Rem: Revista Escola de Minas ISSN: 0370-4467 [email protected] Escola de Minas Brasil

Medeiros Júnior, Edgar Batista de; Evangelista, Hanna Jordt Petrografia e geoquímica dos granulitos do Complexo Acaiaca, região Centro-Sudeste de Rem: Revista Escola de Minas, vol. 63, núm. 2, abril-junio, 2010, pp. 219-228 Escola de Minas , Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=56416596004

Como citar este artigo Número completo Sistema de Informação Científica Mais artigos Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe , Espanha e Portugal Home da revista no Redalyc Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto Edgar Batista de Medeiros Júnior e Hanna Jordt Evangelista Geociências Petrografi a e geoquímica dos granulitos do Complexo Acaiaca, região Centro-Sudeste de Minas Gerais

(Petrography and geochemistry of the Acaiaca Complex granulites, center-southeast portion of Minas Gerais)

Resumo O Complexo Acaiaca abrange uma região composta, predominantemente, por rochas de fácies granulito e essa região está localizada próximo à cidade de Acaiaca, Minas Gerais. O Complexo se estende por, no mínimo, 36 km na direção norte-sul e atinge cerca de 6 km de largura na porção central. Granulitos félsicos (biotita granulitos e charnockitos), granulitos máfi cos (piroxênio ± hornblenda granulitos), granulitos ultramáfi cos (olivina-piroxênio granofels) e granulitos aluminosos (granada-sillimanita ± cordierita granulitos e granada-ordierita-cianita granulitos) são litotipos encontrados nesse Complexo. Os granulitos félsicos são derivados de rochas de composição riolítica. Os máfi cos são derivados de rochas quimicamente semelhantes a basaltos de ambientes de arco de ilhas. Os granulitos aluminosos apresentam protólito sedimentar pelítico a grauvaquiano. O olivina- piroxênio granofels possui composição química semelhante a harzburgitos. As paragêneses minerais indicam metamorfi smo de fácies granulito de pressão inter- mediária para formação das mesmas. Os gnaisses de fácies anfi bolito encontrados na área do Complexo Acaiaca comumente apresentam microestruturas miloníticas e evidências de geração por retrometamorfi smo a partir dos granulitos em zonas de cisalhamento. Palavras-chave: Complexo Acaiaca, granulitos, geoquímica, metamorfi smo de Edgar Batista de Medeiros pressão intermediária. Júnior Doutorando do Programa de Pós- Abstract Graduação em Evolução Crustal e Recursos Naturais The Acaiaca Complex, located near the town of Acaiaca, Minas Gerais, is Departamento de Geologia (DEGEO) composed predominantly of granulite facies rocks. The Complex extends for at Escola de Minas/UFOP least 36 km in the N-S direction and is about 6 km wide in the central area. Felsic E-mail: [email protected] (biotite granulites and charnockites), mafi c (pyroxene ± hornblende granulites), ultramafi c (olivine-pyroxene granofels) and aluminous granulites are the main Hanna Jordt Evangelista rock types. Felsic granulites are derived from rocks of rhyolitic composition. Mafi c granulites are derived from rocks geochemically similar to island arc Professora do Departamento de Geologia (DEGEO) basalts. Aluminous granulites are derived from pelitic rocks and greywackes. Escola de Minas/UFOP. The olivine-pyroxene granofels present a chemical composition similar to E-mail: [email protected] harzburgites. The mineral assemblages of granulites indicate an intermediate- pressure granulite facies metamorphism for their formation. Metamorphic rocks of lower grade found in the area of the Acaiaca Complex commonly present

