção. Nazareth, apresento as boas-vindas à Dire- Portanto, neste momento único e de toria-Geral do Pessoal da Marinha, certo de extrema felicidade pessoal, sou grato ao que possui todos os atributos necessários Almirante de Esquadra Eduardo Bacellar para o sucesso nesta desafiante e empol- Leal Ferreira, comandante da Marinha, gante missão, sua primeira como almirante pela confiança mais uma vez em mim de- de esquadra. Para tanto, terá como impor- positada na indicação do meu nome para o tante ferramenta de trabalho a experiência cargo que ora recebo. Espero corresponder adquirida nos 43 anos de serviço, cerca de às expectativas de Vossa Excelência com 1.100 dias de mar e 10.300 horas de imer- lealdade, coragem moral e total disponibi- são em relevantes e destacadas comissões, lidade para o serviço. dentre as quais ressalto a Escola Naval, os Ao mais antigo ex-diretor-geral do comandos do Aviso de Instrução Aspirante Pessoal da Marinha, e ex-ministro da Nascimento, do Submarino Timbira e da Marinha, Almirante de Esquadra Alfredo Força de Submarinos e os cargos de adido Karam, agradeço, de maneira especial, naval nos Estados Unidos da América os ensinamentos, a sincera amizade e as e no Canadá e de chefe do Gabinete do demonstrações de apreço. Comandante da Marinha, culminando no Destaco também as honrosas presenças prestigiado cargo de comandante em chefe do Almirante de Esquadra Mauro Cesar Ro- da Esquadra. drigues Pereira, ex-ministro da Marinha; dos Estou seguro de que suas credenciais Almirantes de Esquadra Roberto de Guima- são a garantia de que manteremos a evolu- rães Carvalho e Julio Soares de Moura Neto, ção permanente desse relevante Órgão de ex-comandantes da Marinha; dos membros Direção Setorial. do Almirantado; dos ministros do Superior Seja feliz!” Tribunal Militar; do procurador-geral da Justiça Militar; dos ex-diretores-gerais do PALAVRAS INICIAIS DO Pessoal da Marinha e dos antigos e atuais ALMIRANTE NAZARETH chefes navais, que, com seus exemplos de liderança e amor pela Marinha, deixam um “Ao assumir a Direção-Geral do Pes- belo legado a ser seguido. soal da Marinha, externo minha alegria, Às autoridades civis e militares presen- honra e privilégio pela tão nobre missão tes e representadas, senhores generais e recebida: lidar com o maior patrimônio brigadeiros, servidores civis, integrantes de nossa instituição. Por ter atuado no da Sociedade Amigos da Marinha (Soa- Setor de Pessoal por alguns anos, tratando mar), peço desculpas por não nominá-los, dos assuntos mais variados possíveis em estimados amigos e familiares que aqui

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comparecem, alguns vindos de tão longe, portante ajuda não chegaria a este porto afirmo que suas presenças emprestam um seguro. Continuo contando com o apoio e brilho muito especial a esta cerimônia. o incentivo de vocês. A Vossa Excelência Reverendíssima Dirijo-me agora aos oficiais, praças Dom Fernando José Monteiro Guimarães, e servidores civis da Diretoria-Geral do arcebispo militar do Brasil, agradeço a Pessoal da Marinha e das Organizações presença e o constante zelo, guiando os Militares subordinadas, desejando exter- trabalhos dos capelães militares não só em nar que os senhores serão fundamentais nossa Marinha, mas também nas Forças para eu levar a bom termo a minha mis- co-irmãs, onde tem marcado presença são. Os novos desafios que se aproximam paterna constante. implicam sensíveis transformações, as Aos meus amigos e companheiros da quais, para serem atendidas, demandarão Turma Alexandrino, que no longínquo o devido acompanhamento da gestão de ano de 1974, iniciaram comigo nossa jor- pessoas por competência, os ajustes ne- nada de fé e amor à Marinha, agradeço o cessários no efetivo da Força e o aprimo- companheirismo e a amizade que sempre ramento das carreiras de nossos militares, me confiaram. tendo sempre como farol o interesse do À diretora nacional das Voluntárias serviço. Por isso, pregaremos que não se Cisne Branco, Senhora Christiani Prisco faz nada sozinho, pois, em nossa ativida- Leal Ferreira, e a todas que compõem essa de, equipe é tudo. Cultivaremos um am- briosa equipe, bem como à Senhora Léa biente de trabalho forjado na disciplina, Medeiros e às colaboradoras “anjos azuis” na união e no respeito mútuo, com todos do Hospital Naval Marcílio Dias, juntamen- sintonizados em um só ideal: servir bem te com as dedicadas senhoras que laboram à Marinha e ao Brasil. nos programas assistenciais da Marinha, Sinceramente, estou imbuído e ansioso deixo o meu compromisso de contribuir para ‘arregaçar as mangas’ e iniciar os tra- com as iniciativas e os projetos em prol da balhos. Darei o melhor de mim para realizar nossa Família Naval. uma boa gestão, a fim de corresponder às Ao Almirante de Esquadra Ilques Bar- expectativas de todos os amigos que de- bosa Junior, sou grato pela maneira cortês positam sua confiança neste chefe naval. e profissional com que me transmitiu os Trabalharemos de forma serena, profis- assuntos atinentes a esta Diretoria-Geral sional e pró-ativa, buscando a necessária e por todas as gentilezas com as quais me interação com os Órgãos de Direção Seto- distinguiu. Desejamos aos amigos Ilques rial e Geral, dando sequência, de maneira e Leoniza e a sua bela família um período prática e direcionada, aos projetos em de- repleto de alegrias e realizações, em Bra- senvolvimento, buscando o aprimoramento sília, no cargo de chefe do Estado-Maior e a adaptação necessária, consciente de que da Armada, que em breve assumirá. Sejam nessa área tudo deve ser bem planejado e muito felizes! sempre pensado a longo prazo. A minha mãe, meus filhos, genro, Finalmente, não por último, agradeço ao e, em especial, a minha esposa Fátima, bom Deus por sempre estar ao meu lado e companheira de todas as travessias, a rogo que me ilumine nas decisões a tomar minha eterna gratidão pelo carinho e pela e na escolha dos melhores rumos a seguir. paciente compreensão, pois sem essa im- Viva a Marinha!”

274 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO 11o CONCURSO DE ARTIGOS PARA A REVISTA DA AVIAÇÃO NAVAL

Foram os seguintes os trabalhos ven- de caso: atenuação dos estressores de voo cedores do 11o Concurso de Artigos para durante evacuação aeromédica de militar a Revista da Aviação Naval: 1o lugar) “O politraumatizado, vítima de acidente auto- M'Arms e a Manutenção Preditiva – Uma mobílistico em missão no interior de Minas ferramenta valiosa para a Segurança de Gerais”, do Capitão-Tenente (Md) Caio Voo”, de autoria do Capitão de Corveta Cesar Leite Barros (Policlínica Naval de (FN) Carlos Eduardo Nunes Pessanha (do São Pedro da Aldeia). 3o Esquadrão de Helicópteros de Uso Ge- O concurso tem o propósito de promover ral); 2o) “1a Jornada de CRM no Esquadrão a cultura de Segurança de Aviação junto ao HU-5: a importância de difundir uma cultura pessoal da Marinha do Brasil. Os artigos de aprendizagem sobre a influência do fator concorrentes devem abordar temas volta- humano na atividade aérea”, da Primeiro- dos aos diversos aspectos da prevenção de -Tenente (T) Simone Maranhão Dinely (5o acidentes aeronáuticos e provocar, por meio Esquadrão de Helicópteros de Uso Geral); da leitura, a prática de comportamentos 3o) “A nova Política de Gestão de Riscos seguros no universo de leitores da revista. da MB – Inspirando-se na Segurança de Os trabalhos premiados serão pu- Aviação”, do Capitão de Fragata Alessandro blicados na Revista da Aviação Naval, Pires Black Pereira (Diretoria-Geral do Ma- publicação da Diretoria de Aeronáutica terial da Marinha); 4o) “Memória Operativa da Marinha, e seus autores receberam os em convés de voo em navio-aeródromo”, seguintes prêmios: 1o lugar) um notebook, do Suboficial (AV-RV) Odonaldo Alves 2o) um tablet, 3o) uma impressora, 4o) um de Castro Carvalho (1o Esquadrão de smartphone e 5o) um Kindle. Helicópteros de Uso Geral) e 5o) “Relato (Fonte: Bono no 634, de 18/8/2017)

CONCURSO DA REVISTA PASSADIÇO

Após avaliação conduzida pela Comis- Leão – CAAML); 3o) “A realidade virtual são Julgadora dos artigos e das fotografias e aumentada aplicada ao meio militar”, do que participaram do concurso da edição Primeiro-Tenente Victor Fernando Teles 2017 da revista Passadiço, sagraram-se Romeiro (Corveta Barroso); 4o) “Sistema de vencedores os seguintes trabalhos: Monitoramento Acústico Submarino”, do – Categoria Melhor Artigo: 1o lugar) Capitão-Tenente Michel Pessoa da Cunha “A Aviação Naval russa em combate na (Navio-Patrulha Babitonga); e 5o) “Mísseis Síria”, do Capitão de Mar e Guerra Marcelo Superfície-Superfície (MSS) na atualidade: Veloso de Paula (Comando de Operações diferentes concepções e futuras tendências”, Navais); 2o) "Veículos aéreos não tripu- do Primeiro-Tenente Rafael Bortolami lados colaborativos e a importância do Catanho da Silva (Fragata Independência). emprego nas Operações SAR”, do Capitão – Categoria Melhor Fotografia: o1 lugar) de Corveta Tiago Duarte Neves (Centro CT Alberto Ferreira Filho (CAAML); 2o) de Adestramento Almirante Marques de CMG Ricardo Silveira Mello (Fragata

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Liberal); 3o) Segundo-Sargento Flávio Ro- A revista Passadiço, publicação anual berto Gomes Sousa (Estação Naval do Rio do Centro de Adestramento Almirante Grande); e Menção Honrosa) Capitão de Marques de Leão, existe desde 1987. Fragata Cláudio Pinto Cardoso (CAAML). (Fonte: Bono no 661, de 30/8/2017)

PROMOÇÃO DE ALMIRANTES

Foram promovidos por Decreto Presi- -Almirante, o Contra-Almirante Petronio dencial, contando antiguidade a partir de Augusto Siqueira de Aguiar; ao posto de 31 de julho de 2017, os seguintes oficiais: Contra-Almirante, os Capitães de Mar e – No Corpo da Armada: ao posto de Guerra Amaury Calheiros Boite Junior e Almirante de Esquadra, o Vice-Almirante Amintas da Silva Viamonte. Celso Luiz Nazareth; ao posto de Vice- (Fonte: Bono Especial no 579, de 27/7/2017)

NAsH CARLOS CHAGAS RECEBE VISITA DE RIBEIRINHA NASCIDA A BORDO

O Navio de Assistência Hospitalar Tavares Perna, moradora da comunidade (NAsH) Carlos Chagas recebeu, em 1o de Jarilândia (AP) que, em 24 de novem- de junho último, a visita de Lucélia Carla bro de 1989, nasceu no centro cirúrgico do navio, recebendo o nome Carla como homenagem à embarca- ção. Acompanhada das filhas, Lucélia recebeu atendimento médico e odontológico e co- nheceu o navio onde nasceu. A mãe dela, Lucinéia Tavares Perna, de 53 anos, também participou da visita. Além de Lucélia Carla, outras duas ex-moradoras de Jarilândia (AP) nasceram no navio no mesmo dia e também receberam o nome Carla como homenagem. Lucélia Carla durante visita ao navio, onde nasceu há 27 anos (Fonte: www.mar.mil.br)

REBOCADOR-MUSEU LAURINDO PITTA DOCA NO AMRJ

O Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro para reparos do Rebocador Laurindo (AMRJ) realizou, em 24 de agosto último, Pitta. Os principais serviços que serão no Dique Almirante Jardim, a docagem executados no navio serão a inspeção estru-

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tural ultrassônica nas obras vivas e mortas do chapeamento e a substituição de redes e conexões de resfria- mento das buchas de bombordo e boreste. Construído em 1910, o Laurindo Pitta participou, em 1918, da Primeira Guerra Mundial, em tarefas de apoio. Único rema- nescente da Divisão Naval em Operações de Guerra (DNOG), o rebocador foi restau- Laurindo Pitta docado no Dique Almirante Jardim rado em 1997, quando ganhou assentos para 90 passageiros e Desde então, vem sendo empregado na um compartimento onde é apresentada a realização de passeios marítimos pela Baía exposição permanente “A participação da de Guanabara. Marinha na Primeira Guerra Mundial”. (Fonte: www.mar.mil.br)

