95

COMUNIDADE NEGRA RURAL­RINCÃO DO SANTO INÁCIO­RS SOB A ÓTICA DO CAMPESINATO: UMA ALTERNATIVA DE DESENVOLVIMENTO SOCIO­ AMBIENTAL E CULTURAL SUSTENTÁVEL ATRAVÉS DO PARADIGMA DA AGROECOLOGIA Aline Beatriz Stock Eich¹ Lauro César Figueiredo²

Introdução

O passado cultural é importante para definir espaços, auto­estima, reafirmação social tanto no espaço regional quanto no local, não com a intencionalidade de restauração sociocultural, mas de reencontrar valores que promovam atitudes, projetos de vida, integrações, configurando padrões de vida, traumatismos culturais frutos de mudanças significativas no grupo, alterando o modo de vida e a ordem dos valores existentes (TEDESCO, 1999). Assim, sabe­se, que através da criação de gado e do desenvolvimento das , que se concentravam principalmente na cidade de por volta de 1780, foi intensificado o tráfico de escravos no , outra área de grande concentração foi à estrada dos tropeiros, como ficou conhecida a estrada que ligava o extremo sul de Rio Grande ao restante do Estado, ao longo da qual se encontravam as maiores estâncias, local para onde era trazida a maioria destes escravos que chegavam ao Estado (MAGNOLI, 2001). Com o início do século XIX, após a abolição da escravatura e da Revolução , muitas mudanças continuaram a ocorrer no espaço geográfico e a divisão fundiária foi uma delas. Nesse sentido, povos de origem africana, antes refugiados em fazendas, começavam a formar pequenas comunidades denominadas de quilombos, outros permaneciam nas fazendas, pois a abolição ao contrário do que se pensava havia gerado outros tipos de conflitos, tanto no âmbito territorial quanto étnico­racial. Neste sentido, o Rincão do Santo Inácio destaca­se por ser um espaço social marcado pela terra e pelo parentesco, uma vez que, constitui­se num quilombo localizado em área rural, sendo que, nele se estabelecem relações que despertam elementos históricos de organização da família negra, incorporado a uma história de tradição que etnicamente os diferencia (GUSMÃO, 1995).

¹ Artigo desenvolvido na disciplina de Seminários de Mestrado ­ Programa de Pós­Graduação em Geografia e Geociências (PPGGeo), sob orientação do Profº.Drº.Lauro César Figueiredo. ² Aluna de Mestrado Programa de Pós­Graduação em Geografia e Geociências (PPGGeo)­UFSM. 96 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento

Entretanto, passado mais de 300 anos desde o fim da escravidão no Brasil, algumas comunidades negras, ainda refletem limitações impostas historicamente no pensamento social brasileiro e os entraves relativos a vários aspectos que envolvem este segmento étnico em particular. As considerações que segue, têm por proposta repensar a realidade do espaço rural negro na perspectiva do campesinato, na comunidade negra rural Rincão do Santo Inácio, localizada no município de – RS, seus muitos caminhos e lutas para permanecerem como um grupo ligado a uma terra em particular.

O espaço rural das comunidades negras no contexto do campesinato

Cabe­nos destacar que a vigência da escravidão como relação de trabalho única e absoluta durante o período colonial nas Américas é um mito. Mesmo antes da colonização brasileira, os portugueses já haviam estabelecido em outras colônias, como a ilha de São Tomé, uma forma de mão­de­obra mista entre a escravidão e o campesinato. Nesse caso, o escravo possuía pequenas cotas de terra, que podia cultivar uma vez por semana e cuja a produção lhe pertencia, podia vendê­la no mercado e, assim, arrecadar o dinheiro necessário para comprar sua carta de alforria. Esta figura pouco conhecida, metade escravo, metade camponês esta bem presente no Sul dos EUA e no Caribe. (CARDOSO,2004). Neste contexto, surgem diversos autores que buscam conceituar as comunidades rurais e conseqüentemente a figura do camponês, assim, Kroeber também caracteriza a sociedade camponesa como uma forma de organização social, constituindo sociedades parciais com culturas parciais. Carecem de isolamento, da autonomia política e autárquica dos grupos tribais, mas suas unidades locais conservam sua velha identidade, de integração e apego á terra e aos cultivos (1948, p.284). Neste sentido, devemos estar atentos á algumas questões teóricas metodológicas que permeiam o contexto desta síntese, uma vez que serão analisados ao longo deste estudo, alguns aspectos que buscam aproximar o negro da figura do camponês, inferindo tratar­se do mesmo sujeito, porém com histórias de vida diferentes. Assim, as terras de preto, as comunidades negras rurais ou o quilombo, entre outras denominações, constituem­se no nosso recorte espacial e não podem ser compreendido apenas como um espaço histórico, único ou fisicamente definido. Neste sentido, é válido lembrar e compartilhar da mesma idéia do antropólogo Almeida (1996, p. 18), que sustenta:

O conceito de quilombo não pode ser territorial apenas, ou fixado num único lugar geograficamente definido, historicamente ‘documentado’ e arqueologicamente ‘escavado’. Ele designa um processo de trabalho Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo 97

autônomo, livre da submissão dos grandes proprietários. Neste sentido, não importa se está isolado ou próximo das casas grandes. Há uma transição econômica do escravo ao camponês livre, que só indiretamente passa pelo quilombo no caso do Frechal. O que não foi concebido no lugar onde se ergueu o quilombo foi obtido a partir de debilitado o poder da casa grande, bem junto a ela. Este talvez seja o elemento mais controvertido e que dificulta aos historiadores tradicionais entender a essência do significado de quilombo. Tais historiadores sempre querem colocá­lo numa camisa de força geográfica, como se fora sempre isolado, longínquo, distante dos mercados e produzindo para a subsistência. Ao contrário, aqui se tem uma afirmação econômica de produzir para o mercado, de a ele se ligar e de reverter domínios fundiários reconhecidos pela Lei de Terras de 1850, devido ao fato de os grandes proprietários perderem, circunstancialmente, o poder e buscarem um acordo verbal, prometendo alforria e terra, ante a incapacidade de proverem os recursos para a escravaria se alimentar e produzir.