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 219 Petrografi a e geoquímica dos granulitos do Complexo Acaiaca, região Centro-Sudeste de Minas Gerais mylonitic microstructures and evidences de uma área com algumas dezenas de qual o CA, com constituição petrográfi ca of generation by retrometamorphism of quilômetros de extensão NS e de poucos diversifi cada e, predominantemente, de the granulites in shear zones. quilômetros de largura, que é ladeada fácies granulito, representa uma unidade por terrenos com gnaisses de fácies geológica particular. Keywords: Acaiaca Complex, granulites, anfi bolito (Figura 1). geochemistry, intermediate-pressure metamorphism. Embora conhecido de longa data, os estudos petrográfi cos até então de- 2. Materiais e métodos senvolvidos no Complexo Acaiaca (CA) Os estudos petrográfi cos e microes- 1. Introdução limitaram-se a sua porção central (Jordt- truturais dos litotipos do CA se basearam Evangelista, 1984 e 1985). O presente O Complexo Acaiaca (Jordt-Evan- na descrição de 213 lâminas delgadas trabalho teve como objetivo investigar gelista, 1984, 1985 e Jordt-Evangelista de amostras provenientes de 128 pontos a diversidade litológica do CA em toda & Müller, 1986a, 1986b) situa-se na distribuídos conforme é representado a sua faixa de ocorrência, enfatizando região centro-sudeste de Minas Gerais, na Figura 2. Para as análises químicas a caracterização microestrutural e da de rocha total, foram selecionadas 21 mais especifi camente nos municípios composição mineralógica e geoquími- amostras de granulitos. As análises de de Mariana, Acaiaca, e ca. Esses estudos visam a contribuir elementos-traços foram realizadas via . Está inserido na para o entendimento da constituição da Espectrofotômetro de Emissão Atômica Província Mantiqueira Setentrional (Al- Província Geotectônica Mantiqueira, meida & Hasui, 1984). As rochas desse composta, predominantemente, por com Fonte Plasma (ICP-OES), no Complexo são, predominantemente, gnaisses ortoderivados de fácies anfi bo- Laboratório de Geoquímica Ambiental granulitos, que se distribuem ao longo lito médio na região em pauta, dentro da do DEGEO-UFOP. As análises dos ele-

Figura 1 - Localização geográfi ca e mapa geológico do Complexo Acaiaca (Baltazar & Raposo 1993).

220 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 Edgar Batista de Medeiros Júnior e Hanna Jordt Evangelista mentos maiores foram realizadas via Es- aparecem na forma de diques (Figura potássico dos pegmatitos associados pectrômetro de Fluorescência de Raios 3B), e aos pegmatitos, que ora cortam aos granulitos tem baixa triclinicidade, X (FRX), no Laboratório de Preparação os granulitos e ora aparecem em contato próxima de zero, isto é, trata-se de orto- de Amostras para Geoquímica e Geocro- difuso com os mesmos (Figura 3C). O clásio, e o dos associados aos gnaisses nologia (LOPAG) do DEGEO-UFOP. estudo comparativo da triclinicidade de tem tricliniciade bem maior, o que é feldspatos potássicos dos pegmatitos característico de microclina. Portanto os

que cortam os granulitos e dos pegma- pegmatitos dos granulitos foram cristali- 3. Petrografi a titos que cortam os gnaisses de fácies zados em temperaturas maiores do que A análise da distribuição espacial anfi bolito da região (Medeiros Júnior, os dos gnaisses, logo, podem tratar-se de dos diferentes litotipos do Complexo 2009) mostra uma diferença no grau de pegmatitos gerados por anatexia durante Acaiaca é difi cultada pelo acentuado triclinicidade entre os dois: o feldspato o evento de fácies granulito. grau de intemperismo que causa a obliteração dos contatos. Na Figura 2, observam-se os diversos pontos estuda- dos em função dos litotipos encontrados e a faixa constituída, predominantemen- te, por rochas de fácies granulito. Essa área é maior do que aquela originalmente identifi cada por Jordt-Evangelista (1984) e também maior do que a área do Com- plexo no mapa de Baltazar e Raposo (1993) (Figura 1). Ela se estende por, no mínimo, 36 km na direção norte-sul e atinge cerca de 6 km de largura na porção central e torna-se, progressiva- mente, mais estreita para o norte e para o sul, ultrapassando os limites da região estudada. Os granulitos que possuem paragê- neses e composição química indicativas de protólito ígneo foram classifi cados como granulitos félsicos, máficos e ultramáficos. Os félsicos são biotita granulitos e charnockitos, os máfi cos são piroxênio ± hornblenda granulitos e os ultramáfi cos são olivina-piroxênio granofels. Granulitos de protólito se- dimentar pelítico foram denominados granulitos aluminosos. A composição modal de amostras representativas desses granulitos encontra-se na Tabela 1. Granulitos félsicos e máfi cos são, freqüentemente, bandados (Figura 3A), com alternância de bandas de espessura decimétrica a centimétrica. Na área do CA delimitada na Figura 2 também ocor- rem gnaisses de fácies anfi bolito, gabros, metagabros, anfibolitos, diabásios, quartzitos, cianita xistos, pegmatitos e metagranitos. Afl oramentos que permi- tem identifi car as relações de contato entre esses diversos tipos litológicos e Figura 2 - Mapa de distribuição dos litotipos, com delimitação da faixa composta predominante- os granulitos não foram encontrados, ex- mente por rochas de fácies granulito (Complexo Acaiaca). Nos pontos amostrais, os círculos ceto no que se refere aos diabásios, que vazios representam pontos sem lâminas delgadas e os cheios aqueles com lâminas delgadas.

