XI CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA

1 a 5 de Setembro de 2003 UNICAMP – Campinas, SP

GT 23: Sociologia do Lazer e do Esporte

FUTEBOL PROFISSIONAL MINEIRO: UM RETRATO DA REALIDADE

Ronaldo Martins de Assis1 Prof. José Jairo Vieira2 Clara Letícia da Silva3 Rafael Júnio Andrade4 Lucilene Alencar das Dores5

1 Graduando da UFViçosa, bolsista PIBIC/CNPq, orientador José Jairo Vieira. 2 Doutor em Sociologia IUPERJ, Professor Adjunto da UFViçosa. 3 Graduanda da UFViçosa, bolsista PIBIC/CNPq, orientador José Jairo Vieira. 4 Graduando da UFViçosa, bolsista PIBIC/CNPq, orientador José Jairo Vieira 5 Graduanda da UFViçosa, bolsista PIBIC/FAPEMIG, orientador José Jairo Vieira. XI CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA

FUTEBOL PROFISSIONAL MINEIRO: UM RETRATO DA REALIDADE

Ronaldo Martins de Assis6 Prof. José Jairo Vieira7 Clara Letícia da Silva8 Rafael Júnio Andrade9 Lucilene Alencar das Dores10

1 – INTRODUÇÃO

Para a sociedade, o futebol brasileiro é de grande importância e exerce um fascínio, pois as pessoas saem de suas rotinas diárias para ver seu time, ou a seleção nacional, jogar. A importância do futebol no Brasil também é percebida pela quantidade e tamanho dos estádios brasileiros (LEVER, 1983). As personalidades se tornam mais conhecidas que políticos e artistas de cinema, e pessoas fora do Brasil, mau sabem onde fica o Brasil, mas conhecem sobre Pelé (LEVER, 1983). “A escolha do clube do coração é realizada desde muito cedo, ocasião a partir da qual o indivíduo torna-se pessoa, passando a fazer parte de um mundo mais amplo que a casa e a família, o que lhe permite se definir e exercitar como parte de uma fatalidade, vivida na rua, em pleno domínio público” (DA MATTA, 1994).

O futebol e a mídia possuem uma íntima reciprocidade. Em sua relação com o esporte, a mídia disponibiliza ao indivíduo um conhecimento sobre o esporte que possibilitará o seu enriquecimento tanto para apreciar, quanto para entender o mundo esportivo (BETTI, 1999). A mídia possui uma forma específica de se mostrar. Discurso midiático é a expressão em forma de imagem, som e símbolos, característicos da linguagem dos meios de comunicação de massa (PIRES, 2002). O sensacionalismo e o espetáculo são buscados pela televisão, que „dramatiza‟, colocando uma cena e exagerando seus aspectos de importância e gravidade (BOURDIEU, 1997). Os atletas são figuras representativas nos meios de comunicação. Conforme Helal (2001) as „estrelas‟ são importantes para o público se identificar com um determinado evento. O esporte faz parte da experiência pessoal da maioria das pessoas, pois os espectadores já

6 Graduando da UFViçosa, bolsista PIBIC/CNPq, orientador José Jairo Vieira. 7 Doutor em Sociologia IUPERJ, Professor Adjunto da UFViçosa. 8 Graduanda da UFViçosa, bolsista PIBIC/CNPq, orientador José Jairo Vieira. 9 Graduando da UFViçosa, bolsista PIBIC/CNPq, orientador José Jairo Vieira 10 Graduanda da UFViçosa, bolsista PIBIC/FAPEMIG, orientador José Jairo Vieira.

2 praticaram, conhecem as regras, as habilidades específicas e admiram a vontade de superação, a força física, a habilidade e a coragem transformam os atletas profissionais em símbolos sexuais masculinos da sociedade (LEVER, 1983). Este trabalho tem por objetivo analisar o processo de profissionalização do futebol no estado de . Para tanto, Primeiro realizamos uma análise do surgimento e da trajetória de crescimento e expansão do futebol neste estado e a comparamos com a de outros estados. Segundo procuramos levantar a especificidade do futebol praticado neste estado Em terceiro, analisamos o perfil dos jogadores de dois clubes mineiros.

