Universidade Federal Do Paraná Bruno Campos Cardoso O Chão Onde Se Senta, O Lugar Onde Se Pisa: Etnografia Das Técnicas Do Co
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ BRUNO CAMPOS CARDOSO O CHÃO ONDE SE SENTA, O LUGAR ONDE SE PISA: ETNOGRAFIA DAS TÉCNICAS DO CORPO EM EVENTOS DO BUDISMO TIBETANO CURITIBA 2016 UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ BRUNO CAMPOS CARDOSO O CHÃO ONDE SE SENTA, O LUGAR ONDE SE PISA: ETNOGRAFIA DAS TÉCNICAS DO CORPO EM EVENTOS DO BUDISMO TIBETANO Dissertação apresentada ao curso de Pós-Graduação em Antropologia Social, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes da Universidade Federal do Paraná, como parte das exigências para obtenção do título de Mestre em Antropologia Social. Orientadora: Prof. Dra. Laura Pérez Gil CURITIBA 2016 Para meu pai Carlos Antônio In memoriam AGRADECIMENTOS À Aline e Diva, pelo amor, apoio e confiança irrestrita. À Maria, Ana, Ronald e toda família, pelo carinho que supera as distâncias. À Karina, pela parceria, companhia e afeto – e sobretudo pela paciência e leitura atenta ao longo das várias versões deste trabalho. Ao Jimmy, pela amizade e abertura das portas que possibilitaram essa pesquisa, assim como à Julia, Gustavo e Fernanda pelas práticas conjuntas e acolhida generosa. À Tenzin Wangyal Rinpoche e Lama Padma Samten, pelo privilégio de ouvir seus ensinamentos e instruções, e bem como aos demais professores e instrutores que conheci pelo caminho. Aos interlocutores que participaram direta ou indiretamente deste trabalho, e a todos aqueles que caminham por caminhos tão vastos. À Laura Pérez Gil pela paciente e sempre lúcida orientação. À Eva Scheliga e João Rickli pelas valorosas indicações na banca de qualificação. Ao Alisson, Josi e demais colegas do mestrado, pelas conversas e os percalços acadêmicos compartilhados. Aos colaboradores do Libgen, Sci-Hub e demais ativistas anônimos do conhecimento livre, cujo empenho e determinação viabilizaram meu acesso à boa parte das obras aqui citadas. À todos os meus amigos e amigas, companheiros e companheiras do livre pensar das ruas e das calçadas. Aos mestres do cultivo e do improviso, aos alquimistas dos três tempos e aos poetas de todos os cantos. If the meditator is able to use whatever occurs in his life as the path, his body becomes a retreat hut. Jigme Lingpa RESUMO O objetivo desta dissertação é descrever e analisar parte do arranjo complexo com que o budismo tibetano vajrayana se manifesta nos "circuitos espirituais" brasileiros, tendo como foco os percursos dos praticantes e os modos específicos de transmissão e aprendizado do conhecimento e das técnicas corporais budistas. Neste trabalho procuramos descrever tais circuitos espirituais a partir de eventos (cursos, workshops, retiros) que podem ser compreendidos como entroncamentos dos percursos de vários praticantes. Aos descrevermos as técnicas corporais budistas – em especial a prática da meditação (shamatha) e de uma série do ioga tibetano (tsa-lung) – como modos de experimentação de corporalidades não-ordinárias, demonstramos como essas técnicas são, simultaneamente, o veículo do aprendizado budista e como também fazem parte do cotidiano dos praticantes. Ao produzir uma reflexão sobre a produção de corporalidades na articulação de múltiplos campos de prática, descrevemos o contexto heterogêneo dos retiros e cursos budistas. Trata-se, como veremos, de tipo um de conhecimento do mundo que se constitui e se desenvolve no corpo e a partir do corpo, sobretudo nos contextos e situações de aprendizado e articulações de saberes distintos. Palavras-chave: budismo tibetano; técnicas corporais; meditação; ioga; prática. ABSTRACT This dissertation aims to describe and analyze the complex arrangement by which the tibetan buddhism (vajrayana) manifests in brazilian “spiritual circuits”, with focus on the practitioners’ pathways and the specific modes of transmission and learning of buddhist knowledge and corporal techniques. In this work we describe this spiritual circuits by means of events (courses, workshops, retreats) which can be thought as junctions of many practitioner pathways. Describing this buddhist techniques – the shamatha meditation and a tibetan yoga series called tsa-lung – as modes of experimentation of non-ordinary corporealities, e we show how they become part of practitioner’s everyday experiences. By articulating the production of bodies and practice fields, we portray the heterogeneous context of buddhist retreats and courses and this is a kind of knowledge that is constituted and developed in and from the body. Keywords: tibetan buddhism; body techniques; meditation; yoga; practice. