Dissertação para a candidatura ao grau de Mestre em Biologia Celular e Molecular submetida à Faculdade de Ciências da Universidade do Porto.

O presente trabalho foi desenvolvido sob a orientação científica da Professora Doutora Sofia Dória Príncipe dos Santos Cerveira e foi realizado no Departamento de Genética da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

“Por vezes sentimos que aquilo que fazemos não é senão uma gota de água

no mar. Mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota.”

Madre Teresa de Calcutá

FCUP VII Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Agradecimentos

Ao Prof. Doutor José Pissarra, diretor do Mestrado em Biologia Celular e Molecular da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, pelo trabalho realizado em prol deste mestrado. Ao restante corpo docente, agradeço os ensinamentos e a experiência que nos transmitiram.

Ao Departamento de Genética da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, na pessoa do seu diretor Prof. Doutor Alberto Barros, por me ter acolhido e pela disponibilização de todos os materiais e equipamentos para a realização da presente dissertação. Obrigada pelo voto de confiança.

À Prof. Doutora Sofia Dória, orientadora desta dissertação, agradeço a confiança que depositou em mim. Estou também grata pelo acompanhamento disponibilizado ao longo das diferentes etapas deste trabalho e pelo apoio nas dúvidas e inseguranças que me foram surgindo.

À Dra. Vera Lima, co-orientadora desta dissertação, agradeço a amizade, o apoio, os ensinamentos e os bons conselhos que me foi transmitindo desde que nos conhecemos. Agradeço também a disponibilidade, a orientação e a revisão desta dissertação

Aos restantes colaboradores do Departamento de Genética, obrigada pelo apoio na realização deste trabalho. Um agradecimento especial à Dra. Ana Paula Neto pela ajuda na realização do QF-PCR, bem como pela disponibilidade e paciência que sempre demonstrou. À Prof. Doutora Filipa Carvalho agradeço as críticas construtivas que me ajudaram a melhorar o meu trabalho.

Um agradecimento muito especial a todos os casais que participaram neste estudo, pela sua disponibilidade, simpatia e boa-vontade.

À minha turma, Mestrado em Biologia Celular e Molecular 2011/2013, pelos excelentes momentos que fomos partilhando.

Aos meus amigos, em especial à Eduarda, Marta e Tânia, pela compreensão e pelas palavras de incentivo. Obrigada por me perdoarem tantas ausências!

À Liliana, minha colega de estágio e minha amiga. Obrigada por todo o apoio e ajuda que tornaram este processo mais simples. Mas, acima de tudo, obrigada por todos os bons momentos que passamos dentro e fora do Departamento. Obrigada por todas as conversas, bem humoradas ou mais profundas, por todos os almoços e lanches, pelas FCUP VIII Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

palavras amigas nos momentos mais complicados. Em suma: obrigada por seres minha amiga!

A ti, Tiago, obrigada por existires na minha vida!

À minha família, nomeadamente aos meus pais e irmã, pelo apoio incondicional, mesmo nos meus piores momentos. Aos meus pais, agradeço o exemplo de trabalho e determinação que contribuiu muito para me incentivar ao longo deste longo caminho. À minha irmã devo um agradecimento especial pela paciência com que lidou comigo ao longo desta fase e pela disponibilidade para me ajudar sempre que necessário. FCUP IX Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Índice

Agradecimentos VII Índice IX Índice de Tabelas XI Índice de Figuras XIII Lista de Abreviaturas XV Resumo XVII Abstract XIX I- Introdução 1 1. Aneuploidia 3 1.1. Mecanismos de origem da aneuploidia 3 1.1.1. Meiose 3 1.1.2. Origem pós-zigótica (mitótica) 7 1.1.3. Aneuploidias autossómicas mais frequentes 9 2. Diagnóstico pré-natal de aneuploidias 15 2.1. Técnicas de análise de patologia cromossómica 15 2.1.1. Cariótipo 15 2.1.2. FISH (Hibridação in situ de fluorescência) 16 2.1.3. QF-PCR (Quantitative fluorescent polymerase chain reaction) 17 2.1.4. MLPA ® (Multiplex ligation-dependent probe amplification) 18 3. Alteração da expressão génica e aneuploidia 19 3.1. Aneuploidia e instabilidade cromossómica 19 3.1.1. MAD2L2 21 3.1.2. BUB1 22 3.1.3. BUB1B 25 3.1.4. KIF2C 27 II- Objetivos 31 III- Metodologia 35 1. Avaliação da expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C 37 1.1. Obtenção e preparação das amostras 37 1.2. Extração de RNA 37 1.3. Síntese de cDNA 38 1.4. PCR quantitativo em tempo real 38 1.5. Análise dos resultados 39 FCUP X Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

2. Avaliação da origem parental do cromossoma supranumerário em produtos de abortamento com trissomia dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 ou 22 40 2.1. Amostras Biológicas 40 2.2. Extração de DNA 41 2.3. PCR quantitativo de fluorescência 41 2.4. Eletroforese capilar 42 2.5. Análise de resultados 43 IV- Resultados 45 1. Avaliação da expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C 47 2. Avaliação da origem parental do cromossoma supranumerário em produtos de abortamento com trissomia dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 ou 22 52 V- Discussão 53 1. Avaliação da expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C 55 2. Avaliação da origem parental do cromossoma supranumerário em produtos de abortamento com trissomia dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 ou 22 60 VI- Conclusão 63 VII- Referências Bibliográficas 67 Anexos 77 FCUP XI Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Índice de Tabelas

Tabela 1: Condições da PCR de transcrição reversa ...... 54 Tabela 2: Componentes da reação de PCR quantitativo em tempo real ...... 55 Tabela 3: Condições de amplificação da QF-PCR ...... 57 Tabela 4: Primers utilizados para os diferentes Short Tandem Repeats ...... 58 Tabela 5: Informação clínica das amostras selecionadas e média das idades maternas para cada trissomia ...... 64 Tabela 6: Valores normalizados de expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C considerando todas as trissomias em estudo ...... 65 Tabela 7: Valores normalizados de expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C, excluindo a trissomia 15 ...... 66 Tabela 8: Dados clínicos e resultado obtido com a técnica QF-PCR ...... 67

FCUP XIII Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Índice de Figuras Fig. 1: Estimativa da incidência de trissomias com o aumento da idade materna, obtida por combinação de dados relativos às diferentes trissomias, considerando uma taxa de abortamento espontâneo de aproximadamente 15%. (Adaptado de Hassold & Hunt, 2001) ...... 6 Fig. 2: Representação esquemática dos mecanismos causadores de aneuploidia mitótica (Adaptado de Mantikou et al, 2012) ...... 9 Fig. 3: Cariótipo de indivíduo com trissomia do cromossoma 13 (Imagem cedida pelo Departamento de Genética/FMUP) ...... 10 Fig. 4: Cariótipo de um indivíduo com trissomia do cromossoma 18 (Imagem cedida pelo Departamento de Genética/FMUP) ...... 12 Fig.5 - Cariótipo de um indivíduo com trissomia do cromossoma 21 (Imagem cedida pelo Departamento de Genética/FMUP) ...... 13 Fig. 6: Procedimento de MLPA® (Adaptado de http://www.invitrotek.com.tr/en/mlpa.asp) ...... 19 Fig.7 - Ciclo de aneuploidia e instabilidade cromossómica. (Adaptado de Potapova et al 2013)...... 20 Fig.8 - Localização genómica do MAD2L2 (Retirado de http://www.genecards.org/cgi-bin/carddisp.pl?gene=MAD2L2) ...... 21 Fig.9 - Localização genómica do gene BUB1 (Retirado de http://www.genecards.org/cgi-bin/carddisp.pl?gene=BUB1&search=bub1) ...... 22 Fig.10 - Funções de Bub1 no checkpoint do fuso mitótico. a) Recrutamento de Mad1 e para os quinetocoros e subsequente formação do complexo MCC. b) Ação direta de Bub1 fosforilando Cdc20 e impedindo a activação do complexo APC/C. Adaptado de (Yu & Tang, 2005) ...... 23 Fig.11 - Ação de BUB1 na protecção da coesão centromérica, contribuindo para prevenir a separação prematura das cromátides-irmãs. Adaptado de (Yu & Tang, 2005) ...... 24 Fig.12 - Localização genómica do gene BUB1B (Retirado de http://www.genecards.org/cgi-bin/carddisp.pl?gene=BUB1B&search=bub1b) ...... 25 Fig.13 - Localização genómica do gene KIF2C (Retirado de http://www.genecards.org/cgi-bin/carddisp.pl?gene=KIF2C) ...... 27 Fig.14 - Esquema das fases obtidas após adição de clorofórmio na extracção de RNA pelo método convencional do TriPure® ...... 37 Fig.15 - Processo de seleção das amostras fetais a analisar ...... 40 FCUP XIV Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Fig.16 - Picos de fluorescência detetados pelo sequenciador automático ABI 3500 e analisados pelo software GeneMapper v4.1 para a amostra 9. O painel superior corresponde ao DNA fetal, sendo visíveis três picos de fluorescência. O painel intermédio corresponde ao DNA materno e o painel inferior ao DNA paterno, apresentando ambos dois picos de fluorescência...... 41 Fig. 17- Diagramas de extremos-e-quartis dos valores normalizados para os genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C; As caixas representam o intervalo interquartil. A linha tracejada representa a mediana dos valores de expressão. Os extremos representam os valores máximos e mínimos observados...... 41 Fig. 18- Diagramas de extremos-e-quartis dos valores normalizados para os genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C excluindo as amostras com trissomia 15; As caixas representam o intervalo interquartil. A linha tracejada representa a mediana dos valores de expressão. Os extremos representam os valores máximos e mínimos observados...... 41