COMBOIO LOGÍSTICO REGRESSA A LADÁRIO

O Grupamento de Fuzileiros Navais de Todo o planejamento do comboio foi Ladário (GptFNLa), realizou, de 4 a 19 de baseado nos procedimentos previstos no julho último, comboio logístico de 3.700 Manual de Deslocamento Motorizado km, percorrendo o trajeto Ladário/Rio de de Fuzileiros Navais, publicação que Janeiro/Ladário com um carregamento de consolidou a experiência acumulada nos carga de 12 toneladas. Deslocamentos Motorizados para Formosa O comboio foi composto por nove milita- (GO) e para Três Corações (MG), realiza- res e três viaturas de cinco toneladas, e teve o dos pelo Corpo de Fuzileiros Navais nos propósito de levar para o Rio de Janeiro ma- últimos anos. terial ressalvado e equipamentos, como arma- O sucesso deste comboio possibilita mentos e rádios, para manutenção e voltar para que este canal logístico terrestre seja Ladário (MS) com sobressalentes e material utilizado para minimizar as dificuldades destinado à área do 6o Distrito Naval, além logísticas envolvidas na manutenção da de transportar parcela do equipamento para capacidade operativa de meios que operam a Operação Acrux VIII, como embarcações na fronteira oeste do País. pneumáticas e canastras de saúde Foxtrot. (Fonte: www.mar.mil.br)

RMB3oT/2017 277 NOTICIÁRIO MARÍTIMO COMPANHIAS BRASILEIRA E HOLANDESA ASSOCIAM-SE PARA SERVIÇOS DE O&G, INFRAESTRUTURA E LOGÍSTICA

A companhia brasileira GranInvestimen- A nova empresa integrará os serviços tos e a holandesa Royal IHC associaram- de óleo e gás, como manutenção e reparo -se para investir em soluções inovadoras, offshore, e logística já prestados pela Gran integrando serviços de óleo e gás (O&G), com o know-how da Royal IHC em enge- infraestrutura e logística. Com a parceria, nharia e tecnologia no fornecimento de as empresas expandem seus portfólios, suas embarcações e serviços para os mercados áreas de atuação e ampliam seus serviços no offshore, de dragagem e de mineração. Jun- Brasil e na América Latina. A associação tas, as empresas passam a atuar em todas as foi consumada pela aquisição, por parte da etapas da cadeia de valor: fabricação, ins- Royal IHC, de 50% da empresa de serviços talação, integridade e descomissionamento de óleo e gás do Grupo GranInvestimentos, de equipamentos e sistemas. que passará a se chamar GranIHC Services. (Fonte: Ideal H+K Strategies)

JOGO DE GUERRA TRILATERAL/2017

Foi realizado na Escola de Guerra Naval nacional, com emprego de uma Força Naval (EGN), Rio de Janeiro, de 7 a 11 de agosto Multinacional, o jogo tem como propósito último, o Jogo de Guerra Trilateral/2017. promover um fórum acadêmico para inter- O evento contou com a participação de câmbio de ideias e conhecimentos que con- delegações das escolas de Guerra Naval da tribuam para o incremento do entendimento Argentina, do Brasil e do Uruguai. mútuo, na área de planejamento militar, Tomando como base situação fictícia entre as Marinhas dos países participantes. envolvendo análise e solução de crise inter- (Fonte: www.mar.mil.br)

Autoridades e representantes das delegações

278 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO CFAOC RESGATA FAMÍLIA NO RIO NEGRO

A equipe de Inspeção Naval da Capitania resgate de um adulto e duas crianças, uma Fluvial da Amazônia Ocidental (CFAOC) de 4 e outra de 5 anos de idade, no Rio apoiou, na noite de 4 de julho último, o Negro, Amazonas. O bote de alumínio em que eles se encontravam, com um furo no casco, começou a encher de água nas proximidades da Praia de Açutuba. Após receber pedido de socorro por telefone, a equipe de Inspeção Naval da CFAOC solicitou apoio da Polícia Ambiental do Amazonas para iniciar a busca pela embar- cação. A equipe encontrou o bote na margem direita do Rio Negro e transportou o pai e as duas crianças até a comunidade de Cacau Pirêra, no município de Iranduba (AM), onde eles residem. Equipe de Inspeção Naval da CFAOC com família resgatada (Fonte: www.mar.mil.br)

DelLaguna APOIA RESGATE DE NÁUFRAGOS

A Delegacia da Capitania dos Portos em Laguna (DelLaguna) apoiou, em 2 de setembro último, o resgate dos sete tripulantes do Barco Pesqueiro São Diego A. Após receber pedido de socorro infor- mando que a embarcação estava naufragando, a Delegacia iniciou, então, chamadas via rádio para que embarcações próximas efetuassem o socorro dos tripulantes. Na sequência, o Barco Pesqueiro Igor Martins I atendeu ao pedido e resgatou os tripulantes com vida. Os pescadores resgatados foram conduzidos para a sede da Delegacia. (Fonte: www.mar.mil.br) Tripulantes resgatados chegando à delegacia

RMB3oT/2017 279 NOTICIÁRIO MARÍTIMO MB REALIZA RESGATES NO PANTANAL

A Capitania Fluvial do Pantanal (CFPN) realizou, no dia 20 de agosto último, o resgate de três embarcações no Pantanal Matogrossense, com um total de nove pessoas socorridas. Os resgatados não necessitaram de auxílio médico e desembarcaram em segurança em Corumbá (MS). As embarcações resgatadas, de pequeno porte, foram impactadas por severas alterações meteorológicas na área do Pantanal, com fortes rajadas de vento e ondas no Rio Paraguai, que provocaram avarias mecânicas, colocando-as em situação de risco. (Fonte: www.mar.mil.br) Resgate a bordo da embarcação da CFPN

CPSC E DelITAJAÍ PRESTAM APOIO EM RIO DO SUL

Equipes da Capitania dos Portos de Santa Catari- na (CPSC) e da Delegacia da Capitania dos Portos em Itajaí (DelItajaí) prestaram apoio, de 5 a 9 de junho último, ao 5o Batalhão de Bombeiros Militar e à Defe- sa Civil de Rio do Sul (SC). Em decorrência das fortes chuvas na região e do trans- bordamento da barragem de Ituporanga, o município mais uma vez sofreu com problemas de enchentes, tornando-se um dos mais Lancha da CPSC transportando flagelados afetados do Estado. A CPSC e a DelItajaí utilizaram embar- caminhão para o transporte de pessoas e ma- cações de alumínio com motorização de teriais que estavam em locais de difícil acesso. popa, bote inflável, uma viaturapick up e um (Fonte: www.mar.mil.br)

280 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO NAsH DOUTOR MONTENEGRO ATENDE CRIANÇA

O Navio de Assistência Hospitalar esquerdo. A criança viajava em uma embar- (NAsH) Doutor Montenegro prestou atendi- cação regional, e a solicitação para o NAsH mento, em 12 de junho último, a uma criança prestar o atendimento foi feita quando este de seis anos com suspeita de fratura no braço navio navegava no Rio Purus (AM). A criança havia sofrido uma queda e estava, há um dia, com edema local, sentindo dor no ombro, na cintura e com limitação de movimento. Os profissio- nais de saúde do navio, auxiliados por uma equipe da Universidade Positivo, prestaram os primeiros atendimentos à criança a bordo do navio. Foi realizada radiografia no ombro da paciente, o que evidenciou uma fratura completa no úmero esquerdo, sendo a criança anestesiada e imobilizada. Após o atendimento, a criança foi encaminhada Criança rodeada pelo pessoal que a atendeu a bordo do para o hospital regional. NAsH, incluindo equipe da Universidade Positivo (Fonte: www.mar.mil.br)

AMRJ EXPÕE BARCO SOLAR

O Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro (AMRJ) participou, em 26 e 27 de agosto último, do Gran- de Jogo Naval, que reuniu todos os grupos escoteiros do mar do Estado do Rio de Janeiro na Área Recreativa, Esportiva e Social de São Gonçalo (Ares-SG). Na ocasião, o AMRJ expôs a Etam-1, embarcação da Escola Técnica do Arsenal de Marinha (Etam) mo- vida a energia solar, e promoveu palestra sobre a tecnologia usada na montagem do barco. Embarcação da ETAM movida a energia solar Aproximadamente 500 jovens estiveram presentes ao evento, mento, a Etam-1 integrou uma barqueata que teve como propósito testar as habili- junto a barcos a vela e a remo dos grupos dades náuticas e técnicas marinheiras que participantes dos jogos. aprenderam durante o ano. No encerra- (Fonte: www.mar.mil.br)

RMB3oT/2017 281 NOTICIÁRIO MARÍTIMO NavegaReserv@

Encontra-se disponível no portal da Ma- bilhete de pagamento (BP Online), Saúde rinha na Internet, no menu “Institucional” Naval, Hotéis de Trânsito da MB, Balcão (lado esquerdo da página), o link para o Naval Online, Portal de Consignações do site do NavegaReserv@, onde os militares Militar, Guia Rápido da Pensão Militar e da Reserva e reformados podem ter acesso links para páginas de internet, como a da a dados de seu interesse e a oportunidade Soamar Brasil. de apresentar suas perguntas/sugestões Também está disponível na página uma para a Força. área dedicada a perguntas/sugestões, que O NavegaReserv@ tem como propó- serão respondidas em tempo hábil (acesso sito concentrar em um único endereço no banner localizado na parte inferior, so- os principais assuntos de interesse da mente por meio de cadastramento). Abaixo reserva naval, disponibilizando conteú- desse banner, encontram-se as instruções dos ostensivos, tais como mensagens do para acesso à área de perguntas/sugestões. comandante da Marinha, periódicos, pu- Outras informações: telefone (61) 3429- blicações oficiais e fotos históricas, além 1707, Capitão-Tenente Pinheiro. de links úteis, como: acesso à consulta ao (Fonte: Bono no 480, de 21/6/2017)

1o CONGRESSO INTERNACIONAL DE CONTRAMEDIDAS DE MINAGEM

Será realizado na Escola de Guerra Na- e forças policiais e grupos de Operações val, cidade do Rio de Janeiro, em 17 e 18 Especiais das áreas de segurança e defesa. de outubro, o 1o Congresso Internacional Os visitantes e os 40 congressistas do Brasil de Contramedidas de Minagem (CICMM). e de outros países terão oportunidade de O evento tem o propó- percorrer dez estandes sito de compartilhar de exposição dos prin- conteúdo sobre o tema cipais fornecedores por meio de exposi- do segmento, enten- ções, painéis, palestras der as operações com e sessões temáticas navios caça-minas e com especialistas e assistir às palestras e autoridades de defesa sessões temáticas que de todas as esferas e abordarão temas como com os principais com- veículos de superfície pradores e expositores não tripulados, veícu- do mercado. los operados remota- Participarão do mente, nanotecnologia Congresso visitantes aplicada na guerra de da Marinha, do Exército, da Aeronáutica e minas, desativação de artefatos explosivos, de agências governamentais, instituições desminagem terrestre e humanitária e táti- de pesquisa, empresas ligadas ao assunto cas de operações com navios caça-minas.

282 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Planejadores, desenvolvedores de concei- da Marinha do Brasil, sob coordenação tos, usuários e tecnólogos de diferentes do Comando do 2o Distrito Naval e com regiões do Brasil e do mundo trarão para apoio do Exército Brasileiro, da Força o evento inovações, necessidades diversas Aérea Brasileira, da Empresa Gerencial de da área e suas experiências em diferentes Projetos Navais (Emgepron) e da empresa ambientes operacionais. ASV Marine Systems. O CICMM, primeiro evento do tipo rea- (Fontes: Bono no 677, de 5/9/2017, e lizado na América Latina, é uma realização www.cicmm.com.br)

III ENCONTRO DE PRESIDENTES DE SOAMAR

Foi realizado em Brasília, em 28 de julho sequência, o comandante da Marinha pa- último, o III Encontro de Presidentes da lestrou sobre a importância estratégica do Sociedade Amigos da Marinha (Soamar). O mar para o Brasil. evento contou com a participação do coman- Líderes de iniciativas como a Operação dante da Marinha, Almirante de Esquadra Cisne Branco (concurso de redação para Eduardo Bacellar Leal Ferreira, e de mais alunos do Ensino Fundamental e Médio, de 60 representantes da Soamar oriundos de promovido pela Marinha) e o Projeto todo o País. No encontro, houve discussão Amazônico de Atendimento Oftalmológico de projetos em andamento e troca de ex- estiveram presentes, como Tereza Velho, periências acerca de temas relacionados à ex-presidente da Soamar-Brasil e fundado- sociedade civil e à Marinha do Brasil (MB). ra da Operação Cisne Branco. O evento teve início com uma palestra O encontro acontece anualmente, desde ministrada pelo presidente nacional da 2015, e é coordenado pelo Centro de Comu- Soamar, Orson Féres. Ele expôs a situação nicação Social da Marinha, que atua como do grupo em diversas regiões do Brasil e elo entre as Soamar e a MB. destacou alguns projetos de sucesso. Na (Fonte: www.mar.mil.br)

Representantes de Soamar de diversas regiões do Brasil

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PARCERIA MB/AquaRio PROMOVE EXPOSIÇÕES E DESCONTO EM INGRESSOS