2- O FUTEBOL DESEMBARCANDO NO BRASIL

O futebol desembarcou no Brasil, em 1894, através de Charles Miller, brasileiro do bairro do Brás, filho de um britânico que trabalhava em São Paulo. Mas há indícios que havia prática do futebol em terras brasileiras antes dessa data, através dos colégios jesuítas. Por volta de 1880, no colégio de São Luis, na cidade de Itu, no estado de São Paulo, e no colégio Anchieta, no , a prática do futebol já existia, lembrando que os exercícios físicos foram valorizados pelos colégios religiosos. Outra possibilidade possível foi através de funcionários ingleses que trabalhavam em companhias de seu país de origem, como a São Paulo Railway e Leopoldina Railway (Rio de Janeiro), ambas do setor ferroviário e também através de marinheiros britânicos em cidades portuárias, especialmente Rio de Janeiro.

Porém, a prática mais organizada, com bola oficial, uniforme e livro de regras só se daria com a chegada de Charles Miller. Portanto, foi ele quem deu o grande impulso para sua organização. Miller se envolveu com o futebol quando foi estudar em Southampton, na Inglaterra, aonde chegou a defender alguns clubes. 1895, Charles Miller promoveu as primeiras partidas disputadas formalmente no país e logo o futebol se popularizou por suas condições simples de prática. O futebol é visto como algol global, devido à sua forma de prática e as regras serem as mesmas em todo o mundo. Estabelece-se assim,uma forma de comunicação, uma linguagem mundial (VIEIRA, 2001-p. 58). No Rio de Janeiro, em 1901, o principal mentor do futebol foi Oscar Cox, brasileiro filho de uma família inglesa que havia estudado na Suíça. Cox introduziu a modalidade no Paissandu Cricket Clube e foi um dos responsáveis pela fundação do Fluminense Foot-Ball Club.

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3- O FUTEBOL CHEGA NAS ALTEROSAS Dez anos após a sua chegada no Brasil, o futebol chega em Minas Geras. Com apenas sete anos de existência já sentia o futebol. O estudante de direito, o carioca Victor Serpa, foi quem levou e apresentou para os belorizontinos. Antes do futebol, só o ciclismo era uma modalidade esportiva organizada e disputada. Anida em 1904, Serpa, com alguns colegas de direito fundou o Sport Club Foot-ball e em 3 de outubro desse mesmo ano foi realizado o primeiro jogo. Devido a sua grande popularidade e ao seu número de adeptos, o Sport foi desmembrado em duas novas equipes: o Vespúcio e o Colombo, que com o Plínio Foot-ball Club e outros clubes foi criados a e o primeiro campeonato na cidade. Devido ao início do período de férias escolares, o campeonato foi interrompido e nunca mais concluído. Muitos estudantes foram passar férias com os seus familiares e Victor Serpa fez o mesmo, foi para o Rio de Janeiro e não mais retornou a Belo Horizonte, pois faleceu em 1905. Esse acontecimento não foi forte o bastante para desanimar os belorizontinos, pois o interesse continuou crescendo e foram fundados outros clubes. Em julho de 1906, a prefeitura, com a presença de todos os membros do governo, inaugurou o Prado Mineiro, destinado às corridas de cavalo. Nele havia uma pista, arquibancadas e demais dependências para o público. Um gramado era contornado pela pista e logo foi transformado no primeiro campo oficial de Belo Horizonte. No dia 25 de março de 1908, em uma reunião no Parque Municipal (centro de BH), um grupo de estudantes fundou o Atlético Mineiro Futebol Clube. Após fundarem o clube, a maior preocupação daqueles jovens era comprar uma bola de couro, pois jogavam com bolas de meias. Mário Neves um dos integrantes, comerciava besouros com um amigo na França, com isso os garotos aproveitaram a ocasião e trocou o dinheiro da venda dos bichos por uma bola de couro, a primeira de Minas Gerais. Margival Mendens Leal foi o seu primeiro presidente e em 21 de março de 1909 foi o primeiro jogo (vitória de 3x0 sobre o Sport). Em 25 de março de 1913 os diretores resolveram mudar o nome para Clube Atlético Mineiro. Dois anos depois, o Atlético venceu o primeiro campeonato oficial de clubes de Belo Horizonte, que envolvia o América e o Yale. No ano de 1926 o Atlético construiu em um terreno doado pelo governo, o seu estádio em área nobre da cidade. Chamava-se oficialmente Presidente Antonio Carlos, mas era conhecido com estádio de Lurdes, nome do bairro onde se sitiava. O seu primeiro jogo foi uma vitória do Atlético sobre o Corinthians (4x2), no dia 30 de maio de 1929. na década de 70 o estádio foi desapropriado pela prefeitura sendo utilizado

