GOIÂNIA, domingo, 11de novembro de 2012 MAGAZINE / O POPULAR 7 Entrevista MAURO ALENCAR A RECÍPROCA

“Eu respeito ‘ELE FOI UM OBSERVADOR profundamente os meus colegas, mas se tenho DA ALMA HUMANA’ que escolher um ator, é ” Paulo Gracindo em entrevista ao Fantástico Sebastião Vilela Abreu (Rede Globo/TV apresentaçãodolivroUmSéculodePauloGracindo-OEterno Anhanguera), em 1989, Bem-Amado,queeledivideaautoriacomGracindoJúnior.Essa, sobre a fantástica parceria OpaulistaMauroAlencar,50anos,édoutoremTeledramaturgia digamos,fixaçãopeloestiloderepresentardePauloGracindo de ambos em O BrasileiraeLatino-AmericanapelaUSP.Pertencetambémà contribuiu-emuito-paraMauroAlencarestudareensinar Bem-Amado AcademiadeArteseCiênciadaTelevisãodeNovaYork.Esempre televisão.Há20anos,éconsultorepesquisadordaTVGlobo, foifãdePauloGracindo.“Em1971,aos9anosdeidade,emvez ondeministraaindaaulasdeteledramaturgiaemoficinasda demeinteressarpelosprogramasinfanto-juvenis,preferiaas CentralGlobodeComunicação.DeMiami,ondeparticipavado “Paulo Gracindo foi um dos atores peripéciasdobicheiroTucão,pelosubúrbiodoRio,emBandeira CongressoMundialdeTelenovela,Mauroconcedeuentrevistaao da minha predileção, ao lado de 2”,noveladaTVGlobo,escritaporDiasGomes(1922/1999)e POPULAR,viae-mail.Otema,naturalmente,éPauloGracindo, exibidade1971a1972.AdeclaraçãoédadaporMaurona comquemteveoprivilégiodeconvivernaintimidade. (1934/2006). E pude testemunhar Em qual veículo (TV, ci- beu do pai ou ele tinha al- me suas declarações, acre- sua grandeza por ter estado ao seu nema, rádio e teatro), Pau- go especial, comum na vi- dita que o resultado do li- lado durante anos. Fizemos uma lo Gracindo se sentia mais da dosgrandes artistas? vro foi satisfatório e retra- àvontade? O talento nato para a arte taa grandeza de Paulo Gra- amizade muito rica porque era feita Basicamente em todos os dramáticae a vocação para ul- cindo? de lances profundamente veículos, mas destaco o rádio trapassar os obstáculos pró- Sim. Estou completamente humanos. Ele descia do seu e a televisão. No rádio pela fa- prios e comuns da vida. Des- satisfeito com o resultado do cilidade com a qual trabalha- sas duas vertentes forma-se o livro. Assim como fiquei com pedestal de ídolo, eu também, e a va a sua voz, veículo que atin- grande profissional, o grande o filme dirigido por Gracindo gente ria muito, sobretudo um do giu o ápice na juventude do ator! Alem disso, acredito que Junior, Paulo Gracindo, o ator,na década de 1940.Na te- Paulo Gracindo tenha sido Bem-Amado, a origem do li- outro, sobre o que éramos e o que levisão, encontramos o talen- um grande observador da al- vro. Ou seja, são trabalhos as- representávamos, especialmente to de Paulo Gracindo a servi- ma e do comportamento hu- sim que registram para a eter- ço do veículo que inicia seu manos, a base para uma exce- nidade a trajetória de uma vi- ele que era muito engraçado, muito processo de modernização e lente construção psicossocial da,de um ator, dos diversos se- inteligente e muito culto”, industrialização exatamente desuas personagens. res humanos representados Lima Duarte, que conviveu com Paulo Gracindo na década de 1970. Ou seja, por ele. E a celebração de uma durante anos em depoimento no livro Um Século de Paulo Gracindo, um ator ex- Paulo Gracindo perten- existência humana! Mas de- Paulo Gracindo – O Eterno Bem-Amado tremamente popular, foi ao ce a uma geração de atores vo confessar que a grandeza mesmo tempo a base para a que aprendeu no palco. total só conseguimos ao acom- consolidação da comunica- Procópio Ferreira foi seu panhar no vídeo as memorá- ção de massa noBrasil e popu- mestre maior? veis atuações do magistral POR ONDE ELE PASSOU larizou-se por meios desses “Paulo Gracindo, Não exatamente o maior, ator Paulo Gracindo. dois veículos, rádio e televisão, um ator mas os seus mestres, digamos No teatro humorísticos,programas de ainda que o teatro tenha sido a assim,foram as diversas com- Na atualidade, existe al- extremamente A primeira paixão de Paulo Gracindo auditório, teleteatros e casos sua grande escola e o cinema panhias pelas quais Paulo Gra- gum ator com a competên- foio teatro. Aos 18 anos, foi para o especiais: 37 trabalhos. Estreou na uma participação muito espe- popular, foi a base cindopassou: Procópio, Dulci- cia comparável a de Paulo