FCUP XV Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Lista de Abreviaturas

APC- Complexo promotor da anafase

APC/C- Complexo promotor da anafase/ ciclossoma

BUB1- Budding uninhibited by benzimidazole 1

BUB1B- Budding uninhibited by benzimidazole 1 homolog beta

CENP-E - Kinesin like centromere motor

CGH- Hibridação Genómica Comparativa

CIN- Instabilidade Cromossómica

DNA- Ácido Desoxirribonucléico

DPN- Diagnóstico Pré-Natal

FISH- Hibridação in situ Fluorescência

GAPDH - gliceraldeído-3-fosfato desidrogenase

KIF2C- Kinesin family member 2C

MAD2L2- mitotic arrest deficient like 2

MCC- complexo de checkpoint mitótico

MLPA®- Multiplex ligation-dependent probe amplification

mRNA- Ácido ribonucleico mensageiro

PCR- Reação em cadeia da polimerase (do inglês Polymerase chain reaction)

QF-PCR- Reação em cadeia da polimerase quantitativa de fluorescência

RNA- Ácido Ribonucleico

SAC- Checkpoint do fuso mitótico (do inglês Spindle assembly checkpoint)

STR’s- Short Tandem Repeats

FCUP XVII Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Resumo

A aneuploidia, uma das alterações cromossómicas mais comuns na espécie humana, define-se como perda ou ganho de um ou mais cromossomas. A aneuploidia constitucional deriva de erros de segregação cromossómica na divisão meiótica, maioritariamente com origem materna, ou de erros na segregação cromossómica durante as primeiras divisões mitóticas do embrião. Se a aneuploidia surgir numa célula diferenciada designa-se por aneuploidia somática adquirida, estando fortemente associada com o desenvolvimento de diversos tipos de cancro. Uma das hipóteses propostas para explicar o efeito deletério de ambos os tipos de aneuploidia nos organismos é a existência de uma relação cíclica entre aneuploidia e instabilidade cromossómica. A desregulação de genes intervenientes no controlo do ciclo celular é um dos mecanismos que integram a interação entre aneuploidia e instabilidade cromossómica. O objetivo deste trabalho consistiu na avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C em produtos de abortamento de constituição cromossómica aneuplóide. Para tal, foi aplicada a técnica de PCR em tempo real a cinquenta amostras de produtos de abortamento ou tecido fetal com trissomias dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 e 22 e a trinta controlos com cariótipo normal. A análise dos resultados mostrou que, quando se consideram todas as trissomias, existe sobre-expressão de BUB1 e BUB1B. A alteração dos níveis de expressão de ambos os genes tem sido detetada em diversos cancros com instabilidade cromossómica, sendo este o primeiro trabalho a indicar sobre-expressão destes genes em produtos de abortamento aneuplóides. Uma vez que o gene BUB1B se localiza no cromossoma 15, realizou-se uma segunda análise excluindo as amostras com trissomia 15, tendo sido detetada sobre-expressão apenas do gene BUB1. Assim, é provável que a sobre- expressão inicialmente detetada para BUB1B esteja relacionada com a presença de uma cópia supranumerária deste gene nas sete amostras com trissomia 15. Adicionalmente, pretendeu-se determinar a origem parental dos cromossomas supranumerários em vinte amostras de produtos de abortamento e tecidos fetais aneuplóides. Com esse objetivo foram recolhidas amostras de DNA de ambos os progenitores e aplicada a técnica de PCR quantitativo de fluorescência. Os resultados obtidos estão, na sua maioria, de acordo com os descritos na literatura. Das vinte amostras analisadas, dezoito casos derivam de origem materna, um tem origem paterna e foi impossível determinar a origem para uma das amostras devido a homozigotia dos progenitores. FCUP XVIII Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Assim, os resultados deste trabalho contribuíram para o aumento do conhecimento acerca da aneuploidia em produtos de abortamento e da possível relação entre a aneuploidia constitucional e a instabilidade cromossómica, estabelecendo-se, de certa forma, um paralelismo com a aneuploidia adquirida.

PALAVRAS-CHAVE: ANEUPLOIDIA, INSTABILIDADE CROMOSSÓMICA, BUB1, BUB1B, PRODUTOS DE ABORTAMENTO

FCUP XIX Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Abstract

Aneuploidy, one of the most common chromosomal alterations on human species, is defined as gain or loss of one or more . Constitutional aneuploidy results from errors in segregation during meiotic division, the majority of which have maternal origin, or from chromosomal missegregation during the embryo early mitotic divisions. If aneuploidy arises in a differentiated cell it is called acquired somatic aneuploidy, being strongly associated with the onset of several types of cancer. One of the hypotheses to explain the deleterious effect of aneuploidies in organisms is the existence of a cyclical association with chromosomal instability. The disruption of genes involved in cell cycle control is one of the mechanisms related with the interaction between aneuploidy and chromosomal instability. The overall aim of the present study is evaluate the expression pattern of genes known to be involved in cell-cycle regulation (MAD2L2, BUB1, BUB1B and KIF2C), in miscarriage products with a confirmed aneuploidy for chromosomes 13, 15, 16, 18, 21 and 22. In order to do that, quantitative Real-Time PCR was performed in fifty samples and thirty controls with normal karyotype. The results analysis showed that, when all six trisomies are included, both BUB1 and BUB1B expression levels were upregulated. The overexpression of these two genes has been detected in several cancers with chromosomal instability. This is the first work indicating overexpression of BUB1 and BUB1B in miscarriage products with aneuploidy. Once the BUB1B gene is located on chromosome 15, a second analysis was performed without trisomy 15 samples. The results showed upregulation only of BUB1B gene. So, it is likely that the overexpression initially detected for BUB1B may be related with the presence of a supranumerary copy of this gene in the seven samples with trisomy 15. Additionally, it was intended to determine the parental origin of the extra chromosome of twenty miscarriage and fetal products samples with aneuploidy. With this purpose samples were collected from both parents and subjected to quantitative fluorescence PCR. The vast majority of results were consistent with that previous described in literature. From the twenty samples analyzed, eighteen cases had maternal origin, one had paternal origin and for one sample it was not possible to determine the origin of the aneuploidy due to homozygosity of the parents. As a conclusion, the results of this work contributed to increase the knowledge about aneuploidy in miscarriage products and about the possible relationship between constitutional aneuploidy and chromosomal aneuploidy, being possible, at least at some extent, to establish a parallel with somatic acquired aneuploidy. FCUP XX Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

KEY WORDS: ANEUPLOIDY, CHROMOSOMAL INSTABILITY, BUB1, BUB1B, MISCARRIAGE SAMPLES

I. INTRODUÇÃO

FCUP 3 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

I. Introdução

1. Aneuploidia

A aneuploidia é uma condição caraterizada por um número incorreto de cromossomas que resulta da perda ou ganho de cromossomas relativamente ao complemento cromossómico normal da espécie em questão. O complemento cromossómico humano normal é constituído por 22 pares de autossomas e 1 par de cromossomas sexuais. Atualmente, estima-se que cerca de 10-30% dos óvulos humanos fertilizados e 7-10% das gravidezes clinicamente comprovadas têm alterações cromossómicas numéricas. A maioria destas serão trissomias, tornando a aneuploidia na alteração cromossómica mais frequente em humanos e na principal causa genética de abortamentos espontâneos e malformações congénitas (Hunt, 2008). Quando se consideram apenas dados relativos a produtos de abortamento com idade gestacional inferior a 15 semanas, as taxas de aneuploidia podem ascender a cerca de 50% (Hassold et al., 1980, Nicolaidis & Petersen, 1998). No entanto, existe a hipótese de os valores indicados estarem subestimados. Por um lado, a perda ou ganho de determinados cromossomas é tão letal que inviabiliza a progressão da gravidez ainda antes de esta ser clinicamente reconhecida. Por outro, sabe-se que a incidência de aneuploidias aumenta muito consideravelmente com o aumento da idade materna, de tal forma que, para mulheres no fim do período reprodutivo, a taxa de ovócitos aneuplóides pode atingir os 50% (Hunt, 2008). Estes valores estão muito acima das médias para outros mamíferos, nomeadamente para o ratinho, que é o modelo animal mais usado neste tipo de investigação (Hassold & Hunt, 2001). O motivo para esta discrepância entre espécies ainda permanece desconhecido (Martin, 2008).