4 para lazer. Em 1992 o terreno voltou para o clube e 4 anos depois foi construído um dos principais shoppings da cidade. Também fundado por um grupo de garotos, o América Futebol Clube surgiu em 30 de abril de 1912, como uma forma mais organizada para a prática da brincadeira. O nome do clube foi decidido por sorteio e o primeiro presidente foi Afonso Silviano Brandão. Em protesto contra o profissionalismo a com de seu uniforme foi trocada pelo vermelho ate 1971, quando a cor verde volta a imperar na toca do coelho. Seu principal triunfo é o deca conquistado entre 1916 e 1925. Em 1918 surge o Scratch Italiano, um selecionado de jogadores de diversos clubes, de origem italiana, com intuito de participar de amistosos. Essa idéia foi conseqüência da criação do Palestra Itália em São Paulo, hoje Palmeiras. No ano de 1920 uma crise abalou o Yale clube com muitos jogadores de origem italiana, qur fez com que alguns atletas saíssem e planejassem uma nova equipe que integrasse os ítalo-brasileiros. Em 2 de janeiro de 1921 foi criada a Societá Sportiva Palestra Itália, que usava as cores da bandeira italiana. O seu primeiro jogo aconteceu no dia 3 de abril do mesmo ano contra um combinado da cidade de . Dois anos depois de sua fundação foi construído seu estádio, com capacidade para 5 mil torcedores, em um terreno adquirido junto a prefeitura. O jogo inaugural foi em 20 de setembro, um empate de 3 a 3 contra o flamengo. Com a segunda guerra mundial na década de 40 o governo forçou a mudança do nome do clube. Primeiro foi Palestra Mineiro, depois Ipiranga e finalmente Cruzeiro, e com isso a mudança das cores para azul e branco. Em 1945 o estádio foi reformado, passando para 10 mil de capacidade de público, o estádio Juscelino Kubistcheck.

4 - O PROCESSO DE PROFISSIONALIZAÇÃO DO FUTEBOL MINEIRO

Na primeira década do século, o futebol geral começou a se organizar melhor, com competições amadoras promovidas por uma associação constituída pelos clubes. O futebol foi se popularizando e a criação de ligas foi conseqüência, principalmente para a preservação do caráter elitista dos clubes, que chegavam a importar uniformes da Europa.Mas esse processo de construção de associações já era algo que acontecia no século retrasado, no exterior, como também a organização de torneios, referência moderna para competições, tornando-se quase obrigatório. Mas o importante a se considerar é que o futebol, progressivamente, foi sendo praticado pelas classes populares, como os operários, deixando-se de restringir aos clubes e colégios de elite (PRONI, 2000-p. 103).

5 Em 1904, surge o primeiro campeonato e a primeira liga de futebol em Minas Gerais, formada pelos poucos clubes que existiam. Em 1915, surge então, uma liga mais forte, a Liga Mineira de Sports Athleticos (L.M.S.A.), responsável por organizar os campeonatos da cidade de Belo Horizonte. Teve como fundador e primeiro presidente o Dr. Célio Carrão de Castro. Já em 1919, a L.M.S.A. foi extinta e surgiu uma nova, não restrita a Belo Horizonte, mas com participação de clubes de todo o estado, a Liga Mineira de Desportos Terrestres (L.M.D.T.), com 14 clubes. Havia também em uma Sub-Liga local com 7 clubes.

