Hebe 60 anos de sucesso 2

Hebe 60 anos de sucesso

Marcos Paulo Bulques Ferreira 3

“ Hebe, quanto mais te conheço, mais te admiro. Você não é apenas uma excelente artista, você é uma figura humana extraordinária. Sinto-me orgulhoso em tê-la como colega, e sinto- me feliz em tê-la como amiga”. 4

Silvio Santos

SUMÁRIO

Considerações iniciais______05

Agradecimentos______07

CAPÍTULO I

Hebe: Uma estrela no ar ______10

CAPÍTULO II

Hebe: A notícia______38

CAPÍTULO III

Hebe por Hebe e por eles______55

Considerações finais______94

Referências Bibliográficas______97 5

Considerações Iniciais

Este trabalho foi desenvolvido com o propósito de analisar a trajetória de vida de , baseado na imprensa periódica entre as décadas de 40 aos nossos dias. Desenvolvemos esse estudo, procurando compreender o mito Hebe Camargo, e como este se constituiu um dos maiores fenômenos de comunicação do Brasil. As nossas reflexões resultaram nos seguintes capítulos a serem retratados nesta pesquisa: No capítulo I, resgatamos a história de vida da apresentadora Hebe Camargo, contextualizando com fatos históricos da época. O trabalho desenvolvido neste capítulo, conta também com mesclagem de entrevistas concedidas à imprensa na qual a apresentadora fala de sua vida. Na contextualização histórica, foram utilizadas bibliografias de historiadores para a narração de fatos sócio-políticos entre as décadas de 20 à 90. Já no capítulo II, ressaltamos a aparição de Hebe Camargo na imprensa brasileira. Foram muitas as notícias da apresentadora em revista, jornais, sites... Um dos fatos que mexeu muito com a apresentadora, foi quando ela se indignou com a morte de um jovem casal assassinados em São Paulo e se referiu ao autor do crime ( um adolescente de 16 anos) que se o entrevistasse, ela o mataria. A declaração de Hebe em rede nacional foi parar no Ministério Público e repercutiu em toda a imprensa, obrigando a apresentadora na semana seguinte, a pedir desculpas aos pais de “Champinha” ( suposto autor do crime). Essas e outras matérias que constam neste capítulo foram pesquisadas em jornais, revistas para a elaboração do mesmo. Por último, no capítulo III, realizamos entrevistas entre janeiro a novembro de 2004. Foram colhidos depoimentos de pessoas que estão ligadas diretamente à televisão, como atrizes, atores, jornalistas, cantores e também pessoas do nosso convívio social. Os depoimentos contam com histórias dos próprios entrevistados juntamente com a apresentadora e de pessoas que simplesmente opinaram a seu respeito. O termino do capítulo finalizamos com duas grandes entrevistas que Hebe deu à imprensa ( Revista Imprensa / Revista Contigo!), onde a apresentadora fala de sua vida, sua carreira, seus amores, suas conquistas, suas decepções... 6

A posição de profissionais diversas áreas, definem Hebe Camargo como um fenômeno da comunicação de massa. Esse trabalho integra também como parte da memória da história da televisão brasileira bem como a trajetória da imprensa desde o governo de Getúlio Vargas até a contemporaneidade. A iconografia em especial a fotografia, é mostrada de forma que o leitor possa visualmente acompanhar a vida profissional e pessoal de Hebe Camargo, através do olhar jornalístico.

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Agradecimentos

Primeiramente à Deus, por guiar meus passos e pensamentos. Aos meus pais, que não mediram esforços para me auxiliarem no que fosse possível. Obrigado pai! Obrigado mãe! À minha irmã, Fátima, que com todos os meus problemas, sempre me estendeu as mãos, colaborando imensamente para a montagem desse livro. Ao meu irmão José Carlos, que sem sua ajuda, seria difícil prosseguir nessa caminhada. À Maria Cristina Telles do Amaral, que soube guiar-me na busca de um norte e me dando forças para uma vida melhor. Obrigado por todo apoio! À minha orientadora, professora doutora Fabíola Imaculada de Oliveira, que tanto me ensinou na busca ao conhecimento permanente. Agradeço a generosidade intelectual e afetiva. Ás professoras Vânia Braz de Oliveira e Elizabete Mayumy Kobayashi, que sempre pararam suas atividades para me escutar. Muito obrigado! À amiga Suely Elizabete de Castro, que colaborou para meu crescimento profissional. Meus sinceros agradecimentos! À Poliana Leite, pelas sinceras palavras amigas. Ao amigo José Evangelista Chagas, pelas dicas, pelos conselhos, também nos momentos que mais precisei.Obrigado Mesmo! Não poderia deixar de agradecer à Emerson Ferreira Scarpelli, pelo auxílio prestado na finalização deste trabalho. Solange Bortoleto, jornalista, incentivadora para minha escolha profissional. Nunca esquecerei o que aprendi com você. Obrigado amiga! Helena Angonese, psicóloga. Obrigado pela entrevista para a concretização desse estudo. Ivone Dias Avelino, historiadora. Suas palavras colaboraram para que eu entendesse o mito Hebe. 8

Márcia Barros Valdívia, historiadora. Obrigado pela ajuda de sempre. Nem tenho palavras para agradecer o tanto que você merece. Obrigado por direcionar meu crescimento pessoal e intelectual. Aos artistas, cantores, apresentadores, jornalista, que pararam para responderem as minhas perguntas. Muitíssimo obrigado! E a todos aqueles que colaboraram indiretamente. Obrigado de coração! 9

“...Nem mesmo o céu , nem as estrelas Nem mesmo o mar e o infinito Não é maior que o meu amor Nem mais bonito Me desespero a procurar Alguma forma de lhe falar Como é grande meu amor por você”. 10

Roberto Carlos 11

Capítulo I - Hebe : Uma estrela no ar

Década de 20. O Brasil passaria pelo enfraquecimento da agricultura cafeeira, pois durante e após a Primeira Guerra Mundial, que durou de 1914 a 1918, a indústria dos Estados Unidos produziu com euforia e sem planejamento. A produção com o passar do tempo (1918–1929) gerou uma quantidade enorme de mercadorias industriais.Com esse aumento, chegando em 1929, a produção era tanta que já não havia quem comprasse todas as mercadorias fabricadas. Assim, os produtos iam ficando parados nos armazéns, desembocando na queda da Bolsa de Valores de Nova Iorque em 1929.

Devido a relação da agroexportação brasileira com os Estados Unidos, os fazendeiros não conseguiam vender o que produziram, estocando seus produtos em especial, o café(1).

A situação era gravíssima no Brasil. Como os produtos não eram vendidos, as fábricas tiveram que diminuir a produção ou fechar. Com isso, milhares de operários ficaram desempregados. Sem emprego, as pessoas deixavam de receber salários e compravam cada vez menos. E no meio de toda essa crise, uma grande modificação na economia cafeeira também no interior de São Paulo, na cidade de Taubaté, mais precisamente no dia 08 de março de 1929, nascia Hebe Maria Camargo.

Taubaté, que foi palco cenográfico dos filmes do saudoso Mazzaropi(2), é também a cidade natal de uma das maiores apresentadoras do Brasil. Filha de Ester Monteiro Magalhães Camargo e Sigesfredo Camargo, mais conhecido como Fego, nascia ali quem mais tarde se tornaria um fenômeno. O nome Hebe, na mitologia, a deusa grega da juventude, realmente coube a melhor pessoa.

1 Existe uma íntima relação entre a Europa em guerra (1914 – 1918) e a crise de 1929 que foi gerada ao longo de onze anos. Durante a guerra os Estados Unidos voltaram sua economia para a exportação de produtos para a Europa que estava em guerra. A indústria norte americana exportou remédios, roupas, armas, alimentos entre outros produtos, desenvolvendo a indústria e lucrando com a exportação. Ao findar da guerra, a Europa em cri- se diminui as importações norte americanas, gerando estoques de produtos nos Estados Unidos no qual o mer- cado norte americano não deu conta de consumir. 2 Ressaltamos que o cineasta e ator Amacio Mazzaropi parodiou cenas da vida brasileira e seu cotidiano através de seus personagens entre eles o Jeca Tatu. Sobre esse assunto confira. SEVCENKO, Nicolau. A capital irra- diante: técnica, ritmos do Rio. in NOVAES, Fernando A. Historia da vida privada no Brasil. Cia das letras. 1998. col.3 p 359. 12

Fego era violinista na época de filmes mudos. Tocava em uma sala de exibição de filmes na cidade de Taubaté, cinema Politeama, quando músicos acompanhavam “ao vivo” as tramas do cinema mudo, até a chegada do cinema falado, que fez o pai de Hebe perder o emprego. Foram tempos difíceis para a família Camargo, quando Fego se via obrigado a tocar em quermesses para garantir o sustento familiar. Hebe, que tinha cinco irmãos, entre eles, Lourdes, Cicida, Paulo, Feguinho e Estela, relembra esse momento humilde de sua infância:

“Eu queria dizer que essa alegria que vocês vêem em mim, sempre, se eu estou com jóias, roupas bonitas, casa bonita, uma pessoa realizada, essa alegria, eu também tinha quando era pobrinha. Nós éramos uma família muito pobre, mas muito alegrinha. Era um astral muito bom na nossa casa. Quando não tínhamos coisas gostosas para comer, a gente fingia que tinha. Então a minha irmã dizia assim: “Hebe, passe a maçã!”. Nunca tinha visto maçã na vida. A minha outra irmã falava: “Um momento que eu vou na geladeira buscar um queijo”.Imagine, nem queijo, muito menos geladeira. Mas nunca tive trauma por causa disso” (3).

Tempos difíceis também para o país quando Getúlio Vargas assumiu o governo em caráter provisório, até que fossem convocadas as eleições para a escolha dos novos governantes. O período em que Getúlio obteve todo o poder, fechando o Congresso e nomeando interventores para os Estados.

Segundo Nelson e Claudino Piletti:

“o novo governo começou atendendo as principais reivindicações dos trabalhadores: criou o salário mínimo, estabeleceu a jornada de oito horas de trabalho, estabeleceu o repouso semanal remunerado e obrigatório, as férias pagas, a indenização pelo tempo de serviço quando o trabalhador fosse demitido, etc. As mulheres conseguiram o direito de votar. Mas, por outro lado, o governo começou a exercer um controle muito grande sobre os trabalhadores. Os sindicatos deveriam obedecer às regras determinadas pelo governo. Os trabalhadores, continuavam, portanto, sem liberdade para se manifestar, para reclamar seus direitos. Em resumo, a situação do povo não melhorou muito, apesar da propaganda do governo que apresentava Getúlio como “ pai dos pobres e dos trabalhadores” (4).

3 Entrevista concedida à apresentadora Meneghel, programa Xuxa, Rede Globo, 1993. 4 PILETTI, Nelson & Claudino.História e Vida. Brasil: Da independência aos dias de hoje.São Paulo. Ática. 1998.p 65. 13

Os paulistas, liderados por Júlio Prestes no Partido Republicano Paulista ( PRP), de modo especial, os fazendeiros do café, não se conformavam com a derrota sofrida com a Revolução de 1930 e queriam reconquistar o controle do governo. Não aceitavam o interventor que Getúlio tinha nomeado para São Paulo, o tenente pernambucano, João Alberto. Os paulistas queriam um interventor civil e paulista, Portanto o PRP lidera a Revolução de 1932 com o ideal de criar uma constituição para o Brasil.

“As manifestações de rua foram crescendo. Os manifestantes, em sua maioria universitários, comerciários e profissionais liberais, para conseguir mais apoio de seu movimento, apresentavam como principal causa da revolta ao fato de Getúlio Vargas não querer convocar eleições e dar uma nova Constituição ao Brasil. Isto é, o governo provisório estava se estendendo por muito tempo, com o presidente mandando e desmandando, sem ter que prestar contas a ninguém. Em maio de 1932 tornaram-se mais intensas as manifestações paulistas contra o governo provisório. Os oradores que falavam exaltados nos comícios, criticavam violentamente os tenentes e os interventores nomeados pelo governo federal. Na noite do dia 23 de maio, os conflitos de rua foram violentos. Primeiro os manifestantes contrários à Getúlio assaltaram uma casa de armas. Em seguida, atacaram as redações dos jornais tenentistas e a Legião Revolucionária, que era o clube político dos tenentes. As forças do governo federal reagiram e quatro estudantes foram mortos: Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo. As iniciais de seus nomes – MMDC – tornaram-se símbolo da Revolução Constitucionalista paulista, que estourou em 09 de julho de 1932. Os revolucionários paulistas esperavam que os Estados de Minas Gerais, Mato Grosso e Rio Grande do Sul, aderissem ao movimento. Mas isso não ocorreu. Somente a região sul do Mato Grosso, sob o comando do general Bertoldo Klinger, acompanhou São Paulo” (5).

A Revolução é travada entre o PRP representando a oposição contra a Aliança Liberal (AL) representando a situação simbolizada por Vargas. Militarmente o PRP perde a guerra mas esse grupo ganha o projeto ideológico para elaborar a Constituição do Brasil. Embora a liderança do país permaneça sob a liderança de Vargas, que continua no poder, no período posterior chamado Governo Constitucional de Vargas (1932 – 1937).

5 PILETTI, Op.cit. p 67. 14

“Embora derrotados, os constitucionalistas de 1932 conseguiram em parte os seus objetivos, pois Getúlio Vargas apressou-se em convocar as eleições para a Assembléia Constituinte. Essas eleições aconteceram em maio de 1933. Foram as primeiras realizadas depois da Revolução de 1930 e apresentavam algumas novidades em relação às da República Velha. As possibilidades de fraude, diminuíram, mas continuaram a existir” (6).

Essa eleição apresentou algumas características normativas que pretenderam se distanciar das eleições do período anterior. Senão vejamos: O voto secreto e obrigatório; todos os brasileiros e alfabetizados que tivessem mais de 18 anos puderam votar, inclusive as mulheres, que votaram pela primeira vez; a organização e a fiscalização das eleições foram feitas pela Justiça Eleitoral que não existia na República Velha, quando as votações eram organizadas pelo governo que, por isso mesmo, sempre saía vencedor; duzentos e cinqüenta representantes da Constituinte foram eleitos pelo voto popular e cinqüenta foram escolhidos pelas associações de trabalhadores, por meio de eleição entre os seus filiados.

“A Assembléia Nacional Constituinte, foi instalada no dia 15 de novembro de 1933. A nova Constituição, a segunda do período republicano, foi promulgada no dia 06 de julho de 1934. Foi mantida a eleição direta para presidente da República, com exceção à Getúlio Vargas, que foi eleito pela Assembléia Constituinte, para exercer o mandato até o dia 03 de maio de 1938” (7).

Vargas não tinha pretensão de deixar o poder. Para isso forja um plano(8), como se esse estivesse sido feito pelos integrantes do Partido Comunista no qual haveriam manifestações grevistas, assassinatos de líderes políticos e igrejas incendiadas. Mas Getúlio Vargas tinha outros planos. Não lhe agradava muito a idéia de deixar o poder. Porém, como continuar no governo? A maneira encontrada foi forjar um plano, como se ele tivesse sido feito pelos comunistas, segundo o qual haveria greves, líderes políticos seriam assassinados, igrejas incendiadas. Seu autor foi o Capitão Olímpio Mourão Filho, e recebeu o nome de Plano Cohen , tendo sido entregue ao ministro da Guerra, Eurico Gaspar Dutra.

6 PILETTI, idem. 7 SKDMORE, Thomas. Brasil de Getúlio à Castelo. . Saga.1969.p 45. 8 Os registros históricos informam que o autor do Plano Cohen foi elaborado pelo capitão Olímpio Mourão Fi- lho, tendo sido entregue para o ministro da guerra Eurico Gaspar Dutra. Cf. SKDMORE,Op.cit. 15

Getúlio Vargas alegou que o Brasil estava sendo ameaçado pelo “perigo” comunista. Desta forma, com o plano nas mãos, convenceu as Forças Armadas de que só um governo forte, uma ditadura poderia enfrentar a ameaça dos comunistas. Assim, as forças Armadas apoiaram o golpe de Getúlio, preparado para o dia 10 de novembro de 1937, e que instalou o chamado Estado Novo. Conforme Nelson e Claudino Piletti:

“Nesse dia, os brasileiros acordaram como em qualquer outro dia, mas o país já não era o mesmo: Getúlio continuaria no poder, agora com força total. Nada de eleições, nada de democracia. A nova Constituição, que já estava pronta, foi “dada” ao país no mesmo dia, concedendo grandes poderes ao ditador. Entre os quais os seguintes: poder de fechar o Congresso Nacional; poder de acabar com os partidos políticos; poder de acabar com a liberdade de imprensa, por meio da censura prévia, sendo somente publicado aquilo que era aprovado pelos censores do governo; poder de nomear interventores nos Estados; poder de governar até que fosse realizada uma consulta popular, um plebiscito, para ver se os brasileiros aprovavam ou não o Estado Novo (isso nunca chegou a ser feito). Portanto, todos os poderes estavam nas mãos do presidente, que era agora um verdadeiro ditador. Para fazer a propaganda de Getúlio e do Estado Novo, foi organizado o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP)(9). Grandes festas cívicas eram organizadas em homenagem a Vargas, de modo especial no Dia do Trabalho (1º de maio), no aniversário do Estado Novo (10 de novembro) e no aniversário do próprio Getúlio. O rádio(10) foi muito utilizado por ele para falar aos “trabalhadores do Brasil”.

9 O DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda) foi criado por decreto presidencial em dezembro de 1939, dois anos após a instauração do Estado Novo com o objetivo de difundir sua ideologia junto às camadas popu- lares. Mas sua origem remontava a um período anterior. Em 1931, ainda no Governo Provisório de Vargas foi criado o Departamento Oficial de Publicidade, e em 1934, já no Governo Constitucional o Departamento de Propaganda e Difusão Cultural (DPDC). Já no Estado Novo, no início de 1938, o DPDC transformou-se no De- partamento Nacional de Propaganda (DNP), que finalmente deu lugar ao DIP. Na imprensa, a uniformização das notícias era garantida pela Agência Nacional. O DIP as distribuía gratuitamente ou como matéria subvenci- onada, dificultando assim o trabalho das empresas particulares. Contando com uma equipe numerosa e alta- mente qualificada, a Agência Nacional praticamente monopolizava o noticiário.Sobre esse assunto cf SEV- CENKO, Nicolau. A capital irradiante: técnica, ritmos do Rio. in NOVAES, Fernando A. Historia da vida privada no Brasil.Op.cit p 354. 10 Quanto ao rádio, buscou-se difundir seu uso nas escolas e nos estabelecimentos agrícolas e industriais, de modo a promover a cooperação entre a União, os estados, os municípios e particulares. O programa oficial "Hora do Brasil" era transmitido para todo o território nacional. Outra realização do DIP foi o "Cinejornal Bra- sileiro", série de documentários de curta metragem de exibição obrigatória antes das sessões de cinema. No "Cinejornal" fazia-se a crônica cotidiana da política nacional, recorrendo-se ao forte impacto dos recursos audi- ovisuais. Alguns filmes eram exportados para países como a Argentina, o Uruguai e o Paraguai.Cf SEVCEN- KO, Nicolau. Idem. 16

A imprensa(11) do período divulga que o governo do Estado Novo deu muita importância à indústria nacional. Para ajudar desenvolver a indústria, planejou a Hidrelétrica de Paulo Afonso, no Rio São Francisco, para o fornecimento de energia; fundou a companhia do Vale do Rio Doce, para extrair e exportar ferro; criou o Conselho Nacional de Petróleo. Mas a obra mais importante foi a fundação da Usina Siderúrgica de Volta Redonda, em 1943. Sua importância foi muito grande, pois passou a fornecer aço à indústria nacional. Com isso, toda a indústria se “desenvolveu” com empréstimos grandiosos de capital norte americano, pois quem financiou a construção de Volta Redonda foram os Estados Unidos. Em troca desse financiamento, Getúlio Vargas entrou na Segunda Guerra Mundial (1939-1945) ao lado dos aliados (Inglaterra, França, União Soviética e Estados Unidos) contra os países do Eixo (Alemanha, Itália e Japão) Durante a década de 40, ilustrada também como a era do rádio(12), a família Camargo deixa a cidade de Taubaté, no Vale do Paraíba e parte para a cidade de São Paulo no ano de 1943. Fego recebeu o convite para integrar-se na Orquestra da Rádio Difusora, na capital paulista. Nesse momento, tudo que recebia era a conta certa para a sobrevivência da família na nova cidade, que anos mais tarde Hebe adotaria de coração. Moravam em um pequeno porão na rua São Joaquim. Hebe estava no quarto ano primário, mas teve que deixar os estudos para ajudar os pais, já que ela estava com quase quinze anos. Hebe foi trabalhar como ajudante de cozinha na casa de uma tia, cuja a mesma tinha uma situação financeira muito boa. Mas a jovem menina não estava contente e queria

11 Praticamente durante todo o seu primeiro governo, de 1930 a 1945, o presidente Getúlio Vargas manteve uma relação conflituosa com a imprensa. O controle sobre ela exercido pelo DIP durante o Estado Novo pode ter contornado problemas, mas certamente não os eliminou. Foi com a ajuda da imprensa que, em 1945, o regime começou a cair, embora Vargas tenha utilizado desta para divulgar seus feitos. Sobre esse assunto cf.Nosso século. São Paulo.Abril Cultural.1980. 12 Os anos 40 e 50, correspondem a “época de ouro” do rádio. No Brasil, era o tempo dos “reis” e “rainhas” de vozes, como: Francisco Alves, Linda Batista, Marlene e Emilinha Borba. O rádio que já vinha dando seus “pri- meiros passos” na década de 20, se expandiu na década de 40 devido a sua agilidade e ao barateamento pro- gressivo do aparelho. As rádios funcionaram como um veículo integrado ao contexto histórico, utilizando e di- fundindo padrões de comportamento. O rádio, o jornal, a novela, os programas de auditório envolviam, cotidia- namente, a todos. Sobre o rádio cf. CABRAL, Sérgio. A MPB na era do rádio. São Paulo: Moderna. 1998.In Valdívia, Márcia Barros. Velhos Tempos, Belos Dias.Roberto Carlos nos Embalos da . p 190. 17 muito mais. Foi então que Hebe passou a se apresentar em programas de calouros no rádio(13) , interpretando músicas de Carmem Miranda. A política da “boa vizinhança” criada pelo presidente Franklin Delano Roosevelt, durante a guerra passou também influenciar a indústria cultural brasileira, onde o cinema trouxe grandes referenciais mitológicos hollyoodianos, através de filmes que expressaram o American Way of life (modo americano de vida) (14).

