PROBLEMAS AMBIENTAIS, USOS CONSUNTIVOS E NÃO CONSUNTIVOS NA GESTÃO DA BACIA DO RIO MACACU, NO MUNICIPIO DE -RJ

Rafael de Andrade Souza ¹; Isabela Missias Santos Gomes ¹, Raphael Abieri Brandão ¹, José Carlos Teixeira Júnior ¹ 1- Aluno Graduando em Geografia - UERJ/FFP Rua Dr. Francisco Portela, 1470 – Patronato CEP 24435- 005 São Gonçalo – RJ- [email protected]; [email protected]; [email protected], [email protected] 1- Introdução O rio Macacú (fig.1) situa-se na vertente atlântica da Serra do Mar, drenando a escarpa montanhosa (denominada Serra dos Órgãos), e englobando colinas e baixadas até desaguar na Baía de Guanabara. Ele é o maior contribuinte da Baía (fig.2), tanto em extensão quanto em volume d'água. Sua economia baseia-se na agricultura e a pecuária bovina. A Serra dos Órgãos é considerada como área prioritária para a conservação da Mata Atlântica, e os remanescentes florestais da Bacia do Macacu são importantes para estudos que embasem teoricamente o desenvolvimento de políticas ambientais que mitiguem o processo de fragmentação na região. O presente trabalho tem como objetivo observar os usos consuntivos e não consuntivos além de traçar um paralelo com as leis ambientais e realidade observada no município

Figura 1- Rio Macacú Fonte: Isabela Missias

2- Área de estudo e características geomorfológico- ambientais A região apresenta-se predominantemente coberta por Floresta Ombrófila Densa Submontana e Montana (IBGE, 1991). Os remanescentes florestais situam-se nos cumes de morrotes (100 a 200m de altitude) sendo circundados por pastagens ou plantações. Estes fragmentos florestais estão geralmente dentro de pequenas ou médias propriedades rurais (agricultura familiar, algumas assentamentos do INCRA, ou casas de veraneio), e às vezes em fazendas de grande porte cuja atividade predominante é a criação de gado leiteiro e de corte. O Estado do foi o que mais desmatou a Mata Atlântica entre os anos de 1990 e 1995, com média anual superior a 28.000ha, restando cerca de 21% da cobertura florestal natural em relação à área do estado (BRASIL, 1998). A avaliação do Índice de Qualidade de Uso do Solo e da Cobertura Vegetal demonstrou a tendência de urbanização do meio rural no estado, enfatizando o risco da pressão antrópica sobre os remanescentes florestais. O município de Cachoeiras de Macacu foi o 5º colocado (51,3%) e o 20º(27,6%), em % de áreas cobertas por floresta ombrófila densa. Incluindo a vegetação secundária, a porcentagem de cobertura aumenta para 66% em Cachoeiras de Macacu, e 40,6% para Guapimirim (FUNDAÇÃO CIDE, 2000). Esses dois municípios possuem respectivamente 100% e 99,94% de sua área coberta pelo Domínio Mata Atlântica tornando-os prioritários para conservação desse bioma.

Figura 2: Rio Macacú e seus principais contribuintes Fonte: www..serla.rj.br

3- Os usos da água O uso consuntivo da água, ou seja, com existência de perdas (partindo do balanço negativo entre derivação e retorno). De acordo com estudos realizados pela Agência Nacional de Águas (ANA) a demanda das diversas variações de usos no estado do Rio de Janeiro, em especial a área de estudo que é o rio Macacú e seus principais contribuintes que serão demonstrados. O abastecimento de água é constituído pela demanda domestica, acrescida de outras, praticamente inseparáveis desta, visto que se referem às atividades que dão origem ao núcleo urbano: indústria, comércio, prestação de serviços públicos. (SETTI et al.2001). Os usos não consultivos aplicados nessa bacia estão relacionados a diluição, assimilação e transporte de esgoto e outros resíduos; o que depende da capacidade de autodepuração do rio(vazão com elementos poluidores).

4- Áreas de preservação ambiental Tem-se verificado com freqüência que a conservação ambiental não pode ser efetivada em longo prazo sem que se considerem igualmente os fatores sociais como determinantes nos processos ditos "ambientais". Este fato se aplica também no caso da gestão de Unidades de Conservação, que muitas vezes não conseguem promover adequadamente sua finalidade básica de conservação da natureza devido à pressão antrópica em seu entorno ou mesmo em seu interior. Analisar a percepção ambiental, como também possíveis conflitos de interesse de comunidades residentes ao longo da APA da Bacia do Rio Macacu, com o intuito de oferecer subsídios à avaliação qualitativa das possíveis implicações sociais e ambientais da existência desta UC na região e, portanto, à elaboração do plano de manejo e ao planejamento e gestão da APA em questão.