1.1. Mecanismos de origem da aneuploidia

1.1.1. Meiose

A meiose é um mecanismo de divisão celular especializado que origina gâmetas haplóides a partir de células progenitores diplóides. A meiose é antecedida por uma primeira fase de replicação de DNA e consiste em duas divisões celulares, dando assim origem a células com metade do complemento cromossómico das suas progenitoras. FCUP 4 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Na primeira divisão meiótica (Meiose I), os cromossomas que consistem em pares de cromátides-irmãs emparelham com os seus homólogos, formando-se um complexo sinaptonémico entre eles. Neste ponto, as cromátides homólogas não-irmãs sofrem recombinação e permanecem ligadas por estes pontos de quiasma, mesmo após a dissociação do complexo sinaptonémico. Assim, os pares de cromossomas homólogos alinham-se no fuso meiótico na metafase I. Na anafase I os pontos de quiasma são removidos e os cromossomas homólogos são segregados para pólos opostos do fuso meiótico, por ação de microtúbulos. A segunda divisão meiótica inicia-se sem replicação prévia de DNA e decorre de forma mais rápida. Na profase II forma-se um novo fuso meiótico no qual se alinham os cromossomas constituídos por duas cromátides-irmãs cada, durante a metafase II. Na anafase II as duas cromátides-irmãs são segregadas para pólos opostos do fuso meiótico, forma-se um invólucro nuclear na telofase II e dá-se a citocinese. A partir de uma célula progenitora diplóide o processo meiótico origina quatro células-filhas haplóides. Apesar da meiose ser um mecanismo altamente conservado e transversal à maioria dos organismos superiores, na espécie humana existem diferenças consideráveis entre a meiose feminina e masculina, e consequentemente na gametogénese.

i. Gametogénese feminina

A meiose feminina inicia-se no ovário fetal, após um breve período de proliferação mitótica. No entanto, após a dissociação do complexo sinaptonémico, a célula entra num período de quiescência (dictióteno) até ocorrer ovulação, que se inicia na puberdade. A meiose I é então retomada e, quando termina, ocorre a extrusão do primeiro glóbulo polar. Após um breve período denominado Intercinese inicia-se a Meiose II. Esta divisão prossegue até metafase II e apenas se completa se ocorrer fertilização, ocorrendo a extrusão do segundo glóbulo polar. Caso não se dê a fertilização, a célula sofre um processo de degeneração (Hunt, 2008). A elevada taxa de aneuploidias de origem materna tem levantado muito interesse no seio da comunidade científica. Nas últimas décadas foram surgindo diversas teorias no sentido de explicar os mecanismos moleculares na base deste fenómeno e a sua relação com o aumento da idade materna (Figura 1). Atendendo ao facto de a maioria destes erros ocorrer em meiose I, pensa-se que possam estar em larga medida relacionados com o período de quiescência existente após a profase I. Para que ocorra uma correta segregação cromossómica é FCUP 5 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

crucial que os pontos de quiasma formados se mantenham intactos e, consequentemente, a coesão entre as cromátides-irmãs constituintes de cada cromossoma e entre os pares de cromossomas homólogos tem de ser mantida durante décadas. Caso esta conexão seja de alguma forma quebrada precocemente, ou seja, antes de ser atingida a metafase I, os pontos de quiasma perdem-se e podem ocorrer erros de segregação na meiose I. Esta coesão é assegurada por complexos proteicos denominados coesinas. Na transição da metafase I para a anafase I as coesinas entre os cromossomas homólogos são libertadas por ação enzimática, permitindo assim a segregação dos cromossomas homólogos, mas não das cromátides-irmãs que deverão nesta fase permanecer ligadas. A perda de coesão prematura entre as cromátides-irmãs pode ser uma consequência direta do aumento da idade materna, devido a uma eventual degradação das coesinas. A não ocorrência de recombinação diminui a estabilidade das ligações entre cromossomas homólogos e entre cromátides-irmãs, podendo também contribuir para a perda de coesão prematura (Handyside, 2012, Nagaoka S., 2012). Um outro mecanismo gerador de aneuploidia na meiose I é a clássica não- disjunção de um dos cromossomas constituído por duas cromátides-irmãs, embora seja responsável por apenas 3% das aneuploidias (Gabriel et al., 2011). A meiose, como referido anteriormente, não está isenta de erros. No entanto, as células são sujeitas a diversos mecanismos de controlo (checkpoints), numa tentativa de assegurar que apenas células com um correto complemento cromossómico prosseguem a divisão. Um dos checkpoints mais estudados é o SAC (Spindle Assembly Checkpoint) que atua impedindo a ativação do APC (Anaphase Promoter Complex), bloqueando a progressão para anafase até todos os cromossomas estarem corretamente alinhados no plano equatorial e devidamente ligados a microtúbulos provenientes dos pólos, através dos seus cinetocoros. Assim sendo, além dos mecanismos de não-disjunção descritos anteriormente, para serem gerados gâmetas aneuplóides é necessário que as células ultrapassem este controlo, o que pode ocorrer devido a mutações nos seus componentes, inativando o checkpoint ou tornando-o mais permissivo (Zhou et al., 2002). Existem também trabalhos que apontam no sentido de o SAC feminino ser naturalmente mais permissivo do que o masculino, permitindo a progressão da meiose mesmo na presença de um ou mais cromossomas univalentes (Hawley, 2011, Nagaoka et al., 2011). Adicionalmente, estruturas como ligações bipolares podem contornar o mecanismo de controlo do SAC. FCUP 6 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Os mecanismos geradores de aneuploidia na metafase II são de certa forma semelhantes aos verificados em metafase I, assentando essencialmente em não- disjunção dos centrómeros-irmãos ou separação prematura das cromátides-irmãs

(Nagaoka S., 2012).

reconhecidas)

mente

Incidência Incidência de clinica trissomias (% de gravidezes

Idade materna Fig. 1: Estimativa da incidência de trissomias com o aumento da idade materna, obtida por combinação de dados relativos às diferentes trissomias, considerando uma taxa de abortamento espontâneo de aproximadamente 15%. (Adaptado de Hassold & Hunt, 2001)

ii. Gametogénese masculina

A gametogénese masculina é um processo relativamente rápido. Ainda na vida fetal, as células germinativas, espermatogónias, sofrem numerosas divisões mitóticas, que continuam após o nascimento e se prolongam pela vida adulta. Quando é atingida a puberdade, as espermatogónias são estimuladas a progredir o seu desenvolvimento para espermatócitos primários. Estas células iniciam a primeira divisão meiótica, originando espermatócitos secundários que, por sua vez, sofrem a segunda divisão meiótica dando origem a espermátides. Posteriormente, são sujeitas a um mecanismo de amadurecimento de onde resultam espermatozóides. Sendo um processo sequencial em que cada célula que entra em meiose produz quatro espermatozóides e em que não existem períodos de pausa durante a FCUP 7 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

meiose, a espermatogénese é menos propensa à ocorrência de erros de segregação cromossómica. Estudos realizados em homens saudáveis indicam que cerca de 1 a 2% dos espermatozóides produzidos têm um complemento cromossómico incorreto, sendo as alterações mais comuns as trissomias dos cromossomas 21 e 22 e aneuploidias dos cromossomas sexuais. Por outro lado, estima-se que cerca de 6 a 13% dos espermatozóides produzidos por um indivíduo saudável possam ser portadores de alterações estruturais, o que se pode dever à elevada taxa de divisões mitóticas que aumenta a probabilidade de ocorrência de mutações ou de alterações pós-meióticas. A questão do efeito da idade paterna na incidência de anomalias cromossómicas tem sido bastante debatida sem que, no entanto, pareça haver consenso entre os diversos autores. Estudos mais recentes vieram acrescentar evidências que apontam no sentido de a idade paterna avançada aumentar a probabilidade de alterações estruturais mas não de alterações numéricas (Revisto por Martin, 2008). A aneuploidia de origem paterna tem na sua génese mecanismos semelhantes aos verificados na meiose feminina. A não-disjunção pode derivar de emparelhamento anormal dos cromossomas, sinapses deficientes ou inexistentes ou perda de coesão prematura entre as cromátides-irmãs (Uroz & Templado, 2012).