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 221 Petrografi a e geoquímica dos granulitos do Complexo Acaiaca, região Centro-Sudeste de Minas Gerais Tabela 1 - Composição modal (em % volume) dos granulitos do Complexo Acaiaca.

* A: granada-sillimanita ± cordierita granulito; B: granada-cordierita-cianita granulito.

222 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 Edgar Batista de Medeiros Júnior e Hanna Jordt Evangelista

Figura 3 - Granulitos bandados encontrados na pedreira abandonada de Acaiaca (ponto 76). A: Granulito com intercalação de bandas félsicas e máfi cas verticalizadas. B: Diques de diabásio cortando os granulitos. C: Pegmatito que exibe contatos com granulito que variam de difuso a abrupto.

Os granulitos, comumente, pos- Apresentam textura inequigranular, que calação de bandas ricas em hornblenda suem uma foliação milonítica paralela varia de granoblástica a granolepidoblá- e piroxênio. Plagioclásio ocorre como ao bandamento de direção NNE-SSW e tica. Biotita é, comumente, castanho- xenoblastos de 0,05 a 0,8 mm, que mergulhos que variam de 35º para ESE avermelhada, o que sugere a presença apresentam contatos interlobados a po- até subverticalizados. Esse paralelismo de Ti na sua composição, conforme ligonizados. Hornblenda constitui grãos pode ser mais bem observado na transi- é comum nessa fácies. Inclusões de de pleocroísmo castanho-amarelado, ção de bandas máfi cas para félsicas, que zircão, apatita e monazita geram halos verde-acastanhado a verde-escuro, que, se caracterizam por uma zona interme- pleocróicos. Plagioclásio ocorre como freqüentemente, exibem zonamento de diária milonítica. Os gnaisses de fácies xenoblastos de 0,05 a 5 mm que podem cor, caracterizados por núcleo de cor anfi bolito encontrados na faixa de ocor- apresentar exsolução de antipertita. castanha e bordas em tons manchados Quartzo constitui grãos xenoblásticos rência do Complexo Acaiaca apresentam de verde e castanho- escuro (Figura 4A). de até 5 mm com forte extinção ondu- fortes evidências de milonitização, que Ortopiroxênio é xenoblástico e mede de lante e que, freqüentemente, exibem são bem mais raras em gnaisses nas áreas 0,05 a 1 mm. Clinopiroxênio aparece microestrutura do tipo núcleo-manto. subidioblástico a xenoblástico e com até adjacentes. A foliação gnáissica, que é Ortoclásio ocorre sob a forma de xeno- paralela ao bandamento, possui direção 5 mm. Quartzo é, praticamente, ausente blastos de 0,05 a 4 mm. Em amostras nas amostra ricas em hornblenda, mas preferencial semelhante ao bandamento milonitizadas, encontra-se microclina, dos granulitos, isto é, praticamente N-S perfaz até 10% naquelas pobres nesse a qual deve ter-se originado a partir do anfi bólio. Biotita tem forte pleocroísmo e com mergulho variando de até 35º para ortoclásio em virtude da deformação. de castanho-avermelhado a quase inco- leste até 65º para oeste. Granada constitui porfi roblastos de até lor. Hornblenda de pleocroísmo verde- 1 cm, que contêm inclusões de quart- claro, verde-azulado a castanho-claro zo, biotita e feldspatos. Ortopiroxênio ocorre como produto da substituição Granulitos félsicos ocorre como grãos subidioblásticos de marginal de hornblenda zonada de cor até 0,2 mm, que freqüentemente, estão, mais intensa e de piroxênio. Clinoanfi - Os granulitos félsicos são os li- em contato com hornblenda de pleocro- totipos de fácies granulito mais abun- bólio incolor da série cummingtonita- ísmo castanho-amarelado, verde-escuro, grunerita é resultado da substituição dantes na região, possivelmente por verde-acastanhado. representarem rochas mais resistentes parcial ou total de ortopiroxênio. Grana- da é, comumente, xenoblástica, mas, se ao intemperismo do que os outros granu- apresenta, parcialmente, euédrica, quan- litos. A paragênese principal é formada Granulitos máfi cos do em contato com biotita. Pode ocorrer por biotita + plagioclásio + quartzo ± como corona em torno de ilmenita ou em feldspato potássico ± granada ± orto- Os granulitos máfi cos representam o segundo grupo de granulitos mais intercrescimento simplectítico com esta. piroxênio. Apesar de parte dos litotipos abundante na região. A paragênese Ainda uma outra forma de ocorrência félsicos serem isentos de ortopiroxênio, principal é formada por ortopiroxê- é representada por coronas de granada os mesmos também pertencem à fácies nio + clinopiroxênio + plagioclásio ± envolvendo grãos de plagioclásio, que granulito por conterem plagioclásio com hornblenda. Apresentam textura ine- estão em contato com piroxênios e antipertita e ortoclásio (e não microcli- quigranular granoblástica. Entretanto hornblenda (Figura 4B). Essa microes- na) e porque, comumente, ocorrem em algumas amostras exibem bandamento trutura sugere que a granada presente bandas centimétricas a decimétricas, formado pela alternância de camadas de nos granulitos máfi cos não pertence à alternando-se com os granulitos máfi cos. plagioclásio e piroxênio ou pela inter- paragênese de fácies granulito.