4.1- O sistema ambiental A Área de Proteção Ambiental (APA) da Bacia do Rio Macacu (fig.3) foi criada com o objetivo de influenciar de maneira positiva a gestão do uso do solo, protegendo os recursos hídricos através da limitação da extração de areia e o planejamento de outras atividades que, quando mal conduzidas, podem ser danosas aos recursos hídricos. Esta APA compreende todos os terrenos situados numa faixa complementar de proteção, com largura de 150 metros de ambas as margens em toda a extensão do curso de água, desde a sua nascente se estendendo até a APA Guapimirim, na sua desembocadura na Baía de Guanabara, trecho onde o rio Macacu é conhecido como Guapi-Macacu. O seu principal afluente, rio Guapiaçu, possui em sua faixa complementar de proteção idêntica à do rio Macacu. Todos os outros afluentes possuirão faixa complementar de proteção de 50 (cinqüenta) metros em ambas as margens (LEI Nº 4018, DE 05 DE DEZEMBRO DE 2002, Governo do Estado do Rio de Janeiro) Este projeto é realizado dentro das Unidades de Conservação (UCs) pela Bioatlântica, que tem apoio da Feema, Embrapa, UERJ, dentre varias instituições ligadas a preocupação com a preservação ambiental.

LEGENDA

Figura 3: Sistema ambiental de Cachoeiras de Macacú Fonte: www.cachoeirasdemacacu.rj.br

5- O abastecimento de água A bacia do Guapi/Macacu é responsável pelo abastecimento de cerca de 2,5 milhões de habitantes dos municípios de Cachoeira de Macacu, Guapimirim, Itaboraí, São Gonçalo e Niterói, sendo também utilizado para a irrigação e psicultura. A captação para o abastecimento de água é efetuada no canal de Imunana, no município de Guapimirim. Essa captação situa-se no trecho inferior da bacia, que recebe contribuição das sub-bacias dos rios Macacu e Guapi-açu, ficando, porém à jusante das tomadas d'água para diversas finalidades (Helder,1999). No canal do Imunana, afluem as águas dos rios Guapi-açu e Macacu, com áreas de drenagem somando cerca de 1.000 km2, representando aproximadamente ¼ de toda área contribuinte à Baía de Guanabara, sendo, portanto o mais importante manancial da região em quantidade de água. Outro importante rio da região, o Guapimirim, chega ao canal de Imunana à jusante da tomada d'água da CEDAE. Após a confluência com o rio Guapimirim, as águas atravessam a área do manguezal Guapimirim desaguando a Noroeste da Baía de Guanabara. Cabe esclarecer que, manancial com igual capacidade, suficiente para atender à demanda para abastecimento público atual, só é encontrado bem mais distante, podendo-se estudar a possibilidade de utilizar o reservatório de Juturnaíba na bacia do rio São João, ou o rio Paraíba do Sul, que, no entanto, já se encontra comprometido com outros usos. Mananciais subterrâneos também foram analisados e verificou-se que não havia disponibilidade de água suficiente (Helder, 1999). Para elevação do nível d'agua, visando garantir a captação em períodos de estiagem prolongada e impedir a instrução salina, foi construída uma barragem submersa, em concreto armado, com soleira na cota 1m, com referencia ao zero do IBGE. Após a captação, a água segue por um canal de 3.250 m chegando a uma Estação Elevatória, onde é bombeada para 4 Estações de Tratamento de Àgua (ETA) localizadas nas cidades de Itaboraí e São Gonçalo, sendo que nesta última localiza-se a ETA Laranjal, a 2º maior ETA do estado que além do abastecimento desta cidade, é responsável pelo abastecimento de água da cidade de Niterói (CEDAE, 1988). A grande importância da bacia Guapi/Macacu para o abastecimento de água, associado ao elevado grau de destruição ambiental da região evidentemente levaram ao nível do canal de captação, no período de estiagem, apresentar tendências de baixa, contudo, não se poderia supor que a gravidade da situação chegasse ao patamar alcançado nos anos de 2001 e 2002, proporcionando o mais grave problema de abastecimento de água na região Leste da Baía de Guanabara dos últimos 40 anos (O Fluminense, 2002; Jornal Extra, 2002). Para evitar o colapso no abastecimento, soluções emergências foram implementadas para minimizar esta grave situação.

6- Materiais e métodos O campo foi realizado inicialmente percorrendo a rodovia RJ-116 em direção ao centro da cidade de Cachoeiras de Macacú, observando o leito do rio em diversos pontos do trajeto. Com auxilio de GPS nos afastamos da rodovia seguindo por pequenas aglomerações urbanas localizadas às margens do rio, onde foram realizadas perguntas aos moradores em relação à situação atual do rio, verificando a mudança da paisagem ao longo dos anos. Foi observado através da paisagem e do discurso dos entrevistados que tanto o poder público quanto as iniciativas privadas colocam a questão ambiental em segundo plano. Os exemplos mais latentes são a abertura de ruas e construção de condomínios, que por vezes sufocam nascentes e removem grande parte da floresta nativa, bem como o turismo com forte apelo ecológico. No bairro de Boca do Mato está localizado o ponto de captação de água, onde podemos registrar os aquedutos desse sistema que abastece a cidade de considerável centro econômico comercial, que logicamente representa um fator de atração populacional. Neste caso, um importante fator considerado diz respeito ao destino da água pluvial escoada da estrada, pois sabidamente carrega grande quantidade de metais pesados e outros poluentes provenientes da grande frota de veículos que circulam diariamente nesta rodovia, que liga a Região Metropolitana ao Cinturão Verde.