“O componente ideológico mais importante do americanismo é o progressivismo... Associado ao racionalismo, a idéia de um mundo em abundância e capacidade criativa do homem ameri- cano. Essa dimensão do americanismo enaltece o homem enérgico e livre, capaz de transfor- mar o mundo natural graças a isso o mercado poderia oferecer em abundância vários produ- tos úteis e atraentes, criando uma nova forma de prazer, o prazer de consumir” (15).

Com a política da “boa vizinhança”, a música popular brasileira passou a ser contemplada com uma atenção inédita nos Estados Unidos. Em agosto de 1940, aportou no Rio de Janeiro, o navio norte-americano, Uruguai , conduzindo os 109 músicos da All American Youth Orchestra, tendo como regente um dos maiores nomes da música mundial, o maestro Leopoldo Stokowski. Além de apresentar a orquestra no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, Stokowski veio com a missão, conferida pela gravadora Columbia, a de gravar “a mais autêntica música popular brasileira”. Recorreu ao amigo Heitor Vila-Lobos e este encarregou os compositores , Zé Espinguela e de selecionar os cantores e instrumentistas brasileiros que deveriam participar da gravação a ser feio no próprio navio Uruguai, nos dias 07 e 08 de agosto. Foram gravadas 39 músicas apresentadas pelos três sambistas convidados por Vila-Lobos, além das apresentadas por , João da Baiana, Zé com Fome, Jararaca e Ratinho, Mauro César, Luis Americano, Orfeão Vila- Lobos e por um coro feminino formado por pastoras da Escola de Estação Primeira de Mangueira. Das 39 gravações, 16 foram incluídas num álbum de oito discos de 78

13 O acesso instantâneo à música com todo seu poder de alterar os estados psicológicos e as disposições emoci- onais dos ouvintes, tornou-se logo o aspecto mais contagiante e irresistível da audição radiofônica e a principal fonte de seu poder de transformação cultural. No final dos anos 40 a Mayrink Veiga disputava a preferência dos ouvintes juntamente com a Rádio Nacional. Hebe Camargo em sua trajetória artística se apresentou na Rá- dio Mundial do Rio de Janeiro entre outras. 14 Sobre esse assunto cf. MENEGUELLO, Cristina. Poeira de estrelas: O cinema hollywoodiano na mídia brasileira nas décadas de 40 e 50. UNICAMP. 1992. 15 O autor Antonio Pedro Tota na obra O imperialismo sedutor. A Americanização do Brasil na época da Se- gunda Guerra refere-se a dominação ideológica dos Estados Unidos sobre o Brasil. 18 rotações, lançado pela Columbia, com o título Native Brasilian Music. Tais gravações só foram lançadas no Brasil em forma de long-play, em 1987, o ano do centenário de Vila- Lobos, por iniciativa do violinista Turíbio Santos, diretor do Museu Vila-Lobos. Em agosto de 1941, estreitando os laços político-ideológicos entre Brasil e Estados Unidos chegou ao Rio de Janeiro, Walt Disney. Em início de 1942, outro ícone significativo dos Estados Unidos, o ator e diretor, Orson Welles, conforme relata Sérgio Cabral:

“Das suas andanças pela cidade, incluindo uma visita à Escola de Samba , nasceu o personagem Zé Carioca. Disney também pesquisou bastante a música popular brasileira e acabou selecionando Aquarela do Brasil, de Ari Barroso, para o seu filme, Alô, amigos, no qual também estreou o Zé Carioca. Quando Orson Welles chegou ao Rio de Janeiro, antes de embarcar, ele deu uma entrevista a cadeia norte-americana de emissoras de rádio, a NBC, justificando a sua viagem: “ A razão, mais ou menos oficial, é que fui convidado pelo Departamento das Relações Interamericanas para fazer um filme especialmente para os americanos do Norte e do Sul, um filme que, de maneira particular, possam fortalecer as boas relações que unem atualmente os continentes do hemisfério ocidental”. Orson Welles, que aos 23 anos revolucionara o rádio com um programa que simulou a invasão da Terra por seres de outros planetas, provocando pânico na população norte-americana, e que, aos 25 anos revolucionara o cinema com o seu antológico filme Cidadão Kane, passou vários meses filmando aspectos da vida brasileira, incluindo o carnaval carioca, rodas de samba, rodas de pernada e uma viagem de jangadeiros cearenses de Fortaleza ao Rio de Janeiro. O trabalho jamais seria concluído. Somente mais de 50 anos depois, com Welles já morto, foi feita a montagem com parte do material produzido pelo cineasta, surgindo um filme chamado It´s all true , o mesmo nome do filme que ele queria fazer no Brasil” (16).

A guerra, evidentemente, refletiu em nossa música popular e, em particular, no carnaval carioca. No carnaval de 1943, não houve baile no e Teatro Municipal, que se repetia desde 1932. Não foram realizados também os desfiles das grandes sociedades e dos ranchos. “Festejar o carnaval na situação em que nos encontramos, seria leviandade, senão verdadeira inconsciência”, noticiou o Jornal do Brasil em janeiro de 1943. Segundo Sergio Cabral:

16 CABRAL,Sergio.A MPB na Era do Rádio.São Paulo.Moderna.p 87. 19

“as escolas de samba apresentaram-se no estádio do glorioso Clube de Regatas Vasco da Gama, num desfile promovido por Darci Vargas, pela União Nacional dos Estudantes e pela Liga de Defesa Nacional em benefício da cantiga do soldado combatente” (17).

Em meio às conturbações político-culturais, o rádio continuava desempenhando o seu papel de divulgador cultural através dos noticiários e entretenimentos com suas novelas, programas humorísticos e musicais entre eles os programas de calouros, nos quais Hebe Camargo se apresentava. Com todas as apresentações em programas de rádio, como caloura , Hebe conquistou vários prêmios, o que a levou a formar juntamente com a irmã Estela e as primas Maria e Helena, o Quarteto Dó-Ré-Mi-Fá. Foi um sucesso, rendendo contrato com a Rádio Tupi. Mesmo com o sucesso de Dó-Ré-Mi-Fá, três anos depois o Quarteto deixou de existir. Mas a vida de artista, o glamour de quem estava nos palcos não podia desaparecer. Hebe formou com a irmã Estela a dupla Rosalinda e Florisbela. Infelizmente não tiveram o mesmo sucesso que o Quarteto. A dupla teve vida curta entretanto, felizmente teve quem acreditasse no talento da jovem morena (na época Hebe tinha os cabelos escuros) que mais tarde se tornaria loira definitivamente. O diretor da Rádio Tupi, Gilberto Martins convenceu a artista a se lançar em carreira solo. Foi o início de um sonho que nunca mais acabou. Hebe gravou seu primeiro disco em 78 rotações pela gravadora Odeon, que haviam as músicas “Oh! José e quem foi que disse” (18) onde teve uma grande repercussão na época. Com todo esse sucesso Hebe passou a ser conhecida como “Estrelinha do Samba”, quando naquele tempo, cruzava os corredores da Rádio Nacional com o então locutor de rádio, , período que eles se conheceram e a partir de então a admiração passou a ser inevitável entre eles.

Depois de algum tempo, Hebe já conhecida do grande público, prestou uma homenagem à Carmem Miranda, gravando seus maiores sucessos. A artista teve também por alguns momentos a graça de interpretar. Isso aconteceu quando estava no auge do sucesso como cantora de rádio e foi convidada a participar de alguns filmes do comediante Mazzaropi, grande sucesso da comédia nacional. Também participou do filme “Quase no céu” de Oduvaldo Vianna, lançado em maio de 1949.

17 CABRAL, Idem. 18 As composições Oh! José e quem foi que disse, foram gravadas na década de 40. 20

Início da década de 50. O chamado “Anos Dourados” marcaria a história mundial. Anos que Elvis Presley enlouquecia a juventude. No Brasil, a ano de 1950 foi marcante para a nossa história. A chegada da televisão no país causou uma grande revolução tecnológica nos tempos que o rádio liderava. Exatamente no dia 18 de setembro de 1950 que trouxe para o Brasil a televisão. Foi na cidade de Santos, litoral do Estado de São Paulo, que Chateaubriand recebia os primeiros aparelhos televisores no porto. Hebe foi a convidada especial para aquele momento tão importante. Mas a artista não compareceu, pois estava apaixonada por um músico que naquele momento, apresentava-se em um show. Em seu lugar, no porto de Santos, foi a atriz Lolita Rodrigues, amiga de Hebe, que atendeu ao pedido da amiga apaixonada. Os aparelhos que Chateaubriand trouxe para o Brasil, além de caros, não eram suficientes para naquele tempo alcançarem uma audiência satisfatória. Pensando nisso, Chateaubriand, distribuiu 200 aparelhos televisores para o começo de um bem sucedido negócio. De lá para cá foi só crescimento e sucesso. A chegada da televisão trouxe do rádio a radionovela que passou a ser telenovela, um dos maiores sucessos da teledramaturgia mundial, ficando conhecida em todo o planeta. Ainda no início da década de 50, Hebe fez um teste para apresentação de um programa mas infelizmente foi reprovada pelo diretor Cassiano Gabus Mendes. Segundo Mendes, o cabelo escuro, sobrancelhas grossas e bustos fartos, não agradariam o telespectador(19). Na década de 50, Vargas voltou ao cenário político após o governo Dutra. Ganhando as eleições e voltou com força total, “nos braços do povo”. A partir do momento em que assumiu novamente a presidência, 31 de janeiro de 1951, começou a colocar em prática a sua política popular e nacionalista, que consistia em medidas que “beneficiavam” os trabalhadores e “favoreciam” as empresas nacionais. No ano de 1952 Hebe, nunca desistindo de seu sonho, ganhou um presente.O compositor , apresentava o programa de calouro Hora H, na TV Tupi, quando o apresentador adoeceu e precisava as pressas de um substituto. Hebe foi a solicitada para essa função que a partir daquele momento a credenciava para uma carreira brilhante.

19 NETO,João Amorim. Revista Contigo.São Paulo.Abril.25 de março de 2004.Suplemento especial p 16. 21

Com a apresentação de Hebe na TV, em substituição ao apresentador adoecido, Hebe foi vista e notada como apresentadora. Por esse destaque, três anos mais tarde, surge o primeiro programa feminino da televisão brasileira, “O Mundo é das Mulheres”, no comando de Hebe Camargo. O início definitivamente da carreira de apresentadora que a consagraria tempos mais tarde como uma das maiores apresentadoras do Brasil. O responsável pela produção de “O Mundo é das Mulheres” era Walter Forster do então canal 5, responsável também pelo arranque da carreira da mais nova apresentadora. Depois disso, Hebe chegou a comandar entre “O Mundo é das Mulheres”, mais quatro programas na TV Paulista: Calouros em Desfile, Hebe Comanda o Espetáculo, Com a Mão na Massa e Maiôs à Beira-Mar.

No início dos anos 50, a televisão(20) engatinhava no Brasil, mas aos poucos as novelas foram conquistando o público. Em 1963 com Glória Menezes e Tarcísio Meira, ganhou a forma que tem hoje. Diária, gravada em vídeo-tape, feito com profissionalismo e paixão. Há mais de 50 anos, nas telas da TV, seguíamos uma história que nos contam a prestação. Histórias dos sentimentos básicos do ser humano. Nossos dramas, nossas virtudes, nossas vinganças, nossos amores. A primeira experiência de levar uma novela do rádio para a televisão, aconteceu em dezembro de 1951, na TV Tupi de São Paulo. “Sua vida me pertence” ia ao ar duas vezes por semana, ao vivo, e durou dois meses. O texto, a direção e o papel principal era de Walter Forster, naquela época, galã de novelas de rádio. Já o primeiro beijo na televisão ficou por conta da atriz Vida Alves que afirma que naquela época foi complicado, um tempo conservador, diferente dos tempos de hoje. Naquele tempo a televisão era um palco com pouco espaço e muitas situações de aperto. Hoje o improviso ainda está no ar, mas a televisão só mostra se quiser. Para que essa fábrica de ficção prepare-se tudo, é preciso reunir o trabalho de mais de duzentas pessoas. Gente que trabalha na sombra pelos romances dos outros e quando acaba a cena, sai o cenário também, todos os dias...e enrola, tira, guarda, carrega, carrega...tem a turma do empurra, o pessoal das alturas, que desprega, descola, e lá se vão, as janelas, as portas, as paredes. Quando o cenário fica vazio, termina a cena, mas não a ficção.

20 MORAIS, Fernando.Chatô - O Rei do Brasil.Companhia das Letras.1994. 22

No início da televisão no Brasil, os recursos eram primários, com o equipamento mínimo suficiente para manter a estação no ar e a maior parte dos profissionais trabalhavam dentro dos conhecimentos que haviam adquirido no rádio, no cinema ou no teatro. Com poucas horas diárias de permanência no ar, em geral das 18 às 22h (horário nobre), a programação era bastante variada, veiculando dramaturgia, musical, humorismo, jornalismo, programas infantis, esportes e variedades. Na década de 50 o humor era feito de quadros ou pequenas histórias, utilizando, quando possível, a presença de auditório. Programas de circos eram transpostos para o estúdio exatamente como se apresentavam no picadeiro. Para o público infantil, havia sessões de desenhos animados, gincanas e competições. Os telejornais foram constantes na programação, sendo que os mais famosos, emitidos no horário nobre, tiveram longa duração. As reportagens eram feitas em condições precárias, mais lidas que ilustradas e utilizando como fonte de informação notícias recortadas dos jornais locais. As poucas matérias externas eram realizadas com câmeras de cinema, pois os equipamentos de televisão, muito grande e pesados, não permitiam a agilidade de coberturas diárias que um telejornal necessita. Utilizavam-se os equipamentos de TV em externas apenas para transmissão de esportes.

Com a iniciante força da comunicação da televisão, as agências publicitárias intensificaram as pesquisas de opinião para conhecer os hábitos de consumo dos telespectadores e qual o melhor horário para veicular seus produtos. Criado em 1954, o IBOPE – Instituto Brasileiro de Opinião e Pesquisa, fornecia a audiência. Acelerava-se o fator que viria a se transformar na força dominante da televisão: a publicidade.

Enquanto o país vivia o populismo ideológico no slogan de JK “50 anos em cinco”, conforme afirma Costa/Mello: “foi marcado por intenso e acelerado crescimento econômico: “ Cinqüenta anos de progresso em cinco de governo” era o seu lema. Sua política econômica, delineada no Plano de Metas, privilegiou, entretanto, particularmente o setor industrial. O sociólogo Gabriel Cohn afirma: “Encarado do ponto de vista do que se propunha, esse programa (Planos de Metas), foi bem sucedido, ao menos do que se refere à produção industrial, que se expandiu amplamente (cerca de 80% entre 1955 à 1961) e , o que é mais importante, com predominância da produção de bens de capital ( siderurgia, indústria mecânica, de material de transporte, etc.) 23

”. No tocante ao setor de produção alimentar, entretanto o mesmo sociólogo diz que “(...) os resultados foram menos brilhantes, em razão da própria inércia relativa do setor agrário”. A política econômica adotada por Juscelino baseava-se na realização de investimentos diretos, quase sempre precedidos de intensa emissão monetária , e na abertura do capital estrangeiro. Tal estratégia econômica resultou na expansão e consolidação de um capitalismo extremamente independente. A intensa emissão monetária agravou o processo inflacionário, enquanto a expansão do capital estrangeiro no país, atraídos por favores ou privilégios concedidos pela Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC), ocasionou uma desnacionalização econômica. As empresas estrangeiras apossaram-se do controle das indústrias-chave de nossa economia e, em pouco tempo, passaram a remeter ao exterior lucros de investimentos introduzidos originalmente” (21).

A década de 60 foi inesquecível na nossa história. Anos que o medo tomava conta do nosso país, os anos de chumbo, os anos rebeldes, anos do poder militar, do início de uma ditadura que iria durar 20 anos mas que também iria marcar as nossas vidas que segundo Teixeira::

“O golpe militar de 1964 não ocorreu de forma inesperada, nem por razões meramente circunstanciais. A derrubada do governo Goulart, governo constitucional e democraticamente eleito, foi o desfecho de uma prolongada crise político-institucional, aprofundada desde a denúncia de Jânio Quadros em 1961. Ao mesmo tempo, essa crise política combinava-se com os problemas decorrentes de uma clara retração das atividades econômicas. De maneira resumida pode-se dizer que as causas estruturais do golpe militar foram: os anos 60, particularmente entre 1962 e 1967, foram marcados por uma forte redução dos investimentos, gerando desemprego e desabastecimento; a inflação em alta corroia os salários e desequilibrava as pequenas e médias empresas; no governo Goulart, a crise do Estado populista atingiu o limite: a radicalização ideológica da “política de massas” acabou sendo o fator mais de desestabilização de que o apoio ao Estado; amedrontada com a radicalização ideológica, e ameaçada nos seus interesses econômicos, a burguesia, com apoio das camadas médias conservadoras, volta-se contra o governo e as instituições; a conspiração interna é apoiada pelos Estados Unidos, com recursos financeiros, pressões político-diplomáticas e atuação de agentes e agitadores, tudo em nome dos imperativos da Guerra Fria. Assim, o término de mais uma fase do processo de industrialização e esgotamento das possibilidades do populismo político, num quadro de crescente dependência do país em relação aos Estados Unidos, levaram a burguesia brasileira a procurar nos quartéis a solução do golpe. Chamado de movimento revolucionário ou simplesmente de Revolução de 1964, e apoiando-se

21 COSTA,Luis César A.&MELLO, Leonel Itaussu A. História do Brasil São Paulo.Scipione.1991.p 274. 24

diretamente nos comandos militares, o golpe não apenas levou um general para um governo, mas começou rapidamente a organizar um regime autoritário. Leis e decretos arbitrários, reforma eleitoral, nova Constituição, repressão política e sindical, mostravam que o regime militar não era provisório, mas viera para ficar. No primeiro governo militar, do general Castelo Branco, são lançadas as bases político-administrativas e ideológicas do regime: maior centralismo, fortalecimento do poder executivo, extinção dos partidos existentes e criação do bipartidarismo, cassação de inúmeros mandatos parlamentares, intervenção em sindicatos e universidades, suspensão dos direitos políticos de grandes números de cidadãos e rompimento das relações com Cuba. Na equipe de governo estão juntos antigos liberais da UDN e do PSD e ideólogos conservadores, ligados à Escola Superior de Guerra. As funções de vigilância político-ideológica são centralizadas no recém-criado Serviço Nacional de Informações (SNI).

No auge da carreira, Hebe conhece o empresário Décio Capuano e surpreende a todos ao se casar com ele no dia 14 de julho de 1964. Hebe se ausenta da televisão. Em 20 de setembro de 1965 nasce seu único filho(22), Marcelo Camargo Capuano. Hebe dedicou tempo exclusivo à família. Mas à distância da vida artística não durou muito. De dentro de sua casa a apresentadora comandou um programa pela Rádio Excelsior, em 1966, direto do bairro do Sumaré, onde vivia com a família. Neste mesmo ano, Hebe estreou na TV Record (Canal 7) o Programa Hebe, que teve como convidado Roberto Carlos, batendo recordes de audiência chegando a obter 70% dos telespectadores.

“A posição da Rede Record em relação à outras emissoras era privilegiada, mas para liderar ainda mais a preferência popular faltava o horário nobre aos domingos, por isso contrataram Hebe Camargo. Em pouquíssimo tempo ela conquistou o público e durante três anos consecutivos, a maior audiência da televisão em São Paulo” (23). 22 Como uma mulher de vanguarda, Hebe retrata a questão do aborto no site http://www.saa.com.br/links/abor- to/tcnicas.htm, conforme suas palavras: "Lembro de uma mulher falando alto: 'Não grita! Não grita!'Eu tinha 18 anos e um corpinho lindo, sobrancelhas grandes, cabelos compridos e escuros. Começava minha carreira de cantora no rádio. Na minha primeira relação sexual fiquei grávida. Não podia contar para ninguém. Meus pais sempre foram muito severos e naquela época era uma perversão ter relação sexual sem se casar. Contei para uma amiga, uma vizinha. Ela soube de um local onde uma mulher fazia aborto. Ela não era médica. Numa sala pequena, sem anestesia, sem medicamento nenhum, fez a curetagem. A dor era tão intensa que ameacei gritar. Jamais vou esquecer-me daquela voz falando em tom alto e áspero para eu calar a boca. Voltei para casa e tive hemorragia por vários dias. Acabei em um hospital. Estava muito doente. Minha família nunca soube disso e foi ruim ter de esconder. Para ser mãe a gente tem de desejar ter um filho. Ele tem direito à vida, é verdade. Mas com amor dos pais, com condições para crescer com saúde e boa educação. Quem vai garantir isso? Um Estado falido, miserável e hipócrita? A Igreja? Nem pensar. Sou católica e até hoje não me arrependo do que fiz. Hoje tenho o Marcelo, a melhor coisa que me aconteceu. Estava casada e preparada para ter um filho. Sin- to-me muito feliz". 23 AMORIM, Rede Record – 45 anos de história, São Paulo, 1999. 25

No ano de 1967, a situação no país começava a ficar mais complicada ao passar do tempo como afirma o professor Marcos Napolitano, doutor em História Social, USP/SP(24).

“ao longo de 1967 e 1968, os estudantes radicalizaram suas palavras de ordem e suas formas de protesto. Temas estudantis específicos cada vez mais cediam espaço para o protesto contra a ditadura. Paralelamente à radicalização do processo estudantil, os grupos de esquerda, mesmo atuando na ilegalidade, se reorganizavam e preparavam a luta armada. Os dois movimentos freqüentemente iriam se entrecruzar: os estudantes forneciam quadros para a guerrilha, e a guerrilha estimulava as ações de massa. Em 1968, o movimento sindical, que parecia completamente reprimido pelo regime, voltou à cena em duas greves operárias, em Contagem (MG) e Osasco (SP). Para o governo, esse quadro político configurava uma guerra revolucionária. Exageros à parte, eram visíveis os desgastes do regime militar junto a amplos setores da sociedade e a radicalização das formas de protesto político. No caso do movimento estudantil, o mundo todo assistia naquele ano a um crescimento da participação política dos estudantes, na forma de protestos de massa extremamente radicalizados, contra a ordem dominante. Ficaram famosos os processos estudantis na França, México, nos Estados Unidos e na Alemanha, entre outros países”.