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 223 Petrografi a e geoquímica dos granulitos do Complexo Acaiaca, região Centro-Sudeste de Minas Gerais Olivina-piroxênio granofels doblásticos, possuindo palhetas de bio- Geoquímica dos granulitos tita que exibem orientação preferencial. A rocha ultramáfi ca é constituída, Aqueles com sillimanita apresentam A Tabela 2 mostra os dados de essencialmente, por olivina e ortopi- textura inequigranular comumente geoquímica dos granulitos. Entre todos roxênio, não sendo descrita por Jordt- granoblástica. Cianita é subidioblástica os granulitos, os félsicos são aqueles que Evangelista (1984) e nem por Baltazar a idioblástica, em grãos de 0,1 mm a apresentam os teores mais baixos de Cr e Raposo (1993), e é encontrada em 1,5 cm, freqüentemente, envolvidos (3,1 - 63,3 ppm), Ni (3,0 - 21,1 ppm) afl oramentos dispersos numa área de por coronas de cordierita. Observa-se e V (6,6 - 57,2 ppm). Os teores de Ba aproximadamente 2 km² (Figura 2). que diversas inclusões de cianita em (64,3 - 1256,0 ppm), Zr (22,2 - 210,9 Os blocos são, composicionalmente, grão maior de cordierita se extinguem ppm) e Th (0,7 - 10,2 ppm) são, relati- todas simultaneamente, o que indica homogêneos, em termos da distribuição vamente, elevados, quando comparados serem porções diferentes de um grão da mineralogia, porém, localmente, aos dos outros granulitos. O teor de Th de cianita substituído parcialmente por apresentam talcifi cação e serpentiniza- só é mais baixo que o dos granulitos cordierita. Sillimanita ocorre sob forma aluminosos. O diagrama TAS (total ção incipiente. Na área de ocorrência, de fi brolita (Figura 4D), nas bordas de álcalis x SiO ) de Le Bas et al. (1986) foram encontrados, também, granulitos granada, feldspatos e cordierita e pode 2 (Figura 5A) mostra que os granulitos máfi cos e metadiabásios. A não obser- estar intercrescida com biotita. Nas vação de contatos desses litotipos com amostras com sillimanita, cordierita é félsicos podem ser correlacionados a a ultramáfi ca difi culta a interpretação mais rara e ocorre como grãos de 0,2 rochas ígneas de composição riolítica. O diagrama triangular AFM de Irvine & da sua origem, se ígnea ou metamórfi - a 1,5 mm (Figura 4D). As rochas que Baragar (1971) (Figura 5B) mostra que ca. Nesse trabalho, o olivina-piroxênio possuem cianita são caracterizadas por três das amostras de granulitos félsicos granofels foi classifi cado como um tipo minerais que estão, parcial ou totalmen- te, substituídos por coronas de cordierita plotam próximas do vértice A (Na O + de granulito (e não um peridotito ígneo), 2 (Figuras 4E e 4F). Plagioclásio ocorre K O), isto é, têm composição compatível já que está inserido no interior da faixa 2 em grãos xenoblásticos de 0,1 a 2 mm de com diferenciados fi nais gerados por onde predominam litotipos de fácies contatos, freqüentemente interlobados e processos de cristalização fracionada granulito. O olivina-piroxênio granofels que podem conter intercrescimento de de magmas de natureza calcioalcalina. apresenta textura granoblástica a poiqui- quartzo mirmequítico e exibir exsolução O outro litotipo é compatível com os loblástica composta por