1.1.2. Origem pós-zigótica (mitótica)

A ocorrência de um erro de segregação durante as mitoses correspondentes às primeiras clivagens, pode levar ao desenvolvimento de um embrião aneuplóide, por divisão preferencial da célula com o complemento cromossómico anormal em detrimento das células diplóides normais, embora este fenómeno seja raro. Mais frequentemente, erros neste mecanismo de divisão celular originam embriões com mosaicismo, ou seja, onde coexistem duas ou mais linhas celulares de constituição cromossómica distinta, mas ambas com origem em células progenitoras provenientes do embrião. Assim, a maioria dos estudos nesta área estima a incidência de erros de disjunção na mitose a partir da frequência de mosaicismos detetada em embriões. No entanto, estes valores não reúnem consenso, podendo variar entre 15 e <90%, de acordo com os diferentes autores (Bielanska et al., 2002, Daphnis et al., 2005, Harper et al., 1995, van Echten-Arends et al., 2011). Esta discrepância de resultados deve-se a questões como a definição de mosaicismo, o número de cromossomas analisados e a proveniência e qualidade dos embriões usados na pesquisa (Mantikou et al., 2012). As aneuploidias mitóticas encontram-se em todas as fases de desenvolvimento pré-implantatório humano, mas a percentagem relativa de células aneuplóides diminui FCUP 8 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

com a ativação do genoma fetal e continua a diminuir ao longo da vida fetal e após o parto (Fragouli et al., 2013). Mantikou et al refere que, se analisado a fundo, o mosaicismo estará presente em virtualmente todos os indivíduos da população comum, mas a um nível de tal forma baixo que é praticamente indetetável, não causando efeitos a nível fenotípico (Mantikou et al., 2012). Numa divisão mitótica normal, a partir de uma célula progenitora diplóide são originadas duas células filhas também elas diplóides. Diversos mecanismos podem estar na base do surgimento de linhas celulares aneuplóides ou poliplóides (Figura 2). Na situação de atraso na anafase em mitose (anaphase lag), ocorre o atraso na movimentação de uma cromátide durante a anafase, não sendo incorporado no genoma de nenhuma das células-filhas, podendo resultar em monossomia. A não- disjunção é a situação clássica em que as cromátides-irmãs não se separam corretamente, resultando numa célula-filha com uma perda cromossómica e outra com um ganho cromossómico. Em conjunto com a ocorrência de anaphase lag, é responsável pela grande maioria das aneuploidias de causa mitótica. Existem outros mecanismos que contribuem para a taxa de aneuploidias mitóticas, mas a uma escala menor. A extrusão cromossómica é tida como um mecanismo celular de resgate de trissomias. No entanto, quando ocorre em células cromossomicamente normais, este fenómeno leva à perda de um cromossoma, originando monossomias. A quebra cromossómica é um mecanismo algo semelhante mas provoca aneuploidias parciais pois alguns segmentos cromossómicos permanecem viáveis. A aneuploidia pode também resultar de separação prematura das células-filhas ou de citocinese incompleta ou inexistente, das quais podem resultar células-filhas com diferentes padrões de erros do complemento cromossómico. Pode ainda ocorrer fusão de blastómeros no embrião, o que vai originar uma linhagem celular poliplóide (Mantikou et al., 2012).

FCUP 9 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Fig. 2: Representação esquemática dos mecanismos causadores de aneuploidia mitótica (Adaptado de Mantikou et al, 2012)

1.1.3. Aneuploidias autossómicas mais frequentes

Os primeiros estudos citogenéticos acerca da incidência das aneuploidias foram realizados em recém-nascidos, tendo sido observada aneuploidia envolvendo apenas 3 dos 22 autossomas (cromossomas 13, 18 e 21) presentes na espécie humana (Jacobs et al., 1992). No entanto, rapidamente se equacionou a hipótese de a aneuploidia humana se poder estender praticamente a todos os autossomas, sendo as consequências fenotípicas da aneuploidia para os restantes autossomas habitualmente incompatíveis com a vida (exeto quando em mosaico), o que acabou por se comprovar mediante estudos realizados em produtos de abortamento (Jackson- Cook, 2011).

i. Trissomia 13

A trissomia 13, ou Síndrome de Patau, foi descrita pela primeira vez por Klaus Patau em 1960 (Patau et al., 1960). Esta aneuploidia afeta cerca de 0,18% de todas as gravidezes clinicamente reconhecidas, a maioria das quais termina em abortamento espontâneo. Estima-se que 1,1% do total de abortamentos espontâneos e 0,3% do total de nados-mortos sejam portadores de trissomia 13 (Hassold et al., 1980). FCUP 10 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Segundo Hassold et al, a incidência de trissomia 13 em nados-vivos é de 1/5000- 20000, sendo uma das poucas aneuploidias compatível com gestações de termo na espécie humana (Hassold et al., 1980). As alterações fenotípicas associadas à Síndrome de Patau incluem alterações graves do desenvolvimento psico-motor, microcefalia, malformações oculares, fenda lábio-palatina, onfalocelo, hipotonia, malformações renais e cardíacas, entre outras (Baty et al., 1994a, Baty et al., 1994b, Patau et al., 1960). Devido à grave apresentação clínica da Síndrome de Patau, 95% das crianças afectadas não sobrevivem habitualmente ao primeiro ano de vida (Rasmussen et al., 2003). Relativamente ao mecanismo pelo qual é originada, a trissomia 13 pode ocorrer devido à existência de um cromossoma 13 supranumerário livre (Figura 3) ou de uma translocação Robertsoniana envolvendo este cromossoma. No caso de trissomias provocadas por um cromossoma 13 livre, a grande maioria tem origem materna, com contribuição equitativa de erros na primeira e segunda divisão meiótica (Bugge et al., 2007).

Fig. 3: Cariótipo de indivíduo com trissomia do cromossoma 13 (Imagem cedida pelo Departamento de Genética/FMUP)

ii. Trissomia 15

A Trissomia 15 é uma alteração cromossómica incompatível com a vida pós- parto. Estima-se que cerca de 1,4% do total de abortamentos espontâneos tenham esta alteração (Hassold et al., 1980), sendo maioritariamente de origem materna, principalmente devido a erros de não disjunção na meiose I (Zaragoza et al., 1994). FCUP 11 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

iii. Trissomia 16

A Trissomia 16 é a trissomia mais frequentemente encontrada em produtos de abortamento do primeiro trimestre (Nicolaidis & Petersen, 1998, Doria et al., 2009). Estima-se que ocorra em aproximadamente 1,5% do total de gravidezes clinicamente reconhecidas (Wolstenholme, 1995) e em 5,1% dos abortamentos espontâneos (Hassold et al., 1980). A trissomia 16 é considerada incompatível com a vida pós- parto. Segundo vários estudos, virtualmente todos os casos de trissomia 16 derivam de erros de não disjunção na meiose I materna (Hassold et al., 1991, Hassold et al., 2007).

iv. Trissomia 18

A trissomia 18, também conhecida como Síndrome de Edwards, é a segunda trissomia autossómica mais comum no recém-nascido, afetando cerca de 1 em cada 2500 conceções, a maioria das quais termina em abortamento espontâneo (Crider et al., 2008). Os primeiros casos reportados desta alteração cromossómica remontam a 1960, quando dois grupos de investigadores publicaram independentemente descrições de um quadro clínico associado à presença de um cromossoma 18 supranumerário em todas as células do organismo (Figura 4) (Edwards et al., 1960, Smith et al., 1960). A Síndrome de Edwards caracteriza-se por um marcado atraso no crescimento e no desenvolvimento psico-motor e cognitivo. Uma das manifestações clínicas mais características é a malformação das mãos que leva à sobreposição dos dedos. Outras alterações fenotípicas incluem dolicocefalia, micrognatia, onfalocelo, excesso de pele no pescoço e malformações nos pés, bem como graves problemas cardíacos em cerca de 90% dos casos (Cereda & Carey, 2012). Devido à severidade dos sintomas provocados pela trissomia 18 existe uma elevada taxa de mortalidade durante o trabalho de parto e período neonatal, sendo que apenas aproximadamente 20% das crianças afetadas atingem um ano de vida (Niedrist et al., 2006). Existem, no entanto, relatos de pacientes que sobreviveram além dos 15 anos, embora se tratem de casos esporádicos (Niedrist et al., 2006, Kelly et al., 2002, Shanske, 2006). No que diz respeito à origem da trissomia 18, a grande maioria dos casos tem origem materna (aproximadamente 91%), principalmente devido a erros na segunda divisão meiótica (Nicolaidis & Petersen, 1998, Hassold et al., 2007). FCUP 12 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Fig. 4: Cariótipo de um indivíduo com trissomia do cromossoma 18 (Imagem cedida pelo Departamento de Genética/FMUP)

v. Trissomia 21

A trissomia 21, responsável pela maioria dos casos de Síndrome de Down, é a alteração cromossómica numérica mais comum em recém-nascidos, afetando cerca de 1 em cada 750 nados-vivos (O'Connor, 2008), sendo que a incidência aumenta marcadamente com o aumento da idade materna. Esta patologia é referida pela primeira vez em 1886 por John Langdon Down numa publicação em que é descrito o conjunto de sintomas característico desta patologia (Down, 1866). No entanto, só na década de 50 do século XX é estabelecida a relação causa-efeito entre a presença de uma cópia supranumerária do cromossoma 21 e a sintomatologia descrita cerca de 100 anos antes por Down, em duas investigações independentes realizadas por Jerome Lejeune (Lejeune J, 1959) e Patrícia Jacobs (Jacobs et al., 1959). Atualmente, sabe-se que a trissomia 21 é responsável por cerca de 95% do total de casos de Síndrome de Down (Figura 5), sendo que os restantes 5% devem-se a translocações envolvendo o cromossoma 21 (O'Connor, 2008). Cerca de 90% dos casos de trissomia 21 tem origem materna, maioritariamente devido a erros de não-disjunção na meiose I. Dos restantes, estima-se que cerca de 5% tenham origem em alterações pós-zigóticas ocorridas muito cedo no desenvolvimento embrionário (Nicolaidis & Petersen, 1998). Esta patologia caracteriza-se por um défice ligeiro a moderado no desenvolvimento psicológico e cognitivo, sendo mesmo considerada como a principal causa de atraso mental a nível mundial (Galdzicki et al., 2001). No que diz respeito ao fenótipo, as alterações são variáveis mas, por norma, incluem baixa estatura, pescoço FCUP 13 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