Voltando a era da televisão, ainda na década de 60, era uma novidade, trazendo a renovação que alteraram profundamente o comportamento de seu público. As novidades tecnológicas permitiram maior agilidade e maior alcance da informação iniciando as condições para que a televisão se consolidasse como o mais importante veículo de comunicação. Dois gêneros de programas contribuíram para que a TV se tornasse um fenômeno de comunicação de massa no país: o programa de auditório e a telenovela. Profissionais como Abelardo Barbosa (), Flávio Cavalcante, Silvio Santos e Hebe Camargo surgiram cada um com um estilo próprio, e todos obtendo enormes pontos de audiência para as emissoras nas quais trabalhavam. Os comunicadores Chacrinha e Silvio Santos, dirigiam-se a um público de nível sócio-cultural mais baixo, apresentando atrações de apelo popular como calouros, gincanas, distribuição de brindes, concurso, premiações e outros. Chacrinha tornou-se um fenômeno de comunicação analisado por estudiosos por sua

24 NAPOLITANO, Marcos.O regime militar brasileiro 1964-1985. São Paulo. Atual.1998.pp27-28. 26 maneira de apresentação, pela sua maneira de se vestir, já Flávio Cavalcante manteve o esquema que o havia consagrado anteriormente em programas de rádio: a divulgação da música popular brasileira, com lançamentos e concursos. Os três comunicadores valiam-se da presença de júris, compostos por pessoas famosas. O programa da Hebe Camargo, tornou-se uma espécie de salas de visitas de São Paulo, recebendo todas as personalidades em passagem pela cidade. Dirigido a um público mais exigente, o programa exibia desfiles de moda, debates, entrevistas com gente famosas e boa música popular brasileira. Segundo o autor Sergio Miceli:

“O programa Hebe Camargo subsiste em horários “nobres”, escorando-se no carisma “doce” de sua animadora. Portanto, a continuidade dos estereótipos em que se alicerça a figura pública da animadora, devem responder as demandas simbólicas de alguma classe ou de alguns setores de classe que compõem seu público. A relação que se estabeleceu entre ela e o público encontra-se a tal ponto consolidada que o programa mantém com seu espectador uma espécie de pacto afetivo, e, no curso da transmissão, animadora e espectador fazem reiteradas referências à história comum que os une...... Os mecanismos de projeção e identificação entre espectador e animadora apóia-se na percepção da segunda como uma “igual”, uma mulher como as outras que assistem ao programa. Parece estar as voltas de uma dada experiência de vida que simula assumir, tanto em termos expressionais como através de um painel de valores característico, ambos os registros sendo transmitidos pela duplicação dramática dos papéis sociais que exagera. Ela compõe sua imagem na TV a “mãe”, “filha”, “esposa”, e “dona de casa”, vividos com determinações cruciais do conceito mulher” (25).

A partir do golpe militar, o governo foi aos poucos penetrando na vida dos brasileiros. No início do governo militar, em abril de 1964, o comando revolucionário promulgou o Ato Institucional nº 01, que dava amplos poderes ao Alto Comando Militar. De lá para cá, foram vários Atos Institucionais até a chegada do Ato Institucional nº 5, em 13 de dezembro de 1968, quando deu ao presidente Arthur da Costa e Silva, o poder de fechar o Congresso Nacional, cassar mandatos e direitos políticos. Era o momento mais cruel da ditadura militar.

25 MICELI, Sergio. A noite da Madrinha. São Paulo.Perspectiva.1972. p 17. 27

No governo Costa e Silva o ensino sofreu algumas alterações no que diz respeito à alfabetização de adultos, com a criação do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), na qual as perspectivas eram diminuir o analfabetismo no país controlado pelas cartilhas de alfabetização. A comunicação do nosso país também sofreu com o AI-5. A repressão na imprensa foi terrível. O jornal que fosse de oposição, ou seja, na contra mão aos pensamentos do governo, seria censurado. Já aqueles com ideologias esquerdistas foram fechados. Não existia a liberdade de expressão. Era tudo controlado, tudo fiscalizado. Os veí- culos de comunicação sofreriam a repressão dentro das suas próprias redações com censores que o governo implantou para que a censura falasse mais alto. O jornal O Estado de S.Paulo, depois de 40 anos do golpe militar, publicou uma reportagem especial para relatar o que aconteceu de fato em relação à imprensa, na época. Segundo o jornalista Roldão Arruda:

“No dia 12 de dezembro de 1968, após tomar conhecimento do resultado da votação em que o Congresso negou à ditadura licença para processar o deputado Márcio Moreira Alves, acusado de ofender as Forças Armadas, o diretor de redação do Estado, Julio de Mesquita Filho, começou a redigir a Nota Um – o primeiro editorial da seção Notas e Informações. Com o título Instituições em Frangalhos, procurava descrever a crise política e a falta de visão do general Costa e Silva, que pensava poder governar o País como se fosse uma caserna, além de vaticinar dias mais difíceis. Saiu um texto indignado, que a maioria dos leitores do Estado e do Jornal da Tarde, onde também seria publicado, nunca chegou a ler. Às três horas da madrugada, o general Sílvio Correia de Andrade, chefe do Departamento de Polícia Federal em São Paulo, chegou ao jornal e foi para a oficina, onde pegou um exemplar na boca da impressora. Depois de ler o editorial, mandou parar a impressão e ainda confiscou todos os exemplares que já estavam nos caminhões, prontos para serem despachados. Numa conversa com Julio de Mesquita Filho, diretor-responsável do jornal, o general chegou a propor a liberação do jornal desde que o editorial fosse substituído por outro que não fizesse referência à derrota do governo. Mas a proposta não foi aceita. Estava em marcha um dos piores períodos de censura à imprensa no País. Durante o governo Castelo Branco, ocorreram pressões contra alguns empresários da área de comunicações e jornalistas. Jornais de tendência política mais à esquerda foram fechados, mas prevaleceu uma relativa liberdade. Na oficina do Estado, naquela, até ela começava a desmoronar. O episódio ocorreu horas antes da assinatura da Ato Institucional nº 5. Ainda no dia 13, Julio Mesquita Filho compareceu a uma reunião com o governador Abreu Sodré e o general Andrade, no Palácio 28 do Bandeirantes, onde foi informado que a partir dali o jornal deveria ser mais cauteloso nas críticas ao regime. Ele respondeu que a censura era uma tarefa da Polícia Federal e que o Estado não praticaria a autocensura". “Se vocês quiserem, censurem”, disse. E foi o que fizeram. Inconformado com a falta de liberdade, o diretor-responsável do jornal, que morreu em 1969, não escreveu mais editoriais. Ainda em sinal de protesto, o espaço nobre da página 3 deixou de ser utilizado. “Não comentamos mais matéria política por não dispormos de liberdade para dizer o que pensamos”, explicou Julio de Mesquita Neto, que substituiu o pai na direção do jornal, durante um debate na ECA/USP, em 1970. A censura aos dois jornais persistiu de forma irregular durante quase seis anos, entre 1968 e 1975. O rigor dos censores foi maior de acordo com as necessidades do regime. A pior fase aconteceu a partir de 1972, com a instalação definitiva de censores na redação. Era um momento de instabilidade para o regime, às voltas com uma disputa interna em torno da sucessão do general Garrastazu Médici. No dia 15 de setembro daquele ano, o ministro da Justiça, Alfredo Buzaid, proibiu a publicação de notícias sobre redemocratização, anistia e sucessão presidencial. Passados 4 dias, ele recebeu uma carta indignada de Ruy Mesquita, diretor do JT. Começava assim: “Ao tomar conhecimento dessas ordens emanadas de V.As., o meu sentimento foi de profunda humilhação e vergonha. Senti vergonha, senhor ministro, pelo Brasil, degradado à condição de uma republiqueta de banana ou de uma Uganda qualquer por um governo que acaba de perder a compostura.” A maioria das publicações preenchia o espaço censurado com outras notícias, mas alguns editores se recusavam a fazê-lo. O semanário Movimento, que nasceu censurado em 1975, substituía os textos vetados com retângulos com fundo branco ou negro, com a inscrição Leia Movimento. A revista Veja denunciava o rastro do censor com figuras de demônios. No Estado e no JT a orientação era mostrar o resultado da censura aos leitores da forma mais clara possível. A primeira tentativa, logo proibida, foi deixar os espaços em branco. Então, por sugestão de Ruy Mesquita, o JT começou a publicar receitas culinárias nos espaços censurados. Muitos leitores demoraram a compreender a razão daquelas receitas de empadões e tortas no meio do noticiário político. O Estado decidiu inicialmente publicar cartas de leitores no lugar do que fora proibido. Em julho de 1973, por sugestão de Julio de Mesquita Neto, os buracos começaram a ser preenchidos com poemas de Gonçalves Dias, Cecília Meireles, Olavo Bilac, Manuel Bandeira. No dia 2 de agosto saiu um trecho do épico Os Lusíadas, de Luís de Camões. Chamou tanto a atenção que se decidiu manter a receita. Entre 1973 e 1975, Os Lusíadas apareceram no jornal outras 660 vezes. Alguns leitores não entenderam e um deles chegou a escrever à redação pedindo mais cuidado na publicação do poema, pois na forma como era feita não conseguia colecioná-lo. O efeito global, na entanto, foi positivo: Camões acabou virando sinônimo de censura, como observou a historiadora paulista Maria Aparecida d’Aquino, na tese de mestrado Censura, Imprensa, Estado Autoritário (1968-78): “O poema de Camões ficou no imaginário coletivo como lembrança de um tempo em que os cortes dos censores promoveram sua publicação. Restou como 29

símbolo de resistência.” Certa vez, irritado com a proibição de suas entrevistas no Estado, o deputado Ulysses Guimarães desabafou: “Quem mais atrapalha o MDB é Luís de Camões. Este poeta tem-me perseguido desde os bancos escolares, quando eu o achava incompreensível.” O censor vetou a frase. Em 1973, foi proibida a divulgação da notícia de que um ministro (Cirne Lima, da Agricultura) renunciou, e liberada a notícia da nomeação de seu sucessor. O espaço da matéria sobre a demissão foi substituído com um anúncio da Rádio Eldorado, onde se lia: “Agora é samba.” No dia 3 de janeiro de 1975, vésperas do centenário do Estado, foram, publicados os últimos trechos de Os Lusíadas e as receitas do JT. No dia seguinte os censores deixaram a redação” (26).

No final da década de 60 o programa Hebe era um sucesso. A Rede Record estava feliz em ter Hebe Camargo no comando de um programa para a família brasileira. Mas a imagem em evidência, os compromissos profissionais, agenda lotada de trabalhos, estavam atrapalhando o relacionamento de Hebe com o então marido, Décio Capuano, que não suportou dividir a mulher com o Brasil e sendo assim, chegou ao fim o casamento da apresentadora em 1971. Em entrevista(27), Hebe disse que estava triste com os boatos, com o que inventaram a seu respeito: “Chegaram ao absurdo de arrumar meu casamento com um governador. Isso é realmente maldoso e espantoso”, conclui a apresentadora. Mas a vida de Hebe continua e três anos depois da separação ela deixa a Rede Record, quando conheceu o empresário Lélio Ravagnani. Foi amor à primeira vista. Segundo a apresentadora, foi Lélio que se aproximou , até o coração de quem o acompanharia até o final de sua vida.

A tecnologia na década de 70 vinha crescendo satisfatoriamente. As primeiras grandes conquistas técnicas da televisão no Brasil foram a transmissão em via satélite e a transmissão à cores, no início da década. A transmissão via satélite encurtou distâncias e reduziu o país e o mundo, em nível de informação. O universo público atingido pelo veículo cresceu assustadoramente pois se tornou possível informar com imediatismo e credibilidade de qualquer ponto do planeta, com o telespectador testemunhando o fato ocorrido. A investida agora passava a ser para a classe média, o padrão visual diferenciava das outras emissoras, apresentando logotipos, belas imagens, distanciando do Brasil real, que era a miséria. As novelas criam hábitos ao telespectador e a Rede Globo invade suas

26 ARRUDA, Roldão. O jornalista , utilizando materiais do arquivo do Jornal O Estado de S. Paulo, refere-se à época. 27 Entrevista concedida à revista Intervalo, ano IX, nº 427, 1971. 30 programações com elas. A novela das 18h é normalmente romântica ou de época; a das 19h lida com o humor, é mais leve; a das 20h possui mais tramas, triângulos amorosos, riquezas e a das 22h são mais ousadas no conteúdo e na técnica. A conquista da cor exigiu a instalação de novos equipamentos técnicos que, menores e mais aprimorados, permitiram mudança inclusive na linguagem da televisão ao utilizar com grande freqüência os novos efeitos eletrônicos aliados ao vídeo tape. Essa inovação foi verificada principalmente nos programas musicais (quando os números musicais puderam deixar os estúdios e serem gravados nos mais diferentes lugares) e nos programas humorísticos, pois na dramaturgia ou na informação não eram bem aceitos. O show eletrônico aconteceu também no esporte que incorporou vários efeitos, entre eles o replay(28), e conferências de lances. A década de 70 foi muito importante para o reconhecimento da programação televisiva brasileira tanto no país como no exterior. Diversos prêmios internacionais foram obtidos em diferentes gêneros de produção: musical, dramático e infantil. O melhor reconhecimento entretanto, foi número cada vez maior de programas brasileiros sendo consumidos em todo o mundo, especialmente a telenovela que alcançou alto nível de produção e interpretação conquistando no exterior um mercado inédito para a dramaturgia brasileira, introduzindo modismos comportamentais na Itália, Espanha e em .

No ano de 1979, Hebe se muda para a mansão do novo marido, Lélio Ravagnani, juntamente com o filho, onde viveram por mais de vinte anos. Em 1981, Hebe estréia na de Televisão um programa que levava seu nome aos domingos à noite, no mesmo estilo dos outros programas que apresentou anteriormente. Na estréia, recebeu como principal convidado o cantor e apresentador Moacyr Franco, que também trabalhava na emissora naquela época. Muitas personalidades passaram por seu famoso sofá, como o ex-presidente Jânio Quadros, a atriz Dina Sfat, o ator Raul Cortez e a irreverente Dercy Gonçalves. O programa passou, posteriormente, a ser exibido às sextas-feiras, para não concorrer com o Fantástico(29). O programa foi um sucesso durante quatro anos, quando em 1985, Hebe recebeu o convite de Silvio Santos para trabalhar no SBT (Sistema Brasileiro de Televisão).

28 Retransmissão imediata da gravação de trecho de programa transmitido ao vivo, em especial de um aconteci- mento esportivo. 29 O programa Fantástico é exibido pela Rede Globo de Televisão e na época concorria a audiência no mesmo horário, com o programa Hebe, da Rede Bandeirantes. 31

A cúpula da Rede Bandeirantes, especialmente Johnny Saad, dono da emissora, lutou para que Hebe não deixasse a emissora, mas não teve jeito. Nos anos 80 a telenovela começou a transformar-se no eficiente laboratório que é, atualmente, para a formação de novos autores, diretores e atores. Em relação a sua estrutura de produção, ao contrário das décadas anteriores, ela passou a ter diversos diretores: o diretor geral, os diretores de gravação de núcleos (ou seja, a divisão das histórias em partes, cada um sendo dirigido por um diretor diferente), além dos diretores de elenco e de imagem. Em relação ao texto, além de adquirir uma forma de expressão bastante livre, exibindo qualquer tipo de assunto, contou ainda, com a introdução do autor-colaborador que, dentro da idéia original do autor principal, criou novas tramas. Dentro do aspecto técnico, cresceu bastante nos anos 80 a utilização de aparelhos residenciais de vídeo-cassete, fazendo com que o telespectador diversificasse a própria programação entre filmes e vídeos independentes, nacionais ou estrangeiros. Pelo final da década, em razão da popularização do aparelho, algumas redes passaram a copiar seus programas mais famosos em vídeo residenciais (VHS) para vendê-los ao grande público. Outra novidade foi o surgimento das produtoras independentes de vídeo que realizaram reportagens, shows e seriados. Algumas venderam seus produtos para emissoras comerciais. Outras alugaram horários em determinados canais e apresentaram o que produziam, inclusive as Tvs à cabo (televisão paga por assinatura) que começaram a se espelhar pelo país. Os anos 80 foram marcados por vitórias, por exemplo, a reconquista da democracia no país, quando a população, depois do governo militar, pode novamente eleger seus candidatos. Tancredo Neves, ganhou as eleições presidenciais. A ansiedade de todo o país pela sua posse e por uma reorganização da sociedade, ainda amedrontada pelo regime militar, era nítida. A eleição de Tancredo foi recebida com grande entusiasmo pela maioria dos brasileiros. No entanto, Tancredo não chegou a assumir a Presidência. Na véspera da posse foi internado no Hospital de Base, em Brasília, com fortes dores abdominais e José Sarney, toma seu lugar interinamente no dia seguinte, em 15 de março de 1985. Depois de sete cirurgias, veio a falecer em 21 de Abril, aos 75 anos de idade, vítima de infecção generalizada. Deu-se uma comoção nacional. 32

No dia 04 de março de 1986, Hebe estreou no SBT. No primeiro programa, Hebe pediu licença para entrar nas casas dos telespectadores de todo o Brasil a partir daquele dia, naquela emissora. Em 1989, Hebe recebe a apresentadora Xuxa Meneghel em seu programa. Na porta do SBT, centenas de crianças esperavam pela apresentadora que liderou recordes de audiência com seu programa(30). Hebe gostou tanto da visita que se vestiu como Xuxa, nesse programa marcado pela alegria das louras. Em 15 de março de 1990, entra no poder, o então presidente eleito, Fernando Collor de Mello. Neste mesmo ano morre o cantor , vítima da AIDS, a doença que causou medo e matou milhares de pessoas no mundo. A apresentadora Hebe mostrou sua solidariedade e se comoveu, junto com o Brasil participando de uma mobilização contra essa doença. Ainda em 1990, em agosto, numa pesquisa realizada com a população da cidade de São Paulo pela empresa Saldiva&Associados, Hebe foi eleita a “Cara de São Paulo”. A apresentadora emocionou-se com o título. Tantas emoções pelo talento nato, que fez Hebe receber diversos prêmios pela carreira, como o Troféu Roquette Pinto, Troféu Imprensa e o da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).

O presidente lançou um programa de estabilização, o plano Collor, baseado em um gigantesco e inédito confisco monetário, congelamento temporário de preços e salários e reformulação dos índices de correção monetária. Em seguida, tomou medidas duras de enxugamento da máquina estatal, como a demissão em massa de funcionários públicos e a extinção de autarquias(31), fundações e empresas públicas. Ao mesmo tempo, anunciou providências para abrir a economia nacional à competição externa, facilitando a entrada de mercadorias e capitais estrangeiros no país. Assim, a imagem de Collor vai sendo construída por meios midiáticos dando-lhe o caráter heróico. Mas, já em 1991, as dificuldades encontradas pelo plano de estabilização, que não acabou com a inflação e aumentou a recessão, começaram a minar o governo. Circulam suspeitas de envolvimento de ministros e altos funcionários em uma grande rede de corrupção.

30 Xuxa Meneghel apresentou o programa infantil “Xou da Xuxa”, de segunda à sexta, no horário das 8h ás 12h, durante seis anos pela Rede Globo de Televisão, sendo considerada um sucesso pelos críticos. 31 Forma de governo em que um indivíduo ou grupo tem poder absoluto sobre a nação. 33

As suspeitas transformaram-se em denúncias graças a uma intensa campanha da im- prensa. Em 25 de abril de 1992, Pedro Collor, irmão do presidente, deu uma explosiva entre- vista à revista "Veja"(32). Nela, falou sobre o "esquema PC"(33). A reportagem teve enorme re- percussão e a partir daí surgiram novas revelações sobre irregularidades no governo. Em 26 de maio, o Congresso Nacional instalou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as denúncias de irregularidades. Logo depois, a revista "ISTOÉ"(34) publicou uma en- trevista de Eriberto França, motorista da secretária de Collor, Ana Acioli. Ele confirmou que as empresas de PC faziam depósitos com irregularidade nas contas fantasmas movimentados pela secretária. Essas informações atingiram diretamente o presidente. Surgiram manifestações populares em todo o país. Os estudantes organizaram diver- sas passeatas pedindo o impeachment (impedimento) do presidente. Milhares de estudantes pintaram os rostos de verde e amarelo em protesto ao governo e o pedido: “Fora Collor!”. A apresentadora Hebe também se manifestou pintando seu rosto e pedindo justiça. Depois de um penoso processo de apuração e confirmação das acusações e da mobi- lização de amplos setores da sociedade por todo o país, o Congresso Nacional, pressionado pela população, votou o impeachment presidencial. Primeiramente, o processo foi apreciado na Câmara dos Deputados, em 29 de setembro de 1992, e, depois, no Senado Federal, em 29 de dezembro de 1992. O Parlamento decidiu afastar Collor do cargo de Presidente da Repú- blica e seus direitos políticos são cassados por oito anos. Na televisão, aumentou a comercialização de horários em diversas emissoras, aluga- dos para a exibição de programas de vendas diretas ao consumidor e exibição de programas religiosos. A igreja Católica e várias igrejas evangélicas criaram suas redes de transmissão iniciando uma catequese eletrônica sem precedentes, até então, na televisão. Sempre houve transmissão de mensagens religiosas, principalmente as da igreja Católica, dentro de progra- mas vespertinos, nos anos 50 e 60. Praticamente desaparecidas do veículo nos anos 70, em meados da década de 80, essas mensagens retornaram, com os horários alugados pelas igre- jas protestantes, espíritas e outras, na tentativa de obtenção de novos adeptos.