Nesta mesma linha, visando, desfazer a idéia equivocada de que o quilombo (terras de preto, comunidade negra rural...) é um espaço estático, cuja autonomia foi colocada em dúvida, por muitos pesquisadores, sobretudo aqueles que foram os pioneiros nesta temática, Almeida (2002, p. 53), assevera que:

O quilombo já surge como sobrevivência, como ‘remanescente’. Reconhece­se o que sobrou, o que é visto como residual aquilo que restou, ou seja, se aceita o que já foi. Julgo que, ao contrário, se deveria trabalhar com o conceito de quilombo considerando o que ele é no presente. Em outras palavras, tem que haver um deslocamento. Não é discutir o que foi, e sim discutir o que é e como essa autonomia foi sendo construída historicamente. Aqui haveria um corte nos instrumentos conceituais necessários para se pensar a questão do quilombo, porquanto não se pode continuar a trabalhar com uma categoria histórica acrítica nem com a definição de 1740.

Assim, buscamos retomar o texto original, com a finalidade de compreender o que foi reportado pelo Conselho Ultramarino ao rei de Portugal em 1740, como definição de quilombo: “toda habitação de negros fugidos, que passem de cinco, em parte despovoada, ainda que não tenham ranchos levantados e nem se achem pilões nele.” Essa visão reduzida que se tinha das comunidades negras rurais refletia, na verdade, a “invisibilidade” produzida pela história oficial, cuja ideologia propositadamente, ignora os efeitos da escravidão na sociedade brasileira. (GUSMÃO, 1995). A permanência deste sujeito, numa área rural bastante afastada dos centros urbanos, não o torna vítima de um isolamento cruel que poderia ter­ se dado como conseqüência do 98 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento seu passado escravista ou pela má preparação da sociedade em aceitá­lo enquanto homem livre. Tampouco, permanecem nestas terras por obra do acaso; não, ele existe ali enquanto sujeito da própria história, porque, não se trata de qualquer terra, é uma terra impregnada de simbologia, afetividade, que lhes foi passada pela geração anterior que, também cultivava esse vínculo com a mesma, justificando a resistência e a reprodução da unidade familiar sob esse território. Neste aspecto, muitas comunidades negras rurais privilegiaram áreas distantes dos centros urbanos para estabelecerem seu território, isolando­se da convivência diária do modo de produção e de vida das cidades. Entretanto, segundo O’dwyer (2002), o que não pode acontecer, é, confundir esse isolamento como sendo um regresso ao passado ou um isolamento inconsciente. Devemos considerar que existe ali, uma troca entre os saberes do campo e da cidade, presente na realidade desses grupos, bem como uma ligação com os conhecimentos e hábitos pertinentes a atividade urbana, que proporcionam de certa forma, uma reprodução mais organizada e legitima dos indivíduos nesse território. Refiro­me aqui a questões relacionadas a fluidez das informações, velocidade de informações, entre outros que os colocam á par de assuntos importantes para o grupo, como por exemplo, a interação com outras comunidades negras rurais, que se encontram em níveis mais avançados em relação à certificação das terras e mesmo aos aspectos que envolvem a infra­estrutura È neste sentido, que O’dwyer (2002, p.256), afirma tratar­se

... De um isolamento defensivo, que se propõe a obstaculizar a entrada de pessoas vistas como de fora nos círculos mais íntimos do cotidiano de seus territórios. Entre tais grupos, o isolamento é mantido atualizado de forma consciente, sem ser confundido com o isolamento primitivo, muito pelo contrário, o isolamento consciente visa à seleção e o controle, por parte da comunidade, das relações com o exterior e um domínio do espaço. Trata­se da permeabilidade das fronteiras étnicas, que, ao invés de isolar, elege momentos nas quais as mesmas se abrem.

Deste modo, partindo­se do pressuposto de que a cultura negra é responsável por singularidades, que (re) criam­se sobre esse território, é importante destacar a autonomia exercida por estas comunidades negras rurais. Salientando­se que, esta autonomia é determinante no controle sobre os modos de produção, sobre o trabalho, e conseqüentemente sobre a reprodução dos seus meios de vida. Não podemos, porém aceitar esta autonomia como única e verdadeira; tampouco, privilegiar a dicotomia existente entre o campo e a cidade trabalhando­os como realidades independentes, visto que estes sujeitos estão de alguma forma submetidos a fatores externos que influenciam na organização do seu território. Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo 99

Nesta mesma linha, Oliveira (2002, p.74), Afirma que

...o território deve ser entendido como síntese contraditória, como totalidade concreta do processo/modo de produção/ distribuição/ circulação/ consumo e suas articulações e mediações...O território é assim produto concreto da luta de classes travada pela sociedade no processo de produção que dão configuração histórica específica ao território.Logo o território não é um prius ou a um priori , mas a continua luta da sociedade pela socialização igualmente continua da natureza.

Assim, o território também pode ser compreendido, como a projeção espacial de relações do poder, mas não pode ser jamais compreendido e investigado, no que se refere a sua origem e as causas de suas transformações, sem que o aspecto material do espaço seja devidamente considerado. SOUZA (1995, p.64) Ainda, sobre o território e suas projeções espaciais, Raffestin (1978, p.144), afirma que:

Qualquer projeto no espaço que é expresso por uma representação revela a imagem desejada de um território, de um local de relações, assim, todo projeto é sustentado por um conhecimento e uma prática, isto é, por ações ou comportamentos que é claro, supõem a posse de códigos, de sistemas sêmicos. E são por esses sistemas sêmicos que se realizam as objetivações do espaço, que são processos sociais.