Riode Janeiro virar ator, depois que TV Rio, em 1956, integrando oelenco seu pai morreu. A partir de 1930, doteleteatro A Pérola,adaptação de cial em sua vida, a exemplo de na de Moraes, Jaime Costa e Gracindo? Dias Gomes (1922-1999) do sua atuação em A Falecida (de para a consolidação Elza Gomes são os principais Cada ator é resultado de seu integrou o elenco do Grupo Ginástico Português de Amadores, romance do escritor americano John Leon Hirszman, lançado em da comunicação de exemplos. tempo. O que imortaliza um das companhias de Dulcina de Steinbeck (1902-1968). Últimas 1965) e Terra em Transe (de massa no Brasil e ator é o seu talento, a sua gale- Moraes (1908/1996),Alda Garrido aparições ocorreram no ano de (1896/1970),Procópio Ferreira 1993:na minissérie Agosto, escrita , 1967). A partir Qual a principal caracte- riadepersonagens,criaçõeshu- por Jorge Furtado e Giba Assis Brasila (1898/1979) e Elza Gomes desses dois eixos comunicati- popularizou-se por rística do ator Paulo Gra- manas. E o Brasil, a exemplo partir doromance homônimo de (1910/1984).Em 1966, com a Rubem Fonseca, e no episódio O vosancora-seacarreiradePau- meios desses dois cindo? do que tenho escutado e obser- decadência do rádio,retorna ao Besouroe a Rosa, baseado no livro de lo Gracindo. Não por um aca- Transformar-se a cada no- vadono CongressoMundialde teatro, faz cinema e domina a TV. Em Mario de Andrade (1893/1945), veículos, rádio e 1987,montou O Preço, clássico do so, a transição de um Brasil vo trabalho em um novo ser Telenovela, aqui em Miami, é apresentado na Terça Nobre, uma americano Arthur Miller agrário para um Brasil indus- televisão, ainda que humano, com características umceleirodeexcepcionaisato- criação dodiretor de núcleo Guel trial em todos os setores, o au- completamente distintas para res!PauloGracindo,certamen- (1915/2005),e, também, para Arraes. o teatro tenha sido a muitos, o seu maior legado no diovisualinclusive. cada composição de persona- te, foi um pioneiro que desbra- tablado. No cinema sua grande escola e gem(conforme deixo bem cla- vou caminhos e contribuiu pa- A trajetória de Paulo ro em todaa minha apresenta- ra a valorização da carreira ar- No rádio São 26 filmes. Entre eles a produção o cinema uma americana Tarzan and the Great Gracindo é o retrato de ção). Ou seja, suas atuações tística no Brasil e o seu talento Atuou em duasemissoras de rádio: River,rodado no Brasilna década de uma época que não existe participação tornaram-se verdadeiras re- foi peça-chave para toda a Tupi (década de 1930) e Nacional 1960 e lançado no mercado mundial mais. A que se deve tanta presentações sociais. transformação social e cultu- (décadas de 1930, 1940 e início de em 1967.Nos culturaise muito especial 1950). No veículo, permaneceu por conturbados anos 60,Paulo foi desenvoltura do ator? A rí- ral que um jovem país como o 25 anos. Foi radioator (da dirigido por Leon Hirszman gida formação que rece- em sua vida” Como fã do ator, confor- nossonecessitava. radionovelaO Direito de Nascer, de (1937/1987) em A Falecida (1965) e 1951), locutor e apresentador de Glauber Rocha (1939/1981) em Terra programasde variedades. Com emTranse (1967). Brandão Filho (1910/1998), interpretou ospersonagens primo Na literatura Divulgação ricoe primo pobre, dohumorístico Escreveu dois livros: MeuPecado Balança Mas Não Cai, escritopor Max (poesia), de 1942, e Balança Mas Não Nunes, que migrou para TV. Cai – Primo Pobre, Primo Rico Coisas (humor), de 1953. Escreveu também Na TV composições de músicas, como o sambaNa Base do Amor, gravado por de Paulo Entre novelas, minisséries, Bill Farr (1925/2010). Gracindo Paciência de chinês No rádio, Paulo Gracindo aprendeu com Apesar de não ter tido “Paulo Gracindo, (1903/1964). Quando o com- muito envolvimento com o para mim, continua positor não podia apresentar cinema, pois achava que ti- sendo aquele ator o programa de shows de ca- nha de ter paciência de chi- que a gente deve lourosquecomandavanaRá- nês para enfrentar as cansa- procurar imitar, se dio Nacional, ordenava: tivas jornadas de filmagens, “Bota o Gracindo que ele faz Paulo Gracindo fez história for possível, porque é direito.” E ele fazia direito na sétima arte também. Lo- muito difícil imitar mesmo, tanto que seduziu o go que chegou no Rio de Ja- Paulo