grãos de olivina de antipertita. Quartzo constitui grãos membros menos diferenciados da suíte. e ortopiroxênio, que podem chegar xenoblásticos de tamanho de 0,05 a O diagrama de saturação em alumínio a 2,7 cm. Ortopiroxênio pode estar, 2,5mm. Pode formar microestrutura do (Figura 5C) mostra que os granulitos fél- tipo núcleo-manto e/ou possuir forte parcialmente, substituído por carbonato, sicos são peraluminosos. Os granulitos extinção ondulante. Feldspato potássico talco e ortoanfi bólio. Em algumas amos- aluminosos apresentam teores elevados foi encontrado somente em amostras que tras, observam-se diversas inclusões de de Th (5,9 - 25,1 ppm), Ba (222,1 - olivina, que apresentam todas a mesma portam sillimanita. Ocorre como grãos xenoblásticos de 0,05 a 1,5 mm, pertíti- 1080,0 ppm), Zr (84,2 - 162,2 ppm) e V posição de extinção, isto é, parecem ser cos, que apresentam mirmequita em suas (59,0 - 192,8 ppm), quando comparados porções separadas de um mesmo grão, bordas e, em algumas amostras, exibem aos outros granulitos. Os teores de Co que foi parcialmente substituído por maclas em grade incipientes. Biotita, (36,4 - 70,7 ppm) são os mais baixos. Os ortopiroxênio (Figura 4C). Nas porções freqüentemente, contém inclusões de teores de Ni (41,4 - 127,2 ppm) são mais mais retrometamorfizadas, a rocha rutilo, zircão e apatita. Nas amostras baixos que os teores encontrados para os ultramáfi ca é composta, basicamente, com cianita, o pleocroísmo varia de granulitos máfi cos (58,9 - 231,2 ppm) por talco, clorita, serpentina e antofi lita. castanho a quase incolor e, nas amos- e para os olivina-piroxênio granofels tras com sillimanita, o pleocroísmo é (2159,0 - 2269,0 ppm), entretanto são castanho-avermelhado a amarelo-pálido. mais altos que os teores encontrados Granulitos aluminosos Granada ocorre como porfiroblastos para os granulitos félsicos (3,0 - 21,1 Os granulitos aluminosos possuem xenoblásticos a subidioblásticos de ppm). O diagrama de Moine (1969 in 0,1mm a 1,2 cm, que contêm inclusões mineralogia típica de rochas metamórfi - Fujimori, 1990) (Figura 5D) mostra que de quartzo, biotita, minerais opacos e, cas paraderivadas. A associação mineral os granulitos aluminosos com sillimanita mais raramente, de plagioclásio, estau- caem no campo reservado a grauvacas e principal é formada por um polimorfo rolita, cianita ou sillimanita. Mg-clorita de Al SiO (sillimanita ou cianita), aqueles com cianita, no campo reservado 2 5 é produto da substituição de cordierita. biotita, granada, plagioclásio e quartzo, Estaurolita ocorre somente nos granu- a folhelhos e rochas argilo-carbonatadas. podendo conter ortoclásio e cordierita. litos com cianita encontrados no ponto Isso confi rma a origem desses litotipos a Verifi ca-se que as amostras com silli- 129. Apresenta-se como grãos subidio- partir de rochas sedimentares de origem manita não portam cianita e aquelas blásticos a xenoblásticos de 0,05 a 0,6 detrítica. O diagrama discriminante com cianita não possuem sillimanita. mm inclusos em granada ou envolvidos de Roser e Korsch (1986) (Figura 5E) Os litotipos com cianita são granolepi- por cordierita (Figura 4F). indica que o protólito desses granulitos