A Marinha do Brasil (MB) vem promoven- do exposições de suas Organizações Militares no maior aquário mari- nho da América do Sul, graças a parceria entre o Aquário Marinho do Rio de Janeiro (AquaRio), o Instituto Rumo ao Mar (Rumar) e o Centro de Comunicação Social da Marinha, como parte de projeto de difusão da mentalidade marítima. Além disso, os militares e servidores civis da MB Estande da Marinha do Brasil no AquaRio podem visitar o local com um desconto de 50% sobre a tarifa ficou em cartaz até o dia 25 do mesmo cheia, que hoje é de R$ 80. mês. Na ocasião, estiveram presentes o O espaço dedicado à MB no AquaRio comandante da Marinha, Almirante de foi inaugurado em 12 de junho último, Esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira; com a exposição “O Brasil na Antártica o Almirante de Esquadra Mauro César e a Amazônia Azul”, da Comissão Inter- Rodrigues Pereira, ex-ministro da Marinha; ministerial para os Recursos do Mar, que e o diretor-presidente do AquaRio, Marcelo Szpilman. De 17 a 31 de julho, foi a vez da Força de Submarinos ocupar o local, com uma mostra que incluiu artigos das atividades de submarino, mergu- lho saturado e mergulho de combate. A exposição, em comemoração ao 103o aniversário da Força, bus- cou levar ao público um pouco da história centenária da Força de Sub- marinos, bem como as atividades e princípios operativos característicos de seus meios subordinados. Entre os vários equipamentos e acessórios Equipamentos de mergulho saturado despertam curiosidade expostos, os visitantes puderam ver dos visitantes da exposição da Força de Submarinos uma maquete de submarino da classe

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Tupi atualmente em operação pela MB, um quatro fases da Aviação Naval, além de Sistema de Monitoramento Remoto Suba- material relativo à atuação da Diretoria de quático (que permite o monitoramento de Aeronáutica da Marinha. um mergulho em grandes profundidades, Constam da referida parceria, ainda, via internet) e respiradores que operam visitas escolares e palestras, fomento ao em circuito fechado e inibem a formação desenvolvimento científico em assuntos de bolhas que denunciam a trajetória do ligados ao mar e aumento da aproxima- mergulhador, utilizados nas atividades de ção da sociedade civil com a MB. No mergulho de combate. espaço destinado à Força no AquaRio, será feito um rodízio para as demais Organizações Militares da MB realiza- rem suas exposições. Para desfrutar do des- conto nos ingressos, o membro da família naval deve se identificar no mo- mento da compra do ingres- so na bilheteria, e poderão ser adquiridos ingressos para seus familiares, limi- tados a três unidades, ao custo de R$ 35,00 cada. Cabe ressaltar que esses ingressos não poderão ser comercializados e que o Mostra expõe material explicativo sobre as fases da Aviação Naval direito de aquisição para os familiares só poderá ser Em agosto, o espaço foi ocupado por ex- exercido pelo militar ou servidor civil no posição do Comando da Força Aeronaval, momento da compra do seu ingresso indi- em comemoração os 101 anos da Aviação vidual. Os ingressos deverão ser utilizados Naval, completados no dia 23 daquele mês. no mesmo dia. A mostra reuniu equipamentos utilizados (Fontes: Bonos nos 480, de 21/6/2017, e em voo e material explicativo sobre as 533, de 13/7/2017 e www.mar.mil.br)

1a JUNTA DE INTELIGÊNCIA TRIFRONTEIRIÇA

A Capitania Fluvial de Tabatinga propósito de debater temas referentes aos (CFT) participou, em 22 de junho último, crimes transnacionais que afetam os três da 1a Junta de Inteligência Trifronteiriça, países – Colômbia, Brasil e Peru. realizada na cidade de Letícia, Colômbia. Com o debate, os organizadores bus- O evento foi uma iniciativa da Polícia caram gerar estratégias de cooperação Nacional da Colômbia (PNC), com o sobre os seguintes temas: situação atual do

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narcotráfico; explorações ilícitas de minérios e seus efeitos na área de jurisdição; aparecimento de grupos radicais que integram as estruturas das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, e sua possibilidade de chegar à zona de fronteira; migração irregular e tráfico de pessoas e delitos sexuais na zona da tríplice fronteira. Além disso, buscou-se integrar ainda mais os órgãos de Inteligência da região da Tríplice Fronteira. (Fonte: www.mar.mil.br) Participantes da 1a Junta de Inteligência Trifronteiriça

MARINHA PARTICIPA DA 69a REUNIÃO ANUAL DA SBPC

Mesa diretora da solenidade de abertura do evento

O primeiro simulador de passadiço na- de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico cional; maquetes de navios de pesquisa, do da Marinha (DGDNTM), apresentando submarino nuclear e da Estação Antártica projetos de Ciência, Tecnologia e Inovação Comandante Ferraz; e uma oficina de nós de na ExpoT&C, ministrando conferência e pa- marinheiro foram algumas das atrações do lestra e compondo mesa-redonda, na agenda estande da Marinha na 69a Reunião Anual da Programação Técnica. da Sociedade Brasileira para o Progresso da O estande da Marinha, um dos mais Ciência (SBPC). O evento ocorreu entre 16 visitados, recebeu cerca de mil pessoas e 22 de julho, na Universidade Federal de por dia. Nele, o público pôde experimen- Minas Gerais (UFMG), e contou com um tar a sensação de navegar com o primeiro público aproximado de 60 mil visitantes. simulador de passadiço nacional, desenvol- A Marinha participou da reunião, o maior vido pelo Centro de Análises de Sistemas evento científico-tecnológico da América Navais (Casnav), e conhecer os projetos Latina, sob a coordenação da Diretoria-Geral Centro Integrado de Sensores e Navegação

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“Amazônia Azul”, com ma- quetes da Estação Científica do Arquipélago de São Pedro e São Paulo e do Navio-Pa- trulha Oceânico Amazonas. Na Programação Técnica do evento, foram abordados assuntos afetos à área nu- clear, como na conferência “Submarino Nuclear e desa- fios estratégicos do Brasil”, ministrada pelo Capitão de Mar e Guerra José Augusto; na mesa-redonda “As aplica- O presidente do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e ções nucleares no mundo de Tecnológico (CNPq), Mário Neto, é apresentado ao Prosub hoje” e na palestra “Tecno- logia, Inovação e Segurança Eletrônica (Cisne) e Sistema de Detecção, Marítima no século XXI: desafios à pro- Acompanhamento e Classificação de Con- teção da Amazônia Azul”, proferida pelo tatos (SDAC), ambos desenvolvidos pelo Capitão de Mar e Guerra William Moreira. Instituto de Pesquisas da Marinha (IPqM). O estande da Marinha contou, ainda, O Centro Tecnológico da Marinha em com a participação do Laboratório Farma- São Paulo atraiu a atenção dos visitantes ao cêutico da Marinha (LFM), que mostrou apresentar o Programa Nuclear da Marinha aos visitantes alguns dos produtos e medi- (PNM) e o Programa de Desenvolvimento camentos que desenvolve. A Força também de Submarinos (Prosub) por meio de ex- apresentou ao público a tinta-ferrugem plicações didáticas, de totem interativo e protetora, um primer a ser aplicado em da exposição das maquetes do submarino aços para a proteção de suas superfícies, nuclear, do reator, do elemento combustível desenvolvido a partir de estudos realiza- e do painel de equivalência. dos, nos cursos de Mestrado e Doutorado A Secretaria da Comissão Interministe- em Engenharia Metalúrgica e de Materiais rial para Recursos do Mar (Secirm) apresentou o Programa Antártico Brasileiro (Proantar), por meio de exposição composta por materiais utilizados no apoio às pesquisas realizadas naquela região, como as maquetes da nova Estação Antártica Comandante Ferraz, do Navio de Apoio Oceanográfico Ary Rongel e do Navio Polar Maximiano, além de manequins com vestimentas especiais usadas na Antártica e até uma moto de neve (snowmobile). A Deputada federal Jô Moraes, integrante da Frente Parlamentar Secirm também apresentou o tema de Apoio ao Proantar, visita o Estande da Marinha

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da Universidade Federal do Rio de Janeiro, por um oficial da Marinha e por um aluno civil, orientados por professores. O produto é inovador: formulado com a ferrugem formada sobre o aço, busca igualar o po- tencial da ferrugem com o da tinta, sendo aproximadamente três vezes mais potente do que os similares encontrados no merca- do. Produzida a partir do conhecimento e de tecnologias nacionais, a tinta-ferrugem protetora já foi registrada no Brasil, nos Visitante conhece o trabalho do LFM Estados Unidos da América e na Europa. Além de conhecer um pouco mais sobre pôde obter informações sobre os processos o trabalho desenvolvido por diversas or- seletivos para ingresso na instituição. ganizações da Marinha, o público também (Fonte: www.mar.mil.br)

II SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA MILITAR

Foi realizado de 29 a 31 de agosto último, O evento reuniu acadêmicos, docentes, no Museu Naval e na Universidade Federal estudantes, pesquisadores de História do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), cida- Militar, civis e militares, com o propósito de do Rio de Janeiro, o II Simpósio Nacional de discutir questões referentes ao objeto de História Militar. O evento foi promovido desse ramo da História, seus métodos e pela Diretoria do Patrimônio Histórico e técnicas de pesquisa e suas relações com Documentação da Marinha (DPHDM), em outras dimensões da História e outras dis- parceria com a Universidade Estadual de ciplinas, como Sociologia, Antropologia Londrina (UEL), UNIRIO, Universidade e Ciência Política, bem como a utilização Salgado de Oliveira (Universo), Escola de dos arquivos militares e institucionais no Guerra Naval (EGN) e Escola de Comando Brasil e na América. e Estado-Maior do Exército (Eceme). Durante três dias, foram realizadas con- ferências e mesas-redondas, além de apresentações de di- versos trabalhos científicos distribuídos em quatro Sim- pósios Temáticos: “História Militar: teoria, metodologia e fontes de Pesquisa”, “Mi- litares na Política e na Socie- dade”, “História da Guerra e das Instituições Militares” e “Historiografia, Memória e Patrimônio Militar”. O Simpósio buscou con- solidar a História Militar como área de pesquisa in-

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terdisciplinar e plural, congregando as obtidos no fórum foram registrados em diferentes perspectivas de pesquisas publicações impressas e digitais. acadêmicas em andamento. Os resultados (Fonte: Bono no 652, de 28/8/2017)

MB PARTICIPA DO 3o IMSS 2017

A Marinha da Indonésia realizou de ração marítima para o bom ordenamento 23 a 25 de agosto último, em Nusa Dua, no mar”. O simpósio teve como pales- o 3o Simpósio Internacional de Segurança trantes o chefe da Marinha da Austrália; Marítima (IMSS 2017). O evento contou o chefe da Marinha das Filipinas; o com a participação de 11 comandantes/ comandante da Frota do Pacífico dos chefes de Forças Navais e de 350 militares, Estados Unidos da América; almirantes compondo delegações de 43 países. da China, Índia, Japão e Rússia e repre- A Marinha do Brasil, representada sentantes dos Ministérios das Relações pelo adido naval na Indonésia, Capitão Exteriores e da Coordenação Marítima de Mar e Guerra José Marcelo Camelo, da Indonésia. participou do evento, cujo tema foi “Coope- (Fonte: www.mar.mil.br)

Chefes de Delegação no 3o IMSS 2017

AMRJ E DPHDM REALIZAM PAINEL SOBRE CONSTRUÇÃO DE MONITORES

O Arsenal de Marinha do Rio de Janeiro incorporação de novas tecnologias para (AMRJ) e a Diretoria do Patrimônio Históri- a guerra fluvial”. O evento aconteceu no co e Documentação da Marinha (DPHDM) Museu Naval, cidade do Rio de Janeiro. realizaram, em 19 de julho último, o painel A iniciativa teve como motivação duas “O AMRJ na construção de monitores: a efemérides comemoradas em 2017: o ses-

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quicentenário de lançamento ao mar dos de Corveta (T) Carlos André Lopes da Silva, monitores Pará, Rio Grande e Alagoas; historiador da DPHDM, com mediação do e os 80 anos de incorporação do Monitor Vice-Almirante (Refo-EN) Armando de Parnaíba. O evento contou com palestras Senna Bittencourt (membro do Instituto do diretor do AMRJ, Contra-Almirante Histórico Geográfico Brasileiro e do Institu- (EN) Liberal Enio Zanelatto, e do Capitão to de Geografia e História Militar do Brasil). Em sua palestra sobre o Moni- tor Parnaíba, o diretor do AMRJ ressaltou as condições históricas e as inovações que permitiram a construção do navio em apenas 17 meses. Incorporado em 1937 e modernizado em duas ocasiões (para a Segunda Guerra Mundial, em 1943; e em 1997), o Parnaíba é o navio de guerra mais antigo em operação na Marinha do Brasil, e hoje está subordinado ao Comando do 6o Distrito Naval (Ladário-MS). Palestra sobre monitores no Museu Naval (Fonte: www.mar.mil.br)