Neste sentido, as comunidades negras rurais, apresentam um conjunto de características, de códigos e simbologias, muito particulares á este segmento étnico. No entanto, seus modos de produção, seus meios para produzir, as formas de organização do território, a maneira como se deu ao longo dos tempos a apropriação da terra, e até mesmo a estrutura das propriedades, acabaram gerando (de) semelhanças, entre as mesmas.

Aspectos Culturais do negro rural e/ou camponês

Quando observamos a distribuição espacial das comunidades negras rurais no Rio Grande do Sul, e até mesmo no restante do país, verificamos que embora exista uma relevante distância geográfica entre muitas destas, inferimos que algumas características apresentam­se de forma homogênea entre as mesmas, outras já diferem em alguns aspectos. A questão cultural é uma delas, visto que permanecem quase inalteradas entre este grupo étnico; com algumas diferenças entre os ramos religiosos, visto que, algumas comunidades ainda manifestam a religião dos seus antepassados, ligados a cultos africanos, como o candomblé, umbanda, enquanto outros grupos aderiram a religiões mais tradicionais como as evangélicas ou católicas, entre outras. 100 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento

No entanto, a evolução do grupo enquanto unidade de produção, bem estar dos iindivíduos, educação, saúde, infra­estrutura das moradias, entre outros, apresentam­se bem mais desenvolvidas em apenas algumas comunidades, principalmente naquelas onde a busca pela legitimação do território e a abertura das fronteiras para os de “fora” deu­se concomitante aos primeiros debates sobre a posse das terras onde hoje se configuram os territórios quilombolas. Um exemplo desse desenvolvimento e autonomia é a comunidade negra rural de Morro Alto, localizada no litoral norte do nosso Estado, onde a infra­estrutura local e a o trabalho coletivo foram alcançados com êxito, e isto só foi possível entre outros fatores, á abertura que a comunidade promoveu para um grupo de fora, que reunia pesquisadores de universidades e órgãos de apoio do governo, que tinham como único interesse o resgate da cultura negra e a preservação da identidade quilombola bem como sua reprodução territorial. As condições materiais de produção desse modo de vida, associadas ao meio e as relações sociais que se constroem a partir disso, asseguram processos sociais nucleados em torno da família, da organização do trabalho, da comunidade, da vizinhança e do parentesco, do mundo exterior, da organização social para a sobrevivência, para a sociabilidade, para o domínio da natureza e para a construção da individualidade. (TEDESCO 1999, p.49). Assim, ao repensar o território rural negro, buscando inseri­lo no contexto do campesinato, encontramos na trajetória deste segmento étnico, em seu modo de vida e na relação que este mantinha com a terra no período da escravidão; talvez o primeiro quesito, digamos assim, que o colocaria como sujeito na perspectiva de ser camponês. Trata­se da brecha camponesa, que diz respeito em parte “as atividades agrícolas, realizadas por escravos nas parcelas e no tempo para trabalhá­las concedidos para esse fim no interior das fazendas.” (CARDOSO, 1979. p. 145). Sendo assim, a brecha camponesa nada mais era do que um incentivo por parte do proprietário da fazenda, então dono dos escravos, que tinha por objetivo fixar a permanência destes em suas terras, inibindo qualquer tipo de resistência, cumprindo, portanto, o que O’dwyer (2002) denominou de função ideológica de manutenção da estrutura escravista. Todavia, a brecha camponesa, também proporcionou ao escravo, uma determinada autonomia econômica, uma vez que este passou a acumular um pequeno capital que era utilizado na compra de produtos que ora os auxiliavam em sua modesta produção, como sementes, por exemplo, ora serviam para satisfazer outras necessidades, como o vestuário. Desta forma, a relação do negro com a terra passa a ter um novo significado, pois, na sua concepção, não existiria mais a idéia de fuga, luta, e resistência, visto que, o seu senhor era bom. Então, fugir da fazenda para quê? Ir para onde? Considerando que, encontravam­se, ali o que lhes era necessário para sua subsistência, ou seja, a terra e o Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo 101 alimento que esta lhes dava; criando­se assim mais que uma relação de troca, mas de reciprocidade e acima de tudo afetiva com esta terra, que mais tarde passa a ser o seu território. Neste contexto, o negro ex­cativo, passa a ser sujeito da sua própria história, uma vez que se materializava no espaço o que circulava no seu imaginário, a liberdade •, e a “propriedade” de uma parcela de terra na qual poderia produzir para seu autoconsumo bem como da sua família e comercializar ou trocar o excedente, pelo que não tinham acesso, conforme foi exposto anteriormente. É neste sentido, que Sidney Mintz (1974), de quem Cardoso (1979) se dissocia no que se refere à dissolução das categorias escravo e modo de produção escravista, defende que, o cativo poderia ser escravo e camponês, ao viver, em forma alternada, as duas relações de produção. Embora algumas linhas teóricas tenham preconizado o fim do campesinato, enquanto classe social, Paulino (2006. p.3), é bastante firme em sua contribuição sobre este grupo em particular, afirmando que

...alguns pressupostos ganharam força, sobretudo aquele que vislumbrava o seu desaparecimento enquanto classe. Entretanto, constata­se que o desenvolvimento capitalista não tem provocado o desaparecimento do campesinato, mas sua recriação.