32 Revista semanal que trata de assuntos relevantes da semana. A revista Veja está entre as maiores revistas do Brasil. 33 Tráfico de influência e de irregularidades financeiras, organizadas pelo empresário Paulo César Farias, amigo do presidente Collor e caixa de sua campanha eleitoral. 34 Revista semanal que trata de assuntos relevantes da semana, e é concorrente da revista Veja. 34

As igrejas evangélicas conquistaram milhares de fiéis. Assim, conseguiram eleger di- versos parlamentares que receberam do governo federal a concessão de emissoras indepen- dentes de rádio e televisão em todo o país e tornaram-se grande força de mobilização religio- sa e social. O fato obrigou a igreja Católica a iniciar uma ofensiva que acabou se transfor- mando na criação da Rede Vida de Televisão. Ao lado da Rede Família (pertencente a Igreja Universal do Reino de Deus) essas duas corporações se tornaram as maiores, no gênero. O grande alcance da comunicação via satélite fez com que um padre católico, produ- tor da Rede Vida, comentasse que se Cristo voltasse à Terra iria pregar sua doutrina através da televisão. Contraditoriamente à produção religiosa, a programação de TV prestigiou, no final dos anos 80 e em toda a década de 90, a violência em diferentes níveis. O telejornalis- mo foi um dos maiores responsáveis por esse tipo de veiculação. Atrações especiais foram criadas para exibir notícias de desgraças, exploradas com sensacionalismo mórbido e cruel, que tiveram grande audiência e motivaram outras emissoras a veicularem noticiários com o mesmo nível de informação. Também os filmes e seriados estrangeiros propagaram exagera- damente todo tipo de violência banalizando-a como uma atração normal, ao ponto de influ- enciar o principal produto da televisão, a telenovela. Esse tipo de dramaturgia incorporou às cenas trágicas uma violência explícita desnecessária e perdeu audiência, motivo que o levou, rapidamente, a voltar aos padrões considerados normais pelo seu público. Nas TVs à cabo programas específicos de violência, tais como: agressões familiares, acidentes, catástrofes, crimes e outros, produzidos pelas redes norte-americanas, foram e continuam sendo exibidos e vendidos em cópias de vídeo ao público brasileiro. A tendência de exploração da violência foi universal tanto no cinema quanto na televisão. O público, por sua vez, manteve e continua mantendo um ávido interesse nesse tipo de atração, propiciando-lhe enorme audiência. A informação, contudo, manteve o seu caráter de esclarecimento social e prestação de serviços. Nas transmissões de grande interesse político-social foi intensa a participação do veículo. Em alguns momentos da vida pública brasileira essa participação resultou na mudança dos acontecimentos, como na campanha para o impeachement do então presidente Fernando Collor, que o obrigou a renunciar. Ao lado da imprensa em geral, também a televisão funcionou como um órgão de denúncia, não se esquecendo, contudo, que essa participação lhe favorecia a audiência. 35

Coerente com o aspecto de violência do veículo, se intensificou, nos anos 90, um tipo de comunicador de auditório diferente dos comunicadores, até então: o apresentador agressivo, irreverente, propositalmente sem educação, apresentando temas escabrosos como a principal atração de seus programas, fazendo da televisão um palco da miséria humana, e com isso, conquistando grande audiência e obtendo bons lucros aos seus patrocinadores, às suas emissoras e a si mesmos, pois, ainda hoje, recebem os salários mais altos da televisão. Pelo final da década esses comunicadores diminuíram, em parte, a agressividade de suas apresentações em razão de protestos, mas não abandonaram o estilo. Em relação a função e utilidade da televisão, no entanto, uma das maiores caracterís- ticas verificadas nos anos 90, foi sua transformação em veículo de comercialização. O co- mercial foi sempre de importância vital para a sobrevivência da televisão desde o seu início. Contudo, na década de 90, ele chegou a níveis muito exagerados, transformando o vídeo, além de vitrine da miséria humana, também numa vitrine de ofertas. Paralelamente a uma in- tensa comercialização para induzir o público a comprar, a televisão incorporou ainda um sis- tema no qual o público foi induzido a entregar o dinheiro diretamente às emissoras. Para isso, ela incorporou o esquema de discagem telefônica: 0900 em suas atrações, no qual o te- lespectador concorria a prêmios valiosos. Milhares de pessoas ligavam diariamente e muito poucas eram contempladas. Todas as emissoras iniciaram a utilização desse sistema nos mais variados programas, obtendo lucros fabulosos tanto para si mesmas quanto para os departamentos oficiais de comunicação dos governos estaduais e federais. Ante os protestos de entidades, uma pequena parte do dinheiro arrecadado passou a ser distribuído a associações ou hospitais necessitados de assistência econômica. Em relação ao veículo, tinha sido encontrada uma fórmula fácil de ganhar dinheiro e compensar programas de pequena audiência que não conseguiam se pagar apenas com a publicidade ou patrocínio. Pelo final da década, contudo, tal expediente de exploração do telespectador foi proibido pela justiça federal. No período de 1991 à 1993, além de seu programa nas noites de segundas-feiras, Hebe ganhou mais uma atração, mas as terças-feiras, um programa dedicado somente as mulheres chamado Hebe por Elas(35).

35 Hebe, no início da carreira, apresentou um programa só para mulheres chamado “O Mundo é das Mulheres”, conforme já relatado neste trabalho. 36

Em 1994, Hebe recebeu um prêmio importante de sua carreira, quando a Câmara Municipal de São Paulo lhe concedeu o título de Cidadã Paulista. Num momento de seu programa, no ano de 1997, Hebe recebeu a cantora que surpreendeu os telespectadores beijando a boca da apresentadora ao vivo para todo Brasil. Todos os jornais noticiaram o fato. A partir daí Hebe sempre que recebe convidados, marca o momento com um selinho (como ela chama, um beijo leve nos lábios). A carreira de cantora foi marcante na vida de Hebe, que a encerrou depois de passar a ser apresentadora. Esse momento foi revivido por Hebe, quando ela gravou o CD Pra você, e voltou aos palcos no ano de 1999. Foi uma grande emoção. Neste período, Hebe viajou pelo Brasil(36), divulgando seu CD em um show requintado de charme e elegância. Passou pelas principais capitais do país e acompanhada de sua equipe, a apresentadora viveu momentos marcantes. O ano de 2000 foi doloroso para Hebe, que no mês de julho, perdeu o marido, Lélio Ravagnani. A união que durou em torno de 25 anos acabou em vida, mas para Hebe ele sem- pre estará em seu coração. Não suportando a ausência do marido, a apresentadora mergulhou no trabalho e fez com quem os dias de angústias se transformassem em satisfação, de viver, de estar com os amigos. Quinze dias depois da morte do marido, Hebe se muda para sua nova casa, na Cidade Jardim, em São Paulo. A carreira de cantora continua, e no ano de 2001, Hebe volta ao palco com força total para o lançamento de mais um CD, Como É Grande Meu Amor por Você – Hebe e Convida- dos, com a participação de nomes importantes da música brasileira, como , , . Em 2003 Hebe recebeu o título de Professora Honoris Causa, da Universidade FIAM-FAAM. No dia 08 de março de 2004, Hebe completou 75 anos e foi homenageada durante um almoço promovido pela então prefeita de São Paulo, Marta Suplicy, pelo Dia Internacio- nal da Mulher, no Palácio do Anhangabaú, sede da Prefeitura. No mesmo ano de 2004, Hebe reviveu seus momentos de 60 anos de carreira num es- pecial que reuniu centenas de pessoas importantes entre políticos, empresários, artistas,

36 A apresentadora Hebe, aproveitando a viagem para divulgação do CD Pra você, apresentava o programa Hebe, transmitido pelo SBT. O show, era também o programa. 37 grandes personalidades nacionais e internacionais numa festa marcando a história de vida da apresentadora na Sala São Paulo(37).

“É mais emoção do que medo. Quando eu pisei aqui no palco, e vi essa orquestra sinfônica, tudo muito brasileiro, uma coisa nossa, eu cai em choro. Eu não estou acostumada com tudo isso. Nem sei como vou fazer para apresentar o programa, por que as presenças, artistas, co- legas, personalidades...isso tudo mexe muito com a gente. A única coisa que eu sempre acres- cento é realmente você trabalhar com amor, com dedicação, com respeito, pelos colegas, pelo lugar onde você trabalha, respeito pelo público. Fazer o que você gosta é uma coisa maravi- lhosa”, diz Hebe pouco depois que chegou à Sala São Paulo – Estação Julio Prestes.

A festa teve mais de duas horas de duração e foi um sucesso. Hebe recebeu homena- gens, de amigos, de colegas, pessoas que a admiram. Os 60 anos de carreira de Hebe ficou marcado com momentos de muita coragem, muito profissionalismo e dedicação.

37 Nos anos 90, a tendência mundial de revitalização dos centros históricos contagiou São Paulo. Inevitavel- mente, a imponente Estação Júlio Prestes foi vista como um edifício a ser reaproveitado e a quem caberia um nobre destino no próximo milênio: abrigar uma sala de concertos com qualidade acústica irrepreensível, e ser a sede da Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo. Sobre esse assunto cf www.osesp.art.br. 38 39

Capítulo II - Hebe: A notícia

Hoje quando falamos de Hebe Camargo, percebemos a popularidade de sua imagem, da sua pessoa que na década de 60 chegou a ter 70% de audiência, na Rede Record, com seu programa, marcou a história de programas de auditório. Quando falamos em luxo lembramos de Hebe, e com isso, as veiculações de sua imagem na mídia foram inúmeras. A apresentadora ficou “famosa” pelas críticas ao Congresso Nacional, ao nosso governo. Não mediu esforços para, em nome do povo “atacar” o poder de nosso país. As falsas promessas dos nossos governantes enfureceram, por várias vezes a apresentadora, atacando o governo como ocorreu em seu programa, (programa Hebe, 13/02/95, SBT):

“Agora eu queria dizer para vocês que nós estamos aqui com um grande bolo, por que a nossa deputada, essa simpatia de Esther(38), no dia que ela foi tomar posse, ela levou um bolo de 513 merengues para distribuir entre os deputados. E nós estamos aqui com um bolo também, muito bonito, aliás, esse bolo é novo, é bem fresquinho, agora as moscas, continuam as mesmas” (39).

Foram muitas as manchetes, as reportagens, as notícias, de contentamento, de estréia, de comemorações, de emoções e tristezas. Neste capítulo, vamos resgatar algumas das várias notícias que a imprensa no Brasil documentou nesses 60 anos de trajetória.

38 Esther Grossi foi Deputada Federal e esteve no programa Hebe no dia 13 de fevereiro de 1995. 39 Hebe quando falou em “moscas” se referiu aos deputados parlamentares. Entre eles estavam José Sarney, Antônio Carlos Magalhães, Inocêncio de Oliveira, Humberto Lucena, Ibrahim Abi Ackel, Fernandes Amorim, José Carlos Aleluia e Roberto Jefferson. O programa Hebe, por conta dessa afronta da apresentadora, ficou al- gumas semanas sendo gravado (o programa Hebe normalmente é ao vivo). 40 41

ESTOU PERDENDO A VOZ

Ela nunca teve problemas com a garganta, mas nos últimos tempos uma rouquidão constante preocupa a apresentadora da TV Record, Canal 7 (SP).

De uns tempos para cá, as famosas gargalhadas que tanto caracterizam Hebe Camargo não têm sido tão sinceras como de costume. É que um problema muito sério está afetando a tranqüilidade da apresentadora da TV Record de São Paulo: pode perder a voz. Há mais de três meses que, depois da gravação de seu programa domingueiro, feita às quartas-feiras, ela fica totalmente rouca.

“Não sei o que está acontecendo comigo. Nunca tive preocupações com minha garganta, nem quando era crooner(40) e cantava das 10 da noite às 4 da manhã. Pode ser que esteja com um calo nas cordas vocais, ou talvez tudo não passe de cansaço. Só sei que do jeito que está não pode continuar. Até meu programa na rádio Jovem Pan está sendo prejudicado. Sinto que estou emitindo a voz de uma forma muito desagradável. Cantar, nem querendo! Só mesmo no dia do programa. Depois, passo mal a semana toda”.

CANSAÇO É DEMAIS

Há mais de cinco anos Hebe Camargo não tira férias. E, apesar de adorar o seu trabalho, confessa-se cansada.

“Minha carreira sempre foi importante para mim. Nasci para fazer o que faço, não me sinto bem fora do ambiente artístico. Tenho pena de largar meu trabalho, de ficar longe do meu público, mesmo que seja por pouco tempo. É por isso que há cinco anos não tiro férias. Agora, porém, estou desesperadamente ansiosa por um descanso total. É uma necessidade física. Se a Record permitir que me afaste por uns dois meses, sem aquela de ter que deixar programas gravados, vai ser a glória total. Vou desligar todas as turbinas”.

40 Ressaltamos que a palavra crooner significa cantora em inglês. 42

NOVO ESQUEMA

Recentemente, seu programa foi remodelado, mas deverá sofrer novas modificações. Cada meia hora – são quatro horas de duração – será dedicada a um Estado, mostrando fatos e atrações artísticas locais. Hebe está encantada com a idéia, que partiu da Equipe A, mas diz que só começará a gravar neste novo esquema depois das férias e do tratamento para as cordas vocais. Apesar dessa determinação, a apresentadora não esconde a ansiedade de ver como vai ficar o programa com todas essa inovações. “Sou muito ligada ao meu trabalho. Por causa disso, talvez, não tenha alcançado muito sucesso sentimentalmente. Mas não me preocupo muito, não. Não sou de ficar massacrando tristezas. Em compensação, vivo intensamente as alegrias que a vida me oferece e acho que, apesar de tudo, ela é boa. Meus amigos, minha carreira, meu filho – que é o maior presente que já recebi – preenchem meus dias. Não sei o que é solidão”.

(Revista intervalo/década de 70). 43

Ela está sempre rindo. O Brasil inteiro, de norte a sul, conhece o seu bom humor e sua simpatia.

Hebe – “EU, ATRIZ? É SÓ DE BRINCADEIRINHA”

O telespectador senta-se em sua poltrona preferida e liga no Canal 7 não só para ver as atrações que Hebe Camargo apresenta. É pra ver a própria Hebe. Em si mesma ela é uma atração quando sobe ao palco para trabalhar.

Reportagem de Wladimir Tavares de Lima

Hebe Camargo ri à toa. Está sempre rindo e não segura as gargalhadas para responder: “Eu atriz? Calúnia dessa gente...” Suas participações nos “especiais” da TV Record (“Romeu e Julieta”, “César e Cleópatra”) ao lado de Ronald Golias são apenas uma piada. É assim que ela encara a coisa. Quando foi convocada a trabalhar em teatro mais sério, que se dá em desastre. “As Pupilas do Senhor Reitor” mostrou-a como a fadista Magali Porto. Foi um drama fazer as gravações, por causa das risadas de dona Hebe. Há alguns anos, ainda contratada do Canal 5 (Globo, ex-TV Paulista), participou de dois teleteatros: “Um Filho para Sua Alteza” (que lançou Cláudio Marzo) e “Mulheres”. Nesse último, tinha uma briga com Yara Sales. As duas rolavam pelo chão, batendo-se, arranhando-se puxando os cabelos. Hebe ria. “Caí na gargalhada. Ainda bem que ninguém percebeu, porque não focalizaram meu rosto. Senão, a cena ia pro vinagre”. Recentemente ela apareceu como lavadeira, na “Família Trapo”. Não agüentou as caretas de Ronald Golias. “Já é difícil pra eu controlar o riso em condições normais. Com o Golias, então, a situação piora. É só olhar pra cara dele e não sigo mais segurar o riso. Pior é que nos ensaios ele só diz suas falas, sem interpretar, sem encenar nada. Quando chega no palco, ele começa a fazer tudo isso, eu não me controlo mesmo. Minhas risadas são mais fortes do que eu, são naturais. Não tem nada do que muita gente diz, que eu faço de propósito. Rio porque acho engraçado e não consigo me controlar”. Quando Hebe apareceu 44 de lavadeira, rindo daquele jeito, alguns colegas comentaram: “Se ela é lavadeira e ri assim, imagine se fosse baronesa...” Foi “eleita” a lavadeira mais feliz da história.

BRINCADEIRINHA

Hebe Camargo insiste que sempre concordou em aparecer como atriz só para dar sua contribuição e se divertir, fazendo algo diferente de vez em quando. “Nunca tive nenhuma pretensão de ser uma atriz de verdade. Nunca poderia fazer um programa fixo de teatro. Olha, eu tenho muito senso crítico e sei perfeitamente que jamais serei uma atriz razoável. Além disso, ser atriz significa necessidade de uma dedicação extrema, ensaios exaustivos até altas horas e isso me cansa. Eu gosto, mesmo, é de cantar. Ainda assim, só gravo um LP de vez em quando, por falta de tempo”. Mesmo achando que tudo é “brincadeirinha”, Hebe pretende participar dos próximos “especiais” da Record. Rindo sempre, achando graça nas mínimas coisas, só fica chateada quando algum crítico a acusa de ser uma “atriz sem recursos”: “É absurdo esses críticos quererem ver o meu trabalho como se estivessem julgando uma Cacilda Becker, uma . Será que eles não entendem que tudo isso é só uma brincadeirinha?” Hebe encerra a entrevista sem dizer nada, apenas fazendo aquilo que é característico dela. Uma risada solta, sonora, saborosa. (Revista Intervalo / década de 70). 45

Na tranqüilidade de sua casa, Hebe fala abertamente da educação de Marcello, um lindo menino de seis anos.

SOU UMA MÃE MODERNA: NEM PRAFRENTEX NEM QUADRADA

O amor pelo filho é tanto, que a apresentadora da TV Record (SP) acha que, no fundo, casou mais para ser mãe. Hoje, ela e Décio, o marido, continuam apenas bons amigos. Mas do casamento desfeito, restou Marcello, a coisa mais linda que aconteceu a vida de Hebe Camargo.

Reportagem de Carlos Alberto Noronha

“Marcello, vem almoçar! Ta na hora da escola!” A voz ecoa pelo jardim de uma casa da rua Petrópolis, no elegante bairro do Sumaré, em São Paulo. Esta frase se repete todos os dias, durante a semana, à mesma hora. É como um ritual na família de Hebe Camargo, para quem seu filho, Marcello, de seis anos, é a pessoa mais importante do mundo. Nesta hora, ela deixa de lado suas preocupações profissionais para ser apenas a mãe, “uma mulher comum, que procura ser amiga do seu filho, mais do que qualquer coisa, e que não absorve a sua personalidade e sim adapta-se a ele”. É assim que Hebe se define. O relacionamento da apresentadora com seu filho é dos mais espontâneos. Ela sabe a medida das coisas, mas não esconde seu corujismo. “Quando a gente vê que com essa idade ele já escreve e lê, não dá pra ficar quieta. Mas não prendo meu filho de maneira egoísta. Ele deverá gostar de mim, se quiser”. Ultimamente, Hebe viveu dias amargos. O desquite com Décio Capuano foi homologado. Nada disso, porém, influiu na tranqüilidade da vida de Marcello. Com um sorriso nos lábios ela explica que em nenhum momento se sentiu desamparada.“Sempre tive espírito de liderança e, quanto ao Marcello, Décio tem toda a liberdade de vê-lo quando quiser. Ficamos amigos e meu filho deve ter consciência disso”. Entretanto por trás do sorriso tranqüilo persiste uma dúvida: a vida dos filhos de um casal separado. Hebe continua como se estivesse falando consigo mesma, enquanto olha 46 para um lugar ou para alguém que só ele consegue enxergar: “Tenho certeza de que mais tarde Marcello compreenderá. Essas coisas são mais comuns atualmente”.

NADA DE MIMOS

Na opinião dos psicólogos, os filhos únicos, devido ao carinho com que são tratados, tornam-se maioria das vezes, filhos problemas. Hebe sabe disso, mas o carinho que dispensa ao filho é equilibrado. Dividindo seu tempo entre o rádio, a televisão e a casa, ela dedica os fins de semana a brincar e passear com Marcello. Nos outros dias, os deveres escolares têm prioridade e disso Hebe não arreda pé. “Quando Marcello foi para a escola, fiz questão absoluta de que ele fosse tratado como uma criança comum. Não quero que seja encarado como filho de artista.” E isto faz com que Marcello seja uma criança normal, alegre, cheia de vivacidade. Um enorme cachorro policial, uma pomba de estimação, Gigi, e uma piscina enchem sua vida. Assim como ele enche a vida de sua mãe de muita ternura e carinho. Aquela mesma mulher que todo mundo se acostumou a ver no vídeo “identificada com os problemas do lar e sendo o mais natural possível”, segundo sua própria opinião, é antes de mais nada uma mãe consciente. “Quando casei, meu desejo era ter quatro filhos. Hoje, acredito que o número ideal é três. Acontece que sempre tive muita vontade de ser mãe. No fundo, acho que me casei mais para ter filhos. Mas já que só tenho um, nada de mimos.” As invejas, as fofocas de bastidor, as mulheres e os comentários irreverentes que, às vezes, marcaram a vida profissional de Hebe nunca chegaram a abalar a firmeza do seu caráter. Ela compreendeu que era este o terrível preço de sua popularidade e de seu sucesso. Dentro de si, ela guarda muita coisa da educação rígida e ao mesmo tempo cheia de amor e respeito que seus pais lhe deram. “Hoje em dia, sou eu quem cuida deles, com o mesmo carinho que eles me dedicaram.” E quanto à educação de Marcello? Hebe pensa um pouco, talvez lembre de seus tempos de criança em Taubaté (SP) e eis sua resposta cheia de confiança, de bom senso e de certeza: “Nos tempos atuais é muito difícil estabelecer-se uma moral para as pessoas. Meu filho é quem fará sua própria moral. Isto não quer dizer que sou a favor da liberdade total. Uso o meio termo. Nem muito prafrentex, nem muito 47 quadradona.” Depois olha para o relógio e volta a chamar Marcello. (Revista Intervalo, Ano II, 1971, nº 452). 48

CANTAR SEMPRE FOI SEU SONHO

A Estrela de São Paulo. Foi assim que a apresentadora ficou famosa, na época em que só cantava. Mas o começo de sua carreira não foi dos mais fáceis e precisou trabalhar como empregada doméstica antes de tentar o rádio.

Na cidade de Taubaté (SP), terra de Monteiro Lobato, foi que Hebe Maria Camargo nasceu, no dia 8 de março de 1929. Desde criança tinha muita vontade de cantar, mas só a vida artística não dava pra viver. Por isso, nova ainda, trabalhou como empregada doméstica e, nas horas vagas, ia nas emissoras de rádio imitar Carmem Miranda. Hebe começou a se tornar conhecida e resolveu arriscar de vez. Formou uma dupla com sua irmã, Rosalinda e Florisbela, que durou pouco tempo. Depois veio um quarteto: ela, a irmã e duas primas. Mas todo mundo foi casando e o quarteto ficou na história como uma lembrança. Mudar para São Paulo era o sonho da menina Hebe, mas só depois da Revolução Constitucionalista de 32 é que ela conseguiu satisfazê-lo, quando dona Éster e seu Feguinho, seus pais, tentaram a sorte na capital. Eles sempre foram seus maiores incentivadores e com o passar do tempo seu nome começou a ficar famoso. Foi chamada de Estrelinha do Samba e Estrela de São Paulo, e seu programa “O Mundo É das Mulheres”, antiga TV Paulista, hoje Globo, foi líder de audiência durante seis anos. Em julho de 1964 veio o casamento com o industrial Décio Capuano e Hebe abandonou a televisão, para só voltar em 1966 com o “Hebe”, na TV Record, onde continua até hoje, já mãe de Marcello, nascido em 20 de setembro de 1965. (Revista Intervalo, Ano II, 1971, nº 452). 49

Longe das câmaras de televisão, Hebe Camargo continua a ser a mesma pessoa simples, de sorriso fácil

“ARRANJARAM” MEU CASAMENTO COM UM GOVERNADOR

Com a maior franqueza, a apresentadora da TV Record (SP) confessou que o que mais a deixa triste são os boatos inventados a seu respeito. Depois da separação de Décio, seu marido, todo o interesse de Hebe está voltado para o seu filho Marcello, que este ano começa a ir à escola.