OFICIAL DA MB PARTICIPA DE CURSO DA ONU NA CHINA

A Capitão-Tenente (T) Taryn Machado Beijing, na China. O curso, promovido pela Senez, do Estado-Maior da Armada, partici- Organização das Nações Unidas (ONU), pou, de 19 a 30 de junho, do 7o United Na- teve o propósito de encorajar e preparar tions Female Military Officers Course, em mulheres militares para missões de paz e de disseminar as questões rela- cionadas à igualdade de gênero e empoderamento feminino. Conduzido pela UN Women, o curso teve um total de 40 participantes dos seguintes países: Austrália, Bangladesh, Brasil, China, Colômbia, Egito, Etiópia, Finlândia, Fiji, Índia, Indonésia, Irlanda, Jordânia, Quênia, Nepal, Países Baixos, Nigéria, Ruanda, Senegal, Serra Leoa, África do Sul, Sri Lanka, Suécia, Tailândia, Jean-Pierre Lacroix, adjunto do secretário-geral da ONU, entrega o Uganda e Vietnã. certificado de conclusão do curso (Fonte: www.mar.mil.br)

290 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO 51a NAVAMAER INTEGRA ACADEMIAS MILITARES

A Escola Naval (EN), na cidade do Rio Meio Pesado e o 1o lugar na Categoria Leve de Janeiro, foi sede, entre 21 e 28 de julho, ficou com o Aspirante Andrade. da 51a edição da Navamaer, tradicional Na Esgrima, Categoria Espada Indi- competição esportiva realizada entre as vidual Masculina, houve dobradinha no academias militares. Cerca de 600 atletas, pódio, com os Aspirantes Pedro Cardoso

Passagem da Pira Olímpica da EN para a AMAN

entre cadetes da Academia Militar das e Faustino conquistando as medalhas de Agulhas Negras (Aman) e da Academia ouro e prata, respectivamente. da Força Aérea (AFA) e aspirantes da EN No Atletismo, a Escola logrou bons re- disputaram mais de 400 medalhas em 13 sultados. O Aspirante Allan Leite quebrou modalidades esportivas. o recorde da prova de arremesso de peso ao Com o evento, aspirantes e cadetes das lançar 15,44 metros. O recorde anterior, com três Forças Armadas, puderam compartilhar a marca de 14,94 m, pertencia ao Aspirante acomodações e refeitórios durante a semana Luiz Eduardo, conquistado em 2014. Nos de competições, o que promoveu a união e 100 m, 400 m feminino, 1.500 m masculino o congraçamento entre os competidores das e no revezamento 4x100 rasos feminino, a seguintes modalidades: Atletismo, Basque- EN obteve o ouro. A Escola também ven- te, Esgrima, Futebol, Judô, Natação, Polo ceu nas seguintes provas: salto em distância Aquático, Tiro Esportivo Arma Longa, Tiro feminino, revezamento 4x400, 200 m rasos Esportivo Arma Curta, Voleibol, Orienta- feminino, 800 m rasos masculino e salto ção, Pentatlo Militar e Triatlo. triplo masculino. A Aspirante Laís Menezes Na prova de Orientação, realizada na subiu no lugar mais alto do pódio por cinco região onde localiza-se a Base Aérea Na- vezes nas competições de atletismo deste ano val de São Pedro da Aldeia, a Aspirante e, por isso, fez a passagem da pira olímpica Naraiane conquistou o primeiro lugar na para a Aman, que será sede da 52a Navamaer. classificação geral. No Judô, o Aspirante No Pentatlo Militar, a Aspirante Mo- Frederico venceu na Categoria Individual nique Dias obteve a primeira posição na

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prova de natação utilitária. Já na categoria ções culturais na cidade do Rio de Janeiro. avulso, venceu o Aspirante Madeira; na dis- A grande novidade deste ano foi a criação, puta de tiro esportivo, o Aspirante Neipp. por aspirantes da EN, de um aplicativo do Na natação, a EN sagrou-se campeã, na evento com programação, avisos, resul- categoria masculina, nas provas de 100 m tados e outras informações, atualizados a costas e 50 m livre, na qual o Aspirante Ri- todo o momento. cieri quebrou o recorde da Escola ao alcan- Na cerimônia de encerramento, a pira çar a marca de 24 segundos e 92 milésimos. olímpica foi apagada por aspirantes e O último recorde foi obtido em 1990 pelo cadetes, liderados pela Aspirante Laís Aspirante Manoel Luiz Ferreira Romualdo, Menezes, simbolizando o término oficial com 25 segundos e 3 milésimos. Já na ca- da competição. Em seguida, o diretor-geral tegoria feminina, com disputas realizadas do Pessoal da Marinha, declarou encerrada entre as Aspirantes da EN e as cadetes da a 51a Navamaer. Na ocasião, estiveram AFA, a Escola venceu nos 50 m costas, 50 presentes diversas autoridades militares: o m peito, 50 m livre e 50 m borboleta. comandante-geral do Corpo de Fuzileiros Personalidades do esporte nacional mar- Navais, Almirante de Esquadra (FN) Ale- caram presença na 51a Navamaer. O atleta xandre José Barreto de Matos; o secretário Jairzinho deu o pontapé inicial da partida de Pessoal, Ensino e Desporto do Ministério de futebol, realizada no primeiro dia de da Defesa, Tenente-Brigadeiro do Ar Ricar- competições, acompanhado de Nilson Dias, do Machado Vieira; o diretor do Departa- Carlos Alberto (Pintinho), Carlos Roberto e mento de Desporto Militar do Ministério da Moreira, ex-jogadores, na década de 1970, Defesa, Vice-Almirante (FN) Paulo Martino do Botafogo de Futebol e Regatas. Para Zuccaro; o diretor de Ensino da Aeronáutica, encerrar o último dia de competições, foi Major-Brigadeiro Rui Chagas Mesquita; o realizada partida de futebol entre a EN e a presidente da Comissão de Desportos da AFA; na disputa de pênaltis, a EN sagrou- Aeronáutica, Brigadeiro do Ar Arnaldo -se campeã com o resultado de 5 x 4. Augusto do Amaral Neto; o comandante da Além das competições esportivas, o Academia Militar das Agulhas Negras, Ge- evento incluiu programação sociocultural, neral de Brigada Ricardo Augusto Ferreira com sessões de cinema e apresentação dos Costa Neves, e o diretor de Educação Supe- simuladores de passadiço e de aviação e rior Militar do Departamento de Educação saídas nos veleiros e nos avisos de ins- e Cultura do Exército, General de Divisão trução, além de visitação a meios navais, André Luis Novaes Miranda. Organizações Militares da Marinha e atra- (Fonte: www.mar.mil.br)

CBVela INAUGURA SEDE E CRIA HALL DA FAMA

A Confederação Brasileira de Vela da Fama da modalidade no Brasil, com (CBVela) inaugurou, em 28 de junho uma homenagem aos bicampeões olím- último, sua nova sede, localizada na picos Torben Grael e Marcelo Ferreira e Marina da Glória, cidade do Rio de Ja- a presença especial dos velejadores que neiro, local que foi sede das regatas nos defenderão o País em julho no Mundial Jogos Rio 2016. Na ocasião, foi dado de Optimist, a classe de formação para o primeiro passo para criação do Hall crianças e adolescentes.

292 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO

A Confederação Brasileira de Vela cinco pódios, Torben é o maior medalhista fechou, em dezembro de 2016, um con- olímpico do esporte brasileiro, ao lado de vênio com a BR Marinas, responsável Robert Scheidt. Além disso, o velejador pela administração da Marina da Glória, ocupa atualmente o cargo de vice-presi- e agora inaugura no local sua sede e a dente da Federação Internacional de Vela principal base de infraestrutura técnica (World Sailing) e foi o primeiro brasileiro e de treinamento para os velejadores no a ingressar no Hall da Fama internacional país, com vagas secas e molhadas, além de da modalidade. Marcelo Ferreira foi o contêiner. Durante a cerimônia, também foi parceiro de Torben na conquista olímpica assinada a renovação até 2020 do contrato de dois ouros e um bronze (Sydney-2000) da CBVela com o Bradesco, patrocinador na classe Star, entre outros títulos. máster da Confederação desde o último Além da homenagem, na ocasião os ciclo olímpico. dois atletas transmitiram um pouco do seu Torben Grael e Marcelo Ferreira foram conhecimento para os cinco jovens brasilei- os primeiros atletas a colocar as mãos nos ros que disputarão o Mundial de Optimist moldes que irão, no futuro, compor o Hall na Tailândia – Nicolas Bernal, Marina da da Fama da vela brasileira, homenageando Fonte, Bernardo Pereira, Leonardo Crespo os grandes nomes da modalidade. Com e Luiz Otávio Correia. Eles também rece- beram dos ídolos uma bandeira do Brasil para a viagem e cole- tes de competição. A CBVela foi constituída em 2013 e é a representante oficial da vela esportiva do país nos âmbitos nacional e interna- cional. É filiada à Federação Internacional de Vela (World Sailing) e ao Comitê Olímpico do Brasil (COB). (Fonte: Assessoria de Im- prensa da Confederação Bra- Torben Grael e Marcelo Ferreira inauguram o Hall da Fama sileira de Vela)

MB ASSINA CONVÊNIO COM A CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE VELA

A Marinha do Brasil (MB) e a Confe- atletas brasileiros da modalidade de Vela deração Brasileira de Vela (CBVela) assi- para as principais competições do calen- naram, em 26 de junho último, convênio dário oficial da Federação Internacional na sede do Comando-Geral do Corpo de de Vela, além das competições militares. Fuzileiros Navais (CGCFN), no Rio de Estiveram presentes à cerimônia o Janeiro (RJ). O acordo visa viabilizar ações comandante-geral do Corpo de Fuzileiros e projetos que auxiliem na preparação dos Navais, Almirante de Esquadra (FN) Ale-

RMB3oT/2017 293 NOTICIÁRIO MARÍTIMO

xandre José Barreto de Mattos; o presidente O presidente da Comissão de Despor- da Confederação Brasileira de Vela, Marco tos da Marinha do Brasil, Contra-Almi- Aurélio de Sá Ribeiro e os velejadores rante (FN) Pedro Luiz Gueiros Taulois, olímpicos Torben Grael e Isabel Swan, destacou que, após os resultados positivos além de autoridades civis e militares. nos Jogos Olímpicos Rio 2016, este é De acordo com Marco Aurélio, a assina- mais um passo importante na preparação tura sacramenta uma relação de cooperação para as próximas grandes competições que sempre existiu entre a MB e a CBVela que estão por vir. “Com este convênio, e que agora assume caráter estratégico. ambas as instituições estão empenhando “Vamos trabalhar cada vez mais juntos, seus esforços para otimizar os recursos não só para fazer crescer nosso esporte, mas financeiros e de pessoal para atingir metas também para fomentar a cultura marítima e objetivos desafiadores que nos serão brasileira e divulgar o trabalho fantástico impostos, como os 7o Jogos Mundiais que a Marinha do Brasil faz na proteção Militares, na China, em 2019, e os Jogos das nossas águas e na formação humana e Olímpicos em Tóquio, em 2020”. profissional dos nossos atletas”. (Fonte: www.mar.mil.br)

MB INCORPORA NOVOS ATLETAS AO PROLIM

Foi realizada em julho último, no Centro Cargnin (Judô), Yanka Dalben Pascoalino de Educação Física Almirante Adalberto (Judô), Gabrielle Gonçalves Roncatto Nunes (Cefan), na cidade do Rio de Janeiro, (Natação), Fernanda Nunes Leal Ferreira a cerimônia de incorporação da 2a turma de (Remo), Bárbara Dias Novaes (Taekwon- 2017 de atletas de alto rendimento. O evento do), Luísa Schreiber (Tiro), Ana Luiza foi presidido pelo comandante do Cefan, Busato Barbachan (Vela) e Samuel Freitas Contra-Almirante (FN) Pedro Luiz Guei- Moraes Gonçalves (Vela). ros Taulois, com a presença de renomados (Fonte: www.mar.mil.br) atletas olímpicos, entre os quais o velejador Lars Grael e o nadador . Os onze militares incor- porados, todos 3oSG-RM2, representarão a Marinha do Brasil (MB) em diversas mo- dalidades desportivas, como os mais novos integrantes do Programa Olímpico da Marinha (Prolim). São eles os seguintes: Rafael Augusto de Lima Padilha (Beach Soc- cer), Samhia Grasiele Pereira Simão (Futebol Feminino), Tamires Crude Andrade da Silva (Judô), Daniel Borges CA (FN) Taulois, oficiais e os novos atletas

294 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO RESULTADOS ESPORTIVOS

2a ETAPA DA COPA DO MUNDO DE REMO

Realizada de 16 a 18 de junho em Poz- nan, Polônia. Com seis barcos inscritos, o Brasil conquistou a medalha de bronze no Double Skiff, com o o3 SG Willian Karllos Giaretton e sua dupla Xavier Vela Maggi. Participaram 500 atletas de 39 países, competindo em provas de 23 categorias.