As discussões sobre as comunidades negras rurais e/ou camponês negro exigem uma reflexão específica tendo em vista que ao longo das últimas décadas este termo, bem como seu significado, vem sendo amplamente discutido, questionado e reconceituado, soma­se a isto algumas hipóteses que surgiram a cerca da classe camponesa, entre elas, a de que a figura do camponês teria deixado de existir; na medida em que o capitalismo crescente tomou conta do espaço agrário de forma imensurável, estabelecendo­se nos lugares mais remotos, fazendo uso massivo de variadas tecnologias (FERNANDES, 2001). Desta forma, segundo essa concepção, o camponês submetido á este modo capitalista de produção teria sofrido uma metamorfose, tornado­se um agricultor familiar, que luta pela permanência no campo, visto as dificuldades encontradas neste setor. No entanto, observando as considerações de autores como Tedesco (1999) e Gusmão (1995), respectivamente sobre o colono italiano e os negros de comunidades rurais, destaca­se a grande semelhança, entre essas duas diferentes categorias históricas de análise. Diferentes, em sua trajetória de vida, em seus costumes e hábitos, em seu modo de apropriação da terra (no momento da instalação). Porém muito próximas, no que se refere ao sentimento pela terra, aos laços de parentesco, ao exercício da coletividade, entre tantos outros aspectos que se assemelham e permeiam seus cotidianos, configurando seu território e materializando­se no espaço, aproximando­os assim da figura do camponês, e do ser camponês. 102 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento

É válido observarmos as colocações de, (TEDESCO 1999, p.50), quando este caracteriza o típico camponês italiano, que dentro desta lógica contracena com o sujeito e/ou camponês das comunidades negras rurais

[...] a ordem social do colono fundava­se na ligação com a propriedade, família e trabalho, este com sentido além do econômico, que ligado á propriedade, formaria o espaço social e a trajetória seqüencial das estratégias de reprodução familiar e organização da individualidade do colono. As estratégias familiares, serão implementadas em função das especificidades que se constroem nesse espaço de sociabilidade preponderantemente rural, de reciprocidade, de laços pessoais e de mercados débeis, de uma moral que fundamenta a solidariedade familiar e comunitária e, de certa forma, o econômico. São construções simbólicas no âmbito objetivo, e também ritualístico, que envolvem laços de matrimônio e contato coma terra nas práticas de trabalho.

Nesta mesma linha, porém privilegiando o sujeito das comunidades negras rurais, bem como o conjunto de particularidades que os diferenciam enquanto segmento étnico, Gusmão (1990. p.116), sustenta que

[...] as especificidades de que são portadores os torna parte do universo camponês brasileiro e, ao mesmo tempo os diferenciam a partir da condição étnica da história particular que lhes deu origem... Constroem coletivamente a vida sob uma base geográfica física e social formadora de uma territorialidade negra. Dentro dela, elaboram­se formas específicas de ser e existir enquanto camponês e negro.

Acrescenta­se, á isto, a cultura do envolvimento comunitário em torno de soluções para os problemas que são uns das marcas do campesinato. Trata­se da ajuda mútua que acontece independentemente desse esforço dirigido (PAULINO, 2006. p.280.), o vínculo afetuoso que se estabelece com a terra, a forma como se teve acesso á ela seja por herança, seja por doação, ou mesmo por apropriação, essa coletividade que se dá em virtude do parentesco e das afinidades, os aproximam muito da perspectiva camponesa. Neste sentido, Paulino (2006) também coloca que, por vezes, é a troca de experiências na comunidade que garante a sua difusão, viabilizando a produção camponesa e que o saber camponês conserva­se justamente porque o processo produtivo se faz no interior da família, passando de geração a geração. Do mesmo modo, ocorre com a autonomia, relacionada à forma de produção, e a manifestação de hábitos e costumes pertinentes a cultura negra que dão configuração ao seu território e que perpassam os paradigmas do capitalismo e de seus instrumentos tecnológicos dos quais a comunidade Rincão do Santo Inácio, não possuí acesso. Baseado nestes aspectos é que chamamos mais uma vez Gusmão (1990 p.117) que sustenta que Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo 103

[...] em conseqüência da relação com a terra, tais famílias passaram a vivenciar problemas próprios da economia de pequenos produtores (da subsistência), problemas de parentesco e de propriedade. Com isso a dupla estrutura que organiza a vida e existência de grupos rurais negros contemporâneos é de mesmo sentido daquela que afeta todo e qualquer grupo camponês... Um espaço social marcado pela terra e pelo parentesco.