Algo a se considerar é que o futebol, progressivamente, foi sendo praticado pelas classes populares, como os operários, deixando-se de restringir aos clubes e colégios de elite (PRONI, 2000-p. 103). Em um âmbito geral, com o passar do tempo, os clubes de elite acabaram permitindo a participação de equipes mais modestas em suas ligas, mas o controle político ainda estava nas mãos dos clubes de elite. Com a conquista do primeiro título sul-americano pelo Brasil, em 1919, os estádios cariocas e paulistas ficaram lotados e as pessoas compravam seus ingressos para torcer por seus novos ídolos. Para obter uma boa renda, as equipes necessitavam de montar equipes competitivas, e com isso, contar com jogadores das classes mais desfavorecidas. PRONI destaca os fatores para a crise do modelo amador:

“(...) a) a transformação do futebol em espetáculo popular, concomitante com a progressiva inclusão de atletas pobres nos times, que cria uma brecha para o profissionalismo; b) o ambiente ideológico favorável a uma renovação da sociedade, que demanda direitos civis e sociais, e vai tornando o elitismo uma prática anacrônica; e c) a crise econômica e a transição política que marcaram o final dos anos vinte e o início dos trinta, dificultando a sustentação financeira e a manutenção do amadorismo. Considerando esse contexto, o modelo amador estava com os dias contados e a adoção do regime profissional era uma questão de tempo.” (PRONI, 2000, p: 111/112).

A partir de 1930, o mundo se curvava ao profissionalismo, devido ao público crescente, o futebol como uma forma de sobrevivência e o êxodo de jogadores para outras nações, como Itália, Argentina e Uruguai. VIEIRA complementa: O negro e o pardo também fazem parte do processo de profissionalização do futebol brasileiro (VIEIRA, 2001, p. 54). O aparecimento do profissionalismo acarretou o desaparecimento de times, tidos como pequenos, que disputavam com os grandes o campeonato oficial, não podendo pagar aos seus jogadores, com isso, perdendo-os para equipes maiores.

6 Em 1932 (em Minas Gerais) devido as divergências que estavam acontecendo entre os clubes e principalmente da necessidade das equipes mineiras participarem de certames nacionais e internacionais, pois nos outros estados o profissionalismo já havia se instituído, e por um pedido do Clube Atlético Mineiro, foi criada uma federação, nos moldes da Associação Fluminense de Esportes Athleticos e presidida pelo Dr. Jarbas Vidal Gomes (de 2 de março de 1993 a 27 de fevereiro de 1935). Com este movimento, o futebol mineiro deixa de ser amador e passa finalmente a profissional. Em 25 de outubro de 1933, a Associação Mineira de Esportes fundiu a Federação das Associações Mineiras de Atletismo. Em 11 de agosto de 1937 passou a denominar-se Federação das Associações Mineiras de Atletismo e Futebol. A partir de 1939 foi decidido que a entidade receberia o nome de Federação Mineira de Futebol (F.M.F.). No aspecto do êxodo dos jogadores, o futebol mineiro também participou. Os primeiros jogadores brasileiros contratados por uma equipe italiana foram Nininho e Ninão. Que saíram do Palestra Itália para a Lazio de Roma em abril de 1931. Um ano depois, mais um da família Fantoni segue o rumo para o “país da bota”. , então com vinte anos de idade. Em relação ao público, com o crescente número de pessoas assistindo os jogos, os clubes saíram dos campinhos e começaram a construir seus estádios, como já foi mencionado. O estádio do Atlético foi inaugurado em 1929 e o do Cruzeiro em 1923, sendo ampliado em 1945. Para a Copa do Mundo no Brasil, em 1950, foi construído o Independência, projetado para um público de 45 mil pessoas e seu primeiro jogo foi mundial, vitória da Iugoslávia sobre a Suíça por 3 a 0. O estádio Governador Magalhães Pinto, o Mineirão, só foi inaugurado em 1965, com o jogo entre a Seleção Mineira e o River Plate da Argentina.

5 – OS JOGADORES E O FUTEBOL PROFISSIONAL DE MINAS GERAIS

Esta pesquisa contou com o trabalho de campo e entrevistas realizadas junto aos jogadores de dois clubes: o Tupi Foot Ball Club e América Futebol Clube. Além de coleta de dados junto a Federação Mineira de Futebol. A seguir estaremos expondo e descrevendo as principais informações obtidas neste trabalho de campo. A figura distribuição espacial dos clubes do estado.