CAMPEONATO BRASILEIRO DE ORIENTAÇÃO – II ETAPA

Realizado de 23 a 25 de junho em Casi- miro de Abreu, Rio de Janeiro. Os atletas da Marinha do Brasil (MB) obtiveram os seguintes resultados no percurso Sprint: 3oSG João Pedro Cardoso Camilo Jaber Campeonato Pan-Americano Sub-21 de Judô (Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes – Cefan) – 1o lugar na Militar das Agulhas Negras (Aman), em Categoria Elite masculina; e SD-FN Felipe Resende, RJ, em 24 e 25 de junho. A MB, Simeão dos Santos (Batalhão Logístico de representada pela 3oSG Rosane Budag, Fuzileiros Navais) – 1o lugar na categoria obteve os seguintes resultados: 1o lugar na Masculino Adulto A. carabina de ar comprimido e na carabina deitado; e 2o lugar na carabina três posições. 54a EDIÇÃO DO TROFÉU SETTE COLLI DE NATAÇÃO CAMPEONATO PAN-AMERICANO SUB-21 DE JUDÔ Realizada de 23 a 25 de junho, em Roma, Itália. Os atletas da MB obtiveram Realizado em Cancún, México, em 1o os seguintes resultados: 3oSG Etiene Me- e 2 de julho. O Brasil sagrou-se campeão deiros – 2o lugar nos 50 m costas e 7o lugar do evento ao conquistar doze medalhas nos 50 m livre; 3oSG Brandonn Almeida – de ouro, uma de prata e duas de bronze. 3o lugar nos 400 m medley e 10o lugar nos A MB foi representada pelo GR Daniel 400 m livre; e 3oSG João Gomes – 2o lugar Borges Cargnin, que conquistou o 1o lugar nos 50 m peito e 9o lugar nos 100 m peito. na categoria até 66 kg.

TORNEIO GUILHERME CAMPEONATO MUNDIAL DA PARAENSE DE TIRO ESPORTIVO CLASSE STAR – VELA

O mais tradicional evento de tiro espor- A dupla formada pelo GR Samuel Frei- tivo do Brasil foi realizado na Academia tas Moraes Gonçalves e pelo medalhista

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olímpico Lars Grael conquistou o vice- CAMPEONATO MUNDIAL DE -campeonato. A competição foi realizada DESPORTOS AQUÁTICOS em Troense, Dinamarca, de 1o a 8 de julho. Realizado de 14 a 30 de julho em Buda- CAMPEONATO BRASILEIRO DE peste, Hungria. A MB obteve os seguintes LEVANTAMENTO DE PESO SUB-20 resultados: 3oSG Etiene Medeiros – 1o lugar nos 50 m costas, tornando-se a primeira Foi realizado em 5 de julho, no Cen- brasileira campeã mundial de natação em tro Nacional de Levantamento de Pesos, piscina longa (50 m); 3oSG Ana Marcela instalado no Cefan. Setenta e oito atletas Cunha – 1o lugar na prova de 25 km de sub-17 e sub-20 participaram da compe- Maratona Aquática (com essa vitória a tição. Os atletas da MB e dos Projetos atleta sagrou-se tricampeã mundial da de Base por ela apoiados obtiveram os prova – as outras foram em 2011 e 2015); e seguintes resultados: 3oSG Emily Rosa – 3oSG João Gomes – 2o lugar na prova de campeã na categoria 48 kg e índice para 50 m peito. o Campeonato Sul-Americano e eleita a melhor atleta sub-20 da competição; MN Erick Ferreira – campeão na Categoria 62 kg e índice para o Campeonato Sul- -Americano; MN Victor Zomer – cam- peão na Categoria 77 kg e índice para o Campeonato Sul-Americano; Gabriela Oliveira – campeã na categoria 44 kg sub-17; Amanda Souza da Silva – campeã na categoria 63 kg sub-17, vice no sub-20 e índice para o Paramericano sub-17; Laura Nascimento Amaro – campeã na categoria 69 kg sub-17 e sub-20 e índice para o Paramericano sub-17; Thaynara A. Figueiredo – campeã na categoria 75 kg sub-17 e sub-20 e índice para o Parameri- cano sub-17; Yuri de Paula Pereira – cam- peão na categoria 56 kg sub-17 e bronze Campeonato Mundial de Desportos Aquáticos no sub-20; Victor Bizone – campeão na categoria 94 kg sub-17; Luis Felipe Souza CISM OPEN EUROPEAN CUP IN da Silva – campeão na categoria +94 kg NAVAL PENTATHLON-2017/ 33rd sub-17 e vice na +105 kg sub-20; Kessia de NORDIC NAVAL PENTATHLON Souza Luciano – campeã categoria 53 kg CHAMPIONSHIP sub-20; Alexsandra Silva Gonçalves – campeã categoria 58 kg sub-20; Vitória A competição, organizada pela Marinha Lucia Rios Rodrigues – campeã categoria da Alemanha, foi realizada de 15 a 21 de 63 kg sub-20; Renan de Sena Fernandes – julho na Base Naval de Eckernforde, Ale- campeão categoria 94 kg sub-20, índice manha. A equipe brasileira conquistou a para o Campeonato Sul-Americano e eleito medalha de ouro no masculino e de prata o melhor atleta sub-20 da competição. no feminino, por equipe. Individualmente,

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CISM Open European Cup in Naval Pentathon

a MB obteve os seguintes resultados: 2oSG CAMPEONATO PAN-AMERICANO Max Leal Santos – 3o lugar no individual DE LEVANTAMENTO DE PESOS masculino; 3oSG Tatilaile Oliveira – 4o lugar OLÍMPICO no individual feminino; e CB João Pedro Farche – 3o lugar no estreante masculino. Realizado de 20 a 28 de julho em Miami, Participaram competidores dos seguintes pa- Estados Unidos da América. O evento con- íses: Brasil, Alemanha, China, Dinamarca, tou com a participação de 111 mulheres e Finlândia, Suécia e Polônia. Praticada por 119 homens de 21 países. A equipe brasileira diversas Marinhas do mundo, a modalidade foi composta por 12 atletas, sendo quatro do Pentatlo Naval simula situações do dia a dia Programa Olímpico da Marinha. Estes obti- dos homens do mar, exigindo do atleta, além veram os seguintes resultados: 3oSG Rosane da técnica, força, velocidade, resistência, os Reis Santos, categoria 53 kg – 1o lugar no coordenação e equilíbrio. arranco com 88 kg de peso levantado e 1o lu- gar no total olímpico (194 kg), conquistando o índice para o Campeonato Mundial; 3oSG Letícia Cristina Laurindo Mo- raes, categoria 53 kg – 2o lugar no arranco com 86 kg de peso levantado, conquistando o ín- dice para o Campeonato Mun- dial; 3oSG Monique Maria Lima de Araújo, categoria 75 kg – 2o lugar no arranco com 103 kg de peso levantado; e 3oSG Josué Lucas Ferreira da Silva, categoria 85 kg – conquistou o índice para o Levantamento de Pesos Olímpico Campeonato Mundial.

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CAMPEONATO BRASILEIRO DE 64o CAMPEONATO MUNDIAL DE VELA CLASSE STAR 2017 PENTATLO MILITAR

O 3oSG Samuel Freitas Moraes Gonçal- Realizado de 29 de julho a 6 de agosto ves sagrou-se campeão brasileiro, acompa- em Salinas, Equador. A 3oSG Jéssica Lima nhado de Lars Grael, seu parceiro de barco. Lessa conquistou o 3o lugar na categoria A dupla venceu cinco das seis regatas no estreante feminino e o 4o lugar na prova de Lago Paranoá e voltou para o Rio de Janeiro Natação Utilitária. O evento foi organizado com mais um título brasileiro. O campeonato pelas Forças Armadas do Equador e contou foi realizado no Iate Clube de Brasília, DF, com a participação de 150 competidores de 27 a 30 de julho, e contou com 19 barcos de 19 países. tripulados por velejadores de alto nível. TROFÉU JOSÉ FINKEL DE NATAÇÃO

Realizado de 8 e 12 de agosto em San- tos, SP. Os atletas da MB conquistaram os seguintes resultados: 3oSG Daiene Dias – 1o lugar nos 100 m Borboleta e nos Revezamentos 4X50 m Livre e 4x100 m Medley; 3oSG Brandonn Almeida – 1o lugar nos 1.500 m Livre e 2o lugar nos 400 Campeonato Brasileiro de Vela Classe Star m Livre e 200 m Medley; 3oSG Gabrielle Roncatto – 1o lugar no Revezamento 4X50 COPA EUROPEIA SUB-21 DE JUDÔ m e 4X200 m Livre, 2o lugar no Reveza- mento 4x100 m Livre e 3o lugar nos 200 Realizada em Berlim, Alemanha, em 29 m Medley; 3oSG João Gomes – 2o lugar de julho. A MB foi representada pelo 3oSG nos 50 m Peito; 3oSG Etiene Medeiros – Daniel Borges Cargnin, que conquistou o 1o lugar nos 50 m Costas, 50 m Livre e no 1o lugar na categoria 66 kg. O evento foi Revezamento 4x100 m Livre e 2o lugar nos válido para o ranqueamento internacional 50 m Borboleta; e 3oSG Nathalia Almeida da modalidade. – 3o lugar nos 400 m Medley.

CIAW E ITA ASSINAM ACORDO DE COOPERAÇÃO ACADÊMICA E TÉCNICA

A Marinha do Brasil e o Comando da assinatura foi realizada na Ilha das Enxadas, Aeronáutica, representados, respectiva- sede do CIAW, no Rio de Janeiro (RJ). mente, pelo Centro de Instrução Almirante O acordo é fruto da reestruturação dos Wandenkolk (CIAW) e pelo Instituto Tec- Cursos de Aperfeiçoamento Avançado (C- nológico da Aeronáutica (ITA), assinaram, -ApA) após dois anos de intensos trabalhos em 4 de agosto último, Acordo de Coopera- envolvendo todos os órgãos de direção ção Acadêmica e Técnica. A cerimônia de setorial, diretorias especializadas e orga-

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nizações militares orien- tadoras. O propósito foi não apenas promover uma sólida formação tecnológica aos oficiais do Corpo da Armada em nível de pós-graduação, mas também fomentar o intercâmbio de infor- mações, experiências e conhecimentos entre as Forças por meio de seus corpos docentes. A assinatura foi cele- brada entre o comandante do CIAW, Contra-Almi- Comandante do CIAW (à esq.) e reitor do ITA (à dir.) assinam Acordo de rante Paulo Cesar Demby Cooperação entre as instituições Corrêa, e o reitor do ITA, Professor Doutor Anderson Ribeiro Correia. Engenheiro Fernando César Pereira Santos, Estiveram presentes o Almirante de Esqua- entre outras autoridades. dra (Refo) Mauro Cesar Rodrigues Pereira, A primeira turma do C-ApA será inicia- ex-ministro da Marinha; o diretor-geral do da em outubro de 2017, contemplando seis Pessoal da Marinha, Almirante de Esqua- áreas: Guerra Eletrônica, Propulsão Naval, dra Ilques Barbosa Junior; o diretor-geral Sistemas de Controle e Eletricidade de do Departamento de Ciência e Tecnologia Navios, Segurança da Informação e Comu- Aeroespacial (DCTA), Tenente-Brigadeiro nicações, Tecnologia Naval e Sistemas de do Ar Carlos Augusto Amaral Oliveira; o Armas. Nesta última, parte das disciplinas diretor de Ensino da Marinha, Vice-Almi- serão ministradas pelo ITA e pelo Instituto rante Antonio Fernando Garcez Faria; e o de Aeronáutica e Espaço (IAE). vice-diretor do DCTA, Major-Brigadeiro (Fonte: www.mar.mil.br)

CONCLUÍDA MAIS UMA ETAPA DO PROGRAMA DE OBTENÇÃO DAS AERONAVES KC-2

Como parte de mais uma etapa do Pro- discutidos assuntos técnicos e gerenciais grama de Obtenção das Aeronaves KC-2, acerca da versão IOC (Configuração Inicial a Diretoria de Aeronáutica da Marinha de Operação), cujo propósito é concluir a participou, de 12 a 16 de junho último, de integração dos sistemas básicos e possi- reunião sobre o Critical Design Review bilitar o primeiro voo em abril de 2019, (CDR) e o Program Management Review permitindo a evolução para a versão FOC (PMR) dessas aeronaves, realizada na sede (Configuração Final de Operação) das qua- das empresas Elbit Systems of America/ M7 tro aeronaves que serão entregues em 2021. Aerospace, em San Antonio, Estados Uni- No dia 16 de junho, foi realizado o PMR, dos da América. Durante a reunião, foram em que foram discutidos o andamento do

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As aeronaves KC-2 pode- rão cumprir ampla gama de tarefas em proveito da Es- quadra e dos Distritos Navais, como: realização de Esclare- cimento, Vigilância e Patru- lha Naval; reabastecimento em voo das aeronaves AF-1 para operações de apoio a forças navais; prover suporte logístico; contribuir em mis- sões de apoio humanitário; realizar Evacuação Aeromé- dica; contribuir para opera- Participantes da reunião ções de Busca e Salvamento; Programa e as ações necessárias para a exe- apoiar operações de Fuzileiros Navais; cução das metas de acordo com o Cronogra- realizar lançamento de paraquedistas e de ma Físico-Financeiro em vigor. Nos dias 8 carga; e prover transporte administrativo e 9 do mesmo mês, foi realizada a avaliação e de pirotécnicos, munição, armamento e de cabine de um mock-up, proporção 1x1, cargas em geral. da futura aeronave KC-2. (Fonte: www.mar.mil.br)