Reportagem de Carlos Alberto Noronha

Muito se fala de Hebe Camargo. Inculta ou simpática? Dinâmica ou “sempre a mesma coisa”? Seu nome sempre esteve no centro de polêmicas, no meio artístico. Romances, desquites ou outros escândalos. Eu ainda não conhecia essa personalidade tão falada. No vídeo era apenas uma apresentadora restrita a um público fiel. Como mulher, sabia apenas de sua adoração pelo filho de cinco anos, Marcello. Nos últimos dias, sua vida foi abalada por uma crise matrimonial, explorada de todas as maneiras possíveis. As mais diversas e disparatadas versões. Ao lado disso, vinham os romances, tidos como causas da separação. Até onde repórter com pouco tempo de carreira, havia o receio de como seria recebido e tratado por um dos monstros sagrados da TV brasileira. O encontro foi na casa de um pintor chileno, Franulic. O papo, no fuscão branco de Hebe. Logo que chegou, tinha estampado no rosto seu sorriso característico. Trajava uma midi marrom, com botas altas da mesma cor e uma blusa preta. Após as explicações sobre o que pretendíamos, ela continuou sorrindo. Parecia uma mulher feliz, longe de qualquer preocupação momentânea. Mostrou-se acessível e de uma simpatia incomum. Falava, ria. Talvez uma alegria aparente. Mas eu estava na frente da verdade Hebe. “Todos tem se preocupado com meu desquite. Todo mundo falou, menos eu que sou a pessoa mais diretamente envolvida. Fiz um pacto com Décio para não falar disso agora. Eu achei e ele concordou comigo, que se está dando ao fato um sentido muito promocional.” Enquanto rodamos, ela diverte-se com o trânsito de 50

São Paulo. Acha graça nos que buzinam demais, xingam e nos que passam devagar para se certificarem se é Hebe mesmo que está no volante. “Além do mais, tenho que me preocupar com Marcello, que está indo pela primeira vez à escola. Vai iniciar uma vida e eu tenho que acompanhá-lo.” Nem mesmo as preocupações com a pessoa mais querida conseguem tirar o seu bom humor. “O que me deixa triste são os boatos. Inventaram mil coisas. Chegaram ao absurdo de arrumar meu casamento com um governador. Isso é realmente maldoso e espantoso. Sem nenhum fundamento. Nunca houve nada disso. Algumas pessoas não podem admitir uma separação sem que haja outro ou outra. O meu casamento não deu certo e é só isso.” A mágoa de Hebe tem procedência. Alguns jornais usam seu nome ao de diversas figuras da vida pública brasileira. Um outro problema que afetou sua vida profissional relaciona-se com o fato de que ela estaria perdendo a voz. “Estou realmente com um problema nas cordas vocais. Pudera, há cinco anos venho fazendo meu programa sem nunca ter tirado férias. A voz tem que começar a sentir uma certa estafa. Mas não é tão grave assim.” Chegamos ao fim da linha. Hebe é a mesma do início. Só que agora posso considerá-la uma mulher que sabe o que quer, soube como lutar contra todas as adversidades que apareceram. Ela despede-se de mim. O seu calor humano foi realmente confortador naquela tarde fria.(Revista Intervalo, nº 427). 51

Hebe Camargo: “Minha vida é um livro aberto”

23/03/2004 08:24

Hebe Camargo não esconde detalhes de sua vida. Durante sua carreira, a apresentadora cultivou uma amizade sincera com a imprensa e sempre recebeu repórteres, jornalistas ou fotógrafos de braços abertos. Ela brinca dizendo:

“Minha vida é um livro aberto, eu nunca escondi nada. Eu sempre disse tudo para a imprensa. Todas as coisas que fiz, contei quando fui fazer cirurgia plástica e aí voltei reformada. Namoros, casamentos... Sempre contei. Alguns foram inventados, mas isso é bom para dar um pouco de impulso na nossa vida. Eu preferia que os inventados dessem certo”.

Disponível em : http://ofuxico.uol.com.br/noticias/notas_119959.html 52

Hebe Camargo critica atuação de Pitta

São Paulo A apresentadora Hebe Camargo criticou atuação do prefeito de São Paulo, Celso Pit- ta. Ela comentou ontem, no lançamento da campanha do programa “Teleton”, do SBT, que está arrependida de ter votado em Pitta. “Ele estava mal preparado para assumir a prefeitu- ra. Não tenho nada contra ele como pessoa, mas como político é incompetente”, disse Hebe. Mesmo criticando, a apresentadora alertou que as únicas provas contra o prefeito vie- ram de sua família. “É preciso tomar cuidado”, disse. Sobre Paulo Maluf, Hebe foi mais suave. “Ele é um amigo meu. Eu freqüento sua casa. Espero que ele não se candidate esse ano. Não é um bom momento”.

Jornal Notícias Populares – 27-04-2000 53

Contrariada, Hebe pede desculpas a pais de menor

Terça, 25 de novembro de 2003, 10h26 Atualizada às 14h45

Em seu programa semanal, a apresentadora Hebe Camargo pediu desculpas aos pais do menor envolvido nas mortes de Liana Friedenbach e Felipe Silva Caffé. No último dia 17, a apresentadora chegou a afirmar que mataria o menor se o entrevistasse. O caso foi parar no Ministério Público, que solicitou uma fita com o programa na qual a loira se pronunciou. Logo na abertura, Hebe se desculpou com os pais do menor, tido pela polícia como um dos mandantes do assassinato do casal em Embu na Grande São Paulo. "Foi um momento de comoção e eu passei um pouco dos limites", disse Hebe. Indignada, a apresentadora aproveitou para criticar o alarde das autoridades. "Criaram alarido por causa de uma declaração. Mudam as leis, entra e sai ministro e a violência desafia os poderes e a sociedade".

No entanto, a loira fez questão de frisar que continua chocada com "a crueldade das mortes". "A minha indignação continua aqui dentro porque eu sou mãe", afirmou a mãe do menor. A loira disse: "Peço desculpas aos sofridos pais dele (o menor). A mãe deve estar com o coração dilacerado. Ela não tem culpa".

As investigações do Ministério Público começaram na segunda (24) e estão sendo conduzidas pelo promotor Carlos Cardoso. O MP ainda não se pronunciou se Hebe será real- mente processada. Especialistas acreditam que a apresentadora pode responder por apologia ao crime. Leia a íntegra do desabafo e pedido de desculpas de Hebe em seu programa:

"Pois é, nós vivemos num país engraçado né? Eu trabalho há mais de 50 anos em televisão e nunca fiz nada contra ninguém, e se tivesse feito todo mundo saberia porque a minha vida é pública, é notória. Há 50 anos, a cada semana, eu estou exposta na TV discutindo problemas 54

que atingem nosso dia-a-dia. Eu não sei quantas vezes já elogiei muitos, defendi outros tantos e também critiquei bastante. E continuo aqui sem promessas fantasiosas em busca de voto. Ah, mas como eu ia dizendo, o Brasil é um país engraçado, né? Ai de quem ousar mostrar indignação num veículo de comunicação. Nesta semana o mundo veio abaixo porque num momento de comoção eu passei um pouquinho dos limites, nada que você, você, você ou você (aponta para pessoas da platéia e para a câmera) não tenha ao menos pensado num momento de comoção como aquele que se abateu sobre todas as mães e todos os pais por causa dos bárbaros crimes que vitimaram a Liana e o Felipe. Mas como eu tenho certeza de que vocês também devem ter refletido e em sã consciência pedido perdão, como faço agora, para os sofridos pais do Champinha. Mas só para eles; eu não queria estar no lugar deles. A mãe então, deve estar com o coração dilacerado, ela não tem culpa. Agora, tentar criar alarido por causa de uma declaração nascida da indignação de uma mãe é fácil. Duro é encarar de frente uma verdadeira guerra que mata 17 mil jovens brasileiros a cada ano. Parece até impossível que autoridades bem remuneradas para esse fim abandonem microfones e holofotes e faça cumprir as leis ou que se aprofundem no que elas tiverem de errado, mudem o que for necessário para que barbaridades como as que assistimos quase que diariamente, não sejam cometidas. Entra ano sai ano, entra ministro sai ministro, e a violência desafia os poderes e a sociedade. Para você, meu povo, e para você pai e mãe do Champinha, se realmente eu me excedi, eu peço desculpa humildemente. Mas a minha indignação continua aqui dentro de mim, porque eu sou mãe, eu tenho um filho e eu estaria sem condições de voltar a falar com quem quer que seja se acontecesse uma barbaridade dessa com um filho meu, da mesma maneira que você também pensa igual".

Disponível em: http://exclusivo.terra.com.br/interna/0%2C%2COI219812-I1118%2C00.html 55

Hebe Camargo lança CD com convidados ilustres

Carla Nascimento da Folha Online

"Por que vocês não ensinam essa mulher a cantar?". A pergunta foi feita pelo diretor de um programa da extinta TV Tupi, quando Hebe Camargo ensaiava uma música que iria cantar na abertura de seu programa. Segundo a apresentadora, o fato gerou um trauma que a afastou dos estúdios durante vários anos. Em 1999,o jejum foi quebrado com o lançamento do CD "Prá Você". Agora, Hebe volta com "Como é Grande O meu Amor por Você", que ela apresentou hoje à imprensa em uma entrevista coletiva em São Paulo. E para mostrar que o trauma está de fato superado, ela convidou nomes consagrados para dividir nove das 12 faixas do novo CD.O disco, que chega às lojas com quatro meses de atraso - era para ter sido lançado no Dia das Mães, em maio, reúne nomes como Chico Buarque, Caetano Veloso, Nana Caymmi e Zeca Pagodinho. O atraso não atrapalhou, "saiu um disco que eu considero de bom gosto", disse.

Mais uma vez Hebe regrava composições já consagradas na voz de outros intérpretes como “Trocando em Miúdos” (Chico Buarque e Francis Hime), “Como é Grande Meu Amor por Você” (Roberto Carlos) e “Sábado em Copacabana” (Carlos Guinle e ).

Pouco conhecida do público como cantora até gravar o cd em 1999, ela disse não se considerar cantora. “Sou uma intérprete, por isso canto só o que eu gosto. Não sei ser falsa”.

Com a mesma naturalidade, Hebe disse que não faz questão de vender milhões e confessou a “mentirinha” que contou sobre o CD anterior. “Eu disse que tinha vendido 100 mil, mas vendi 60 mil. Agora as pessoas sabem que canto, acho que vai vender mais”, disse.

Fábio Jr., Ivete Sangalo e Zeca Pagodinho também tem participações especiais.

Publicado em 29/08/2001

Disponível em: www.folha.com.br 56

Hebe celebra 18 anos no SBT

Mauro Fernando Do Diário do Grande ABC

A apresentadora Hebe Camargo, que completou 75 anos no dia 08, comemora na próxima segunda-feira, dia 22, o 18º aniversário de seu programa no SBT. A emissora pau- lista coloca no ar, a partir das 22h30, o especial Hebe por Hebe, 18 anos com o SBT. Hebe, que começou a carreira aos 15 anos imitando no rádio, rece- be vários convidados. , Leonardo, Maria Rita, e Zeca Pa- godinho estão confirmados, assim, como a inglesa Sarah Brightman. A orquestra Sinfô- nica acompanha os cantores. O programa com 150 minutos de duração será transmitido ao vivo da Sala São Paulo. O ministro da Cultura, , estará presente. “No meu ambiente de trabalho, conhecido como pouco fácil em termos de relacio- namento, por causa da concorrência, há um clima de inveja, mas nunca senti isso. Fico aplaudindo o sucesso de colegas”, disse Hebe nesta terça-feira em entrevista coletiva. “O sucesso é uma coisa efêmera. Se você não tiver estrutura, com a mesma força que ele vem, ele vai”. Hebe reverenciou os primeiros tempos da televisão brasileira. “Estou na TV desde sua criação (1950). Antes ela era mais pura, não tinha artifícios. A tecnologia tira um pou- co a naturalidade do fato, maquia a programação. O artesanal da TV de ontem era espeta- cular”. E revelou descontentamento com os rumos de seu veículo. “Infelizmente a TV está indo para o caminho de devassar muito a vida íntima das pessoas e, assim, cai o nível. Não falo da vida alheia, apenas faço algumas perguntinhas sem agressão. A invasão à vida pri- vada dos artistas não é algo bom”, afirmou. Disse, ainda, que não faz mais campanhas políticas: “Quando participei, nunca fiz por dinheiro, sempre foi por convicção”. Ao final da coletiva, à qual compareceu coberta de jóias, Hebe deu um selinho em uma repórter da TV Gazeta, a pedido desta. Publicado em 16 de março de 2004 57

Jornal Diário do Grande ABC Capítulo III – Hebe por Hebe e por eles

Hebe Camargo é uma mulher considerada vitoriosa, por suas conquistas, por seu desempenho, por seu trabalho. Há 60 anos ela iniciava uma carreira que mais tarde seria considerada um ícone. Durante o ano de 2004, realizamos entrevistas com pessoas ligadas diretamente com a mídia, entre eles, artistas, personalidades, jornalistas e também pessoas do nosso convívio social, para analisarem o que Hebe representa para o Brasil. Neste capítulo, vamos resgatar alguns dos momentos que Hebe abriu sua vida para falar de sua carreira, de seus amores, de suas vontades, de suas indignações, em duas entrevistas históricas (concedidas às revistas Imprensa e Contigo!) Segundo a socióloga Marta Regina Ferreira dos Santos Zoccola, graduada em Ciências Sociais pela Fundação Valeparaibana de Ensino, o sucesso da apresentadora é decorrente da dinâmica de comunicação utilizada:

“ Partindo do princípio de uma linguagem simples e objetiva é que faz com que Hebe consiga atingir telespectadores de diferentes classes sociais e intelectuais. Podemos dizer que essa receptividade é decorrente do enorme carisma que ela exerce sobre o público. Sua trajetória, com o início no rádio, passando pelo cinema e logo depois a televisão é que fez Hebe adquirir a experiência e com determinação, conseguiu ser uma das pioneiras da televisão no Brasil, o que era muito difícil para as mulheres de sua época”.

Podemos entender que a apresentadora passa através de sua imagem uma mulher de uma representatividade social frente ao povo. Sua espontaneidade leva-nos a enxergarmos uma mulher moderna, acompanhando todas as tendências em favor do rejuvenescimento. 58

Susana Vieira

“Eu sou afilhada da Hebe e a conheço há 40 anos. Ela foi minha madrinha de casamento, é muito minha amiga. Nunca pensei nos 60 anos de carreira dela, porque só eu tenho 40, então, para mim interessa a quantidade de anos, interessa o que a gente é. Se a gente ficou é porque somos bons e ela é maravilhosa. Acho que existem coisas boas no Brasil que ficam e ela é uma delas. É a melhor apresentadora do Brasil, melhor figura de mulher, que ela entra em cena e arrebenta e é uma pessoa que já passou por quase todas as profissões centro do tele-visão. É a pessoa que mais entende de televisão porque ela foi atriz, garota propaganda, cantora, bailarina, entrevistado- ra, ela faz parte da história... sinceramente, ela junto com a Xuxa são as pessoas mais amadas do Brasil. Eu e Hebe estivemos juntas em Miami num jantar, porque meu neto é amigo dos amigos dela e vira e mexe os meus netos, meu filho estão com ela, e nós nos jantamos e longe de jornalis- tas, fotógrafos, a gente falou mal de todo mundo, foi maravilhoso...(risos). Eu adorei porque a gente falou das pessoas, da novela, de homem e foi tão maravilhoso, porque ela também é muito cobrada e tudo que a gente fala tem uma repercussão enorme, por isso não podemos expor tudo que a gente acha da televisão brasileira, porque será mal interpretado, apesar da gente ter idade suficiente para dizer o que a gente acha da puta da vida, mas como a gente tem uma aura simpática, não podemos falar o que a gente não gosta da televisão. Em relação a viagem a Miami, foram momentos inesquecíveis que eu pude falar tanta coisa para ela em particular da novela que na época era Mulheres Apaixonada e eu contando dos bastidores e ela dizendo o que ela achava mas foi uma delícia, parecia que eu tinha 15 anos de idade” (41).

41 Susana Vieira é atriz da Rede Globo de Televisão e cedeu esse depoimento exclusivo para a realização desse trabalho. 59

Nívea Maria

“Realmente, eu estaria torcendo, pois tenho 41 anos de carreira e chegar nos 60 anos de traje- tória profissional com essa vitalidade, com essa alegria. Tenho o prazer muito grande de ter nascido no mesmo mês que a Hebe, que é do dia 08 de março e eu dia 07. Na realidade, eu me identifico muito de repente com a mulher que é Hebe Camargo, batalhadora, lutadora, que está há tantos anos na carreira, nas luzes e não desanima. Ela é uma representante de uma geração e de uma mulher guerreira, independente, na qual a gente tem que se espelhar e é um grande exemplo” (42).

42 Nívea Maria é atriz da Rede Globo de Televisão e cedeu esse depoimento para a realização desse trabalho. 60

Chico Pinheiro

“Hebe Camargo é um ícone(43) da televisão brasileira. Hebe que já foi um dia um ídolo do país, pela beleza dela, pela exuberância dela, e vai ficando mais idosa e cada vez mais queri- da, isso é muito interessante. Ela é uma pessoa da casa de todo mundo. Representa para o Brasil uma personagem família brasileira. Eu em alguns momentos vi a Hebe se manifestar politicamente e ficava irritado porque em al- guns momentos se manifestava politicamente na contra mão da busca de cidadania. Eu me as- sustei muitas vezes com Hebe Camargo pelas posições políticas que ela assumia publicamen- te. Então eu me assustava, pensava: “Mas o que é isso? Ela está a serviço do quê”? Eu vi a Hebe se manifestar, por exemplo a favor da pena de morte, que sou radicalmente contra, e não combina com ela. Levei muito tempo para entender que Hebe é muito coração. Ela tem um coração enorme, então você consegue entender... Acho que não era uma jogo de marketing e sim da sincerida- de, do coração brasileiro” (44).

43 Pessoa ou coisa emblemática do seu tempo, do seu grupo, de um modo de agir ou pensar etc.cf. Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Edição Especial. 44 Chico Pinheiro é jornalista da Rede Globo de Televisão e cedeu esse depoimento exclusivo para a realização desse trabalho. 61

Simone

“Hebe é uma vitória só. Adoro,ela é maravilhosa, sem dúvida nenhuma a Hebe é a vida, a alegria em pessoa. Ela nos ensina dia a dia e diz que através de um sorriso que você vive muito melhor. É uma pessoa que esbanja felicidade, participa de todos os atos em função dos brasileiros, tanto da televisão quanto fora. Acredito que seja uma mãe maravilhosa, enfim, ela é o Brasil, é a mãe que todos gostariam de ter ou uma grande amiga. Uma pessoa que todos gostariam de ter na sua família, como mãe, como irmã, como tia... eu gostaria de tê-la como alguém da minha família, aliás, de uma certa forma eu a tenho na minha família”(45).

45 Simone é cantora, artista da gravadora Polygram e cedeu esse depoimento exclusivo para a realização desse trabalho. 62

Sandy

“A Hebe tem uma trajetória muito respeitável. Uma artista, uma pessoa maravilha. Ela mar- cou a história do Brasil. Acho que ela vai ficar para sempre. Ela sempre torna as coisas inte- ressantes, divertidas, faz coisas inusitadas, não tem medo de ousar e isso é muito legal. Eu desejo muita boa sorte a ela e espero que continue sempre com essa luz, porque eu acho que ela tem uma luz que irradia para todo mundo” (46).

46 Sandy, da dupla Sandy & Junior, é cantora e cedeu esse depoimento exclusivo para a realização desse traba- lho. 63

Jair Rodrigues

“É uma pessoa da maior representatividade. Além dela ser amiga dos artistas, de todo mundo, é uma extraordinária mulher que merece tudo e mais que ela tem na vida. Eu amo a Hebe de paixão. No tempos áureos da Rede Record, que Hebe apresentava um programa nessa emissora, tem- pos da Bossa, da Jovem Guarda, a minha mãe, dona Conceição, já falecida, foi uma das con- vidadas do programa e a Hebe fez uma pergunta para minha mãe: “Como é o fora da TV?” então a minha mãe, na simplicidade dela disse: “Olha, ele é como trata os ou- tros, um cachorrão!” Eu espero que a Hebe continue sempre assim. Que Deus a abençoe cada vez mais, por que ela merece, é uma pessoa que não pode ficar de jeito nenhum fora da televisão. Com a Hebe na TV com certeza não virão nota dez e sim nota mil” (47).

47 Jair Rodrigues é cantor e cedeu esse depoimento exclusivo para a realização desse trabalho. 64

Nélson Rubens

“A Hebe Camargo é a primeira dama da televisão brasileira pela postura dela, pela dignidade, pelo compromisso que ela tem também social que ela tem com o povo brasileiro, com os te- lespectadores. Hoje você vê a Hebe sempre engajada, está sempre participando de campa- nhas e vem há muitos anos dando uma contribuição como apresentadora, ela faz parte da inauguração da televisão. A Hebe parece estar realizando o sonho de muita gente. Por exemplo, o sujeito nasce velho e vai rejuvenescendo, até virar um bebê. Então você vê a Hebe com quantos anos de idade, 60 anos de carreira, ela está mais jovem do que quando começou e a vantagem que a jovialidade dela, a disposição, a garra, hoje com a vantagem dela estar mais amadurecida, mais experien- te, então ela tem a experiência para falar sobre política, moda, qualquer coisa e com a profun- didade que a TV permite. E ela nunca deixa de mandar um recado para um político, para um artista, para o próprio telespectador e até para Silvio Santos, quando ela não gosta de alguma coisa no SBT” (48) .

48 Nélson Rubens é jornalista da Rede TV! e cedeu esse depoimento exclusivo para a realização desse trabalho. 65

Milton Gonçalves

“Num país cheio de improvisações, durante 60 anos uma pessoa manter uma posição no sen- tido ascendente, e ela continua linda, esplendorosa...Isso tudo é o resultado de um trabalho constante, de perseverança, aquilo que ela acredita e é uma coisa maravilhosa e fantástica. Hoje ela poderia , se quisesse, parar de trabalhar, por que ela cumpriu com aquilo que a vida lhe destinou” (49).

49 Milton Gonçalves, ator, cedeu esse depoimento exclusivo para a realização desse trabalho. 66

Entrevista com Hebe Camargo ( 1)

Há 48 anos no ar e com contrato até 2001, a rainha da TV está sempre disposta a de- fender seu público: "Quando vejo algo errado, não meço palavras. Não tenho papas na lín- gua"

Hebe Camargo aparece no corredor de sua belíssima casa no bairro paulistano do Morumbi, estende os braços e grita, de longe: "Querido!". Passo a me sentir a pessoa mais importante do mundo só por causa desse "querido" — relata o jornalista Alex Solnik, convi- dado por IMPRENSA para entrevistá-la.

Ela se aproxima, a passos rápidos, esbanjando energia. Não espera para começar. Já está falando, ao mesmo tempo em que me encaminha para a varanda. Até então, eu estava apreciando os belos quadros e tapeçarias da sala de estar. O pé direito alto dá um tom suntu- oso ao ambiente, que também se mantém mais fresco. Hebe avisa que a decoradora está tro- cando todas as peças. Em poucos dias, a sala não será a mesma.