7 Ilustração 1 Distribuição Geográfica dos Clubes Profissionais Mineiros

Nota-se a partir da ilustração 1 que a distribuição geográfica dos clubes ocorre de forma bem dispersa, guardando dois pontos de concentração situados região metropolitana de Belo Horizonte (capital estadual) e região Sul de Minas Gerais. Uma característica dessas duas regiões é que são pólos industriais importantes do estado. A região Sul de Minas Gerais é limítrofe ao estado de São Paulo, um dos principais pólos industriais do país. Essa proximidade de São Paulo também nos mostra um outro destaque, São Paulo é um dos principais centros do futebol nacional. Isso demonstra a influência que Minas Gerais sofre desse estado. Dessa afirmação, observou-se que na região próxima ao estado do Rio de Janeiro, região da Zona da Mata Mineira, não acontece a mesma influência percebida em relação a São Paulo, pois só existe um clube (Tupi Foot Ball Club, de Juiz de Fora), mesmo o Rio de Janeiro sendo um importantíssimo pólo industrial e futebolístico. Apesar desses dois pontos de maior concentração, os clubes se encontram espalhados por todo o estado. Bem diferente do que acontece no Rio de Janeiro, onde a grande maioria se encontra na capital (VIEIRA, 2001). Isto talvez explique a dificuldade de existência de muitos times “grandes” neste estado como ocorre com Rio e São Paulo. Abaixo estão os descritos os dados obtidos nos dois clubes pesquisados.

5.1 - TUPI FOOT BALL CLUB

O Tupi é um clube situado na cidade de Juiz de Fora e conta com 18 jogadores:. a) Origem dos Jogadores: Observa-se uma significativa maioria de jogadores nascidos no estado de Minas Gerais (78%), o mesmo estado do clube. Em relação às cidades de origem

8 dos jogadores mineiros, verificou-se que mais de um terço (36%) é da própria cidade do clube, tendo uma concentração de jogadores juizforanos. Os outros jogadores se distribuem igualmente por outras nove cidades. Nota-se, então, que um clube, que não faz parte do grupo de elite dos clubes no Brasil e sendo do interior, possui jogadores da própria cidade, talvez vindos das categorias de base do próprio clube, muito comum no futebol brasileiro. b) Cor/Raça: Quando a cor/raça foi atribuída pelos próprio jogadores, verificou-se que metade dos jogadores (50%) se atribuiu a cor/raça „mulato/pardo/mestiço‟ e 17% se atribuiu a cor/raça „negro/preto‟. Já quando atribuído pelo entrevistador, observou-se um equilíbrio entre as respostas „branco‟, „negro/preto‟ e „mulato/pardo/mestiço‟ (39%, 33% e 28% respectivamente). Primeiro, um jogador, ao ler as opções de resposta, disse: eles falam que eu sou moreno! c) Grau de Escolaridade dos Jogadores: Em relação ao grau de escolaridade dos jogadores, há um índice maior de jogadores com a 5ª a 7ª série e 2º grau completo (28% cada). A menor incidência é de universitários, 5%. Esse jogador trancou a matrícula na faculdade de engenharia civil. Um dos jogadores entrevistados foi revelado por um grande clube de Belo Horizonte e chegou a ser convocado para a Seleção Brasileira pelo técnico e o que nos chamou a atenção foi que ele só havia estudado até a 5ª série. Vieira (2001) demonstra que no Rio de Janeiro a maioria dos jogadores tem o primeiro grau completo (40.9%). Nenhum jogador entrevistado se disse analfabeto e ter nível superior completo. Dos jogadores que responderam ao questionário, somente um disse que voltaria a estudar este ano, começaria o 2º grau (a entrevista foi realizada em janeiro e as aulas ainda não haviam começado). d) O Início: Boa parte dos jogadores (61%) teve o futebol como primeiro trabalho ou ocupação. Desses que começaram com o futebol, metade (50%) começou com 13 à 15 anos de idade e a maioria (67%) recebia no máximo um salário mínimo, a chamada ajuda de custo, um salário simbólico. Dos que tiveram uma outra ocupação antes do futebol, a maioria (83%) também começou com 13 à 15 anos de idade na devida ocupação e 83% também recebia um salário mínimo. A metade desses (50,2%) começou no futebol com 17 à 19 anos de idade, recebendo até um salário mínimo, também como ajuda de custo.