Gracindo. Mas ouvinte à frente de Noite de neiro,nadécadade1930,an- a gente pode Estrelas, Hoje Tem Espetácu- tes de completar 20 anos, admirar, né?” lo e Rádio Almanaque Kily- participou de algumas co- nos. médias da Cinédia. Em (1915-1993), Paulo lançou ao estrelato 1941,contracenoucomDul- que trabalhou com o a cantora Emilinha Borba cina Moraes (1908/1996), ator no filme Onde Estás, (1923/2005), que duelou nofilme24HorasdeSonho. Felicidade? com Marlene durante anos Nadécadade1960,foire- pelo título de Rainha do Rá- descoberto pelo cinema no- afirmouFernandaMontene- dio. Desnecessário reafir- Oator nopapel de Antenor nanovela OsOssos do Barão (1973), com Lima Duarte vo. Em 1967, apareceu nas gro sobre o primeiro encon- mar que, nessa boa guerra telas em Terra em Transe, de tro com Paulo Gracindo no de ouvidos apurados, Paulo na, 1971), Odorico Paragua- tos verbais cômicos, o início executivos da mexicana Te- Glauber Rocha cinema em A Falecida, ba- Gracindo sempre se mante- çu (O Bem-Amado, 1973), daexportação das telenove- levisa, que comprou a nove- (1939/1981), e na estreia do seadonaobradeNelsonRo- veao lado deEmilinha. Antenor Camargo Parente las nacionais. Claro, o fato la e depois a espalhou pelo diretorJúlioBressaneemCa- drigues (1912/1980). De- E na televisão com quem de Rendon Pompeo e Ta- de O Bem-Amado ser a pri- mundo. raaCara. pois,Fernanda oconvenceu Paulo Gracindo aprendeu? ques (Os Ossos do Barão, meira novela colorida do Independente do peso do “Paulo Gracindo, para a atuar em Tudo Bem Atuando, se valendo de suas 1973), João Maciel (O Casa- Brasil contribuiu também. autor, Paulo Gracindo, em- mim, continua sendo aque- (1978), de Arnaldo Jabor, e próprias experiências, obser- rão, 1976, personagem que Mas se Dias Gomes bora tenha encontrado exce- le ator que a gente deve pro- se reencontraram em Tran- vando a sociedade, além do foi também interpretado pe- (1922/1999), o autor da vi- lentes novelistas que escre- curar imitar, se for possível, cado por Dentro (1989), cur- aprendizado que acumulou lo seu filho no início da fase da de Paulo Gracindo – com veram para ele, sempre porque é muito difícil imitar ta-metragem de Luciana primeiro no teatro, depois no adulta, Gracindo Júnior) e quem trabalhou em Bandei- atraiu o olhar pela voz firme Paulo Gracindo. Mas a gen- Vendraminietambémaúlti- rádio.Emprestouaoarrogan- Tião Borges (Sinal de Aler- ra 2, Sinal de Alerta, Roque e sedutora presença. Na sua te pode admirar, né?”, disse maapariçãodoatornocine- te coronel Ramiro Bastos, da ta, 1978) indicam não só a Santeiro (na qual viveu pa- penúltima novela, Rainha Grande Otelo (1915/1993), ma. primeiraversãodanovelaGa- evolução arrebatadora do dre Hipólito,de 1986) eMan- da Sucata (de Sílvio de atorecomediantequetraba- “Tinha um aspecto no briela (1975), um hábito do ator Paulo Gracindo como a dala (Vovô Pepe, 1988) – Abreu, de 1990), lançou o lhou com Paulo Gracindo Paulo que me encantava seu avô alagoano. De pegar profissionalização, a indus- não tivesse encontrado o in- bordão: “Coisas de em Onde Estás, Felicidade?, muito: essa loucura dos comidaeguardarnobolsodo trialização datelenovela na- térprete ideal de Odorico, a Laurinha”. Como o milioná- de1939. anos 60, essa malandragem paletó para comer sozinho. cional. mania nacional de se entre- rio falido Betinho Figueroa, “Na hora da ação, entra- suburbana,umcertocafaje- Nasceu daí um dos momen- ter em frente à televisão te- referia-se às excentricida- va um monstro de um ator tismo poético”, observou o tos mais marcantes da tele- DIAS GOMES, O AUTOR ria demorado um pouco desde sua mulher, a vingati- altamentepreparado,quali- cineasta Arnaldo Jabor, que dramaturgianacional. Deve-se à interpretação mais para chegar ao exte- va Laurinha (Glória Mene- ficado e com uma bagagem odirigiuemTudoBem. Arthur do Amor Divino, de Paulo Gracindo como o rior. Foi Paulo Gracindo, co- zes). E competênciaem fren- de estudo sobre o seu perso- o Tucão (Bandeira 2, 1971), político populista e hipócri- mo Odorico Paraguaçu, que te às câmeras é coisa de Pau- nagem que eu não vi em ne- Vejagaleria de fotos Fredda Silva Barros (O Cafo- ta, comseus adoráveis trejei- aliciou, no bom sentido, os lo Gracindo. nhum ator com quem eu te- naversão flip do jornal: nha trabalhado na vida”, www.opopular.com.br