largo, fissuras palpebrais oblíquas, língua protuberante, prega palmar transversal única, entre outras. Do ponto de vista clínico, as complicações associadas à Síndrome de Down prendem-se com malformações cardíacas (afetam cerca de 50% dos recém nascidos com Síndrome de Down), perda de audição (38-78%), problemas oftalmológicos, malformações gastro-intestinais e propensão para infeções e doenças hematológicas, nomeadamente leucemias (Roizen & Patterson, 2003). A esperança média de vida de um indivíduo com Trissomia 21 é variável de acordo com o conjunto de sintomas apresentado. No entanto, para países economicamente desenvolvidos esta situa-se acima dos 55 anos (Glasson et al., 2002).

Fig.5 - Cariótipo de um indivíduo com trissomia do cromossoma 21 (Imagem cedida pelo Departamento de Genética/FMUP)

vi. Trissomia 22

A trissomia 22 é a terceira trissomia mais comum em produtos de abortamento, estimando-se que afete 1 em cada 200 gravidezes clinicamente reconhecidas e sendo responsável por pelo menos 2,7% do total de abortamentos espontâneos e 0,2% do total de nados-mortos (Hassold & Jacobs, 1984). Devido à severidade dos sintomas associados à trissomia 22, que incluem microcefalia, malformações cardíacas e renais e restrição de crescimento intra-uterino, são raros os relatos de gravidezes que atingem o termo (Heinrich et al., 2013). No caso de nados-vivos, a sobrevivência média é de apenas 4 dias e a maior longevidade registada foi de 29 dias (Heinrich et al., 2013, Tinkle et al., 2003). FCUP 14 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Segundo Hall et al, cerca de 96% dos casos de trissomia 22 derivam de erros na meiose materna, sendo que 90% deles estão relacionados com erros de disjunção na primeira divisão meiótica (Hall et al., 2007).

vii. Triploidia

A triploidia é uma das anomalias cromossómicas mais comuns na espécie humana, ocorrendo em cerca de 1% do total de conceções que, na sua maioria, resultam em abortamento frequentemente ainda numa fase precoce da gravidez. Em casos muito raros, fetos com triploidia completa sobrevivem até ao termo da gestação. O tempo máximo de sobrevivência de uma criança com triploidia (não mosaico) registado até hoje é de 11 meses (Sherard et al., 1986). Esta anomalia cromossómica consiste na existência de uma cópia adicional de cada um dos cromossomas em todas as células do organismo, ou seja, indivíduos com esta condição possuem um complemento cromossómico haplóide adicional, resultando num total de 69 cromossomas. Esta condição pode resultar de diginia (complemento cromossómico adicional tem origem materna) ou de diandria (complemento cromossómico adicional tem origem paterna). A prevalência de cada um destes mecanismos de origem varia de acordo com a idade gestacional atingida. Tratando-se de abortamentos ocorridos nas primeiras semanas de gestação, a origem é predominantemente paterna. Abortamentos mais tardios tendem a relacionar-se com diginia. Considerando a triploidia como um todo, a diandria é o mecanismo de origem mais comum (Wick et al., 2013, Zaragoza et al., 2000). A nível do fenótipo provocado por esta condição também existem diferenças de acordo com a origem parental da anomalia. Em casos derivados de diandria, verifica- se um crescimento fetal normal ou moderadamente afetado de forma simétrica, com glândulas adrenais normais. A placenta tende a ser de grandes dimensões e com características histológicas conhecidas como mola hidatiforme parcial. Quando a triploidia deriva de diginia, o feto apresenta habitualmente uma restrição de crescimento grave e hipoplasia adrenal. A placenta classifica-se como não molar. Em comum, os fetos tendem a apresentar anomalias congénitas generalizadas, nomeadamente sindactilia nos dedos das mãos e nos dedos dos pés, anomalias genitais e cardíacas bem como malformações cerebrais, entre outras (McFadden & Robinson, 2006).

FCUP 15 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

2. Diagnóstico Pré-Natal de Aneuploidias

Por norma, no acompanhamento normal de uma gravidez é realizado de forma generalizada o rastreio pré-natal de cromossomopatias que, levando em consideração uma série de fatores, fornece indicações sobre a existência ou não de risco aumentado de patologia cromossómica. Nas situações em que o resultado deste rastreio é positivo, deve ser oferecida à grávida a possibilidade de realização de diagnóstico pré-natal (DPN). O DPN engloba um conjunto de técnicas de recolha de material fetal, nomeadamente amniocentese, biópsia de vilosidades coriónicas, cordocentese e recolha de material fetal em circulação no plasma materno, permitindo assim a determinação direta da constituição cromossómica do feto.

2.1. Técnicas de análise da patologia cromossómica

2.1.1. Cariótipo

A análise do cariótipo, ferramenta tradicional de citogenética, é um processo demorado e relativamente trabalhoso. Inicialmente, é necessário estabelecer uma cultura celular do material biológico em questão (vilosidades coriónicas, sangue, líquido amniótico, ou outros) que posteriormente é sincronizada no sentido de se obter a maior quantidade de metafases possível. Os cromossomas metafásicos são sujeitos a processos de coloração, tradicionalmente Bandas-G, que permitem a sua visualização ao microscópio. A análise do cariótipo permite avaliar a ploidia bem como a existência, dentro de certos limites de resolução, de rearranjos estruturais, equilibrados ou não, em qualquer cromossoma. Apesar da sua inegável importância esta técnica apresenta limitações, nomeadamente a necessidade de cultura celular prévia. A falência de culturas, que se pode dever a uma multiplicidade de fatores, impossibilita a obtenção de cariótipos, surgindo a necessidade de recorrer a outras técnicas que não necessitam de cultura celular, nomeadamente de análise molecular. Adicionalmente, na cultura celular pode ocorrer crescimento preferencial de células de origem materna, contaminação por material externo ou mesmo seleção contra as células anormais, tratando-se de fetos com mosaicismo. A análise do cariótipo está muito dependente da experiência do profissional, podendo por vezes surgir situações ambíguas, nomeadamente devido à resolução do bandeamento, que dificultam a determinação dos resultados. A limitação mais importante da análise do cariótipo é, no entanto, o tempo necessário até serem reportados os resultados (aproximadamente 15 dias), o que em FCUP 16 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

contexto de Diagnóstico Pré-Natal coloca o casal sob uma grande ansiedade. Do ponto de vista médico esta situação também é problemática pois procedimentos como a interrupção médica da gravidez são mais seguros se realizados mais precocemente.

2.1.2. FISH (Hibridação in situ de Fluorescência)

É uma técnica pela qual um segmento de DNA conjugado previamente com um fluorocromo (sonda) hibridiza numa metafase ou interfase, com determinado cromossoma ou determinada região de um ou mais cromossomas, na sua região complementar. Uma vez que permite a deteção de aneuploidias e alterações da ploidia em células em interfase, não exige cultura celular prévia, possibilitando resultados mais rápidos do que os obtidos pela técnica convencional de análise do cariótipo. Esta técnica possibilita ainda a deteção de mosaicismo mesmo que de baixo grau (<10%) bem como de situações de contaminação materna em fetos de sexo masculino. No contexto do diagnóstico pré-natal de aneuploidias, são usadas sondas específicas para as aneuploidias mais comuns (13, 16, 18, 21 e 22), disponíveis em kits comerciais. Esta técnica tem como principal desvantagem o facto de estar limitada às sondas utilizadas no estudo, não fazendo um estudo integral de todo o genoma. Um dos desenvolvimentos mais importantes conseguidos a partir da técnica de FISH foi a introdução da Hibridação Genómica Comparativa (CGH), que alarga a pesquisa de alterações numéricas e estruturais desequilibradas a todo o genoma. Nesta técnica o DNA em estudo e o DNA controlo (extraído de um indivíduo cariotipicamente normal) são marcados com fluorocromos distintos e hibridados com cromossomas metafásicos humanos de referência. A interpretação dos resultados é feita avaliando o rácio da intensidade de fluorescência entre o controlo e o DNA estudado, através de ferramentas de análise digital (Revisto por Bishop, 2010). Esta técnica clássica já deixou de ser usada pois foi substituída pela técnica de array-CGH, em que a hibridação é feita numa lâmina de array, comumente designada de chip, onde são impressas milhares de sondas de DNA (mais recentemente oligonucleótideos) permitindo a análise da totalidade do genoma (perdas e ganhos) com uma resolução muito superior (pelo menos 100kb ou mesmo maior resolução, conforme o tipo de array).