EsqdHU-2 RECEBE AERONAVE C-SAR

O 2o Esquadrão de Helicópteros de Emprego Geral (EsqdHU-2) recebeu em 21 de julho último, em Itajubá (MG), a aeronave C-SAR (Combat Search and Rescue - Busca e Resgate em Comba- te), da família Super Cougar, numerada como N-7202. A aeronave é a nona recebida pelo EsqdHU-2 e faz parte do programa H-XBR, que prevê a entrega de 16 unidades do helicóptero modelo H-225M para a Marinha do Brasil (MB). A N-7202 possui supressor de ra- diação e sensor de visão frontal infra- vermelha. O meio aumentará a capa- cidade de busca e resgate da MB, bem como o quantidade de tarefas exercidas pelo EsqdHU-2. (Fonte: www.mar.mil.br)

A aeronave C-SAR é especializada em busca e resgate em combate

300 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO HS-1 HOMOLOGA MAG 7,62 mm EM AERONAVE SH-16

O 1o Esquadrão de Helicópteros Antissub- Com a incorporação desse novo ar- marino (HS-1) realizou, em junho, a cam- mamento, as aeronaves SH-16 Seahawk panha de Ensaios para homologação do uso adquiriram a capacidade de se contrapor da metralhadora lateral MAG 7,62 mm em às ameaças assimétricas, as quais podem se aeronave SH-16. O ensaio balístico aconte- fazer presentes, principalmente, em Ações ceu na raia de tiro da Ilha da Marambaia (RJ), de Emprego Limitado da Força, em que se com uso de munição real, e também serviu destacam a Patrulha Naval e a Operação de para verificação da eficácia do armamento Garantia da Lei e da Ordem. e da adaptabilidade do atirador ao meio. (Fonte: www.mar.mil.br)

Aeronave SH-16 Seahawk armada com metralhadora lateral MAG 7,62 mm

COMANDO DA MARINHA TERÁ NOVA SEDE EM BRASÍLIA

O 7o Distrito Naval (Brasília) recebeu, A escrituração definitiva da área ocor- em abril último, o Termo de Cessão de Uso rerá após a análise final no Conselho de a Título Precário de terreno para as futuras Planejamento Territorial e Urbano do instalações do Comando da Marinha. A Distrito Federal (Conplan), a ser concluída área, de 91.680 m², foi cedida à MB pela ainda este ano. Superintendência do Patrimônio da União. (Fonte: www.mar.mil.br)

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Terreno das futuras instalações do Comando da Marinha

CFN RECEBE NOVOS CLAnf

O Corpo de Fuzileiros Navais (CFN) ocorrer em 2018, a Força de Fuzileiros da recebeu os dois primeiros carros-lagarta Esquadra terá em seu acervo operacional 49 anfíbios (CLAnf) do padrão Reliability, unidades de CLAnf, liderando o quantitati- Availability, Maintainability/Rebuild to vo no Hemisfério Sul e auferindo melhores Standard (RAM/RS). Os carros, um na condições de contribuir para a defesa da configuração Transporte de Pessoal (P) Amazônia Azul. e outro na versão Comando e Controle De acordo com o comandante do Mate- (C), desembarcaram na madrugada de 31 rial de Fuzileiros Navais, Contra-Almiran- de maio último no porto de Santos (SP) e te (FN) Renato Rangel Ferreira, os veículos seguiram para o Centro Tecnológico do do padrão RAM/RS trarão mais confiabi- Corpo de Fuzileiros Navais. lidade e disponibilidade e melhor logística A aquisição foi fruto de um contrato de manutenção, proporcionando ao CFN assinado entre a Marinha do Brasil (MB) e e à MB um considerável incremento em a Marinha dos Estados Unidos da América seu caráter anfíbio. “O CLAnf padrão (EUA) para o fornecimento de 23 CLAnf. RAM/RS supera, em todos os aspectos, Após a chegada do lote final, prevista para as gerações anteriores, possui motor mais

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potente, nova transmissão e sistema de mobilidade, maior velocidade, facilidade suspensão atualizado, oferecendo melhor de operação e condições de conforto e segurança à tropa embar- cada”, avaliou o almirante. O apoio irrestrito do Al- mirantado e o profissionalis- mo e a coordenação entre o Comando-Geral do Corpo de Fuzileiros Navais, a Adidância Naval nos EUA e no Canadá, o Comando do Material de Fuzileiros Navais, a Comissão Naval Brasileira em Washington (EUA) e a Diretoria de Abas- tecimento da Marinha foram essenciais para a concretiza- ção deste projeto. Novos CLAnf desembarcaram no porto de Santos (Fonte: www.mar.mil.br)

BtlVtrAnf E NDCC ALMIRANTE SABOIA REALIZAM EXERCÍCIO COM CLAnf

O Batalhão de Viaturas Anfíbias foram empregados 23 militares e três via- (BtlVtrAnf) realizou, em 28 de junho turas (um CLAnf Comando e dois CLAnf último, exercício de lançamento e acolhi- Transporte de Pessoal). mento de Carro Lagarta Anfíbio (CLAnf) O exercício teve início com o desloca- com o Navio de Desembarque de Carros mento dos meios do Complexo Naval da de Combate Almirante Saboia. Na ação, Ilha das Flores (São Gonçalo-RJ) rumo ao navio, que se encontrava fundeado nas proximidades da Ponte Rio-Niterói, onde ocor- reu o primeiro acolhimento. O adestramento foi de grande valia para a capa- citação das guarnições das viaturas blindadas anfíbias e para estreitar laços entre os meios navais e de Fuzileiros Navais, colaborando, assim, para o aprestamento do con- jugado anfíbio. Acolhimento de CLAnf no Almirante Saboia (Fonte: www.mar.mil.br)

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CAÇAS DA MB PARTICIPAM DE EXERCÍCIO EM MS

Duas aeronaves caças AF-1 Skyhawk, perten- centes ao 1o Esquadrão de Aviões de Interceptação e Ataque, participaram, de 5 a 26 de junho último, de adestramento de guia aéreo avançado no Es- tado de Mato Grosso do Sul (MS). As tripulações das aeronaves realizaram exercícios com militares do Comando do 6o Distrito Naval (Ladário-MS). (Fonte: www.mar.mil.br) Militares do Grupamento de Fuzileiros Navais de Ladário e aeronave AF-1

GAT-FN PARTICIPA DE EXERCÍCIO ENTRE SÃO TOMÉ E PRÍNCIPE E PORTUGAL

A cidade de São Tomé foi palco da Operação Combinada Relâmpago entre a Unidade de Fuzileiros Navais de São Tomé e Príncipe e o Batalhão de Fuzileiros no 2 da Marinha de Portugal, embarcados no navio português Álvares Cabral, com participação do Grupo de Assessoramento Técnico de Fuzileiros Navais (GAT-FN) da Marinha do Brasil (MB). A operação constou de uma incursão anfíbia lançada por meio de embarcações pneumáticas, a fim de cumprir missão de captura, des- truição e retomada do controle de uma localidade, utilizando, para isso, pelotões Operação Combinada Relâmpago mistos, compostos de militares santomen- ses e portugueses. um momento marcante para os fuzileiros Nesse contexto, militares do GAT-FN navais daquele país, pois pela primeira participaram como assessores dos fuzileiros vez realizaram um adestramento dentro navais de São Tomé e Príncipe, orientando do contexto de uma Operação Anfíbia, os militares desde a fase de planejamento desembarcando a partir de um navio de até a conquista dos objetivos. Este foi uma Marinha de guerra.

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O posicionamen- to geoestratégico de São Tomé e Prínci- pe, no Golfo da Gui- né, constitui-se em um importante ponto de apoio para futuras operações que por- ventura venham a ser conduzidas pela MB na região, tais como Evacuação de Não Combatentes e Operações Huma- nitárias ou de Paz Localização, no entorno estratégico brasileiro, de São Tomé e Príncipe, em países africanos. no Golfo da Guiné A presença da Mari- Desde 2014, a MB, por meio de um nha do Brasil na região vai ao encontro GAT-FN, conduz iniciativa de cooperação da Política Nacional de Defesa (PND), com a Guarda Costeira da República de reforçando o compromisso do País com São Tomé e Príncipe, sendo responsável o fortalecimento da Comunidade dos Pa- pela formação e realização de adestramen- íses de Língua Portuguesa (CPLP), e cria tos dos fuzileiros navais santomenses. A condições para um ambiente de confiança cooperação vem apresentando resultados mútua no entorno estratégico brasileiro, significativos, o que pode ser comprovado que abrange os países africanos lindeiros com o sucesso do exercício combinado com do Atlântico Sul. a Marinha portuguesa. (Fonte: www.mar.mil.br)

4o DN DIVULGA RESULTADOS DA OPERAÇÃO ASURINI

O Comando do 4o Distrito Naval (Belém- Federal, a Receita Federal e a Secretaria de -PA), em cooperação com órgãos de segu- Fazenda do Estado do Pará (Sefa). rança pública e agências governamentais, realizou, de 21 de agosto a 1o de setembro, a Operação Asurini. O propósito foi intensificar as ações ostensivas de Patrulha e Inspeção Naval, a repressão a delitos transfronteiriços e ambientais na região dos municípios de Gurupá e Almerim e nas calhas dos rios Amazonas e Xingu, no estado do Pará. Cerca de 70 militares embarcaram no Navio-Patrulha Bocaina, subordinado ao Comando do Grupamento de Patrulha Naval do Norte, juntamente com a Polícia Atendimento médico em Gurupá

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As apreensões mais significativas foram embarcações foram inspecionadas, seis de 3.200 kg de pescado e de cargas de gêne- notificadas e duas apreendidas. ros diversos, todos transportados sem docu- (Fonte: www.mar.mil.br) mentação fiscal. Em paralelo às fiscalizações e repressões, foram realizadas Ações Cívico-Sociais, com apoio de mé- dicos do Hospital Naval de Belém, junto às comuni- dades ribeirinhas de Gurupá. Foram realizados cerca de 200 atendimentos médicos e distri- buídos 440 medi- camentos. Durante Tripulação do Navio-Patrulha Bocaina, com militares do 2o Batalhão de Operações toda a operação, 55 Ribeirinhas, agentes da Polícia Federal, da Sefa e da Receita Federal

6o DN REALIZA OpRib PRÉ-FRONTEIRA SUL II

O 6o Distrito Naval realizou, de 19 a 23 de junho, a Operação Ribeirinha (OpRib) Pré-Fron- teira Sul II, nas proximidades da região de Corumbá/Ladário (MS). O propósito da ação foi o de incrementar o nível de adestramento dos militares na execução de uma OpRib no bioma do Pantanal. Participaram do exercício cerca de 600 militares e diversos meios navais, aeronavais e de fuzileiros do Comando do 6o DN. Foram empregados seis navios, dois helicópteros de emprego geral e mais de 40 embarcações. Navios suspendem para a OpRib

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A operação também foi marcada pelo emprego de duas aeronaves AF-1A, pertencentes ao 1o Esquadrão de Aviões de Interceptação e Ataque (VF-1), na realização de ataque ao solo e de meios da Força Aérea Bra- sileira e do Exército Brasileiro, na fase final do exercício. (Fonte: www.mar.mil.br)

Fuzileiros Navais durante os exercícios

ESQUADRÃO VF-1 PARTICIPA DA OPERAÇÃO PRÉ-FRONTEIRA SUL II

Foi realizada na região fronteiriça do Pantanal Sul- -Mato-Grossense, entre 19 e 23 de junho último, a Opera- ção Ribeirinha Pré-Fronteira Sul II, conduzida pelo Coman- do do 6o Distrito Naval, com a participação de meios do Exército Brasileiro (EB) e da Força Aérea Brasileira (FAB). Simulando a existência de uma ameaça paramilitar assi- métrica, fruto de um cenário de instabilidade político- -econômica em um fictício país fronteiriço ao Brasil, a AF-1 sobrevoando a região do Pantanal operação teve o propósito de neutralizar a ação de grupos guerrilhei- Pantanal, realizar o apoio de fogo Aéreo ros. Para isso, foram realizadas patrulhas na conquista dos objetivos da operação. navais e uma operação ribeirinha que Dessa forma, duas aeronaves AF-1/1A do permitisse o reestabelecimento da lei e Esquadrão, momentaneamente deslocadas da ordem na região ocupada pela ameaça, para as instalações da ALA-5 (FAB), na por meio do emprego de navios, tropas em cidade de Campo Grande (MS), compu- terra e aeronaves. seram a Unidade-Tarefa de Ataque Aéreo Coube ao 1o Esquadrão de Aviões de e realizaram missões de ataque terrestre, Interceptação e Ataque (Esquadrão VF-1), apoio aéreo aproximado e reconhecimento que pela primeira vez operou sobre o armado ao longo da calha do Rio Paraguai.