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Detalhe da Roda da Vida.................................................................................40 Figura 2: A Roda da Vida pintada na parede do templo CEBB Caminho do Meio.........58 Figura 3: Os três canais (tsa) por onde a energia (lung) circula pelo corpo...................87 Figura 4: O Arado, recorte do livro “Yantra Yoga: The Tibetan Yoga of Movement”.......90 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Relação dos elementos, partes do corpo, lung e cores..................................88 Tabela 2: Relações entre as dimensões ou aspectos do corpo....................................120 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.................................................................................................................13 Estrutura do trabalho.......................................................................................................17 Nota sobre a convenção dos nomes e termos estrangeiros...........................................19 1. CONSTRUÇÃO DO CAMPO......................................................................................20 Eventos como reuniões...................................................................................................28 Contextos do campo........................................................................................................31 Contexto local & urbano: circuitos, mercados e commodities espirituais...................32 Contexto global & histórico: diáspora, linhagens, meios hábeis.................................35 2. O BUDISMO TIBETANO COMO PRÁTICA...............................................................45 A noção de prática e os praticantes: adentrando no campo...........................................46 Um só ou vários corpos? Roda da vida & Prajnaparamita: vacuidade e a insubstancialidade dos fenômenos.................................................................................56 Etnografia das práticas coletivas: técnicas do corpo, visualizações, auto-observação..64 Tomando refúgio nas Três Joias / ambiente, espaço e as posturas iniciais...............71 Práticas preliminares e práticas centrais: shamatha, yantras e corpos sutis.............82 Dedicação dos méritos: restituição e transformação das relações cotidianas...........92 3. CORPOS SUTIS: ESTRUTURAS E REVERBERAÇÕES DA PRÁTICA..................96 Modos de usar: imitação, conexão e ritmo......................................................................96 Desenhando posturas, imitando formas.....................................................................96 Conexões elementais, corpos expandidos...............................................................100 Imitação como conexão, modos de aprendizado: ajuste rítmico e mímese.............106 Corpo-instrumento, corpo-máquina, corpo-veículo.......................................................110 "Modos de entrar em contato com o deus": técnica e habitus..................................110 Os três corpos conscienciosos..................................................................................115 Da mandala ao corpo-veículo: interfaces e conexões..............................................118 CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................122 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................125 13 INTRODUÇÃO Este trabalho é uma reflexão a partir da minha pesquisa de campo em retiros e cursos relacionados ao budismo tibetano vajrayana no sul, sudeste e centro-oeste do Brasil. O objetivo é delinear parte do arranjo complexo com que o budismo tibetano se manifesta nos "circuitos espirituais" brasileiros, tendo como foco os percursos dos praticantes e os modos específicos de transmissão e aprendizado do conhecimento e das técnicas corporais budista. Meu ponto de partida foi um questionamento acerca das técnicas corporais budistas – em especial sobre a prática da meditação e do ioga tibetano – como modos de experimentação de corporalidades não-ordinárias. Pretendia investigar como essas técnicas eram simultaneamente o veículo do aprendizado budista e como também faziam parte do cotidiano dos praticantes. Entrei em contato com o budismo, como alguns de meus interlocutores, alguns anos atrás, a partir dos Vagabundos Iluminados de Jack Kerouac e das abordagens mais filosóficas de Alan Watts acerca do budismo zen japonês. Numa primeira oportunidade, ainda na graduação em Ciências Sociais, realizei um exercício de campo em uma comunidade zen-budista de Curitiba, participando por três meses das sessões de meditação e de um retiro curto. Algum tempo depois, diagramas das paisagens corporais taoistas, em que o corpo humano aparecia representado por planícies e relevos e fluxos d'água, me chamaram atenção novamente para o tema da corporalidade das práticas contemplativas. Pretendia então, no mestrado, estudar os rituais taoistas de um grupo na cidade de São Paulo, mas minha incursão logo se desviou novamente para o budismo, dessa vez o tibetano, em especial por conta das muitas