7- Resultados e discussões No trajeto do trabalho foi observado o esgoto residencial sendo lançado diretamente no leito do rio sem qualquer tipo de tratamento. (fig.4) Outro aspecto observado está relacionado à ocupação das margens, que retira a vegetação ciliar, importantíssima para o ciclo hidrológico, altera padrões de drenagem, inibe a recarga dos aqüíferos, aumenta a erosão/sedimentação. Algumas casas possuem , que não garante um destino ecologicamente correto, já que, este pode contaminar “águas subsuperficiais”. É comum observarmos ao longo do rio os dutos de transporte da água captada para abastecer, (fig.4) além do município de Cachoeira de Macacú. Existe também a pressão do turismo ecológico, onde é fácil encontrar, principalmente ao longo do rio, diversas pousadas e restaurantes. Foi identificada uma irregularidade com relação à localização do cemitério, pois esse se encontra numa porção inclinada do terreno, às margens do rio. Quanto ao uso industrial, tiveram como destaque a fábrica Schincariol com grande captação de água para fabricação da cerveja, assim como, indústrias de pequeno porte, geralmente associadas ao setor alimentício. A grande maioria das captações não é de conhecimento da SERLA, estando dessa maneira em desacordo com a lei nº. 3239/99 que prevê que as águas de domínio do Estado, superficiais ou subterrâneas, somente poderão ser objeto de uso após outorga pelo poder público. Também foram observados durante o trajeto usos consuntivos da água para irrigação e dessedentação de animais, o que representa grande risco de contaminação da bacia por defensivos agrícolas.

8- Considerações Finais A gestão participativa, na qual se insere a mediação de conflitos entre agentes sociais, pode se constituir em uma das ferramentas mais adequadas no sentido de superar os problemas identificados e os conflitos de uso que comprometem a conservação das bacias hidrográficas. Dentro de seus limites e diante de um processo de desenvolvimento econômico pautado na expropriação do trabalhador e do patrimônio natural, uma das principais ferramentas para a conservação da natureza são as Unidades de Conservação (UC). Para superar as dificuldades de gestão destas unidades territoriais e as ações que dicotomizam natureza e cultura, a mediação de conflitos, seja resolvendo-os e/ou explicitando-os, só é possível por meio do entendimento das diferentes realidades socioeconômicas e culturais da população associada a estes territórios. A educação ambiental pode atuar diretamente neste aspecto, uma vez que é reconhecida como um instrumento de suma importância para mobilizar a população, trabalhando de forma contextualizada suas múltiplas percepções, necessidades e interesses. A identificação dos atores locais e de suas percepções em relação ao ambiente em que vivem compreende uma das abordagens necessárias para a construção participativa do plano de manejo, pois o conhecimento de diferentes realidades permite a formulação de políticas educacionais mobilizadoras ao processo de gestão participativa. A comunidade em geral não possui uma visão preservacionista da bacia hidrográfica. Este fato pode estar relacionado à ausência de uma educação ambiental voltada para a comunidade mais carente. Em geral, ocorre um embate entre a preservação e o desenvolvimento econômico, no qual o discurso desenvolvimentista quase sempre prevalece. Observa-se que cidades como o Rio de Janeiro que priorizaram o modelo de desenvolvimento não respeitou a natureza, e hoje gastam/gastarão muito com a recuperação das áreas degradadas. A redução da vazão no canal não só é proporcionada pela diminuição de recarga do lençol freático da bacia contribuinte, mas também pelo elevado número de captações não autorizadas. Portanto, deve- se buscar o entendimento dos usuários desta bacia através da comissão pró-comitê das bacias do Leste da Guanabara com o objetivo de apresentar o problema e discutir possíveis alternativas para otimização do uso das águas.

9- Referencias Bibliográficas

AMADOR, E. S. Baía de Guanabara e ecossistemas periféricos: homem e natureza. Rio de Janeiro: E. S. Amador, 1997. 539 p.

CASTRO J.S.M. & Confalonieri, U. Uso de agrotóxicos no Município de Cachoeiras de Macacú (RJ).

LAMEGO, A. R. O homem e a serra. Rio de Janeiro: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 1950. 350 p

SETTI et al. Introdução ao Gerenciamento de Recursos Hídricos. Agencia Nacional de Energia Elétrica; Agencia Nacional de Águas, 2001. 3ª ed. Brasília.

ZBOROWSKI, M.B. & LOUREIRO, C.F. Analisando conflitos: percepção ambiental de comunidades na Área de Proteção Ambiental da Bacia do Rio Macacu