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Nas missões de apoio aéreo aproximado, de adestramentos conjuntos para que ela o Esquadrão VF-1 operou com militares possa ser corretamente executada, dado o do Grupamento de Fuzileiros Navais de alto nível de complexidade que a caracteri- Ladário, do Batalhão de Operações Espe- za e a importância de que as coordenações ciais de Fuzileiros Navais e do Grupamento entre o piloto e a tropa em terra sejam de Mergulhadores de Combate. Esses rápidas e precisas. militares trabalharam em conjunto com o A interoperabilidade que caracterizou a Esquadrão durante as duas semanas que operação, somada à diversidade dos meios antecederam a operação, de modo a pa- envolvidos, num ambiente incomum, propi- dronizar procedimentos e propiciar melhor ciou um considerável incremento nos níveis aproveitamento por ocasião do exercício. Já de adestramento de todos os envolvidos, ra- durante a Operação, a condução dos fogos tificando a vocação das aeronaves AF-1/1A no terreno ficou a cargo dos militares do como vetores capazes de incrementar o valor

Tripulação dos Esquadrões VF-1 (MB), 3o BAvEx (EB), 2o/10o (FAB) e 3o/3o GAv (FAB)

Grupamento de Fuzileiros Navais de La- militar das forças navais, proporcionando dário, inseridos no contexto tático do apoio proteção e projeção de poder não somente de fogo de uma companhia de Fuzileiros na Amazônia Azul, mas também nas águas Navais. Esses militares exerceram o papel interiores de nosso território, especialmente de guias aéreos avançados, vetorando as quando elas se encontram em áreas frontei- aeronaves para alvos no terreno. Cabe res- riças, como é o caso do Pantanal, a maior saltar a relevância desse tipo de missão para área úmida continental do planeta. o apoio às tropas em terra e a necessidade (Fonte: www.mar.mil.br)

308 RMB3oT/2017 NOTICIÁRIO MARÍTIMO OPERAÇÃO ACRUX VIII

Navios da Força-Tarefa da Operação Ribeirinha Combinada

Foi realizada de 24 a 27 de agosto Todo o planejamento da Operação Ribei- último, na localidade argentina de Porto rinha Combinada foi realizado com a par- Ibicuy, a fase operativa da Comissão Acrux ticipação das Marinhas envolvidas, com o VIII. Participaram quatro navios da Flotilha propósito de contribuir para o aprestamento de Mato Grosso, uma aeronave do 4o Es- dos meios navais, aeronavais e de fuzileiros quadrão de Helicópteros de Emprego Geral navais, bem como promover a interopera- e 47 fuzileiros navais do Grupamento de bilidade entre as Marinhas participantes. Fuzileiros Navais de Ladário (MS), além Durante os exercícios, foram desenvolvidas de cinco navios da Armada argentina, um ações de Controle de Tráfego Fluvial, As- navio da Armada do Uruguai e destacamen- salto Ribeirinho, Operações Especiais, Pro- tos dos fuzileiros desses países. O Paraguai teção ao Avanço de Força-Tarefa Ribeirinha e a Bolívia estiveram presentes na comissão e Defesa de Base de Combate Ribeirinha. como observadores. (Fonte: www.mar.mil.br)

OPERAÇÃO FRATERNO XXXV

A Marinha do Brasil (MB) e a Armada alizados exercícios de Manobras Táticas, da República Argentina (ARA) realizaram, Operações Aéreas, LeapFrog, Light-Line, de 10 a 18 de agosto último, a Operação Transferência de Óleo no Mar, Tiros sobre Fraterno XXXV, na área marítima entre o Granada Iluminativa, Tiros sobre Killer Rio de Janeiro (RJ) e Itajaí (SC). Tomato, Trânsito sob Ameaça Aérea e Durante os cinco dias de mar, os meios Oposição de Superfície, entre outros. da Esquadra brasileira e a Corveta Spiro, da O tradicional exercício de Transferência ARA, praticaram exercícios para aperfei- de Óleo no Mar foi realizado simultaneamen- çoar o nível de adestramento das unidades te entre o Navio-Tanque Almirante Gastão navais no planejamento e na execução de Motta e as fragatas Rademaker e Consti- operações, além de reforçar os laços de tuição. No primeiro dia, a transferência foi amizade entre estas Marinhas. Foram re- realizada com a passagem do mangote de

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combustível por boreste para a Constituição que o navio realizou esse exercício foi em e pela popa para Rademaker, uma prática que 2008, quando abasteceu simultaneamente já não era realizada há seis anos pelo navio- o Parker, um navio argentino, e a Fragata -tanque. Na ocasião, o Almirante Gastão Rademaker. O reabastecimento simultâneo Motta também realizou a transferência de dos navios diminui o tempo de vulnerabi- combustível para a Corveta Spiro. lidade da Força Naval em ocasião hostil. No segundo dia, o Almirante Gastão Além dos meios da MB citados, integra- Motta teve a oportunidade de realizar a ram a Operação o Navio-Patrulha Gurupá transferência por bombordo e boreste ao e as aeronaves AF-1 e UH-12. Aeronaves mesmo tempo. Nessa ocasião, o navio P-3AM, A-1 e P95, da Força Aérea Brasi- reabasteceu a Constituição por bombordo leira, também participaram dos exercícios. e a Rademaker por boreste. A última vez (Fonte: www.mar.mil.br)

OPERAÇÃO MISSILEX 2017

A Operação Missilex 2017, realizada de (AF-1), os primeiros sinais de afundamento 24 a 28 de julho último, ao sul da Ilha de do casco da ex-Fragata Bosísio já eram Cabo Frio, no Rio de Janeiro, foi marcada observados. As oito bombas de 230 kg pelo ineditismo de alguns procedimentos de aumentaram a tendência de afundamento. combate. Foram cinco dias consecutivos de Com o navio bastante adernado, as fragatas exercícios no mar, de caráter estritamente Liberal e Independência dispararam seus militar, concernentes às tarefas do Poder canhões de 4.5 polegadas e os impactos Naval, empregando mísseis, torpedos, levaram o casco ao fundo. bombas, canhões e metralhadoras. A ope- Ainda no mesmo dia, na parte da tarde, ração teve como propósito incrementar o a Fragata Liberal lançou pela primeira vez aprestamento das unidades da Esquadra míssil Aspide sobre drone e atirou, junta- e afundar o casco da ex-Fragata Bosísio. mente com a Fragata Independência, com Durante a operação, no dia 25, foi canhão de 4.5 polegadas sobre este alvo. realizado lançamento de míssil ar-super- Os tiros de canhões ainda continuaram na fície Penguim por aeronave SH-16. Pela manhã do dia 27, quando os navios testaram primeira vez, a aeronave foi armada com esse míssil em navio da Esquadra, o Navio- -Doca Multipropósito Bahia. Na sequência, a Fragata Ra- demaker lançou míssil super- fície-superfície Exocet MM40. De forma inédita, uma fragata da classe Greenhalgh realizou o disparo de forma integrada ao seu sistema de armas. Mesmo antes do lançamento de bombas pelas aeronaves de interceptação e ataque RbAM Almirante Guillobel rebocando a ex-Fragata Bosísio

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o pronto emprego dos seus armamentos sobre alvo Killer Tomato, de superfície, e alvo aéreo derivante. O término da missão, no dia 28, foi co- roado com o lançamento de torpedo MK46 por aeronave SH-16. A Operação Missi- lex-2017 também con- tou com a participação do Rebocador de Alto- -Mar Almirante Guillo- bel e do Navio-Patrulha Gurupi. Os navios, do Afundamento do casco da ex-Fragata Bosísio Grupamento de Patru- lha Naval do Sudeste, contribuíram com ponsável pela identificação de alterações a operação por meio do reboque do alvo, de flutuabilidade do casco. tarefa que necessitou de longa preparação Visando otimizar a permanência dos e de uma série de adestramentos mensais navios no mar, foram realizados, durante para a tripulação do Almirante Guillobel. o reboque, exercícios de Light Line e Leap O Gurupi atuou como figurativo inimigo Frog, que envolvem aproximações entre no exercício de trânsito sob múltiplas navios para transferências de material ou ameaças e, ainda, como navio auxiliar ao pessoal durante a navegação. longo do trânsito do reboque, sendo res- (Fonte: www.mar.mil.br)

NDM BAHIA COORDENA PRIMEIRO VOO SIMULTÂNEO

Duas aeronaves UH-15 Super Cougar decolaram si- multaneamente, pela primeira vez, dos convoos A e Z do Navio-Doca Multipropósito (NDM) Bahia, em 5 de junho último. Os helicópteros atua- ram em prol da realização da projeção anfíbia em Itaoca (ES), durante a Operação Sinal Vermelho. Essa nova capacitação do NDM Bahia poderá contribuir para a diversidade das opera- ções aéreas desempenhadas Exercício realizado com aeronaves UH-15 Super Cougar

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pela Força Naval, como foi o caso do trans- atuação simultânea com duas aeronaves de porte de tropas e a retirada dos evacuados médio porte elevou o grau de flexibilidade no contexto de uma operação de evacuação e versatilidade do navio. de não-combatentes. A prontidão para (Fonte: www.mar.mil.br)

CPRJ PARTICIPA DE OPERAÇÃO NA BAÍA DE GUANABARA

A Capitania dos Portos do Rio de Janeiro (CPRJ) participou no final do primeiro semestre deste ano, no Rio de Janeiro, de ação de fiscalização noturna do tráfego aquaviário na Baía da Guanabara. A operação foi realizada em conjunto com o Insti- tuto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (Ibama); o Núcleo Especial de Polícia Marítima da Polícia Federal; e o Grupamento Marítimo e Fluvial, unidade da Po- lícia Militar do Estado do Rio de Ja- neiro, a fim de coibir irregularidades, Militares da MB acompanhados de agentes do Ibama e da sob o aspecto da Lei de Segurança Polícia Federal e de policiais militares do RJ do Tráfego Aquaviário, bem como de reprimir a pesca predatória no Como partes do efetivo, foram empre- interior da baía. gados militares da CPRJ, do Comando do Durante a ação, uma equipe de inspeto- Grupamento de Patrulha Naval do Sudeste res navais da CPRJ realizou abordagens a e do Grupamento de Fuzileiros Navais do embarcações, sendo aplicadas notificações, Rio de Janeiro, Organizações Militares enquanto o Ibama autuou uma embarcação subordinadas ao Comando do 1o Distrito e apreendeu sua carga ilegal de cerca de 400 Naval que utilizaram avisos de patrulha e quilos de peixe, que, posteriormente, foram lancha de inspeção naval. doados a entidades carentes de Niterói (RJ) (Fonte: www.mar.mil.br)

MB APOIA REPRESSÃO A DELITOS TRANSFRONTEIRIÇOS NO RIO PARANÁ

A Marinha do Brasil (MB), por inter- Batalhão de Polícia de Fronteira da Polícia médio da Capitania Fluvial do Rio Paraná Militar do Estado do Paraná na repressão (CFRP), apoiou, nos meses de julho e agosto a delitos no trecho do Rio Paraná que se últimos, o Núcleo Especializado de Polícia constitui na fronteira entre o Brasil e o Pa- Marítima (Nepom), da Polícia Federal, e o raguai, no município de Foz do Iguaçu (PR).