9 Antes de entrarem no futebol, exerciam as seguintes ocupações: servente de pedreiro (3), office boy, doceiro e trabalhador em olaria (1 cada). e) Profissionalização: As idades de profissionalização dos jogadores ficaram na faixa entre 17 e 22 anos, com a maior incidência de 20 anos, 28% e a menor incidência de 22 anos, 5%. f) Salários: Verificou-se que metade dos jogadores (50%) do Tupi Foot Ball Club ganhou até um salário mínimo em seu primeiro salário como profissional. O salário máximo respondido foi entre 2 e 3 salários mínimos, 401 a 600 reais (dois jogadores). Comparando com o salário de quando começaram a trabalhar, futebol ou não, observamos que com a profissionalização, não há grandes mudanças no salário, em relação ao amadorismo. Em relação ao salário atual, 33% dos jogadores recebem de 8 à 15 salários mínimos, 1.601 à 3.000 reais, seguido de perto, 28%, recebendo de 2 à 3 salários mínimos, 401à 600 reais. Isso mostra que o clube possui dois grupos distintos, os que recebem o maior salário (seis jogadores) e os que recebem o menor salário (cinco jogadores). Os outros sete jogadores se dividem entre as outras opções de salários. Percebe-se que há uma tendência de o salário aumentar conforme a experiência que o jogador vai adquirindo. Os dois jogadores mais novos (nascidos em 1982 e 1983), estão no grupo de menor salário e os dois jogadores mais velhos (nascidos em 1971 e 1972), estão no grupo de maior salário. Dois jogadores questionaram o porquê dessa pergunta sobre salário. Um deles, ao final, perguntou se essa entrevista não ia ser divulgada, temendo que seus dados fossem expostos. Um outro jogador, em uma conversa após a entrevista, confessou que alguns jogadores recebem propostas de clubes menores do Rio de Janeiro, porém ninguém quer jogar nesses clubes, pois não sabem se vão receber os seus salários. g) Ocupação do Pai: Foi perguntado qual era a profissão dos pais dos jogadores, quando esses se tornaram profissionais. Houve diversas respostas, as mais freqüentes foram: aposentado (3), comerciante, mecânico, motorista, pedreiro e funcionário público (2 cada). Só um tinha uma relação com o futebol, era árbitro amador. Em relação ao rendimento atual do pai, mais de dois terços (72,5%) não sabiam afirmar. h) Outra Ocupação: Foi perguntado se o jogador exercia outra ocupação/profissão, além do futebol. Todos responderam negativamente.

10 i) Após o Encerramento da Carreira: Quando questionados sobre o que pretendiam profissionalmente após encerrada a carreira no futebol, um pouco mais da metade (56%) respondeu que continuariam no futebol. Desses que continuariam pensando no futebol como ocupação, 10% pensam atuar como técnico, 30% pensam em abrir escolinhas de futebol, 20% responderam que gostariam de trabalhar tanto como técnico, quanto abrindo escolinhas e 40%, a maior parte, pensa em exercer outras funções. Dos que deram outras respostas, não sendo as opções do futebol, nenhum quer trabalhar em uma área que já é qualificado, provavelmente por não trem uma qualificação, ou, também, em uma área que terão que complementar os estudos. Das outras respostas, 75% respondeu que não sabiam o que iriam fazer depois da carreira futebolística, um disse que poderia ser no futebol, outro disse que não quer saber mais do futebol no futuro. Houve também uma resposta para motorista, que foi a profissão de seu pai, e comerciante.