Da varanda dá para ver a piscina, muito azul. Alegre, como sempre, Hebe transforma a tarde em dia de festa. Não sei se o programa tem o jeitão da casa dela, ou vice-versa. Os gestos, a voz, tudo é igual: aqui, ou no teatro. Uma voz de mulher a chama. Ela se inclina e descobre, lá no pátio, uma amiga.

"Querida!", exclama logo, radiante, como se fosse a visita mais importante do plane- ta. "Como você entrou, que eu não vi?" 67

"Você está com visitas..."

As duas tricotam um pouquinho e ela, de novo, dá toda a atenção para mim. Ao gar- çom, também se dirige com entusiasmo: "Por favor, um café bem gostoso e um copo d'água bem fresquinho!"

Envolvente como poucas pessoas conseguem ser, simples como uma anônima dona de casa... Trepidante. Incapaz de ficar parada um minuto. Como na TV, onde impera há 48 anos.

IMPRENSA — O Gugu quer ter uma televisão... Você se vê como proprietária de emissora de televisão?

Hebe — Não. Nunca tive essa pretensão... O Gugu é empresário, muito bom empresário, né?! Você vê: tudo o que ele está fazendo está dando certo. Mas para ter isso tudo, ele está trabalhando pra caramba! Não está ganhando isso de presente. Ele é empresário; eu não. Eu sou... eu sou... uma brincalhona. Gosto de fazer aquilo, adoro fazer aquilo. Quando estou ali, não tenho tristeza, não tenho dor. Quero ser feliz e fazer as pessoas felizes. Com as besteiras que falo, se consigo arrancar uma risada da platéia... eu adoro, porque sei que quem está em casa está rindo também, porque a coisa contagia. Isso, eu acho bárbaro. É um prêmio que re- cebo.

IMPRENSA — E essa história de que você iria para a TV Bandeirantes?

Hebe — Eu e o Nilton Travesso somos muito amigos... Quando eu soube que ele saiu da Manchete, falei para o Silvio: "Silvio, traz o Nilton para cá. Ele é um tremendo de um pro- fissional, competente, maravilhoso". O Silvio levou ele pra lá. Depois, acabou o núcleo de novela — as confusões do Silvio... — e o Nilton saiu. Voltou para a Globo. Ficou uma se- 68 mana. Aí foi para a Bandeirantes. Então, há essa recíproca... Eu o convido para vir para cá... Quando ele vai, ele me convida... Ele é meu amigo.

IMPRENSA — Como o Silvio Santos reagiu?

Hebe — O Silvio Santos soube, porque saiu no jornal: "Hebe vai para a Bandeirantes". Eu sempre estou disposta a ouvir as pessoas que me ligam. Aí, o Silvio me liga em casa: "Mas, Hebe, você fica me assustando. Que que é isso? Você não vai sair, vem aqui falar comigo". Aí, fui falar com ele: "Silvio, não é nada disso..." E contei tudo, direitinho, porque não faço leilão, nunca fiz leilão. Nunca cheguei, por exemplo, para o Silvio Santos e falei: "Quero tanto para ficar!''. Nunca. Estava na época de reformar o contrato. "O que é que vocês estão me oferecendo?" E o que eles oferecem está ótimo. Nunca criei problema pra ninguém. Sempre fui assim. Eu já tinha dado a palavra para o Luciano (Callegari) que ia reformar. E ele já tinha até mandado o contrato. Eu o deixei na gaveta. Aí, como o Luciano viajou, não assinei, não mandei... E ninguém veio buscar. Ficou aí... Minha palavra é palavra. Mas o Sil- vio Santos achou que eu não tinha aceito a proposta. E disse: "Você vai ficar até o ano 2001!". 2001! Eu disse: "Eu não acredito! Será que chego lá?" Ai meu Deus... Eu pensei: "Pô! Por que não?" Energia eu tenho para dar e vender. Tem gente que me pergunta se tomo bolinha, guaraná... Até o próprio Silvio: "O que é que você toma? Eu vejo você no progra- ma: você pula, dança... Eu não tenho mais esta vitalidade". Eu digo: "Ter, eu tenho, o que é que eu vou fazer? Não preciso tomar nada para ficar alegre. Eu sou feliz." Ele morre de rir. Não se conforma de eu ter a energia que tenho. Vamos ver até 2001...

IMPRENSA — Seu programa é de variedades, mas às vezes você bate nos políticos... Por quê?

Hebe — Eu tenho um público fiel que vai ao auditório.. Tem gente que me acompanha des- de que comecei. Eles acham que estou ali para defendê-los, porque não tenho papas na lín- gua. Quando vejo alguma coisa errada, alguma coisa que é absurda, aí não meço palavras. 69

Eu não me preparo para falar. Vou falando, vou falando, num crescendo... O coração fica me empurrando para falar, porque tem cada coisa que os governos fazem!...

IMPRENSA — Você causou uma grande celeuma com aquele bolo cheio de moscas...

Hebe — Eu não pedi para fazer tão grande! Fizeram cada mosca deste tamanho! Eu tive a idéia: vamos fazer um bolo. A história é a seguinte: o bolo é novo, mas as moscas continuam as mesmas. Nossa! Quase me tiraram do ar!

IMPRENSA — No dia do bolo?

Hebe — No dia do bolo! Opa! Foi um auê! Aí começaram a querer que eu gravasse o pro- grama. Acho que gravei uns dois... Fui obrigada a gravar para acalmar os ânimos. Depois voltou ao normal. Meu programa tem de ser ao vivo. Uma vez a Dercy Gonçalves foi ao meu programa e disse que tinha de fechar o Congresso, que estava lá só para gastar dinheiro, não fazia coisa nenhuma. Aí o Ulysses Guimarães foi pro plenário e fez um discurso violen- tíssimo contra mim. Quiseram me tirar do ar. E eu disse: "Mas, gente, não fui eu quem falou. Foi uma convidada." Muito tempo depois, fiquei amiguinha do Ulysses. Viajei com ele e dona Mora (a mulher do deputado) num vôo de Nova York para São Paulo. Nos cumpri- mentamos e ele foi gentil comigo. Já tinha passado o ódio... Não chegou a ser ódio. As pes- soas sentem-se agredidas por mim, depois elas vêem que não faço nada assim (com essa in- tenção)... A única pessoa que agrido diretamente é o Inocêncio de Oliveira (deputado fede- ral pelo PFL de Pernambuco).

IMPRENSA — Por quê?

Hebe — Porque eu não o perdôo por ter feito um poço na fazenda dele com máquinas do governo. E depois ele quer falar dos outros e fazer a política do sério, do digno, do decente. 70

Ele fica louco quando eu falo dele. Manda, pede: "Fala pra Hebe que eu não sou assim, que eu não sou isso que ela pensa." Ele é o único em quem eu bato.

IMPRENSA — Você não acha que a televisão, de um tempo para cá, só tem usado a beleza e não a inteligência das mulheres?

Hebe — Eu já disse isso e fui mal-interpretada por algumas pessoas que ficaram de mal co- migo. Mas eu acho que a televisão regrediu. Nesses últimos tempos, teve uma regressão ab- surda de qualidade, porque um quer concorrer com o outro. E, lamentavelmente, o público, não sei se estava meio saturado daquela coisa mais nobre... Eu não sei avaliar... mas o públi- co está dando índices para esse tipo de programa, que eu acho um absurdo. As pessoas en- volvidas ficam loucas da vida quando a gente fala... Mas eu acho que eles poderiam ter o di- reito de dizer: "Não. Não dá para ser assim. Vamos dar uma melhorada." As pessoas ficam com medo de perder o emprego e vão aceitando tudo o que mandam fazer. E a qualidade caiu demais. Até a Globo, que tinha aquele alto padrão, também já aderiu a coisas mais... mais vulgares, de mau gosto. Fico muito triste. As próprias novelas brasileiras são um pri- mor, um cinema! Mas agora já estão apelando! Se não botam mulher nua, mulher com ho- mem na cama fazendo sexo explícito, eles acham que não dá audiência. Eu acho que a coisa feita com mais elegância... — botar uma mulher com uma camisola supertransparente... — fica muito mais... erótica. Por que mostrar os seios? Pra quê? Mostrar simplesmente, eu acho vulgar. Eu não gosto de ver. Mas não sou puritana...

IMPRENSA — Você acha que isso acontece porque os homens é que mandam?

Hebe — Não sei. Eu acho que as pessoas que estão se submetendo a isso, são muito submis- sas. Elas estão aceitando. Mandam fazer, elas fazem.

IMPRENSA — Você acha que a presença da Marluce Dias da Silva na Rede Globo é capaz de mudar esse quadro? 71

Hebe — Talvez... não sei. Dizem que ela é uma pessoa de muito equilíbrio, muito bom gos- to. Pelo menos para se vestir, ela é de extremo bom gosto. É muito chique. Pode ser que ela passe isso para a televisão. Mas eu não sei explicar o que está havendo. Eu acho que o pró- prio mundo está muito devasso. Hoje em dia, mulher não é mais tratada como mulher. Mu- lher virou uma coisa. Por quê? Porque ela própria se expõe. A mulher de hoje se concede muito. Então, ela própria se vulgariza, se põe na vitrine, se vendendo. Eu acho isso uma pe- na. Não falo isso para denegrir; muito pelo contrário!

IMPRENSA —Esse mito das loiras na televisão começou com você?

Hebe — Engraçado, porque eu era morena... Cabelo bem até aqui (faz um gesto, mostrando a cintura). Eu era um pedaço de morena! Que pena, não? O que o tempo faz com a gente! Os homens ficavam loucos. Eu era insinuante, tinha os olhos pretos. Eles brilhavam, brilha- vam... Não perdia nada. Hoje também vejo tudo, mas não com aquela vitalidade. Então, uma vez eu fui para os Estados Unidos e achei tão lindo aquela mulherada — só loura, loura, lou- ra... Quando voltei, comecei a oxigenar o cabelo. Mais tarde, clareei. Quando casei, escureci. Mas não me adaptei. Todas minhas roupas eram feitas para loura. Então, clareei de novo. Vou morrer loura. Depois, tem aquele filme Os homens preferem as loiras... Agora saiu uma reportagem dizendo que não, que eles gostam é de morena. Falei: "Então vou escurecer". Quero aproveitar mais um tempinho...

IMPRENSA — Como você conheceu Assis Chateaubriand? Foi em 1950?

Hebe — Bom, eu conheci Chateaubriand como dono dos Diários e Emissoras Associadas. Ele tinha jornais e emissoras em todo o Brasil. E eu era contratada da Rádio Tupi. Era canto- ra, a "estrelinha do samba", e participava de toda a programação. Eu ainda sou do tempo do Almirante, quando ele fazia um programa lá na Rádio Tupi. Me obrigou a aprender uma mú- sica enorme, comprida, e aprendi. Ele fazia um programa sobre folclore brasileiro e explica- va tudo, as raízes... Tinha uma voz lindíssima... Sofri tanto para decorar a letra, muito com- prida, que até hoje sei quase inteira. Quando vou almoçar no La Tambouille, tem um pianis- 72 ta lá que toca. Outro dia estive lá, ele tocou Flor Amorosa e cantei... É um xote. Era assim (canta): "Flor amorosa, compassiva, sensitiva, ó Deus/ Por quê? Ó uma rosa, orgulhosa/ tão vaidosa.../" Então, eu comecei a cantar. Eu cantava um número solo ou cantava em conjunto. E o Chateaubriand, sempre que vinha a São Paulo, chegava lá — o xodó dele era a rádio Tu- pi. Uma vez eu o vi ser barrado por um porteiro, o Baiano, o Bom Baiano... Não... O Baiano da Bahilha... Ele era uma graça... (Imita a voz) "Aqui não entra! Tenho ordens para proibir!" E o Chatô (imita nordestino): "O quê? Não vai me proibir, não! Eu sou o dono!"

IMPRENSA — O Chatô tinha noção da força que era a televisão?

Hebe — Eu acho que tinha, porque ele trouxe a televisão. Sabia tudo. Chateaubriand era uma pessoa de uma perspicácia, uma argúcia... Todo mundo conhece a história dele, como ele fundou o museu aqui (o Masp — Museu de Arte de São Paulo), essa maravilha que a gente tem. Mas a forma... Não sei se a televisão foi nessa base também. Mas a gente partici- pou muito da idéia dele, de "vou trazer". A respeito disso, me lembro de um episódio. Eu es- tava no Ceará, andando de jangada... Quem estava pilotando, se é assim que a gente fala, era o Jerônimo, o jangadeiro mais famoso do Nordeste. Estávamos eu, Anita Otero — uma can- tora de folclore, bonita, morena, de tranças enormes — e o João Calmon, o presidente das Associadas no Norte. Não sei por que cargas d'água saiu esse assunto de televisão. Já tinha lá nos Estados Unidos e aí a Anita Otero disse: "Ah, isso ainda vai levar muitos anos para ter no Brasil". E eu falei, não sei por quê, não tenho a menor idéia — foi uma coisa meio espiri- tual: "Ah, eu não acho. Acho que isso é uma coisa para termos daqui a uns dois anos". Não sabia nada a respeito e falei isso. Dois anos depois, Chateaubriand anunciou que estava tra- zendo e iria montar a primeira televisão no Brasil. Era uma coisa absurda na cabeça da gente pensar que bastaria virar um botão para ver imagens. Aí, quando os equipamentos chegaram, ele organizou uma caravana. Fomos todos para Santos.

IMPRENSA — Quem foi? 73

Hebe — Fomos eu, o Demerval Costa Lima, o Walter Foster e Sarita Campos, que tinha um programa feminino, dava conselhos. Naquele tempo, as pessoas ainda pediam conselhos pelo rádio e aceitavam, seguiam as orientações. Era muito engraçado. Tinha uma audiência louca. Também foram o Homero Silva e o Ribeiro Silva — as grandes vozes do rádio. Subi- mos no navio, vimos aqueles caixotes todos. Eu olhava aquilo e meu coração parecia que ia pular da boca. Completamente analfabeta, eu não tinha idéia do que era, mas a emoção que eu sentia era um negócio... Parecia que eu sabia tudo e ia trabalhar com aquilo tudo. Aí, quando desembarcou, o Chateaubriand deu um almoço no Parque Balneário, em Santos. E um show. Apresentou todo mundo. Um técnico norte-americano explicou como ia montar aquilo tudo. Depois que montaram a emisssora, a gente tinha teste todas as tardes. O Cassia- no Gabus Mendes ia para o switcher. Engraçado, as pessoas que trabalhavam no rádio come- çaram a trabalhar na televisão, como se tivessem feito isso a vida inteira. Era o talento brasi- leiro formando aquilo que hoje é essa potência. Eu acho a televisão do Brasil a melhor do mundo.

IMPRENSA — Como eram os tais testes?

Hebe — A gente ficava no salão da Rádio Tupi, que tinha um grande saguão e auditório no bairro do Sumaré — "A cidade do rádio". A Tupi fazia programas na hora do almoço e à tar- de, com auditório...

IMPRENSA — Você fazia programa de auditório ou só cantava no rádio?

Hebe — No programa de auditório, cantava, mexia com o público... Foi aí que começou o traquejo com o público, desde novinha. Fiz meu primeiro contrato quando tinha 14 anos. Ainda tenho a carteira de trabalho. A cara é engraçadíssima... Então, todos os artistas da rá- dio faziam testes. Às 3 ou 4 horas da tarde, começavam os testes para ver quem era bom de câmera, quem fotografava bem, quem tinha jeito. Fui reprovada porque tinha sombrancelhas imensas, iguais às da Malu Mader. Cabelo enorme, castanho, até os ombros. Busto deste ta- manho, tipo Fafá de Belém. Então, minha imagem ficava toda borrada. Aí, eles falaram: 74

"Hebe, você realmente não fotografa bem. Está reprovada". Fiquei arrasada: "Meu Deus, como?" Depois eles chegaram à conclusão que talvez não estivessem acertando a ilumina- ção. Não sabiam. Era tudo novo, tudo surpresa.

IMPRENSA — Ninguém tinha ido fazer curso nos Estados Unidos?

Hebe — Nada. O Chateaubriand pôs de repente na cabeça que ia montar uma TV. Foi muito bonito, realmente. A gente deveria render as maiores honrarias a essa gente, que realmente fez uma coisa fantástica. Como não existiam aparelhos de televisão no Brasil, Chateaubriand trouxe alguns e instalou no saguão dos Diários Associados, na Rua Sete de Abril. Também distribuiu pela cidade, para alguns amigos, para que pudessem ver... O Chatô era um crânio, né?

IMPRENSA — É verdadeira a história de que o Chatô quebrou uma garrafa de champanhe na câmera?

Hebe — Tenho a impressão, até hoje, de que isso é lenda. Alguém inventou. O Chateaubri- and não ia fazer uma coisa dessas... Quem sabe bem direitinho da história é o . Eu não vi, porque não estava lá naquele momento... Não sei se quebrou ou não quebrou...

IMPRENSA — Você não estava no primeiro dia? Não cantou o Hino Nacional na TV?

Hebe — Não. Quem cantou foi a Lolita Rodrigues. Eu escondi a verdadeira história durante muitos anos. Na época, disse que fiquei com uma gripe muito forte, perdi a voz e não pude ir. Na realidade, não foi isso. Eu tinha conhecido o Luís Ramos, que era das Folhas, irmão do José Nabantino e do João Batista Ramos, e fiquei apaixonada por ele... E ele por mim... Ia ter um evento das Lojas Assumpção ali no Teatro Cultura Artística. E eu queria vê-lo de perto, ficar perto dele, tudo. Então, falei: "Lolita, eu não vou cantar o hino." Além disso, eu 75 achava difícil, uma letra esquisitíssima. Ela sabe dessa história. Fui lá só para ver o Luís. Só para ver... Então, eu não cantei o hino porque fui, digamos, namorar.

IMPRENSA — Mas por que você tinha sido escolhida para cantar o hino?

Hebe — Nem sei porque fui escolhida. Eu não era a maior cantora da rádio Tupi. Tinha ou- tras muito melhores.

IMPRENSA — Você chegou a ter programa de auditório na TV Tupi?

Hebe — Não, mas na TV Tupi eu participava de todos os programas. Tem uma história en- graçada... A primeira apresentadora do Clube dos Artistas foi a Márcia Real. Mas eu tam- bém fui uma das primeiras, porque um dia o Airton Rodrigues não pôde ir, uma coisa assim, e eu fiz o Clube dos Artistas. Ninguém se lembra disso, mas eu me lembro. Também fiz um filminho com o Ivon Cury...

IMPRENSA — Era difícil para a mulher trabalhar em televisão?

Hebe — Eu tenho a impressão de que hoje em dia está mais difícil, porque falam sempre no negócio do teste do sofá, né? Eu nunca precisei do teste do sofá. Todas as vezes que me ena- morei de alguém foi porque quis e não para subir degrau, nem nada. Eu subi por minha força própria. Na minha época, não me lembro desse negócio do sofá, não. E não havia tóxicos. Era uma coisa muito pura, muito família. A gente ia para lá, ficava o dia inteiro, mesmo que não tivesse programa. Mas ficava porque era um ambiente muito gostoso, uma fraternida- de... É claro que pintava um namorico aqui, um namorico ali... Tinha um que namorava três de uma vez Nós três, eu, a Lia de Aguiar e a Vida Alves, ficávamos disputando o Ribeiro Fi- lho. Apaixonadíssimas por ele. Era um galã, uma voz. E ele driblou todas. Dizia que gostava de todas e casou com outra. (Ri) Aí, acabou-se a história, morreu a Vitória; quem quiser que conte outra. Foi muito engraçado... Mas claro, claro, que tinha paixões. O Cassiano (Gabus 76

Mendes) se apaixonava... Eu não devo falar... mas ele se apaixonava pelas atrizes, e quem queria, ia com ele. Não era aquele negócio de forçar: "Você quer ser contratada, tem que dar!". Não era assim. Não era mesmo. A pessoa ia porque às vezes a paixão era recíproca. Agora, tóxico, essas coisas, não tinha mesmo. Nunca vi e nunca soube de nada disso, de co- legas que usassem drogas naquela época. Acho que naquela época nem tinha, né?

IMPRENSA — Em 1950? Muito raro. Cocaína era coisa chique, se comprava em farmá- cia...

Hebe — Era chique...

IMPRENSA— Você encomendava uma grama na farmácia. Era fabricada pela Merck. Ago- ra, maconha era coisa de bandido... Não tinha chegado à classe média. Isso é mais anos 60...

Hebe — É... Aí começou a explosão. Passei por essa época toda... Eu via, eu sabia de tudo, mas isso nunca me contaminou. Nunca nem tive curiosidade de ver ou saber como é que era. Pra mim, o que me interessava era fazer meu trabalho, cantar, fazer sucesso. Viajei pelo Bra- sil inteiro pelas Emissoras Associadas. Saía daqui na segunda-feira, naquele avião...

IMPRENSA — DC-3 Caravelle?

Hebe — Não, o Caravelle eu também peguei, quando ia pro Rio Grande do Sul... Era aque- le... Como é que era o nome? Viajava não sei quantas mil horas para chegar no Ceará... En- tão, na segunda eu ia pro Rio, fazer um programa de televisão; depois ia para Belo Horizonte e para a Bahia. Da Bahia eu ia para o Recife. Tudo em uma semana. Do Recife eu ia para o Ceará e do Ceará eu voltava no sábado. Chegava aqui 11 da noite, com os pés inchados. Mas era disso que eu gostava. No começo mamãe ou papai iam, porque gostavam. Papai era mú- sico... Ele adorava... Mamãe ia para tomar conta da virgem dela. Naquela época eu ainda era virgem... Imagine que horror, que coisa antiga! Que coisa antiga! Mas a gente levava a sério. 77

Depois, quando comecei a viajar sozinha, uma vez, lá no Ceará, terminei um programa em que perdi uns três quilos, de tanto calor. Fui para o hotel. Meia hora depois, tocou o telefone. Era um hóspede. "Eu queria bater um papo com você". Com certeza ele pensava que eu era uma daquelas artistinhas que estavam lá para isso... "Eu vou levantar muito cedo, não tenho nada para falar com você, não sei quem você é. Boa Noite." Pum! Desliguei. Foi a única vez que alguém se atreveu a telefonar pro meu quarto. (Hebe interrompe a resposta, para me oferecer um café, um uísque ou uma cervejinha. Recuso a gentileza, e ela prossegue.) Era uma coisa árdua, mas fascinante, porque eu ia descobrindo o Brasil inteiro às custas dos Diá- rios Associados.

IMPRENSA — Como você começou com o programa de auditório? Você pediu? Pintou?