Assim, nesse processo de compreensão dos espaços e dos sujeitos, deste novo mundo rural, as valorizações culturais e econômicas da cidade e das indústrias acabam desqualificando saberes e outras racionalidades específicas deste grupo étnico em particular (do negro camponês), conforme afirmou Gusmão anteriormente, surgem problemas próprios. Principalmente no que se refere ao trabalho coletivo da terra, onde nas últimas décadas, o homem que era responsável pela produção e cultivo, teve que sair da “roça” em busca de emprego fora da comunidade e em muitos casos, até em outras cidades, contribuindo para a permanência de outros moradores, pais, esposas, filhos e irmãos na comunidade e colaborando para a permanência, ali, de uma campesinidade, através da alteração do ethos do trabalho. Também nesta perspectiva, Tedesco (1999) coloca que o espaço da casa, das visitas a parentes, entre outros, são atribuídos à mulher, que reforça a visão de poder na esfera do lar. Porém nesta alteração de ethos, em decorrência da saída do homem da roça, é a mulher que assume o papel de trabalhar a terra e, portanto domina mesmo que por períodos, o território masculino. Assim, no modo de vida camponês a representação social da dominação masculina é reforçada na medida em que o grupo doméstico tem um papel fundamental na constituição e manutenção econômica e moral, da unidade familiar. Estas e outras colocações a respeito da organização de vida rural, dos camponeses, visam demonstrar a importância de alguns fatores indispensáveis em suas vidas, tais como a terra, a família e o capital, que já foi explanado por autores como Tedesco e aqui nesta síntese, procura aproximá­las do modo de vida dos negros e/ou camponeses das comunidades rurais, buscando mostrar que estes sujeitos há muitos séculos trabalham a terra e relaciona­se com ela na mesma perspectiva do camponês tradicional e, portanto devem ser vistos como tais. Também, a respeito das relações internas da agricultura camponesa, Chayanov (1974) considera que as mesmas não reproduzem a lógica capitalista, e sim, visam atender, primeiramente, às necessidades e expectativas da família. Guzmán e Molina (2005) ressaltam que, ainda, vinculados ao mercado, mesmo que, a maior parte de sua produção vai para o autoconsumo, seu traço central, é sem dúvida, constituído pela forma de dependência que possui com a sociedade maior em termos de exploração. Nesta mesma linha, o processo de trabalho aponta alguns significados para a compreensão da trajetória do sujeito camponês nas sociedades capitalistas, cuja lógica 104 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento não foi capaz de extingui­los enquanto categoria histórica. Pois, a expansão deste modo de produção é contraditória, marcada por relações sociais de produção capitalistas e também não capitalistas que se reproduzem no seu interior. (FERNANDES, 2008), (MARQUES, 2008). Assim, o campo sociocultural e a nova ordem neoliberal dos mercados podem abrir espaço para uma revalorização do saber e do fazer camponês e até a uma ampliação do setor camponês no contexto da sociedade, porém a perspectiva histórica indica que esta revalorização só será viável se a apropriação deste conhecimento implicar em ganhos nas esferas da acumulação capitalista, dentro desta análise, observa­se que a dominação cultural e suas críticas conformam um campo de realidade polimorfa onde se valorizam determinados saberes, desvalorizando outros. São construções sociais e humanas, que foram e ainda são, historicamente determinadas. (MOREIRA, 2007). Portanto, as comunidades negras rurais, da forma como as percebemos são espaços de transformações constantes, de tensões com a cultura e a natureza, do distante e do próximo, do familiar e do desconhecido, formando no seu conjunto, uma lógica da vida cotidiana baseada em critérios e representações sociais, estabelecendo eixos culturais que tentam, hoje, perpassar ou ser resgatados, com novas interpretações ou com racionalidades adaptativas ao período em que vivemos. (TEDESCO, 1999).

O paradigma da agroecologia como alternativa de desenvolvimento sustentável nas comunidades negras rurais e/ou camponesas.

Antes de iniciarmos o debate que segue, sobre o paradigma da agroecologia, nas comunidades negras rurais, faz­se extremamente necessário, salientar que o objetivo desta síntese, é demonstrar que, o desenvolvimento agroecológico e sustentável podem ser aplicados e trabalhados com mais facilidade e melhor aceitação dentro das comunidades rurais tradicionais. Uma vez que, segundo Sevilla (2001) é a fusão entre a “empiria camponesa” e a “teoria agroecológica” que estabelece um desenvolvimento alternativo, um desenvolvimento rural e sustentável. É neste sentido, através dos seus saberes e práticas camponesas, que estes pequenos agricultores estabeleceram uma relação com a terra que vai além da mesma como capital, a terra, neste universo camponês, representa muito mais, que uma mercadoria, ela é símbolo de autonomia, de domínio sobre a estrutura familiar. E, é a partir desta relação de afetividade que se estabelece entre o camponês e a terra, no qual, o objetivo principal é a manutenção e a perpetuação desta terra para os seus sucessores, que se torna viável aproximar e trazer como sugestão para este debate o desenvolvimento das práticas agroecológicas nas Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo 105 comunidades negras rurais. É válido porque ambos, buscam o mesmo interesse, baseado num resgate de técnicas e saberes tradicionais, que colocados em prática, proporcionarão, a sustentabilidade tanto do agroecossistema (local) quanto da cultura étnica dessas comunidades negras e demais comunidades rurais tradicionais. Salientamos que, mesmo que não existam ainda, no Brasil, comunidades rurais totalmente agroecológicas, existem sim, comunidades negras desenvolvendo projetos em fase inicial, que visam à substituição do modelo agrícola tradicional pelo agroecológico, como é o caso da Comunidade Negra de Jatobá, localizada em Patu, no Rio Grande do Norte, onde a produção de hortaliças e um banco de sementes crioulas e nativas estão dando início às práticas agroecológicas, também como exemplos temos a comunidade quilombola “Terra dos Kalungas”, localizada na Chapada dos Veadeiros, que da mesma forma tentam dar os primeiros passos em busca de um desenvolvimento agroecológico. Assim, o conceito de agroecologia vem buscando nas últimas décadas sistematizar esforços e produzir uma proposta de agricultura abrangente, que seja socialmente justa, economicamente viável e ecologicamente sustentável; um modelo que seja o (re) começo de um novo jeito de relacionar do homem com a natureza, com os meios e modos de produção. Nesta visão estabelece­se uma ética ecológica que implica no abandono de uma moral consumista e individualista e que postula a aceitação e a reprodução da justiça e da solidariedade como valores indispensáveis. (ROSA, 2004). Assim, as comunidades negras rurais são parte integrante de um amplo mosaico étnico­social, ecológico e cultural do cenário agrário brasileiro. Em sua maioria, estas comunidades negras apresentam invariavelmente um quadro de agravante pobreza rural, sendo necessário a análise e o estudo de possibilidades que busquem a inserção econômica desses pequenos camponeses, a partir da elaboração de projetos que permitam a agregação de valor aos produtos agrícolas e não­ agrícolas (GRAZIANO, 1999), e a partir de suas dinâmicas e fatores de desenvolvimento Nesta perspectiva, é a fusão entre a empiria camponesa e a teoria agroecológica que estabelece um desenvolvimento alternativo e um desenvolvimento rural sustentável (GUZMÁN, 2001), considerando que a agroecologia se assenta nas particulares condições locais e na singularidade de suas práticas culturais, contribuindo para o delineamento de um novo paradigma, que atenda as necessidades de uma crise ampla da sociedade moderna e que abra espaço para uma nova visão sobre a questão ecológica (CANUTO, 2003). São essas características socioculturais que reproduzidas no espaço (re) criam as formas endógenas advindas do conhecimento e que perpassam as gerações, sendo que está inserido neste contexto o negro e/ou camponês, portador de especificidades culturais que nas últimas décadas vem mudando a paisagem rural brasileira e regional, 106 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento conformando realidades singulares do seu modo de ser, produzir e reproduzir­se no espaço. Assim, na “agroecologia a agricultura é vista como um sistema vivo e complexo, inserida na natureza rica em diversidade, por isso a agricultura familiar com enfoque agroecológico é sem dúvida uma das formas de expressão do atual ecologismo popular”, visto sua diversificação de culturas e cuidados com preservação do solo em unidades de produção familiar. (CANUTO, 2003, p.131). Nesta perspectiva a agroecologia “é como um paradigma que se abre para a democracia participativa como forma de superar a assimetria social entre incluídos e excluídos” (Canuto, 2003, p.128), é nesse aspecto, que a agroecologia também surge como uma alternativa para os camponeses e/ou negros obterem mais renda de suas terras, uma vez que dependem menos do capital externo ao da sua unidade de produção familiar. Devemos considerar que as comunidades devem explorar características e potencialidades próprias, na busca de diversificação de atividades que lhes tragam vantagens, tanto no âmbito natural, quanto econômico, social, político, e conseqüentemente respeitando a preservação dos recursos. Neste sentido, Guzmán (2005), atenta para a necessidade de se valorizar as culturas tradicionais, neste caso específico (dos negros) que resgatam a trajetória histórica das famílias, devido ao amplo debate que se formou em função da utilização de técnicas modernas de produção, concomitante ao aumento do número de comunidades tradicionais que tem afirmado suas territorialidades. Pois, mesmo que a distância geográfica entre a rede urbana e as comunidades rurais seja pequena, as comunidades negras rurais e as demais comunidades tradicionais mantém sua identidade e sua cultura local, ou seja, a proximidade entre ambas não interferiu em suas características culturais que se transformam com as dinâmicas e reorganizações do espaço, mas permanecem num conjunto de valores que se reproduzem socialmente. Atrela­se a isto, o fato da maioria das comunidades negras, manterem uma relação sustentável no manejo dos recursos naturais, aproximando, portanto, o campesinato da proposta Agroecológica. Entretanto, Gusmão (1996. p. 13), afirma que,