5.2 - AMÉRICA FUTEBOL CLUBE a) Origem dos Jogadores: Em relação à cidade de nascimento dos jogadores do América Futebol Clube, verifica-se que grande parte deles (72,2%) nasceu no próprio estado de Minas Gerais, sendo que 31% naceu em Belo Horizonte, uma pequena concentração. Os outros jogadores se distribuem por diversas cidades. b) Cor/Raça: Quando perguntados sobre cor/raça atribuídos por eles mesmos, 56% se disseram brancos e os outros se dividiram igualmente (22% cada) para negro/preto e mulato/pardo/mestiço. Quando atribuído pelo entrevistador, manteve-se a hegemonia do brancos, porém o índice aumentou para 61%. Negro/preto abaixou para 11% e mulato/pardo/mestiço aumentou para 28%. Um jogador ao ler as opções para resposta, perguntava ao assessor de imprensa que cor ele seria, merecendo uma explicação sobre a cor amarela, advinda do povo oriental. c) Grau de Escolaridade dos Jogadores: Em relação ao grau de escolaridade dos jogadores, a maior índicde foi de 2º grau completo e universitário incompleto (28% cada) e o menor índice foi de 5ª a 7ª série (5%). Observa-se que há na verdade, um equilíbio entre todas respostas: 8ª série (17%) e grau incompleto (22%).

11 Nenhum jogador afirmou ser analfabeto e não Ter universitário completo. Dos que tinham universitrário incompleto (5), 3 eram de Educação Física, 1 de Administração e 1 de Administração em Esportes e Promoção de Eventos. Somente 17% está estudando, todos na universidade. d) O Início: Observou-se que quase todos os jogadores do América (83%) tiveram o futebol como seu primeiro trabalho/ocupação. Desses que iniciaram como o futebol, 67% tinha entre 13 e 15 anos de idade e 80% recebia até 1 salário mínimo, a chamada ajuda de custo. Dos que tiveram uma outra ocupação antes do futebol, 67% iniciou-se em uma ocupação com 12 ou 12 anos e todos recebiam até 1 salário mínimo. Quando esses entraram no futebol, 67% iniciou com 15 ou 16 anos e 67% também ganhava até 1 salário mínimo. e) Profissionalização: Em relação a idade que os jogadores tinham quando se tornaram profissionais, ficou na faixa entre 17 e 21 anos de idade. A maior incidência foi de 20 anos, com 39%, e a menor incidência foi de 17 anos, 5%. f) Salários: Verificou-se que 28% dos jogadores receberam entre 1 e 2 salários mínimos como profissional e entre 2 e 3 e entre 3 e 5 salários mínimos com 22 % cada. O salário máximo respondido, quando se tornaram profissionais, foi de 6 a 8 salários mínimos (5%). Em relação ao salário atual, 61% recebe acima de 15 salários mínimos (a partir de 3.000,00 reais), 28% recebe acima de 6 a 8 salários mínimos ( de 1.201,00 a 1.600,00). As menores incidências foram de 5 a 6 salários mínimos (de 1.001,00 a 1.200,00, o menor salário) e entre 8 e 15 salários mínimos (de 1.601,00 a 3.000,00), com 5,5% cada. Os três jogadores mais velhos (nascidos em 1969, 1974 e 1975) estão no grupo que recebem o maior salário e dentre os sete jogadores mais novos (um nascido em 1983 e seis em 1982), um recebe de 5 a 6 salários mínimos, quarto recebem de 6 a 8 salários mínimos, um recebe de 8 a 15 salários mínimos e um recebe acima de 15 salários mínimos. Esse, por sinal, é o mais novo dentre os entrevistados (1983) e a grande revelação do ano. g) Ocupação do Pai: Quando os jogadores se tornaram profissionais, a ocupação de seus pais era das mais diversas. As mais citadas foram: aposentado (3), professor, comerciante e policial (2 cada). Não houve nenhuma profissão ligada ao futebol.

12 Em relação ao rendimento atual do pai, os mais citados foram: de 2 a 3 salários mínimos e acima de 8 salários mínimos (22% cada) e 17% não soube responder. h) Outra Ocupação: Todos negaram possuir outra profissão além do futebol. i) Após Encerrar a Carreira: Quando questionados sobre o que pretendiam profissionalmente após encerrar a carreira no futebol, 61%, disse que não gostaria de continuar no futebol. Desses, 1 disse que gostaria de atuar em outra área para qual teria que se qualificar, empresário esportivo. Dos outros 91%, 50% não sabe ainda o que quer, 20% também não sabe, porém, quer continuar no futebol e 30% não tem idéia, mas tem certezaa que não quer continuar no futebol. Dos 35% que quer continuar no futebol, 43% pensa em abrir escolinhas de futebol, 28,5% quer atuar como técnico e também 28,5% quer exercer outras atividades no futebol.