224 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 Edgar Batista de Medeiros Júnior e Hanna Jordt Evangelista

Figura 4 - Fotomicrografi as de granulitos do Complexo Acaiaca. A: Granulito máfi co com Hbl mostrando zonamento de cor, núcleo castanho e borda esverdeada (LPP). B: Granulito máfi co com Opx parcialmente substituído por Cum e com Grt desenvolvida entre Opx e Pl (LPP). C: Olivina-piroxênio granofels exibindo grãos de Ol com a mesma orientação cristalográfi ca dentro de Opx (LPX). D: Granulito aluminoso mostrando Crd com Sil e Bt em suas bordas (LPP). E: Granulito aluminoso com Ky, Bt e Pl envolvidos por Crd (LPX). F: Granulito aluminoso mostrando Bt, Grt e St envolvidos por Crd (LPP). Legenda: clinopiroxênio (Cpx), ortopiroxênio (Opx), plagioclásio (Pl), hornblenda (Hbl), cummingtonita (Cum), granada (Grt), opacos (Op), olivina (Ol), sillimanita (Sil), biotita (Bt), quartzo (Qtz), cordierita (Crd), cianita (Ky) e estaurolita (St). LPP: luz polarizada plana; LPX: luz polarizada cruzada. pode ter sido gerado em um ambiente de arco de ilhas. Os 4. Metamorfi smo do Complexo granulitos máfi cos são caracterizados por teores relativamente baixos de Zr (10,9-73 ppm) e Th (até 2,1 ppm). Os teores de V Acaiaca: discussão e conclusões (193,3 - 373,0 ppm) e Cu (90,7 - 390,6 ppm) são os mais altos No Complexo Acaiaca predominam rochas geradas entre todos os granulitos estudados. O diagrama TAS (total por metamorfi smo de fácies granulito. Um evento retrome- tamórfi co posterior, possivelmente relacionado à exumação álcalis x SiO2) de Le Bas et al. (1986) (Figura 5A) mostra que os granulitos máfi cos podem ser correlacionados a basaltos e do Complexo Acaiaca, transformou parte dos granulitos em andesitos basálticos subalcalinos. O diagrama triangular AFM gnaisses de fácies anfi bolito. de Irvine e Baragar (1971) (Figura 5B) evidencia que caem no Nos granulitos félsicos, derivados de rochas de compo- campo da suíte tholeiítica. O diagrama triangular de Mullen sição riolítica e caracterizados pela paragênese plagioclásio (1983) (Figura 5F) indica um ambiente de arco de ilhas para o + quartzo + granada + biotita ± feldspato potássico ± ortopi- protólito dos granulitos máfi cos. O olivina-piroxênio granofels roxênio, o metamorfi smo de fácies granulito é marcado pela apresenta composição mineralógica semelhante a de harzbur- ocorrência de ortopiroxênio, ortoclásio e plagioclásio com gitos, porém a sua associação espacial com granulitos máfi cos antipertita. Os granulitos máfi cos, derivados de rochas de sugere que se trata de um granulito ultramáfi co. A química composição basáltica, são compostos pela paragênese ortopi- dessa rocha mostra um elevado conteúdo de MgO (em torno roxênio + clinopiroxênio + hornblenda + plagioclásio, típica de 38 %) e um conteúdo inexpressivo de CaO (0,09 - 0,12 %). de fácies granulito. Segundo De Ward (1965), que dividiu a Os teores de Ni (2159 - 2269 ppm) e Cr (3531 - 4176 ppm) fácies granulito em subfácies de baixa e alta pressão, a para- são os mais elevados entre todos os granulitos estudados, com gênese é característica de granulitos de pressão relativamente valores típicos de rochas ultramáfi cas. Os diagramas de Cr x baixa. Os granulitos máfi cos do Complexo Acaiaca podem ser caracterizados como rochas de fácies granulito de condições TiO2 (Figura 5G) e Ni x TiO2 (Figura 5H) de Hallberg (1985) indicam que essas rochas apresentam composição similar a de pressão baixa a intermediária, pois durante os estudos ge- komatiítos cumuláticos. otermobarométricos realizados por Medeiros Júnior (2009)

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 225 Petrografi a e geoquímica dos granulitos do Complexo Acaiaca, região Centro-Sudeste de Minas Gerais Tabela 2 - Dados de geoquímica dos granulitos com elementos maiores obtidos via FRX e elementos-traços obtidos via ICP-OES.

*PPC é a perda por calcinação; FeOt indica ferro total calculado como Fe2+.