Hebe — Uma vez, quando eu era das Organizações Victor Costa, e a televisão era ali na avenida Paulista, o Roberto Corte Real apresentava um programinha de 15 minutos chamado Musical Manon. Tinha o Rago e seu conjunto e o Mário Genari Filho. Um dia o Roberto caiu na asneira de pegar uma gripe muito forte. O Costa Lima, que era diretor, me ligou e disse: "Olha, Hebe, você vem fazer o programa. Você conversa com o Rago, com o Mário Genari e canta o que você quiser. São quinze minutos." Ah, eu amei, né? Aí eu comecei a fa- zer esse programinha. Em vez de conversar com o Mário e com o Rago, eu conversava com o telespectador, dizia pra câmera: "Olha, tem certas coisas de que a gente gosta na vida. Eu, por exemplo, sou louca por música. Há letras de música que me tocam, que têm alguma se- melhança com o momento que eu vivi. Eu adoro. Preste atenção nessa música que eu vou cantar, veja se você se identifica com ela". Aí, eu cantava (canta): "Jamais te esquecerei/ pois tu és a minha vida..." — um bolero do Rago. Aí eu perguntava se tinham gostado. Can- tava outra, sempre conversando. Depois eu dizia: "Liguem ou mandem cartinha. Na semana que vem a gente volta a se encontrar". E eles telefonavam e mandavam um monte de cartas.

IMPRENSA — Isso de falar com o público, falar com a câmera, você tirou da sua cabeça? Ninguém te falou nada? 78

Hebe — Nada, nada. Esse negócio de olhar pra luzinha... — acho que fui a primeira a fazer. Quando terminava o programa eu ficava uns 40 minutos atendendo telefonemas. Eu pergun- tava o nome da pessoa que ligava, e na semana seguinte dizia: "Oh, minha querida Marina, adorei seu telefonema, viu?" Falava com os telespectadores, dizia seus nomes, e cantava as músicas de que eles gostavam... Bom, quem que não queria ouvir seu nome na televisão? Era uma coisa... Aí a audiência começou a crescer, e o patrocinador não quis mais que eu saísse. Daí, o Murilo P. Ferreira teve a idéia do programa O Mundo é das Mulheres. O Wal- ter Foster, que também era da Organização Víctor Costa, era o redator. O programa era de auditório e tinha quatro ou cinco mulheres e um convidado. A gente trazia escritores, atores, políticos e era muito engraçado porque todos contestavam: "Imagine se o mundo é das mu- lheres. Vocês não sabem de nada, nós é que mandamos" — eles acabavam se entregando. A partir daí, todos os meus programas tiveram auditório. Numa época, cheguei a apresentar cinco programas por semana, ao vivo, na Organização Victor Costa. Por isso, morro de rir quando as pessoas dizem: "Se você aparecer muito, desgasta a imagem". Se desgastasse, eu não estaria mais aqui...

IMPRENSA — Quais eram esses programas?

Hebe — Eu tinha um programa chamado Maiôs a Beira-mar, o Hebe comanda o espetácu- lo, o Calouros em Desfile... Quando o Ari Barroso morreu, o Jaime Moreira Filho ficou fa- zendo A Hora do Pato. Aí o Costa Lima, que tinha uma cabeça fantástica e era uma pessoa adorável, disse: "Não, pra substituir o Ari Barroso, não posso botar outro homem, porque nunca ninguém vai aceitar, achar graça, por melhor que seja. Vou botar uma mulher. Quem? "A Hebe". E lá fui eu. Puxa, fiz A Hora do Pato durante anos. Depois mudamos o nome para Calouros Toddy.

IMPRENSA — Cada dia você fazia um programa diferente?

Hebe — Eu não sei como é que eu conseguia... 79

IMPRENSA — Com o mesmo cabelo?

Hebe — Com a mesma cara, a mesma cabeça. Eu não sei... Olha, foi uma coisa, um fenôme- no naquela época. Eu era uma pessoa extremamente simples, não sabia nada, fazia tudo o que meu coração mandava. E sou assim até hoje.

IMPRENSA — Nessa época da TV Paulista você trabalhava com o Silvio Santos?

Hebe — Não, eu trabalhei com o Silvio na Rádio Nacional, na rua Sebastião Pereira. Quan- do o Victor Costa veio para São Paulo eu era da Rádio Excelsior. Aí fui contratada pela Rá- dio Nacional. O Silvio era locutor do Programa Manoel de Nóbrega. Daí ele começou a deslanchar, a fazer os showzinhos de circo, com o Carlos Alberto, o Golias e o Canarinho...

IMPRENSA — Era a Caravana do Peru que Fala...

Hebe — É... A Caravana do Peru que Fala. A atração era a macaquinha, e eles começaram a ganhar dinheiro com essas caravanas. Depois o Manuel de Nóbrega deu para ele, de pre- sente, o Baú, a idéia do Baú da Felicidade. Ele soube administrar isso divinamente e se tor- nou essa potência que é hoje. Agora, quando eu fazia minhas viagens, trabalhei na TV Tupi do Rio de Janeiro, na TV Continental do Rio de Janeiro e na TV Rio, quando o Walter Clark era o diretor. Mas a Ilka Soares, que era linda, era um poço de ciúmes. Ele não podia olhar para ninguém nem falar o nome de ninguém, de tanto ciúme que ela tinha. Mas mesmo as- sim eu fiz uma temporada pequena lá. Trabalhei oito anos na TV Record, conseguindo índi- ce de 72 pontos de média. Ninguém perdia o programa de domingo. Qualquer autoridade, qualquer personalidade, qualquer artista de maior projeção que viesse para o Brasil tinha de ir ao meu programa.

IMPRENSA — Quando você começou a ser disputada pelas emissoras? 80

Hebe — Nunca fui assim... disputada. Os convites chegavam na hora certa. Casei em 64. Em 65, o Marcelo nasceu, e eu saí da televisão, deixando o programa O Mundo é das Mu- lheres. Casei, saí e falei: "Quero ser dona de casa, mãe de família". Eu ganhava 1.000 cruzei- ros por mês. Era um salário formidável em 65. Acho que era. Saí, mas nunca deixei de rece- ber convites. O Clóvis Azevedo, da Rádio Excelsior, me procurou: "Hebe você precisa vol- tar, você não pode ficar fora!" Eu respondi: "Mas meu marido não vai deixar... A condição pro casamento era eu sair da televisão. E eu, bobinha, saí." Então o Clóvis propôs: "Pergunte se ele deixa você fazer um programa de rádio?" Aí, eu é que fiz objeção: "Você acha que vou deixar meu filho aqui e sair pra fazer um programa de rádio?" Ele me disse: "Eu monto a rádio aí". E assim ele fez. Montou o estudiozinho, e eu todo dia: pá, pá, pá...

IMPRENSA — E como você voltou para a TV?

Hebe — O Agnaldo Rayol fazia aquele programa com o Renato Corte Real, o Corte Real Show. Era o maior sucesso da televisão. O Marcelo estava com um mês. Quem era a atração? Hebe Camargo com o filho. Meu marido foi junto. Aí, antes de entrar no programa, o Paulinho Machado de Carvalho me disse: "Como é? Você não vai voltar? Você precisa voltar pra Record!". Eu respondi: "Não tem jeito de voltar". Naquela semana, o Airton Ro- drigues veio com uma proposta do Cassiano Gabus Mendes, diretor da TV Tupi: "Olha, o Cassiano quer que você faça um programa como sempre fez, com orquestra. Você não vai precisar viajar, vai ser aqui." O Airton e a Lolita Rodrigues, a mulher dele na época, eram meus amigos e não saíam lá de casa. Eu morava atrás da TV Tupi e eles do outro lado, atrás. Toda noite eles iam lá jantar com a gente, jogar um baralhinho, etc... Ele me ofereceu 10 mil... não me lembro qual a moeda em vigor na época, acho que era o cruzeiro...

IMPRENSA — E você aceitou?

Hebe — O Cassiano me mandou falar com o Edmundo Monteiro, que me deu um chá de cansaço logo de entrada. Fiquei na sala uns 40 minutos, esperando para ser atendida... Quan- do entrei, ele falou: "Que bom, você de volta pra Tupi... Então vamos conversar, porque 81 você vai fazer um programa aqui e outro no Rio." Falei: "Como?" "Você vai fazer dois pro- gramas. Um aqui e um no Rio. Mas não vai ter orquestra, por contenção de despesas". "Não foi isso o que o Cassiano falou para mim. Quanto você vai me pagar?" "Ah... uns 8 mil". Eu disse: "Como? O Cassiano me ofereceu 10 mil pra fazer um programa por semana aqui em São Paulo. E eu fui bem clara: não posso viajar". "Ah... não... Aí foge muito do orçamento". "Tudo bem, muito obrigada por ter me atendido. Vou pensar e depois telefono pra ver quan- do a gente vai assinar o contrato". Aí, o Agnaldo chega em casa: "Olha, o Paulinho Machado de Carvalho mandou dizer que ele paga o que a Tupi oferecer, para fazer um programa, um grande programa, aqui em São Paulo". Respondi: "Pode dizer que já aceitei". O Cassiano não se conformava: "Não é possível!" Eu falei: "Cassiano, eu fui tratada desse jeito... O Ed- mundo desmentiu tudo o que você me falou. A Record me chamou, eu vou". Era muito di- nheiro.

IMPRENSA — Você não tinha empresário?

Hebe — Nada! Nunca tive empresário, nem secretária. Não tive e não tenho. Até morro de rir quando as pessoas dizem: "Ah, depois eu falo com sua secretária". Não tenho secretária, nem motorista. Gosto de dirigir eu mesma. Nunca levei calote e nunca ninguém me tungou com esse negócio de cachê, viagem... Nunca...

IMPRENSA— Quem dava mais atenção para o artista: o Chatô ou o Paulo Machado de Carvalho?

Hebe — O Paulo Machado. Ele era uma maravilha! O Chatô gostava muito de mulher da so- ciedade. Pra artista, ele não dava muita confiança, não. Chegava, olhava tudo, mas muito por alto. O doutor Paulo, não. Ele conversava com os artistas...

IMPRENSA — Você nunca bateu papo com o Chatô? 82

Hebe — Não, nunca. Ele nunca me olhou. Nunca nem soube quem eu era, eu acho. Eu era uma estrelinha contratada por uma das potências dele. A única vez que tive um contato mai- or foi quando fomos buscar o equipamento. Tenho uma foto ao lado dele no navio. Ele era uma criatura que transformava em ouro tudo em que punha a mão... Mas daquela maneira...

IMPRENSA — O que você sentia nele? Firmeza?

Hebe — Não. Ele era... potente, poderoso... Tudo o que queria fazer, ele conseguia. Punha na cabeça e dizia: "Vai sair". Você de repente estava de frente para o projeto. Ele foi uma das maiores potências em matéria de televisão e jornais, né? Eu não sei como uma herança dessa, de tanto poder, possa de repente, se diluir... Sem que se saiba aonde foi parar. O Paulo Machado já era mais presente...

IMPRENSA — Mandava parabéns?

Hebe — Mandava. Mandava cartões. O Silvio Santos também faz isso. Ele manda cartões lindos, flores. O Silvio é uma pessoa muito... não posso dizer acessível, porque ele cresceu tanto que o poder dele distancia as pessoas... Não é ele que afasta as pessoas, a gente é que não tem coragem de chegar. Eu, quando chego na frente do Silvio, fico assustada. Eu acho ele assim... grande. Eu digo: "Tenho medo de você." E ele morre de rir: "Mas Hebe, pelo amor de Deus, não fala uma coisa dessas..."

IMPRENSA — E como era quando vocês foram colegas?

Hebe — Eu brincava com ele, quando era da Caravana do Peru que Fala: "Ô Silvio, vamos juntar nossas fortunas?" Nem ele nem eu tínhamos nada, mas eu brincava com ele. Nunca namorei com ele. Mas eu admiro muito a capacidade de trabalho do Silvio. É fora de série. O Dr. João Saad (TV Bandeirantes) também era um amor. Foi um diretor, um presidente en- cantador, muito acessível, muito presente. O Johnny (filho de João Saad), também. Mas 83 quando eu estava na Bandeirantes tive de viajar com o Lélio (Lélio Ravagnani, marido de Hebe) pra Paris e pedi licença para deixar dois programas gravados. Aí, quando eu estava gravando um deles correu a notícia de que o Walter Clark tinha sido contratado. "Oba! Wal- ter Clark vem para cá!" — pensei. Depois, parei cinco segundos. Engraçado, foi uma coisa instantânea: "Será oba?" Tô em Paris, minha enteada liga e diz: "Hebe, o Walter Clark tirou teu programa do ar". Me tirou do ar, com patrocinador e tudo. Foi uma gritaria. Nos jornais, todo mundo acabando com ele — um absurdo o que tinha feito comigo, com a programa- ção... Ele não deu certo. Acabei voltando, fazendo meu programa.

IMPRENSA — Você não teve mais contato com o Walter Clark?

Hebe — Só muito tempo depois, porque o Lélio queria saber quem era o Walter Clark, para matar... A gente se encontrava, às vezes em boates, e eu, quietinha, não falava nada para o Lélio... Depois ele ficou grande amigo nosso, cansou de vir almoçar aqui. No livro que es- creveu, ele se retratou, dizendo que foi um mal-entendido, etc. e tal...

IMPRENSA — É verdade que você chegou a tirar dinheiro do bolso para pagar o cachê de artistas que iam ao seu programa?

Hebe — A TV Tupi já estava cambaleando, não tinha dinheiro para pagar os artistas. Eu morava atrás da emissora. Os artistas ameaçavam ir embora na hora do programa: "Se não receber, não participo". Aí, eu mandava minha empregada em casa buscar o dinheiro e paga- va o cachê. Depois, pra receber, era uma luta... Mas eu pensava: "Não posso deixar, é meu nome que está em risco". Se não, como é que eu ia fazer o programa?

IMPRENSA — Naquele tempo se pagava cachê aos artistas. Hoje não, né?

Hebe — Hoje são as gravadoras que promovem. Interessa para elas. Mas naquele tempo, pa- gava-se. A Tupi estava mal e eu ouvia um zum-zum-zum, lia notinha em jornal: "O progra- 84 ma da Hebe vai terminar". O Walter Foster era o diretor naquela época e era muito meu ami- go. Cheguei e falei: "Walter, estou ouvindo notícias de que vão tirar meu programa do ar. Eu gostaria que você me dissesse, pra eu me preparar emocionalmente". Aí, um dia estou em casa, no Sumaré, sozinha, meu filho na escola... Eu já era separada, estava comendo uma sa- ladinha... Toca a campainha e um rapaz, um office-boy, entrega uma carta, aberta: "Comuni- camos à senhora Hebe Camargo que a partir do dia 30 de abril deixará de ser apresentado o Programa Hebe". Minhas lágrimas caíram na salada! Eu falei: "Mas como? Eu pedi para me avisar." Mas engoli, fiz o programa, bonitinho. Não tinha ninguém. Quem passava no corre- dor, eu pegava. Passou a Lolita, passou a Nair Bello... Ninguém queria ir ao programa, por- que não tinha dinheiro para pagar. Então minha despedida da TV Tupi foi melancólica. Eu me lembro que cantei "O show já terminou, não adianta mais..." Cantei até o fim, sem cho- rar. Depois fui para casa e chorei, chorei, chorei...

IMPRENSA — Com o Boni, você chegou a trabalhar?

Hebe — O Boni só me chamou uma vez, quando era diretor da Rádio Bandeirantes. Eu ti- nha um programa de muito sucesso na Rádio Jovem Pan e ele mandou me chamar porque queria que eu fosse para a Rádio Bandeirantes. E eu ganhava 1.000 cruzeiros na Jovem Pan. Eu fui lá e ele disse: "Quanto você ganha na Jovem Pan?" Falei: "Tanto". Ele falou: "Ah, sei... Patati, patatá, depois eu te ligo." Nunca mais eu ouvi a voz do Boni. Aí ele virou o todo-poderoso da Globo. Também nunca fui chamada, nunca me permitiram atuar na Glo- bo...

IMPRENSA— Você nunca trabalhou na Globo?

Hebe — Nunca. Na Manchete também não. Participei de programas, sempre tive muito cari- nho do pessoal da Manchete. Sempre me convidaram, mas nunca conseguimos chegar aos pois é. Na Globo, só participei de uma entrevista no programa da Xuxa, porque a Xuxa in- sistiu com o Boni. Ela queria que eu fosse e eu fui. Até falei: "Olha, a Xuxa faz milagres, porque é a primeira vez que participo de um programa da Globo". Foi o único. O único! 85

Quando o Nilton Travesso ainda estava na Globo, naquela fase áurea, ele veio aqui em casa me convidar para fazer um programa aos sábados à tarde, antes do Chacrinha. Aí, eu disse: "Mas o estilo do meu programa não é para a tarde." Aí, simultaneamente, a Bandeirantes e o SBT me convidaram. O programa que o Silvio queria que eu fizesse não tinha nada a ver co- migo e também não me entusiasmou. Fui para a Bandeirantes e fiquei oito anos lá. Quando estava para terminar meu contrato, o Silvio Santos mandou o Luciano (Callegari) aqui em casa. Queria que eu fosse para o SBT. Eu ganhava acho que 15 mil na Bandeirantes e me ofereceram 19 mil para reformar o contrato. Aí, o Luciano disse: "O Silvio mandou oferecer 50 mil para você".

IMPRENSA — E você aceitou?

Hebe — Bom, de 19 para 50 mil era muita diferença. O Silvio nos convidou para jantar na casa dele. Fui com o Lélio. O Lélio falou: "Olha, eu nunca me meti na vida da Hebe. Nunca dei palpite. Ela faz o que acha que é melhor, mas dessa vez eu disse para ela: — Você vai para o SBT." A proposta era boa demais. Mas quando fui fazer o último programa na Ban- deirantes, o Ivan... — não me lembro o sobrenome dele —, uma pessoa boa, pensou que eu ia falar no ar que iria pro SBT e não me deixou fazer o programa. Eu nunca faria uma coisa dessas, tenho educação, ética. Botou meu cenário no ar e ficou uns 15 minutos assim, com o locutor dizendo: "A apresentadora deste programa, Hebe Camargo, não mais pertence ao cast da Bandeirantes. Por isso, deixa de ir ao ar o Programa Hebe". E de cinco em cinco mi- nutos vinha o locutor dizer isso. Parecia que eu tinha morrido... Falei: "Gente, eu morri!" Li- guei pra casa e pedi: "Lélio, venha me buscar. Não quero ir com o carro da Bandeirantes." Aí veio o dr. João: "Que que foi querida?" "Não , nada, dr. João, foi um mal-entendido. O Ivan pensou que eu ia fazer uma coisa que eu jamais iria fazer. Mas eu quero que o senhor saiba que fui muito feliz aqui. Muito obrigada." Beijei o rosto dele, chorei, chorei e ainda vi meu funeral no vídeo. Nunca havia visto uma emissora fazer isso. Muito feio. Uma coisa ridícula.

IMPRENSA — Sempre foram os homens que mandaram na televisão, não? 86

Hebe — Sempre os homens. Agora tem a Marluce, que parece que está representando bem nosso sexo.

IMPRENSA — Por que você acha que mulher nunca mandou na televisão?

Hebe — Porque sempre os donos já eram eles, né?! É coisa de homem. De uns 10 anos para cá é que a mulher começou a evoluir, a crescer, participar. A mulher era submissa demais.

IMPRENSA — Você ajudou nisso?

Hebe — Não sei. Meu programa O Mundo é das Mulheres, nos anos 50, era um programa absolutamente feminista. O Hebe por Elas também era um programa no qual as mulheres ti- nham o direito de falar tudo o que queriam, comentar seus problemas. Depois que fiquei in- dependente, nunca dependi de homem e não dependo até hoje. Faço o que quero. Se quiser comprar alguma coisa, compro. Não pergunto para o Lélio se devo. Eu sou eu, dona de mim. Acho que sou uma vitoriosa na vida. Eu sempre digo: "Agora, acho que a brasinha vai come- çar a formar uma cinzinha. Já está chegando a hora da coisa não ser assim..." De repente, faz djum! Parece que o vulcão explode. É uma coisa! Eu vou aos lugares, e as velhinhas, as cri- anças me amam... Fui num evento num domingo, aqui na Berrini (Avenida Luís Carlos Ber- rini, em São Paulo), e você precisava ver a criançada! Esticava a mão para pegar na minha, subia no palanque para dançar comigo... Criança de cinco, seis anos, não de 14. Eu me sinto muito feliz com isso... Fiz um programa para as crianças em outubro, deu 20 pontos de audi- ência, em média. Eu de short... porque me adapto à ocasião. Vou acompanhando, e não paro. Eu não vou ficar velhinha...

Disponível em: http://www.paremasmaquinas.com.br/entre002.htm

Entrevista publicada na Revista Imprensa – 1998. 87

Entrevista com Hebe Camargo ( 2)

Deusa da eterna juventude

Com 75 anos e 60 de carreira, a maior apresentadora que o Brasil já teve mostra por que ninguém acompanha seu pique: “Sou um caso a ser estudado pela ciência”

Revista Contigo! - Qual é o registro de memória da infância mais remoto que você tem? Hebe: Andando de bicicleta em Taubaté (interior de São Paulo). Essa imagem é bem forte. Lembro também do grupo escolar. Na hora do recreio, eu cutucava uma árvore, um pé de abiu, uma frutinha amarela bonitinha. Eu me lembro como se fosse hoje. Outra lembrança é de uma casa, com um quintal enorme. Eu pulava o muro para pegar goiaba e levava para mamãe. Isso eu tenho na minha cabeça como fotografia. Uma forte lembrança também, já em São Paulo, é de quando fiz a primeira comunhão no Grupo Escolar Imaculada Conceição, vestida de anjo. A roupa era azul com a asa branca, e tênis. Eu entrava duas, três vezes na fila, depois da comunhão, para ganhar o pãozinho. São coisas que marcam a vida da gente. Talvez por isso eu goste tanto de pão e de goiaba. Abiu eu nunca mais comi.

Contigo! - Você anda de bicicleta? Hebe:Não ando por falta de tempo, mas se eu pegar uma bicicleta saio andando tranqüilamente.

Contigo! - E dos pais? Qual é a primeira imagem? Hebe:Papai sempre com o violino. Ele tocava nas missas da igreja de Taubaté. Mamãe tocava piano de ouvido. Era uma figura de mulher frágil, muito engraçadinha, vaidosinha. Eu tinha mais intimidade com papai. Ele era um homem atualizado, nunca parou no tempo. A mamãe não, ela parou no tempo.

Contigo! - Sua mãe era bem diferente de você? 88

Hebe: Completamente. Sou mais papai. Ele era boêmio, eu sou boêmia, ele era músico, eu adoro música. Sou incapaz de passar um dia sem ouvir música. Nos meus carros, se não tiver música não saio.