FCUP 17 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

2.1.3. QF-PCR (Quantitative fluorescent polymerase chain reaction)

A técnica de QF-PCR baseia-se na amplificação de sequências de DNA altamente polimórficas, nomeadamente STR’S (Short Tandem Repeats) específicas para um cromossoma, recorrendo a pares de primers marcados com fluorescência. Uma vez que se assume que na fase exponencial do PCR a quantidade de DNA específico produzida é proporcional à quantidade de DNA-alvo inicial, é possível determinar o número de cópias do cromossoma em questão, por análise da intensidade de fluorescência dos fragmentos amplificados. A interpretação dos resultados baseia-se no número de picos de fluorescência e no cálculo do rácio entre a altura dos mesmos, para cada marcador polimórfico usado. Assim, um indivíduo heterozigótico euplóide para o cromossoma em questão deve apresentar dois picos de fluorescência com rácio de intensidade de fluorescência não superior a 0,8-1. Tratando-se de um indivíduo homozigótico, deverá existir apenas um pico de fluorescência. Quando estamos perante uma trissomia para o cromossoma em questão, as três cópias cromossómicas podem ser detetadas como três picos de fluorescência distintos com um rácio de intensidade de 1:1:1 ou como dois picos com rácio de intensidade inferior a 0,65 ou superior a 1,8 (Diego-Alvarez et al., 2005, Hulten et al., 2003). A QF-PCR permite a realização de ensaios em multiplex, ou seja, com vários pares de primers em simultâneo, existindo mesmo kits comerciais disponíveis em várias empresas que permitem o diagnóstico de forma relativamente económica. Uma vez que o DNA usado para esta técnica é extraído a partir de líquido amniótico, vilosidades coriónicas ou tecido fetal sem cultura celular prévia, a QF-PCR permite a obtenção de resultados num curto período de tempo (24-48 horas). Esta técnica tem ainda a vantagem de permitir detetar células com genótipo diferente do DNA da maioria das células presente na amostra, o que pode representar contaminação materna, mosaicismo, quimerismo ou mesmo contaminação externa (Mann & Ogilvie, 2012). Adicionalmente, permite obtenção de resultados em casos em que o diagnóstico citogenético não foi possível, sendo ainda informativo relativamente à origem parental e meiótica da aneuploidia. Relativamente às desvantagens da QF-PCR, a existência de resultados não informativos (existência de um só pico de fluorescência que pode corresponder a um padrão de 1:1 ou de 1:1:1) é apontada com alguma frequência. Adicionalmente, a existência de tetraploidia e de mosaicismos de baixo grau pode ser difícil de identificar (Diego-Alvarez et al., 2005). Devido ao facto de os kits comerciais só testarem as FCUP 18 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

aneuploidias mais comuns (cromossomas 13, 16, 18, 21, 22 e sexuais), aneupoidias dos restantes cromossomas não são detetadas por esta técnica.

2.1.4. MLPA® (Multiplex ligation-dependent probe amplification)

A técnica de MLPA foi desenvolvida pela empresa “MCR-Holland” em 2002 como um método de quantificação relativa que permitia a pesquisa direcionada de alterações do número de cópias de DNA de até 50 sequências de DNA, baseada na técnica de PCR quantitativa. No contexto do Diagnóstico Pré-natal, a MLPA pode ser usada para detetar aneuploidias, microdeleções e estudos familiares de alteração do número de cópias num gene. Numa reação de MLPA, para cada alvo são usadas duas sondas oligonucleotídicas que são complementares a regiões imediatamente adjacentes na sequência de DNA em estudo. Cada sonda contém um local de ligação para um primer, forward e reverse respetivamente. A sonda 3’ contém ainda uma sequência de DNA, conhecida como stuffer sequence, que não emparelha com a sequência-alvo e que confere um comprimento distinto aos amplicões, permitindo a sua distinção em ensaios multiplex, através de separação por eletroforese capilar. Uma vez que os primers usados são marcados com fluorescência, a análise dos resultados baseia-se na interpretação da intensidade dos picos de fluorescência detetados por eletroforese capilar, por comparação com um padrão de referência ou com os rácios relativamente a outros cromossomas (Figura 6). Rácios abaixo de 0,7 são indicativos de perda de material-alvo e acima de 1,3 de ganho de material-alvo. Os valores intermédios são considerados normais. (Willis et al., 2012). FCUP 19 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Fig. 6: Procedimento de MLPA® (Adaptado de http://www.invitrotek.com.tr/en/mlpa.asp)

As vantagens da MLPA relativamente a outras técnicas relacionam-se com o facto de ser uma técnica rápida (resultados disponíveis em cerca de 48 horas) e relativamente simples, com resultados fiáveis, robustos e replicáveis devido à existência de kits comerciais otimizados para a deteção das aneuploidias mais comuns. A quantidade de DNA necessária é relativamente baixa. Adicionalmente, a MLPA elimina o problema dos resultados não informativos existentes na QF-PCR. Os aspetos negativos desta técnica incluem a não deteção de triploidias, cujo resultado é igual ao de um indivíduo diplóide, bem como a não deteção de contaminação materna.

3. Alteração da expressão génica e aneuploidia

3.1. Aneuploidia e instabilidade cromossómica

O efeito prejudicial da aneuploidia no desenvolvimento humano está largamente documentado, sendo particularmente evidente no fenótipo associado às trissomias compatíveis com a vida pós-parto. Adicionalmente a aquisição de aneuploidia em células diferenciadas tem vindo a ser associada ao desenvolvimento de diversos tipos de cancro. O mecanismo pelo qual a aneuploidia afeta de tal forma FCUP 20 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

os organismos tem vindo a ser alvo de estudo nas últimas décadas e, embora tenham surgido diversas teorias, permanece por esclarecer. Uma das hipóteses colocadas é a relação entre a aneuploidia e a instabilidade cromossómica. Potapova et al sugerem que esta relação se baseia num ciclo, em que a existência de uma potencia a outra. Assim, a existência de aneuploidia provoca um desequilíbrio da expressão de mRNA, o que por sua vez altera os níveis proteicos. Estas perturbações podem afetar diversos complexos proteicos e vias metabólicas, alterando o correto funcionamento de processos biológicos essenciais à célula e podendo provocar, entre outros, defeitos na maquinaria de checkpoint e no fuso celular. Estas alterações levam ao aumento de erros de segregação, contribuindo assim para o aumento da instabilidade cromossómica e, consequentemente, da incidência de aneuploidia (Figura 7) (Potapova et al., 2013).

Fig.7 - Ciclo de aneuploidia e instabilidade cromossómica. (Adaptado de Potapova et al 2013)

A maioria dos trabalhos que focam a instabilidade cromossómica baseia-se em situações de aneuploidia adquirida, nomeadamente em oncologia. No entanto, a relação entre aneuploidia e instabilidade cromossómica também existe em aneuploidias constitucionais. Potapova et al afirmam que células provenientes de pacientes com Síndrome de Down, Edward e Patau são menos estáveis do que células provenientes de indivíduos cariotipicamente normais (Potapova et al., 2013). FCUP 21 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Muito embora aparentemente a alteração dos componentes do checkpoint seja responsável apenas por uma minoria dos casos de instabilidade cromossómica, esta continua a ser uma contribuição relevante para o conhecimento global acerca de aneuploidia.

3.1.1. MAD2L2

Os genes envolvidos no mecanismo de checkpoint do fuso mitótico de Saccaromyces cerevisiae têm sido amplamente estudados ao longo das últimas décadas. O gene MAD2, responsável por monitorizar a ligação dos microtúbulos ao cinetocoro pertence a uma das famílias de genes melhor caracterizadas, a família MAD (mitotic arrest deficent). Em organismos eucarióticos superiores existem dois homólogos de MAD2: MAD2L1 (mitotic arrest deficient like 1), frequentemente designado apenas como MAD2, e MAD2L2 (mitotic arrest deficient like 2), também designado por MAD2B ou hREV. Este último gene foi identificado e caracterizado por Cahill et al em linhas celulares humanas provenientes de tumores com instabilidade cromossómica. MAD2L2 tem localização citogenética em 1p36 (Figura 8) e codifica a proteína Mad2l2. Esta proteína intervém no mecanismo de checkpoint, inibindo o complexo APC/C através da ligação a um dos seus ativadores, CDC20 ou CDH1. No entanto, atendendo ao facto de Mad2l2 se localizar essencialmente no núcleo mas não se associar com os cinetocoros ao longo do ciclo celular, pensa-se que esta proteína estará envolvida em algum processo celular para além do checkpoint do fuso. Adicionalmente, Mad2l2 representa uma subunidade da enzima polimerase de DNA zeta. Esta enzima é mais permissiva a alterações na cadeia molde, sendo capaz de prosseguir a replicação de DNA em situações em que as DNA-polimerases convencionais parariam. Quando atinge o local da lesão na cadeia molde, a DNA polimerase zeta insere um nucleótido (correto ou não) na posição correspondente da cadeia sintetizada e prossegue a replicação. Este processo tem a desvantagem de poder fixar mutações (Murakumo, 2002). Como esta DNA polimerase não tem atividade de revisão da cadeia sintetizada, há maior propensão para a ocorrência de mutações. Apesar deste risco, este mecanismo tende a implicar menos consequências do que a paragem da replicação.