...para além da condição de pequeno produtor de subsistência e força de trabalho disponível para o capital, deve­se descobrir a existência de mecanismos próprios de uma condição histórica que permitiu, não só a existência de grupos rurais negros, mas também sua resistência no tempo. Outra função atribuída à agricultura camponesa é o aspecto sócio­cultural, que equivale ao resgate de um modo de vida que associa conceitos de cultura, tradição e identidade. Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo 107

Também faz parte desse contexto a valorização do desenvolvimento local, baseado em processos endógenos, com o aproveitamento racional dos recursos disponíveis em unidades territoriais delimitadas pela identidade sócio­cultural (ALTAFIN, 2003). Assim, os saberes agroecológico são uma constelação de conhecimentos, técnicos, saberes e práticas dispersas que respondem as condições ecológicas, econômicas, técnicas e culturais de cada geografia e de cada população, entendendo que cada comunidade tem um perfil específico e deve ser valorizada como verdadeira guardiã na construção de modelos de desenvolvimento alternativos. Compreendendo que a diversidade não é apenas biológica, mas também étnico­cultural e religiosa sendo, decisiva para a manutenção da vida. (CANUTO, 2003) Deste modo, conforme afirma Leff, (2001, p. 43)

...na reapropriação de saberes tradicionais e sua hibridação com conhecimentos científicos e modernos, o elemento aglutinante não é o desejo de lucro, senão a reprodução ecológico­cultural do agroecossistema e do território.

Neste contexto, em suas aplicações pontuais, a agroecologia contribui para desmontar os modelos agroquímicos tradicionais, mas sua ação transformadora implica a inserção de suas técnicas e suas práticas em uma nova teoria da produção (LEFF, 1994), configurando­se através

...de um novo campo de saberes “práticos para uma agricultura mais sustentável, orientada ao bem comum e ao equilíbrio ecológico do planeta, e como uma ferramenta para a auto­subsistência e a segurança alimentar das comunidades rurais” (LEFF. 2001 p. 37)

Dessa maneira considerando o camponês, detentor do seu espaço de produção, ou ainda, possuidor de uma territorialidade particular, podemos dizer que ele também se constitui como classe dentro do processo de acumulação capitalista. Assim, sua crescente desterritorialização é resultado das desigualdades entre os atores hegemônicos desse capitalismo. Assim, enquanto a sociedade avança rumo ao consumismo e ao individualismo no anseio de satisfazer as necessidades materiais, o campesinato aparece como uma forma do camponês/negro, enquanto sujeito, se relacionar com a natureza, ao considerar­se agente transformador, dentro de um processo, que visa à união do conhecimento tradicional e conhecimento científico. Conforme exposto anteriormente, o acúmulo de conhecimentos tanto tradicionais quanto científicos é significativo, neste novo paradigma, caracterizando 108 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento

[...] o conhecimento cotidiano como produto tanto da acumulação pessoal, como do acúmulo das sucessivas gerações, e sua circulação depende diretamente da memória e da sabedoria [...] essa forma de produção e de circulação de conhecimentos como epistemologia natural, o que significa que esses conhecimentos ou saberes cotidianos são dotados de valor epistêmico e de grande importância para a própria produção de conhecimento científico (Gomes, 2005, p.90).