6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS

Similarmente a outros estados, o profissionalismo e sua tensão com o amadorismo (VIEIRA, 2001), foi parte importante da trajetória do futebol mineiro e que, ao passar dos anos, o futebol de Minas Gerais foi crescendo, modernizando-se, adquirindo maior número de torcedores, maior divulgação e conseguindo títulos importantes. Observou-se uma grande dispersão dos clubes de futebol pelo estado de Minas Gerais, não havendo, portanto, uma grande concentração em uma cidade, como é o caso do Rio de Janeiro (VIEIRA, 2001). A cidade que possui mais clubes é Belo Horizonte, somente quatro. O que ocorre, na verdade, é uma pequena concentração em duas regiões, Região Metropolitana de Belo Horizonte e Sul de Minas Gerais. Comparando-se os dois clubes, em relação a origem dos jogadores, tanto o Tupi, quanto o América, mais de dois terços nasceram no estado de Minas Gerais. Há também uma concentração dos jogadores nascidos nas mesmas cidades dos clubes (36% de juiz de For a e 31% de Belo Horizonte), mostrando-se assim, a utilização de jogadores de equipe de base. Sobre a cor/raça, atribuída pelos próprios jogadores, no Tupi há uma maior concentração de mulato/pardo/mestiço (50%) e no América há uma maior número de broncos (56%). Quando atribuída pelo entrevistador, houve um equilíbrio entre as cor/raça no Tupi (39% branco, 33% negro/preto e 28% mulato/pardo/mestiço. No América, houve um aumento

13 de broncos para 61% e uma queda de negro/preto para 11%. Percebeu-se que pela grande miscigenação que o Brasil possui (europeus, africanos, orientais e índios), o brasileiro possui uma diversidade de cores sendo, algumas vezes, de difícil atribuição. No item escolaridade dos jogadores, nenhum dos dois clubes possuem analfabetos tampouco que tenham concluído a universidade. Dos que continuam estudando, no América somente 17% (universidade) e no Tupi 5% (recomeçaria o 2ºgrau). Verificou-se que nos dois clubes, boa parte desconhece o grau de escolaridade dos pais. Isso também acontece em relação ao rendimento do pai, principalmente no Tupi (72,5%). Observou-se que o futebol foi a primeira ocupação de grande parte dos jogadores. A idade introdutória de maior porcentagem é igual nos dois clubes, entre 13 e 15 anos e 80% recebeu uma ajuda de custo, que é de até 1 salário mínimo. A idade mais freqüente de profissionalização é de 17 anos, Isso mostra que alguns se tornaram profissionais sem chegar à idade de maioridade civil (21 anos até 2002). Um salário mínimo ou menos é o que foi mais respondido em relação ao primeiro salário como profissional. Esse índice é praticamente duas vezes maior no Tupi que no América. Em relação ao salário atual, o América é mais generoso. Mais da metade recebe mais de 15 salários mínimos. Já no Tupi, um terço recebe de 8 a 15 salários mínimos. Questionados sobre o futuro após a carreira profissional de jogador, os jogadores possuíam opiniões diferentes. No tupi, mais da metade gostaria de continuar no futebol. Já no América, mais da metade não quer saber de futebol no futuro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BOURDIEU, P. Sobre a Televisão. MACHADO, M. L. (trad.). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

DAMO, A. S. Futebol e Estética. São Paulo: Perspec., Jul. 2001, Vol. 15, p. 82-91.

HELAL, R. Mídia, Construção da Derrota e o Mito do Herói. In: HELAL, R.; SOARES, A. J. & LOVISOLO, H. A Invenção do País Futebol. Mídia, Raça e Idolatria. Rio de Janeiro: Mauad, 2001.

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