Fig.8 - Localização genómica do gene MAD2L2 (Retirado de http://www.genecards.org/cgi- bin/carddisp.pl?gene=MAD2L2) FCUP 22 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Trabalhos focando a DNA polimerase zeta em leveduras indicam que Mad2l2 é fundamental para a sua capacidade de síntese transpondo a lesão. Assim, é de esperar que a redução de Mad2l2 prejudique a capacidade de tolerância de erros na cadeia de DNA, levando à paragem da síntese, com consequências drásticas para os organismos. Por outro lado, dados relativos à sobre-expressão de Mad2l2 que provêm maioritariamente de estudos em tumores (nomeadamente colo-retais e neuroblastomas) mostram que pacientes em que este gene se encontra sobre- expresso têm pior prognóstico, com diminuição das taxas de sobrevivência. Apesar das informações disponíveis acerca da intervenção de Mad2l2 em processos distintos, o seu papel exato no controlo do ciclo celular e os mecanismos através dos quais ele se processa permanecem pouco claros.

3.1.2. BUB1

O gene BUB1 (Budding uninhibited by benzimidazole) tem localização citogenética 2q13 (figura 9) e foi identificado pela primeira vez em levedura. Posteriormente, foi identificada a sequência de cDNA que codifica o gene BUB1 em humanos. A comparação desta sequência com a de Saccaromyces cerevisiae e com a de ratinho, previamente determinadas, revelou uma grande similaridade, indicativa de elevado grau de conservação (Cahill et al., 1999). A proteína codificada por este gene, uma cínase rica em serinas e treoninas denominada Bub1, está presente em níveis de concentração variáveis de acordo com o tecido considerado, tendo sido detetados níveis máximos em amostras de tecido testicular e níveis mínimos em amostras de baço (The GeneCards human gene database).

Fig.9 - Localização genómica do gene BUB1 (Retirado de http://www.genecards.org/cgi- bin/carddisp.pl?gene=BUB1&search=bub1 )

A maioria da informação sobre o papel de Bub1 na mitose provém de estudos em S. cerevisiae e S. pombe (Marchetti & Venkatachalam, 2010). As evidências em vertebrados derivam maioritariamente de trabalhos com linhas celulares tumorais humanas ou de modelos animais como o ratinho. No seu conjunto, estes trabalhos FCUP 23 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

denotam o papel essencial de Bub1 na correta segregação cromossómica na mitose. Durante a profase, esta proteína acumula-se nos cinetocoros não ligados, para onde recruta dímeros Mad1-Mad2. Em resposta a danos no fuso mitótico, Bub1 fosforila Mad1, levando à dissociação do complexo Mad1-Mad2. Uma vez livre, Mad2 liga-se a Cdc20, um ativador do complexo APC/C. Pensa-se que esta ligação pode desencadear a formação do complexo de checkpoint mitótico (MCC) constituído por BubR1-Bub3-Mad2-Cdc20, qua atua inibindo o complexo APC/C e, consequentemente, a progressão para anafase. No entanto, a formação do complexo MCC no cinetocoro ainda não está suficientemente documentada (Figura 10a). Adicionalmente, pensa-se que Bub1 pode atuar diretamente fosforilando Cdc20, impedindo assim a ativação do complexo APC/C, embora o mecanismo através do qual esta inibição ocorre ainda não esteja totalmente esclarecido (Figura 10b) (Marchetti & Venkatachalam, 2010, Williams et al., 2007). Existem ainda autores que defendem que a proteína Bub1 pode sinalizar células que escaparam aos mecanismos de controlo, tendo herdado um complemento cromossómico incorreto, promovendo a sua degradação (Jeganathan et al., 2007). No que diz respeito à meiose, à semelhança do que acontece na mitose, Bub1 é um componente-chave do checkpoint do fuso. Assim, a inativação ou o decréscimo de atividade de Bub1 afetaria numerosos aspetos em ambos os processos de divisão celular, nomeadamente o correto alinhamento cromossómico e a sincronização temporal pois seria desencadeada uma entrada precoce em anafase (Marchetti & Venkatachalam, 2010).

Fig.10 - Funções de Bub1 no checkpoint do fuso mitótico. a) Recrutamento de Mad1 e Mad2 para os quinetocoros e subsequente formação do complexo MCC. b) Ação direta de Bub1 fosforilando Cdc20 e impedindo a activação do complexo APC/C. Adaptado de (Yu & Tang, 2005)

FCUP 24 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Uma vez que a perda total de função de Bub1 é letal ainda na fase embriónica, a investigação do papel desta proteína in vivo tem sido realizada em ratinhos mutantes com redução de atividade ou mutação de apenas uma das cópias do gene em questão. Estes trabalhos permitiram concluir que o fenótipo provocado pela redução de Bub1 na meiose é marcadamente diferente entre os sexos. O estudo dos espermatozóides destes organismos mutantes não revelou alterações significativas nas taxas de aneuploidia detetadas. Por oposição, quando foram analisados óvulos, s taxas de aneuploidia detetadas sofreram um incremento relativamente a controlos não mutados. Este aumento de aneuploidia em óvulos de organismos mutantes estará, muito provavelmente relacionado com separação prematura das cromátides-irmãs (Leland et al., 2009). Além do seu papel como proteína de checkpoint, Bub1 atua também evitando a separação prematura das cromátides-irmãs. Para que ocorra segregação dos cromossomas homólogos, os complexos de coesinas localizados ao longo dos braços dos cromossomas têm de ser retirados por fosforilação mediada por Plk1/Aurora B, durante a profase. No entanto, é necessário que se mantenha a coesão no centrómero para conservar as cromátides-imãs unidas, evitando a remoção das coesinas desta região. Este papel é levado a cabo por proteínas denominadas sugosinas, que protegem a coesão centromérica. Bub1 regula a estabilidade e a correta localização centromérica das sugosinas, contribuindo assim para evitar a separação prematura das cromátides-irmãs. Posteriormente, em meiose II a enzima separase cliva as coesinas centroméricas para permitir a segregação das cromátides-irmãs (Figura 11) (Yu & Tang, 2005, Marchetti & Venkatachalam, 2010).

Fig. 11 - Ação de BUB1 na protecção da coesão centromérica, contribuindo para prevenir a separação prematura das cromátides-irmãs. Adaptado de (Yu & Tang, 2005)

FCUP 25 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Os efeitos de uma eventual sobre-expressão de BUB1 não estão muito documentados. No entanto, sabe-se que existe sobre-expressão de BUB1 em determinados tipos de cancro, nomeadamente linfomas, por oposição a outras neoplasias referidas anteriormente em que a expressão deste gene está diminuída. Segundo um trabalho de Ricke et al, a sobre-expressão de BUB1 pode ser potenciadora do desenvolvimento de neoplasias de constituição cromossómica aneuplóide por promover erros de segregação cromossómica. No entanto, as consequências moleculares e fisiológicas desta sobre-expressão ainda não são conhecidas (Ricke et al., 2011). Assim, embora sejam necessárias evidências adicionais para suportar estes dados, poderá ser de esperar um aumento das taxas de aneuploidia tanto quando existe sub-expressão de BUB1 como quando este gene é sobre-expresso.

3.1.3. BUB1B

O gene BUB1B (Budding uninhibited by benzimidazole 1 homolog beta), localizado no cromossoma 15 em q15 (Figura 12), foi inicialmente identificado devido à homologia com BUB1. Pouco depois da sua identificação, este gene foi reconhecido como o ortólogo em mamíferos do gene MAD3 de leveduras. No entanto existem diferenças entre a proteína BubR1, codificada por BUB1B e a proteína Mad3, nomeadamente a existência de um domínio de cínase na primeira. Esta particularidade é indicativa de que a atividade de cínase de BubR1 terá sido adquirida no decorrer da evolução, provavelmente no sentido de dar resposta a novas funções que lhe terão sido atribuídas (Elowe, 2011). Atualmente, pensa-se que a proteína BubR1 é muito importante tanto para os mecanismos de checkpoint da divisão celular como para estabilizar a ligação dos microtúbulos aos cinetocoros.