Quando abordamos o tema comunidade negra rural e/ou camponesa e/ou agricultura familiar, é intrínseco que o conhecimento tradicional depende da reprodução por meio do surgimento de novos sujeitos e do aprendizado sobre o modo de reprodução que os caracterizam, definindo assim um contexto histórico especifico dos grupos étnicos. É a partir do resgate desses elementos que se permite fundamentar a proposta de um pluralismo metodológico na produção de um conhecimento agrário, tomando como base epistemológica a agroecologia. Esta síntese aborda uma variedade de contextos para a produção e a circulação do conhecimento agrário, bem como busca revalorizar o aspecto social e suas demandas pertinentes as comunidades negras rurais e demais comunidades rurais tradicionais. Neste sentido, os agroecossistemas desenvolvidos a muitas gerações pelos camponeses permitem satisfazer as necessidades locais baseando­se nos princípios da sustentabilidade, muitas vezes nem sabem que o estão fazendo, são atitudes e atividades rurais cotidianas, porém desenvolvidas com muito cuidado, no sentido de preservar para suas gerações futuras, estas unidades familiares, que são reproduzidas aos seus sucessores. Contudo, conforme (Caporal & Hernandéz, 2004).

É considerado também que a matriz comunitária ao qual o agricultor está inserido é de suma importância, já que por meio da matriz sociocultural o agricultor é dotado de uma práxis intelectual e política que define sua identidade local e sua rede de relações sociais; que permitem elaborar propostas de ação social coletivas

Portanto, devem ser reconhecidas e legitimadas como exemplos de aplicação do conhecimento ecológico de certa forma avançado, quando comparado a outras formas de produção. Assim, os moradores das comunidades rurais negras e os camponeses tradicionais, que optem por uma produção agroecológica de alimentos diversificados devem procurar inserir­se dentro de uma lógica comercial que pague preços justos para garantir a reprodução do sistema bem como da unidade de produção. Neste contexto, os sujeitos sociais, representados aqui pelos negros e/ou camponeses, buscam políticas públicas fundamentadas na multifuncionalidade da agricultura, visando o fortalecimento das Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo 109 comunidades composta por unidades de produção familiares e sustentáveis no tempo. Vista como solução, na agroecologia os camponeses são partes de um todo, podem colocar seus conhecimentos à prova; não a prova científica, mas à prova do cotidiano, das estações do ano, da colheita, da memória coletiva dos antepassados. Nela, os camponeses detêm o conhecimento que o pesquisador/cientista quer valorizar e, se possível, aprimorar a partir de estudos que evoquem a antiga produção do espaço cujas bases estejam alicerçadas para um desenvolvimento do território mais humanizado. (ROSA, 2004). Neste contexto, depois de decorrida esta síntese, sabe­se que, o desenvolvimento de um modelo agrícola baseado totalmente no paradigma da agroecologia, não é uma tarefa muito fácil de realizar, porém deve ser trabalhado aos poucos, somando­se as técnicas e saberes tradicionais, ás novas técnicas que o modelo agroecológico nos traz, incorporado nas comunidades negras rurais e demais comunidades camponesas futuramente poderá vir a ser uma prática cotidiana, já que muitas organizações não governamentais e governamentais estão lançando políticas de apóio á este tipo de desenvolvimento. Assim, a comunidade Rincão do Santo Inácio, nossa área de estudo, não faz parte das comunidades que estão dando inicio á essa prática agrícola, tão pouco é sustentável, porém, tentamos com essa abordagem inseri ­ lá nesta perspectiva, sugerindo como foi mencionado ao longo do texto, que por se tratar de uma comunidade camponesa, dotada de particularidades e considerando a relação afetiva que se estabelece com a terra, neste território, o desenvolvimento agroecológico é viável e aplicável. E, assim como nos dois exemplos mencionados, da comunidade do Jatobá e da Terra dos Kalungas, o Rincão do Santo Inácio poderia dar inicio a projetos agroecológico simples, como o cultivo de hortaliças agroecológicas e bancos de sementes crioulas, e talvez assim em longo prazo venha tornar­se a primeira comunidade negra rural totalmente agroecológica.

Referências

ALMEIDA, R. A. A geografia da prática de Ariovaldo e o campesinato: uma homenagem. IN Geografia Agrária. Teoria e Poder. FERNANDES, B.M.; MARQUES, M.I.M.; SUZUKI, J.C. (Orgs). 1ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2007.

ALMEIDA. A.W.B de. Terras de preto, terras de santo e terras de índio:posse comunal e conflito, humanidades. Nº15, ano IV, 1997/1988, Brasília, Ed.UNB. pg42­48.

______: In: na trilha dos grandes projetos­modernização e conflito na Amazônia. Org. Edna. M. R de Castro, Jean Hébette, Belém: NAEA/UFPA 1989. 110 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento

______de Terras de preto, terras de santo e terras de índio:posse comunal e conflito, humanidades. Nº15, ano IV, 1997/1988 Quilombos: sematologia face as novas identidades. In: Frechal: terra de preto. Quilombo reconhecido como reserva extrativista. São Luiz: SMDDH/CCN­ PVN, 1996. 219pg.

ALTAFIN, I. Sustentabilidade, Políticas Públicas e Agricultura Familiar: uma apreciação sobre a trajetória brasileira. Tese de Doutorado, agosto/2003.

CANUTO, J.R. A pesquisa e os desafios da transição agroecológica. Revista Ciência e Ambiente, nº27. Ano 2003. Pg120 ­131.