Contigo! - Você cantarolava o tempo todo? Hebe: Cantarolo, danço, as pessoas pensam que sou louca. Passam ao lado do meu carro e me vêem dançando. (Pequena pausa). Sou muito íntima de mim. Tenho muito convívio comigo mesma. E acho formidável porque eu nunca sou só. Estou sempre comigo. Engraçado, né?

Contigo! - E quando acorda se sentindo só? Hebe: Nunca. Não é mentira. Eu nunca tive a sensação da solidão. Não sei o que é, mesmo quando estou só. Eu sou povoada.

Contigo! - Há muita Hebe aí dentro? Hebe: É, tenho lembranças gostosas. De vez em quando me lembro de alguém que eu amei, aí fico recordando a história como se estivesse acontecendo. É um negócio bárbaro. As pessoas deviam aproveitar essas coisas. Eu só penso e coisas boas. Não penso em fatos horríveis, desagradáveis, porque seria um desastre, me entristeceria. É por só pensar positivamente que tenho tanta alegria de viver.

Contigo! - E quando lhe vem um pensamento triste? Hebe: Eu falo “xô, urubu!”. E procuro mudar de ambiente. Se estou no quarto, desço para a sala, vou para o banheiro, fico mexendo nos meus cremes, nos meus perfumes, nos meus batons, me distraio. Não tenho a capacidade de cultuar coisa ruim.

Contigo! - Quando aprendeu a se defender assim da tristeza? Hebe:A vida foi me ensinando, fui aprendendo sozinha. Sou uma mulher que não teve estudo, nunca cursei faculdade, tive só curso primário.

Contigo! - Estudou até que série? 89

Hebe: Que série nada. Fiz o quarto ano primário e olhe lá. Com muito esforço. Logo comecei a trabalhar para ajudar a família. Tinha de viajar para cantar nas emissoras (de rádio) de outros Estados. Chegava exausta. O transporte era difícil, mais demorado.

Contigo! - Você é a caçula de seis irmãos. (Hebe interrompe) E nos dávamos muitíssimo bem. Éramos uma família feliz mesmo. Nunca fomos tristes por sermos pobres. Éramos pobretes, mas alegretes, como mamãe dizia. (Rindo) A gente fingia que tinha fortuna, frutas e queijos maravilhosos. Um falava para o outro “Traz o queijo da geladeira” e não tinha nem geladeira. Mas a gente morria de rir. Maçã, eu dizia: “Vou comer uma maçã, quer um pedaço?”

Nós brincávamos com a nossa pobreza.

Contigo! - Qual era o grau dessa pobreza? Hebe: Tinha dia que só tinha arroz para comer. No tempo do arroz puro, só papai trabalhava. Os filhos ainda jovens, era pobreza mesmo. Morávamos em lugares bem pobrinhos. Depois os irmãos cresceram e começaram a trabalhar. Uma irmã trabalhava em um escritório e a outra em uma loja de cosméticos, muito chique, na Praça do Patriarca (no centro de São Paulo). Éramos quatro mulheres e dois homens. Eles já morreram e, recentemente, perdi uma irmã, a Cicida. Ela tinha perdido o marido, não suportou a ausência dele e um ano depois morreu também. Agora somos três. Minha irmã mais velha tem 87 anos. Semana passada, quando eu fiz 75, ela me mandou uma cartinha linda, escrita de próprio punho. Não temos tido tempo de grande convívio porque minha vida é muito atribulada.

Contigo! - Sua vida tomou outro rumo. Hebe: Sou diferente das minhas irmãs em termos de situação financeira, mas todas foram bem casadas, com maridos trabalhadores. No temperamento, somos bem parecidas. Minha irmã ri de tudo. A risada é permanente na nossa vida. A Estelinha, que é linda, de olhos verdes, também é muito risonha. A mais séria era a Cicida, mas mesmo ela falava coisas engraçadas. Basta contar que foi cantando para a UTI. “Eu não sou cachorro não” (risos). Por aí se tira uma idéia do que é a nossa família. Estamos morrendo e rindo. 90

Contigo! - É uma atitude herdada do seu pai? Hebe: É genética mesmo.

Contigo! - O que seus pais lhe contavam sobre o seu nascimento? Hebe: Mamãe dizia que eu nasci às 9h30, numa noite de temporal. Mas não sei se foi em uma maternidade ou em casa. Dessa história não sei muito. Só sei que chovia, com muito trovão. É por isso que eu sou tão elétrica.

Contigo! - Vamos dar um salto para o período de maior prosperidade. Quando você ganhou a primeira jóia? Hebe: Minhas jóias são todas compradas. A única vez em que ganhei jóias espetaculares de um namorado foi do Pepino Matarazzo. E quando eu desmanchei, devolvi todas. A Diana, irmã dele, disse que eu era boba de devolver os presentes.

Contigo! - Orgulho? Hebe: Consciência. Não achei justo ficar com tudo aquilo, eram peças muito valiosas. Aí comecei a comprar coisas equivalentes. Sempre gostei de jóias. Mesmo quando não podia comprar, a fantasia (bijuteria) me satisfazia. A primeira jóia que comprei foi de um joalheiro, seu Samuel, que vendia “em vezes” (risos). Sempre gostei de brilho. Tanto que, quando meu pai ficou doentinho, fiz a promessa de não usar jóias ou fantasia durante um ano. Aquilo para mim era o maior sacrifício. Fiquei um ano sem usar nada. Sofri para caramba.

Contigo! - E valeu a promessa? Hebe: Valeu, papai sarou na época. (Pega um colar de pérolas e descreve) Eu estava em Paris e fiquei enlouquecida por um colar que vi em uma vitrine, na Plaza Vandôme. Entrei, olhei, perguntei e custava 120 mil euros. Não era para o meu bico. Voltei para o Brasil pensando no colar. Tenho um japonês, que é designer, e faz jóias lindas para mim. Expliquei como era o colar, ele encomendou as pérolas e fez mais bonito, com pérolas bem maiores (risos). Gosto de jóia grande, tudo exagerado. Esse designer fez um outro anel para mim que 91 toma o dedo todo de tão grande. Eu o apelidei de lagostine, parece uma lagosta. A Astrid Fontenelle é tarada por esse anel. Eu prometi que vou deixá-lo para ela no meu testamento.

Contigo! - Seu testamento está pronto?

Hebe: Não. Eu tenho um filho só, para que testamento? Se bem que é bom, a vida às vezes prepara surpresas.

Contigo! - Você gostaria de ter netos?

Hebe: Eu tenho três tortos, netos do Lélio, meu marido (morto em 2000). Eu gostaria de ter um netinho, filho do Marcello (Camargo, 39 anos). E com o mesmo caráter do meu filho.

Contigo! - Como a maternidade chegou para você?

Hebe: Só percebi que estava grávida quando a barriga cresceu. Não tive pé inchado, enjôos, desejos. Eu não sou normal, meu organismo não é normal.

Contigo! - Como assim não é normal?

Hebe: Comigo tudo é diferente. As pessoas misturam bebidas e, no dia seguinte, não conseguem levantar, com dores de cabeça, náuseas. Eu não. Misturo vodca com vinho com champanhe e levanto inteira. Só entrei em hospital para ter o meu filho, na Maternidade São Paulo, e quando fiz lipoaspiração e plástica. Os apelidos que me dão são engraçadíssimos. Uma amiga me chamava de “puta tourão”. Nair Belo (atriz) me chama de “velhinha filha da p” (gargalhadas). As pessoas não se conformam com a minha estrutura orgânica. Eu deveria ser estudada pela ciência.

Contigo! - O que seu médico diz?

Hebe: Eu não tenho médico. 92

Contigo! - Não sofre nem de pressão alta?

Hebe: Pressão alta? Não sei nem o que é isso. Vou ao médico quando estou mais gordinha e com dificuldade para perder peso. Faço uns exames, mas é tudo normal. Tenho o meu cirurgião plástico. Se bem que não sou chegada a muitas plásticas. Prefiro deixar até estar realmente precisando. Também não escondo. Quando faço plástica, eu conto.

Contigo! - Como você avalia o ponto de fazer plástica?

Hebe: Olho no espelho e vejo a cara mais flácida, o queixo caído. Com tantos recursos, por que não ficar melhor? Na primeira cirurgia que fiz em 1974, diminuí os seios. Eram enormes e eu não os achava bonitos, não era feliz. Depois que operei, não usei mais sutiã. Ganho muitas lingeries lindas, mas não me sinto bem de sutiã.

Contigo! - Nem para um momento de sedução?

Hebe: Não, eu seduzo com o peito mesmo (gargalhadas).

Contigo! - Na fase áurea do rádio, você era a mais gostosa do pedaço?

Hebe: Não, nunca tive essa pretensão. Ninguém acredita, mas eu não sou vaidosa. Me visto assim e uso jóias para o meu público. A Hebe normal, em casa, é supersimples. A sofisticação é para o palco.

Contigo! - Você nasceu morena, mas é loira desde os anos 50.

Hebe: Pensam que eu sou loira de fato. Em 1952, fui para os Estados Unidos, vi aquela mulherada de cabelo claro e achei lindo. Aí comecei a passar, eu mesma, água oxigenada. Só escureci quando me casei, em 1964 com o Décio (Capuano), porque larguei a carreira artística. Achei que, como dona-de-casa e mãe, aquela loirice não tinha nada a ver.

Contigo! - A loirice não é coisa para mãe de família? 93

Hebe: Não, foi um momento de estupidez. Eu escureci o cabelo, me olhava no espelho e não me sentia eu. Hoje, quando ponho peruca escura para alguma brincadeira no programa, eu não me conheço. O cabelo escuro não combina comigo. Louco, não é?

Contigo! - Hebe tem alma de loira?

Hebe: É, eu nasci loira (risos). Virar loira foi uma mudança fantástica. Eu era morena, sensualíssima, com um cabelo comprido, olhos pretos de jaboticaba que brilhavam, sobrancelha à la Malu Mader. E muito risonha, coquete. Naquele tempo se dizia coquete.

Contigo! – Que significa...

Hebe: Coquete era meio marotinha, malandrinha. Mas eu não era. Só tinha tipo de malandrinha.

Contigo! - E enlouquecia os homens?

Hebe: Os homens. Nossa Senhora! Tive homens apaixonados por mim incrivelmente. Homens importantes, políticos.

Contigo! - Quem por exemplo?

Hebe: Tipo ministro do Trabalho, vice-governador do Rio de Janeiro. Nomes, eu jamais direi. Todos já morreram, mas não devo expor em respeito às famílias.

Contigo! - Ter um affair com Hebe Camargo não é um upgrade na biografia?

Hebe: Não, naquela época eu não era importante. E não sou importante. Sou apenas uma pessoa em muita evidência. E isso, aliás, afasta os homens. Eles ficam com medo.

Contigo! - Quando sentiu que um homem fugiu, intimidado pelo seu sucesso? 94

Hebe: Fácil, várias vezes. Quando o homem chega em um lugar comigo e fica aquele assédio, com homens e mulheres vindo conversar comigo, cheios de intimidade. Isso assusta o homem que está ao meu lado. Eu brinco muito com as pessoas.

Contigo! - Você sempre foi extrovertida?

Hebe: Sempre fui gaiata. E com muita personalidade. Mas me lembro de que eu era apaixonada pelo locutor da Rádio Tupi Ribeiro Filho, que era bonitão, com uma voz linda. Três ou quatro estrelas da rádio eram loucas por ele. No dia de um programa especial, eu vesti uma roupa cor-de-rosa e sentei na primeira fileira para que ele me visse. Aí alguém me disse que, do outro lado do auditório, estava a Silvia, uma professora que ficou noiva do Ribeiro. Quando ele entrou no palco, eu vi a aliança na mão dele. Fui embora para casa, chorei a noite inteirinha e, no dia seguinte, o terei da minha cabeça e do meu coração.

Contigo! - Em uma noite curou a paixão?

Hebe: Em uma noite. Não queria perder tempo e sofrer por amor.

Contigo! - Você nunca sofreu por amor?

Hebe: Opa! Meu maior sofrimento foi por Luís Ramos. Ele era separado, tinha três filhos com a primeira mulher e, quando me conheceu, tinha uma amante e uma filha com ela. Mas ele não me contou, me enganou. Quando eu descobri, sofri demais. Eu era tão apaixonada que não consegui deixá-lo. Ficamos oito anos juntos. Um dia, descobri que ele estava namorando outra pessoa.

Contigo! - Uma terceira mulher?

Hebe: É. Aí acabou. Arrumei as coisinhas dele e o mandei embora. Ele ficou uns três meses enlouquecido atrás de mim. Procurando todas as pessoas que me conheciam. Eu falei não porque se eu voltasse ele me faria feliz um, dois meses, e depois começaria tudo de novo. Eu não perdoei. Chorei muito, senti uma falta enorme, quanta dor. 95

Contigo! - A saudade provoca dor física, não é?

Hebe: É horrível, uma dor física mesmo.

Contigo! - É verdade que você já quis se casar com Silvio Santos?

Hebe: Silvio era locutor e eu era a Estrelinha do Samba da Rádio Nacional. Quando nos cruzamos no corredor da emissora, nós éramos nada, estávamos começando, e eu brincava com ele: “Vamos juntar nossas fortunas?” Era para casar ou para namorar, né? Mas nunca namoramos. Se eu tivesse namorado o Silvio acho que eu teria conseguido fazê-lo mais feliz. Era capaz de ter dado certo, naquela época.

Contigo! - Você o achava bonitão?

Hebe: Ah! Ele é bonitão até hoje. Acho que eu iria fazê-lo ser uma pessoa alegre, daria felicidade para ele. Mas ele não percebeu (risos).

Contigo! - Silvio escreveu uma carta para você no fim de 2003?

Hebe: Não é uma carta de amor. Nesta carta, ele diz que não gostaria de me perder, para eu tirar da minha cabeça esses pensamentos horríveis de querer sair do SBT, que ele não entende o SBT sem Hebe Camargo. Uma carta maravilhosa, que pus em um porta-retrato na minha casa. E os cartões que ele me manda de aniversário são sempre assim: “Do amigo e admirador Silvio Santos”. Umas gracinhas os cartões. Ele é muito respeitoso, delicado, mostra que me admira.

Contigo! - Como Silvio Santos, você já pensou em parar de trabalhar? 96

Hebe: Só paro quando morrer. Agora devo renovar meu contrato com o SBT, que termina em dezembro. Eu recebi um convite da Record, todo mundo sabe, mas nunca usei convite para negociar contrato. Eu renovo sem fazer exigências.

Contigo! - No amor, você é mais exigente. Há quanto tempo não se apaixona?

Hebe: Há muitos anos mesmo. Atualmente não tenho ninguém. Eu saio com amigos e sempre tem alguém que me admira e vai junto, mas nada de comprometimento. Há muito tempo não tenho relação sexual com ninguém.

Contigo! - Há quanto tempo?

Hebe: Muito tempo. Sexo tem de acontecer quando você está sentido aquela emoção forte.

Contigo! - E quando os hormônios se revoltam e bate aquele desejo incontrolável?

Hebe: Banho frio (gargalhadas).

Contigo! - Resolve?

Hebe: Ah! Tem de resolver. Não vou ter sexo por sexo, pegar qualquer um. Pegar é triste. Muito triste ter de pagar para ter um homem.

Contigo! - Nenhum homem a emociona a ponto de levá-la para cama?

Hebe: Não apareceu quem me tenha dado vontade de levar para cama.

Contigo! - Como foi sua primeira experiência sexual?

Hebe: Horrível, tanto que eu não me lembro direito. Foi com o Luís, meu primeiro homem.

Contigo! - E o primeiro beijo? 97

Hebe: Desastroso. Um primo me pegou desprevenida e me deu um beijo para valer. Detestei. Não tinha nenhum sentimento de amor por ele, era um parente. Ele ficou contente com a boca cheia de batom e eu, possessa. Hoje eu adoro beijo (risos).

Contigo! - Quando descobriu que beijar era bom?

Hebe: Com meu primeiro namorado, Toninho, um pistonista da orquestrada Rádio Tupi (Hebe tinha em torno de 18 anos). Lembro que era muito bom o beijo dele. Mas nunca transamos. Naquele tempo, imagina se tinha sexo. Nada.

Contigo! - Até onde se chegava?

Hebe: Chegava ao amaço e mãozinhas andando. (risos). Vou dizer uma coisa que vai surpreender as mulheres, mas em termos de sexo sou muito mais arrojada hoje do que eu era.

Contigo! - Arrojada como?

Hebe: Não é arrojada a palavra certa. Voraz (eleva a voz, quase ruge).

Contigo! - Você sente mais desejo?

Hebe: Sinto mais desejo e sou mais impetuosa (pausa). O engraçado é que ninguém acredita nisso. Pensa que estou fazendo publicidade de uma coisa que não existe. Não é. Entre quatro paredes, sou muito audaciosa.

Contigo! - Que fantasias você tem?

Hebe: Não gosto de fantasias, quero realidade.

Contigo! - Você se toca? 98

Hebe: Não, prefiro que me toquem (risos). Não acho graça no meu corpo. Gosto de corpo de homem.

Contigo - Nunca pensou em ter uma experiência com uma mulher?

Hebe: Não. Tiveram mulheres interessadas em mim, que se insinuaram, e tenho amigas homossexuais. Eu respeito, mas não chegaria a ter relação sexual com uma mulher. Prefiro a relação com o homem, é mais emocionante.

Contigo! - Explique, então, essa sua voracidade.

Hebe: Sou uma mulher que, se tiver uma oportunidade, eu me entrego inteira.

Contigo! - Você faz sexo oral?

Hebe: Se o momento pedir, dependendo da brincadeira, vale tudo, claro.

Contigo! - Como avalia os homens da sua idade?

Hebe: Os homens da minha idade, se caem na minha mão, morrem. Não têm pique para me acompanhar. Não sou uma mulher de 75 anos na cama. Na cama, eu devo ter uns 28, 30, no auge da sexualidade.

Contigo! - Então você tem de se relacionar com homens que tenham de 30 a 40 anos...

Hebe: Não. Eu jamais faria isso. Tenho total aversão a essa idéia. Eu teria vergonha de ter um relacionamento com homem bem mais novo que eu. E não acreditaria. Não acredito que um homem possa gostar de uma mulher mais velha.

Contigo! - Você não acredita no amor de Marília Gabriela e Reynaldo Gianecchini? 99

Hebe: Estou falando de mim. Eu jamais me relacionaria com um homem de 30, 40 anos.

Contigo! - Se os homens da sua idade não agüentariam o seu pique e os mais jovens nem pensar, como resolve essa sinuca?

Hebe: Chuveiro (risos). E bem frio. As mulheres da minha idade devem achar isso anormal, mas não é. Eu realmente não tenho uma cabeça de 75 anos.

Contigo! - Qual é melhor e o pior de ver os anos passando?

Hebe: O melhor é não pensar. Eu não penso. Se você pensar, sofre. Eu faço projetos para daqui a dez anos. Quero viajar, lançar CD, fazer shows.

Contigo! - Existe o medo de ficar incapacitada para poder segurar um programa na TV?

Hebe: Eu me preocupo, mas não quero pensar nisso. Se pensar, atrai. A receita é simples: não pense negativamente. Eu falo isso sempre para as minhas amigas porque deu certo comigo a vida toda. Ocupe a cabeça com coisas boas.

Contigo! - Algum arrependimento a incomoda?

Hebe: Só me arrependo do que eu não fiz. Das pessoas maravilhosas com as quais eu tive a oportunidade de ter um relacionamento mais íntimo e me recolhi, tive receio. Me arrependo.

Contigo! - Quando você revê a sua trajetória, o que se sobressai?

Hebe: A minha alegria de viver, seja na pobreza, seja com dinheiro. Hebe é o nome da deusa da eterna juventude. É, a minha cabeça tem 30 anos. Eu não sou normal.

Contigo! - Você vai viver 500 anos? 100

Hebe: Eu tenho de ser tombada, virar patrimônio (risos). Eu não tenho nenhum medo de morrer. Vou entender Deus quando ele me tirar porque já me deu tanto na vida. Mas peço para Ele me deixar um pouco mais ainda, porque está tão bom aqui.

Entrevista publicada na Revista Contigo, em 25 de março de 2004, edição 1488 101

Considerações finais

O objetivo maior desse trabalho foi levar o leitor a uma reflexão do mito Hebe. Amada por muitos brasileiros, ela vivenciou todos os momentos de mudança da televisão. Transformou o sofá de seu programa em centros de debates trazendo temas polêmicos. Sua carreira de vitória começou como cantora até chegar na apresentação de programas televisivos. Hebe é autêntica pela sua sinceridade diante dos fatos. Não poupa ninguém quando quer falar de algo que não lhe agradou. Segundo a psicóloga Helena Angonese, a apresentadora permanece na mídia há tanto tempo por sua capacidade de persuasão junto ao público:

“ É de caráter determinado que convence e transmite segurança em suas idéias. É pela alegria, por ser espontânea, que passa uma imagem otimista e esperançosa. A Hebe tem um jeito singular de acolher as pessoas, deixando-as livres e descontraídas. Ela toca na vida de seu público, tendo uma profundidade nas palavras, idéias que levam as pessoas a refletirem e confrontarem com seus comportamentos. Isso gera credibilidade e, portanto, é capaz de segurar os telespectadores, junto ao seu programa, garantindo sua permanência na mídia”, conclui.

Há quem diga que o carisma da apresentadora é seu principal instrumento de permanência durante todo esse tempo, conforme explica a historiadora, Ivone Dias Avelino, professora doutora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo:

“ A apresentadora Hebe está ligada ao SBT (Sistema Brasileiro de Televisão), que é uma empresa que tem como uma de suas principais metas a valorização de seus apresentadores, principalmente aqueles que marcam a trajetória desse empresa., por exemplo, quando falamos em SBT, imediatamente posicionamos o apresentador Silvio Santos e como apresentadora, Hebe Camargo. Por outro lado, a própria trajetória da apresentadora está vinculada a programas de auditório, desde que começou sua carreira como cantora e teve que lidar com público e desenvolver seu carisma, portanto, o que mantém Hebe Camargo no ar é sua simpatia, pois, o atributo que se destaca na apresentadora está a frente até mesmo de sua competência intelectual”. 102

A projeção e identificação com seu público leva-nos a crer que Hebe Camargo, como uma mulher de vanguarda, está a frente do seu tempo, mostrando, por exemplo, que estar com 75 anos de idade não implica na sua condição de apresentadora, bem como na vida em si. Transmite uma imagem moderna, de uma pessoa forte. Com base nesse estudo, podemos entender que pela sensibilidade, credibilidade, autenticidade, sinceridade, é que faz Hebe uma das maiores apresentadoras do Brasil. 103

“Vou entender Deus quando ele me tirar porque já me deu tanto na vida. Mas peço para Ele me deixar um pouco mais ainda, porque está tão bom aqui”. 104

Hebe Camargo

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Endereço eletrônico com conteúdo jornalístico. Acessado em 20 de outubro de 2004 e disponível em:

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