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17 eram constituídos por material eletrônico e outros sete por cigarros. Todo o material apreendido foi en- caminhado para a Delegacia da Receita Federal do Brasil em Foz do Iguaçu. Nas ações coordenadas, a CFRP empregou sua lancha de ação rápida com cabine blindada, operando a partir da base do Nepom no Rio Paraná, próxima à Ponte Internacional da Amizade. (Fonte: www.mar.mil.br)

Lancha de ação rápida de cabine blindada da MB em ação no Rio Paraná

As ações de fiscalização do tráfego aquaviário conduzidas pelas equipes da CFRP, em coordenação com as investi- gações e o patrulhamento realizados pelas citadas forças policiais, resultaram em diversas prisões e apreensões por parte dos órgãos de Segurança Pública. No período de 21 a 23 de agosto, foram presas duas pessoas e apreendidos dois carros e 24 volumes de material contraban- deado às margens do rio. Desses volumes, Materiais apreendidos

CLPC – PERITO BRASILEIRO É REELEITO

O Contra-Almirante (Refo) Jair Alberto O Almirante Ribas recebeu 161 votos, Ribas Marques foi reeleito, em 14 de junho em um total de 163 válidos, sendo o segun- último, perito da Comissão de Limites da Pla- do candidato mais votado. Essa reeleição taforma Continental (CLPC), da Organização representa o reconhecimento do trabalho das Nações Unidas (ONU), para mais um realizado naquela Comissão, na qual está período de cinco anos. As eleições foram re- sendo apreciada a proposta brasileira de alizadas em Nova Iorque (EUA), por ocasião extensão da Plataforma Continental além de reunião dos Estados Partes da Convenção das 200 milhas náuticas. das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. (Fonte: Bono no 506, de 30/6/2017)

RMB3oT/2017 313 NOTICIÁRIO MARÍTIMO LEPLAC - O BRASIL ALÉM DAS 200 MILHAS

Uma delegação brasileira esteve reunida, meira fase de aquisição de dados, foram de 8 a 10 de agosto último, com a Comis- coletados cerca de 330 mil km de dados são de Limites da Plataforma Continental sísmicos multicanal, batimétricos, mag- (CLPC) da Organização das Nações Unidas néticos e de gravidade ao longo de toda a (ONU). O propósito da reunião foi defender extensão da margem continental brasileira. argumentações técnicas quanto à aplicação A Proposta de Limite Exterior da Pla- do Art. 76 da Convenção das Nações Unidas taforma Continental Brasileira foi enca- para o Direito do Mar (CNUDM), visando minhada à CLPC em 17 de maio de 2004. à definição da Plataforma Continental além Após as devidas deliberações, a CLPC das 200 milhas náuticas na Região Sul, ou formalizou sua análise em abril de 2007, seja, determinar a área marítima na qual o sob a forma de recomendações, segundo Brasil exercerá direitos de soberania para a as quais o Brasil poderia incorporar cer- exploração e o aproveitamento dos recursos ca de 765 mil km², o que correspondia a naturais do leito e subsolo marinhos. aproximadamente 80% da área pleiteada. A delegação brasileira foi composta por O governo brasileiro, contudo, decidiu dar representantes diplomáticos e militares da continuidade às atividades do Leplac, com Missão Brasileira em vistas à elaboração de Nova Iorque e repre- uma Proposta Revista, sentantes da Diretoria A definição do limite de modo a incorporar de Hidrografia e Na- os 20% inicialmente vegação (DHN), do exterior da plataforma pleiteados. Serviço Geológico do continental será um Assim, em 2008, Brasil e da Universida- legado de fundamental teve início a segunda de Federal Fluminense, fase de aquisição de além de consultores importância para o futuro dados, da qual parti- com reconhecimento das próximas gerações de ciparam dois navios internacional nas áreas brasileiros da Marinha do Brasil de geologia e geofísica. e três navios contrata- A DHN é o braço dos. Foram coletados executivo do Plano de Levantamento da cerca de 440 mil km de dados geofísicos Plataforma Continental Brasileira (Le- ao longo de toda a extensão da margem plac), programa do governo instituído continental brasileira, além de sonoboias pelo Decreto no 98.145, de 15 de setembro e dragagem de rochas nas cadeias Vitória- de 1989, sob a coordenação da Comissão -Trindade e Norte Brasileira. Interministerial para os Recursos do Mar O governo brasileiro aprovou o envio (Cirm), com o propósito de estabelecer o da Submissão Revista sob a forma de limite exterior da Plataforma Continental três Submissões Parciais – Regiões Sul, Brasileira no seu enfoque jurídico. Equatorial, e Oriental/Meridional. Em As atividades do Leplac foram inicia- 10 de abril de 2015, foi encaminhada das em junho de 1987, com a primeira à CLPC a Submissão Parcial Revista Comissão de Levantamento efetuada pelo da Região Sul, já tendo sido realizadas Navio OceanográficoAlmirante Câmara, cinco reuniões com a Subcomissão subordinado à DHN. Durante toda a pri- da CLPC, formada por peritos de Angola,

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Chile, Coreia do Sul, Dinamarca, Japão e Ni- géria, responsável pela análise desta proposta. Sem dúvida, a de- finição do limite ex- terior da plataforma continental será um legado de fundamental importância para o fu- turo das próximas ge- rações de brasileiros, que verão aumentadas as possibilidades de descoberta de novas reservas de petróleo e Delegação brasileira na ONU gás, de exploração de recursos minerais em grandes profundida- como um dos campos mais promissores do des e de explorar recursos da biodiversida- desenvolvimento da biogenética. de marinha, que a ciência atual reconhece (Fonte: www.mar.mil.br)

MB APOIA DEFESA CIVIL NA ENCHENTE DO RIO URUGUAI

A Marinha do Brasil (MB), por meio da A assistência humanitária às famílias afe- Delegacia Fluvial de Uruguaiana (DelUru- tadas pela cheia do Rio Uruguai continuou guaiana), atuou, de 6 a 19 de junho último, até a situação se normalizar. junto às coordenadorias municipais de (Fonte: www.mar.mil.br) Defesa Civil, em apoio às equi- pes de assistência, transporte e remoção das pessoas atin- gidas pelas enchentes do Rio Uruguai ocorridas no início daquele mês. Por ocasião da última cheia, a DelUruguaiana empregou equipes de apoio na cidade de Uruguaiana e no distrito de São Marcos, além dos municí- pios de Itaqui e Porto Xavier, todos no Rio Grande do Sul. Além disso, a DelUruguaiana prestou apoio na retirada de 239 famílias das áreas de risco. Militares da DelUruguaiana prestaram auxílio em Itaqui

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CPAP REALIZA AÇÃO DE PREVENÇÃO AOS ACIDENTES DE ESCALPELAMENTO

A Capitania dos Portos do Amapá e de estudantes da Universidade Federal (CPAP) realizou em 20 de junho último, do Amapá (Unifap) e da Universidade mais uma ação de prevenção aos acidentes Estadual do Amapá (Ueap). por escalpelamento. O trabalho foi realizado Ações desse tipo, quando realizadas em Macapá (AP), em parceria com a Asso- em conjunto com a comunidade local, ciação de Mulheres Ribeirinhas e Vítimas de contribuem para o desenvolvimento da Escalpelamento da Amazônia (AMRVEA). mentalidade de segurança da navegação, Assim como na primeira ação, ocorrida alertando a população para os diversos ris- em 31 de maio, foram prestados serviços cos de acidentes envolvendo embarcações. gratuitos de instalação de coberturas (Fonte: www.mar.mil.br) protetoras nos eixos de embarcações e proferidas palestras sobre segurança da navegação. Duran- te as apresentações, foram abordados te- mas como prevenção aos acidentes por es- calpelamento e pre- venção à poluição hídrica. O eventou contou com a pre- sença de moradores Capitão dos Portos do Amapá, mulheres da AMRVEA e da comunidade local estudantes da Unifap e Ueap

NAsH TENENTE MAXIMIANO REALIZA AÇÕES DE ASSISTÊNCIA HOSPITALAR

O Navio de Assistência Hospitalar (NAsH) Tenente Maximiano, subordinado ao Comando da Flotilha de Mato Grosso, realizou, de 5 a 10 de junho, atendimentos médicos e odontológicos à população do município de Porto Murtinho (MS). O navio é equipado com dois consul- tórios odontológicos, dois consultórios médicos, uma sala para pequenas cirurgias e uma farmácia para distribuição gratuita de medicamentos, além de possuir três Atendimento odontológico realizado no navio

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embarcações orgânicas empregadas para panhado pelo secretário de Saúde, Andrei atendimentos em locais de difícil acesso. Guimarães. Na ocasião, a comitiva conhe- Durante o período em que esteve em Porto ceu as instalações do Tenente Maximiano e Murtinho, o navio recebeu a visita do prefeito acompanhou a realização dos atendimentos. da cidade, Derlei João Dellevati, acom- (Fonte: www.mar.mil.br)

NAsH TENENTE MAXIMIANO REALIZA AÇÕES DE ASSISTÊNCIA HOSPITALAR NOS RIOS PARAGUAI E CUIABÁ

O Navio de Assistência Hospitalar ocasião, foram realizados 134 atendimentos (NAsH) Tenente Maximiano realizou, de médicos e 51 atendimentos odontológicos e 21 a 30 de agosto, atendimentos médicos distribuídos mais de 7.600 medicamentos. e odontológicos nas comunidades ribeiri- (Fonte: www.mar.mil.br) nhas localizadas no Tramo Norte do Rio Paraguai, deslocando-se até o km 72 do Rio Cuia- bá. Durante a Comissão, a equipe de saúde do navio atendeu às comunidades de Jatobazinho, Fazenda Amolar, Porto Mangueiral, Barra de São Lourenço, Paraguai Mirim e Porto Domingos Ramos. A equipe móvel do na- vio foi utilizada também para atender a comunida- des de difícil acesso nas re- dondezas de Baía do Cas- telo, Porto São Francisco, Porto Santa Catarina, Ta- marineiro e Estarume. Na População local embarca para atendimento

NAsH TENENTE MAXIMIANO REALIZA MAIS DE 1.500 PROCEDIMENTOS DE SAÚDE

O Navio de Assistência Hospitalar Paraguai. Foram contempladas as localida- (NAsH) Tenente Maximiano realizou, de des de Porto Morrinho, Porto Esperança, 29 de maio a 16 de junho, comissão de Forte Coimbra e Porto Murtinho, todas no assistência hospitalar no tramo sul do Rio Mato Grosso do Sul, além de localidades

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mais isoladas, em assistên- cias em trânsito. Durante a comissão, fo- ram realizados 479 proce- dimentos médicos e 1.039 procedimentos odonto- lógicos. Houve, ainda, a distribuição gratuita de aproximadamente 27 mil medicamentos, kits odon- tológicos e preservativos. Os pacientes também re- ceberam orientações sobre higiene bucal e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis. (Fonte: www.mar.mil.br) NAsH Tenente Maximiano atracado em Porto Murtinho

LANÇAMENTO DO LIVRO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO SUBAQUÁTICO NA MARINHA DO BRASIL

Foi lançado em 18 de julho último, no O Patrimônio Cultural Subaquático Bra- Museu Naval (Rio de Janeiro-RJ), o livro sileiro é representado na obra pela coleção Patrimônio Arqueológico Subaquático na de artefatos arqueológicos, como canhões, Marinha do Brasil – Objetos oriundos de porcelanas, faianças, utensílios de bordo e sítios de naufrágios na costa brasileira. moedas, oriundos dos naufrágios históricos A obra é uma das iniciativas da Mari- das seguintes embarcações: Nau Nossa nha do Brasil na divul- gação e ampliação do conhecimento sobre o Patrimônio Cultural Su- baquático Brasileiro. O evento foi presidido pelo comandante da Marinha, Almirante de Esquadra Eduardo Bacellar Leal Ferreira, que recebeu o primeiro exemplar das mãos do Vice-Almirante (Refo-EN) Armando de Senna Bittencourt, um dos autores e coordena- dor-geral do livro. Entrega do primeiro exemplar da obra ao Comandante da Marinha

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Senhora do Rosário (1648), Nau Utrecht do Patrimônio Histórico e Documentação (1648), Galeão São Paulo (1652), Galeão da Marinha (DPHDM), e algumas das peças Santíssimo Sacramento (1668), Fragata podem ser vistas na exposição temporária Santa Escolástica (1701), Nau Nossa Se- aberta ao público no Museu Naval, sede nhora do Rosário e Santo André (1735), da Diretoria. O livro traz também textos Mercante Queen, Fragata Dona Paula de diversos especialistas, que abordam (1827), Fragata Thetis (1830), Fragata assuntos como o despertar da Arqueologia Dom Afonso (1853), Brigue Alfama (1809), Subaquática no Brasil e seus desafios na Encouraçado Aquidabã (1906) e Corveta atualidade, navios e embarcações e os sítios Camaquã, além do Paquete Príncipe de de naufrágios, entre outros. Astúrias, que naufragou na madrugada de A publicação, organizada pela DPHDM, 5 de março de 1916, ao largo da Ilha Bela, foi decorrente de participação em Edital litoral de São Paulo, tragédia marítima con- Pronac da Sociedade de Arqueologia Bra- siderada, até os dias atuais, como a maior sileira/Petrobras e contou com o patrocínio acontecida na costa brasileira. Todo esse da empresa Vale S.A. e do Departamento acervo encontra-se sob guarda da Diretoria Cultural do Abrigo do Marinheiro.

MINISTÉRIO DA DEFESA LANÇA “LIVRO VERDE”

O Ministério da Defesa realizou, em sobre a temática do meio ambiente. O livro 2 de junho último, a cerimônia de lança- reúne boas práticas de gestão ambiental mento do livro Defesa & Meio Ambiente. executadas pelas Forças Armadas. O propó- A solenidade ocorreu no Centro Gestor e sito é divulgar essas ações, além de difundir Operacional do Sistema de Proteção da a mentalidade ambiental na sociedade por Amazônia (Censipam), em Brasília. meio dos assuntos contidos na publicação. Popularmente conhecido como “Livro Durante o evento, o ministro da Defesa, Verde”, o documento é uma coletânea reali- Raul Jungmann, destacou que a função da zada pelo Ministério da Defesa, em parceria Defesa, na proteção do território nacional, com a Marinha, o Exército e a Aeronáutica, inclui a proteção ao meio ambiente. “O meio ambiente significa a defesa para as futuras gerações. Não podemos legar águas e atmosfera poluídas, florestas devastadas, mudanças climáticas. O significado do lan- çamento do livro segue o caminho da defesa do futuro da humanidade”, completou. Ao final da cerimônia, o ministro entre- gou exemplares do livro ao secretário-exe- cutivo do Ministério do Meio Ambiente, Marcelo Cruz, e ao presidente substituto do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Ministro Jungmann entrega a publicação ao Luciano Evaristo. presidente substituto do Ibama (Fonte: www.mar.mil.br)

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