CAPORAL, F. HERNÁNDEZ, J. M. La agroecología desde Latinoamérica: avances e perspectivas. 2004. Disponível em http://www.agroeco.org/brasil/books_port.html. Acesso em 08/07/10.

CARDOSO, C.F. IV­ A Brecha Camponesa no Sistema Escravista. In: Agricultura, Escravidão e Capitalismo. Ed. Vozes, 1979, pg133 ­ 154.

CARDOSO, C.F. Escravo ou camponês? O protocampesinato negro nas Américas. Ed. Brasiliense. São Paulo,2004.

CHAYANOV, A. La organización de la unidad económica campesina. Buenos Aires: Ediciones Nueva Visión, 1974.

FERNANDES, B. M. Educação do Campo e Território Camponês no Brasil. In:SANTOS, C. A. dos. (org.). Por uma educação do campo. Brasília: INCRA;MDA, 2008.

GRAZIANO, J. da S. O Novo Rural Brasileiro. Campinas: IE/UNICAMP (Série Pesquisa, I, 1999)

GLIESSMAN, S. R. Agroecologia: Processos ecológicos em agricultura sustentável. 3ª Ed. . Editora da UFRGS, 2008.

GOMES, J. C. C. Bases Epistemológicas da Agroecologia. IN Agroecologia: Princípios e Técnicas para uma agricultura orgânica sustentável. AQUINO, Adriana Maria de; ASSIS, Renato Linhares de. (ed. téc.) 1ª Ed. Brasília, DF. Embrapa Informação Tecnológica, 2005.

GUSMÃO, N.M. M de. Negro e Camponês­Politica e Identidade no Meio Rural Brasileiro. Revista São Paulo em perspectiva, V6, nº3, 1992. Pg. 116 a 122.

______. Os direitos dos remanescentes de Quilombos. Cultura Vozes, São Paulo, v. 98, n. 6, 1995.

______. Terras de uso comum: oralidade e escrita em confronto. Afro ­ Ásia, Salvador, v. 16, n. Nov, 1995.

______Terra de pretos, terras de mulheres: terra, mulher e raça num bairro rural negro. Brasília: MINC/ Fundação Palmares, 1996.

GUZMÁN, Eduardo Sevilla; La Agroecología como estrategia metodológica de transformación social. 2006. Disponível em: www.agroeco.org/brasil/books_port.html. Acesso em 13/07/10. Aline Beatriz Stock Eich; Lauro César Figueiredo 111

GUZMÁN. E, S. MOLINA. M. G. de; Sobre a evolução do conceito de campesinato. 3ed. São Paulo: Expressão Popular, 2005.96p.

KROEBER, A.L. Antropology. 2ed.Nova York, Harcout Brace.(1948)

LEFF, E. Racionalidade Ambiental. 1ª Ed. Rio de Janeiro, RJ. Ed. Civilização Brasileira, 2006.

______Ecología y Capital. Racionalidad Ambiental, Democracia Participativa y Desarrollo Sustentable, México: Siglo XXI/UNAM Editores, 1994.

______Saber ambiental. Petrópolis: Vozes, 2001.

MAGNOLI, D. OLIVEIRA, G. MENEGOTTO, R. Cenário Gaúcho­Representações Históricas e Geográficas. São Paulo:Ed Moderna, 2001.

MARQUES, M. I. M. Agricultura e campesinato no mundo e no Brasil: um renovado desafio a reflexão teórica. In.: PAULINO, E. T.; FABRINI, J. E. (org.).Campesinato e territórios em disputa. São Paulo: Expressão Popular, 2008.

MINTZ, W.S. Caribbean Transformations. Published: Chicago: Aldine Pub.Co, 1974.

MOREIRA, R.J. Terra, Poder e Território. São Paulo, Ed. Expressão Popular, 2007.

O´DWYER, Eliane Cantarino (org). Quilombos: identidade étnica e territorialidade. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002, pg. 67­68.

O'WYER, E. C. Os Quilombos dos Trombetas e Erepeairu­Cuminá. 1ªEd­2002 Pará­Ed. FGV. Rio de Janeiro. 296pg.

OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. Modo Capitalista de Produção e Agricultura. 3ª ed. São Paulo. Editora Ática, 1990.

______A geografia agrária e as transformações territoriais recentes no campo brasileiro. In: CARLOS, A.F. A (org.) Novos caminhos da geografia. São Paulo: contexto, 2002. pg. 63­110.

PAULINO, Eliane T. Geografia Agrária e Questão Agrária. In Geografia Agrária. Teoria e Poder. FERNANDES, B.M.; MARQUES, M.I.M.; SUZUKI, J.C. (Orgs). 1ª ed. São Paulo: Expressão Popular, 2007.

______Por uma geografia dos camponeses. São Paulo: Unesp, 2006.

RAFFESTIN, Claude. Por uma geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993.

ROSA, P.P.V. Agroecologia e campesinato: pela valorização do conhecimento tradicional que possa levar a uma gestão do território assentada em bases culturais. Artigo apresentado para o II Congresso Brasileiro de Agroecologia, Porto Alegre/RS 22 a 25 de novembro de 2004. Resumos do II Congresso Brasileiro de Agroecologia Rev. Bras.

SANTOS, M. O espaço geográfico como categoria filosófica. Terra Livre. n.5,pg.9­20,1988. 112 Comunidade negra rural­ Rincão do Santo Inácio­RS sob a ótica do campesinato: uma alternativa de desenvolvimento

SOUZA, M. L. Território da divergência e da confusão: em torno das imprecisas fronteiras de um conceito fundamental. Universidade Federal do Rio de Janeiro.2006

TEDESCO, J, C. Terra, trabalho e família: racionalidade produtiva e ethos camponês. Passo. Fundo: Editora da UPF, 1999.