226 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 Edgar Batista de Medeiros Júnior e Hanna Jordt Evangelista

Figura 5 - Diagramas para caracterização química dos granulitos. A: TAS (total álcalis x SiO2) de Le Bas et al. (1989) e com a divisão de séries alcalinas e subalcalinas segundo Irvine e Baragar (1971). B: Diagrama triangular AFM segundo Irvine e Baragar (1971). C: Diagrama que mede aluminosidade da rocha por meio dos índices de Shand (1963) e segundo os campos de Maniar & Piccoli (1989). D: Diagrama de

Moine para rochas sedimentares detríticas (1969 in Fujimori, 1990). E: Diagrama log(K2O/Na2O) versus SiO2 de Roser e Korsch (1986).

F: Diagrama triangular de Mullen (1983). G: Diagrama Cr x TiO2 de Hallberg (1985). H: Diagrama Ni x TiO2 de Hallberg (1985). Nas fi guras A, B, C e F, os campos tracejados mostram onde se concentram as amostras analisadas. nesses litotipos, foram obtidos valores Frey (1994), rochas metamórfi cas ultra- Os granulitos aluminosos apresentam de pressão em torno de 6,5 kbar. De acor- máfi cas compostas por essa paragênese mineralogia e química compatível com do com De Ward (1965), pressões mais podem ser geradas a partir de 670°C, rochas derivadas de protólito sedimentar altas são marcadas por paragêneses que independente das condições de pressão. do tipo folhelho e grauvaca. São cons- contêm granada. Embora granada apare- Verifi ca-se que a paragênese olivina + tituídos por dois litotipos principais. ça nos granulitos máfi cos do Complexo ortopiroxênio apresenta um campo de O primeiro é composto por granada + Acaiaca, há evidências microestruturais estabilidade que é compatível com as biotita + sillimanita + plagioclásio + de ser secundária, resultante do evento associações minerais encontradas nos quartzo ± feldspato potássico ± cordie- retrometamórfi co de fácies anfi bolito, outros granulitos do Complexo Acaiaca. rita e o segundo, por biotita + cianita tal como biotita, cummingtonita e A química dos granulitos ultramáfi cos + plagioclásio + quartzo + cordierita hornblenda verde-azulada. O olivina- permite correlacioná-los a harzburgitos. ± granada ± estaurolita. A associação piroxênio granofels é composto pela O evento retrometamórfi co é evidencia- mineral do primeiro litotipo mostra-se paragênese principal dada por olivina + do nessas rochas pela formação de an- texturalmente em equilíbrio e, de acor- ortopiroxênio. De acordo com Bucher e tofi lita, serpentinas, carbonatos e talco. do com Lee e Holdaway (1977), indica

REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010 227 Petrografi a e geoquímica dos granulitos do Complexo Acaiaca, região Centro-Sudeste de Minas Gerais recristalização sob condições do início 6. Referências JORDT-EVANGELISTA, H., MULLER, da fácies granulito, sob temperaturas bibliográfi cas G. Petrologia da Zona de Transição que variam de 690º a 710ºC, condições entre o Cráton do São Francisco ALMEIDA, F. F. M., HASUI, Y. O pré- de pressão entre 4 e 5,7 kbar e XH O de e o Cinturão Móvel Costeiro na 2 cambriano do Brazil. São Paulo: 0,2 a 0,5. White et al. (2007) evidencia, Edgard Blücher,1984. 378p. Região Sudeste do Quadrilátero que essa paragênese pode indicar tempe- BALTAZAR, O. F., RAPOSO, F. Ferrífero, MG. In: CONGRESSO raturas mais altas e condições de pressão O. Programa levantamentos BRASILEIRO DE GEOLOGIA, 34. de até 8 kbar. Estudos geotermobaro- geológicos básicos do Brasil. Folha Anais... Goiânia, 1986b. p.1471-1479. métricos, desenvolvidos por Medeiros Mariana (SF.23-X-B-I). Estado de LE BAS, M. J. et al. A chemical Júnior (2009), corroboram isso, pois Minas Gerais. Escala: 1:100.000. Rio classifi cation of volcanic rocks based foram obtidas temperaturas entre 715ºC de Janeiro: CPRM, 1993. p.17-93. on the total alkali-silica diagram. e 732ºC e pressões entre 6,4 e 8,4 kbar BUCHER, K., FREY, M. Petrogenesis Journal of Petrology, v. 27, n. 3, p. para essas rochas. O segundo litotipo of metamorphic rocks. (6. ed.) 745-750, 1986. apresenta microestruturas não equilibra- Berlim: Springer, 1994. 318p. LEE, S. M., HOLDAWAY, M. S. DE WARD, D. A proposed subdivision das como simplectitas e coronas. Nesse, Significance of Fe-Mg cordierite of the granulite facies. American os minerais podem ser agrupados em stability relations on temperature, Journal of Science, v. 263, n. 4, p. pressure and water pressure in duas paragêneses distintas: estaurolita + 55-461, 1965. cordierite granulites. Geophysical cianita + plagioclásio + biotita + quartzo FUJIMORI, S. Composição química de Monograph, v. 20, p. 79-94, 1977. (mais antiga, de fácies anfi bolito de mé- rochas e suas aplicações. Salvador: dia a alta pressão) e cordierita + granada Centro Editorial e Didático da MANIAR, P. D., PICCOLI, P. M. + sillimanita + plagioclásio + biotita + UFBA, 1990. 306p. Tectonic discrimination of granitoids. quartzo (mais nova, de fácies granulito HALLBERG, J. A. Geology and Geological Society of America de baixa a média pressão). mineral deposits of the Leonora- Bulletin, v. 101, p. 635-643, 1989. Laverton area, Northeastern MEDEIROS JÚNIOR, E. B. Petrogênese A partir da análise das associações Yilgarn Block, Western Australia. do Complexo Acaiaca, MG. Ouro minerais que constituem os granulitos do Western Australia: Hesperian Press, Preto: Universidade Federal de Ouro Complexo Acaiaca, pode-se afi rmar que 1985. 140p. Preto, 2009. 101p. (Dissertação de essas rochas foram geradas em fácies IRVINE, T. N., BARAGAR, W.R.A. A Mestrado). granulito sob condições de pressão inter- guide to the chemical classifi cation MULLEN, E. D. MnO/TiO2/P2O5: a mediária. A ocorrência de zonas de cisa- of the common volcanic rocks. minor element discriminant for lhamento, granulitos milonitizados e/ou Canadian Journal of Earth basaltic rocks of oceanic enviroments com bandamento verticalizado sugerem Sciences, v. 8, p. 523-548, 1971. and its implications for petrogenesis. JORDT-EVANGELISTA, H. que, através de falhas de empurrão com Earth and Planetary Science Petrologische untersuchungen direção NS e vergência para oeste, Letters, v. 62, p. 53-62, 1983. im Gebiete zwischen Mariana foi possível a ascensão do Complexo und , Minas Gerais, ROSER, B. P., KORSCH, R. J. Acaiaca de níveis crustais profundos Brasilien. Alemanha: Universidade Determination of tectonic setting até níveis mais rasos constituídos pelos Técnica de Clausthal, 1984. 183p. of sandstone-mudstone suites using terrenos gnáissicos, conforme sugerido (Tese de doutorado). SiO2 content and K2O/Na2O ratio. por Jordt-Evangelista & Müller (1986a). JORDT-EVANGELISTA, H. Journal of Geology, v. 94, p. 635- Durante este processo parte das rochas Petrologia de fases, geotermometria 650, 1986. foi gnaissifi cada e, no caso de acesso de e geobarometria do Complexo SHAND, S. J. Rocks of the Mid-Atlantic fl uidos aquosos, houve transformações Granulítico de Acaiaca, Sudeste Ridge. Journal of Geology, v. 57, retrometamórfi cas. do Quadrilátero Ferrífero, MG. In: p. 89-92, 1949. SIMPÓSIO DE GEOLOGIA DE WHITE, R. W., POWELL, R., MINAS GERAIS, 3. Anais... Belo HOLLAND, T. J. B. Progress 5. Agradecimentos Horizonte: SBG, 1985. p. 165-178. relating to calculation of partial JORDT-EVANGELISTA, H., MULLER, melting equilibria for metapelites. Nosso agradecimento à CAPES G. Petrology of a transition zone Journal of Metamorphic Geology, (Coordenação de Aperfeiçoamento de between the Archean Craton and v. 25, p.511-527, 2007. Pessoal de Nível Superior) pela bolsa de the Coast Belt, SE of the Iron mestrado ao primeiro autor e ao revisor Quadrangle, Brazil. Chemie der Artigo recebido em 25/03/2009 e aprovado em 18/11/2009. do artigo pelas sugestões. Erde, v. 45, p. 129-145, 1986a.

228 REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(2): 219-228, abr. jun. 2010