Fig.12 - Localização genómica do gene BUB1B (Retirado de http://www.genecards.org/cgi- bin/carddisp.pl?gene=BUB1B&search=bub1b)

Esta proteína é recrutada para os cinetocoros onde provavelmente atua regulando a acção de CENP-E (Kinesin like centromere motor protein). CENP-E intervém na ligação dos microtúbulos aos cinetocoros bem como no alinhamento dos cromossomas na placa metafásica. A monitorização destes processos foi comprovada pelo facto de células em que CENP-E está ausente permanecerem bloqueadas no processo de divisão, não completando a meiose. Esta monitorização é, pelo menos FCUP 26 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

em parte, levada a cabo por BubR1, como demonstrado por Chan e colaboradores (Chan et al., 1999). Adicionalmente, BubR1 integra o complexo MCC que, em resposta a erros de ligação ao fuso, impede a ativação de APC/C e consequente progressão para anafase. É ainda sugerido um papel de BubR1 na sinalização de células aneuplóides, promovendo a sua apoptose, à semelhança do que foi descrito para o gene BUB1 (Elowe, 2011). Trabalhos com linhas celulares e organismos mutantes com diminuição da expressão de BubR1, nomeadamente ratinho, têm vindo a acrescentar informação acerca das funções desta proteína. Células de levedura em que foram induzidas mutações que inativam BUB1B permanecem viáveis. No entanto, desenvolvem-se mais lentamente e apresentam erros de segregação cromossómica e aneuploidia. De forma semelhante, trabalhos com fibroblastos de ratinho com níveis reduzidos de BubR1 indicam um elevado nível de aneuploidia, enquanto que os ratinhos em si apresentam uma marcada propensão para o desenvolvimento de tumores. Estes resultados estão em concordância com os obtidos em humanos com sub-expressão desta proteína. (Harris et al., 2005). A redução de expressão de BUB1B e/ou do nível da sua proteína tem vindo a ser associada a um conjunto de sintomas denominado de Síndrome de Separação Prematura das Cromátides Irmãs com Aneuploidia Variegada em Mosaico. Trata-se de uma condição autossómica recessiva rara, caracterizada por atraso no desenvolvimento psico-motor, microcefalia e elevada taxa de desenvolvimento de cancro nos primeiros anos de infância ou mesmo durante o desenvolvimento embrionário (Hanks et al., 2004). Cerca de 37% dos pacientes desenvolvem cancro nos primeiros 3 anos de vida (Suijkerbuijk et al., 2010). Adicionalmente, estes pacientes tendem a apresentar separação prematura das cromátides irmãs para todos os cromossomas, bem como mosaicismo para várias trissomias e monossomias. A pesquisa em famílias afetadas por esta condição revelou comprometimento das funções normalmente desempenhadas por BubR1, nomeadamente ao nível do checkpoint mitótico e do correto alinhamento cromossómico. Foram também detetadas mutações no gene em questão, causadoras de redução da quantidade de BubR1 disponível ou da perda de funcionalidade desta proteína (Suijkerbuijk et al., 2010). Embora muito provavelmente a ocorrência desta síndrome não possa ser atribuída exclusivamente às mutações de BUB1B, os dados existentes apontam no sentido de contribuírem maioritariamente para esta condição. Existem ainda trabalhos que relacionam a sub-expressão de BUB1B com fenótipos típicos de quadros de envelhecimento. Sabe-se também que os níveis de BubR1 diminuem com o envelhecimento cronológico. Assim, especula-se que este FCUP 27 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

gene esteja de alguma forma envolvido no controlo do envelhecimento precoce (Baker et al., 2013). A sobre-expressão de BUB1B, por sua vez, não reúne consenso no que diz respeito às consequências provocadas. Por um lado, seria de esperar um conjunto de efeitos semelhantes aos observados quando ocorre sobre-expressão de BUB1. Esta conjetura é apoiada por trabalhos na área da oncologia que evidenciam a existência de sobre-expressão de BUB1B em diversos tumores de constituição cromossómica aneuplóide, nomeadamente tumores do ovário, da mama, do estômago e da bexiga, entre outros. No entanto, segundo um trabalho recente de Baker et al., a sobre- expressão de BubR1 pode ter um papel protetor relativamente ao aparecimento de aneuploidia e cancro (Baker et al., 2013).

3.1.4. KIF2C

O gene KIF2C (Kinesin family member 2C), localizado em 1p34.1 (Figura 13), codifica a proteína Kif2c também designada por MCAK (mitotic centromere associated kinesin). Esta proteína é o membro melhor caraterizado da família cinesina-13 e foi identificada através da sua elevada homologia com a proteína Mcak já conhecida em hamster (Kim et al., 1997). As proteínas pertencentes a esta família são “motores moleculares” que despolimerizam microtúbulos através da remoção de unidades de tubulina na extremidade onde ocorre a polimerização. Kif2c, em particular, tem uma afinidade muito elevada para as extremidades dos microtúbulos, tendo a capacidade

de destabilizar cataliticamente ambas as extremidades a níveis semelhantes.

Fig.13 - Localização genómica do gene KIF2C (Retirado de http://www.genecards.org/cgi- bin/carddisp.pl?gene=KIF2C)

Esta proteína pode ser encontrada no citoplasma da maioria das células ao longo de todo o ciclo celular, havendo no entanto um considerável enriquecimento nas regiões dos cromossomas, cinetocoros e fuso durante a mitose. Atendendo a este facto, têm sido atribuídas a Kif2c funções na elaboração do fuso mitótico, na dinâmica dos microtúbulos e no movimento cromossómico no sentido da sua correta segregação (Sanhaji et al., 2011). A sobre-expressão de Kif2c está associada à diminuição de erros de segregação em linhas celulares cromossomicamente instáveis. Assim, pensa-se que FCUP 28 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

esta proteína recorre à sua atividade de despolimerizadora para desligar os microtúbulos dos cinetocoros e promover a reparação de ligações incorretas (Sanhaji et al., 2011). A inibição de Kif2c em mitose leva à acumulação de microtúbulos incorretamente ligados causando nomeadamente a ligação de um cinetocoro a ambos os polos, o que se designa por ligação merotélica. Por norma, este tipo de ligações incorretas não é detetado pelos mecanismos de controlo do SAC, o que torna a merotelia numa potencial causa de aneuploidia (Cimini et al., 2001, Salmon et al., 2005). Em concordância com este facto, a diminuição da atividade ou ausência de Kif2c não impede a progressão da divisão em células somáticas mas, em consequência, estas células apresentam problemas no alinhamento cromossómico em prometafase, atraso no movimento cromossómico em anafase e erros de segregação cromossómica (Sanhaji et al., 2011). A redução de kif2c pode também, de certa forma, estar relacionada com o efeito da idade materna no aumento da taxa de ovócitos aneuploides. Estudos de expressão génica em ovócitos de ratinho sugerem uma redução de quantidade de Kif2c à medida que a idade materna avança (Pan et al., 2008). A confirmar-se existe a possibilidade de que, devido à redução da proteína, exista uma redução da capacidade de Kif2c na reparação de ligações cinetocoro-microtúbulo incorretas, contribuindo assim para o aparecimento de ovócitos aneuplóides. No entanto, diversos trabalhos têm vindo a apontar no sentido de, apesar de Kif2C ser importante para o correto alinhamento cromossómico, a sua inibição não implicar necessariamente aumento na taxa de aneuploidias verificada (Illingworth et al., 2010, Vogt et al., 2010). Níveis baixos de Kif2c podem estar também implicados na ocorrência de separação prematura das cromátides-irmãs. Um estudo de Vogt e colaboradores sugere a possibilidade de esta proteína se acumular nos locais de conexão entre cromátides- irmãs, evitando que se formam ligações estáveis de microtúbulos aos seus cinetocoros, o que provocaria a sua separação prematura (Vogt et al., 2010). As evidências provenientes de trabalhos na área da oncologia permitem concluir que diferentes tipos de tumores estão associados a diferentes alterações da expressão de KIF2C. Este gene encontra-se sobre-expresso em tumores da mama (Shimo et al., 2008), gástricos (Nakamura et al., 2007), colo-retais (Ishikawa et al., 2008), entre outros. A expressão aumentada deste gene encontra-se ainda relacionada com prognósticos piores, nomeadamente com maior invasão de células tumorais nos tecidos circundantes, possibilidade aumentada de metástases e progressão acelerada da doença (Sanhaji et al., 2011). Estes dados indicam que existe desregulação de Kif2c em células tumorais, que culmina no desenvolvimento de FCUP 29 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

instabilidade cromossómica o que, aparentemente não é impeditivo da proliferação descontrolada deste tipo de células.

II. OBJETIVOS

FCUP 33 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

II. Objetivos

O objetivo global deste estudo consiste na avaliação da expressão de genes associados ao controlo do ciclo celular em produtos de abortamento de constituição cromossómica aneuplóide. Para tal foram estabelecidos três objetivos sequenciais: 1. Realização de uma base de dados com todos os produtos de abortamento com cariótipo aneuplóide para os cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 e 22, que foram estudados no Departamento de Genética FMUP, entre 2004 e 2012, e respetivo registo de dados clínicos. 2. Seleção de genes-alvo que, de acordo com a literatura, têm um papel relevante na segregação cromossómica; 3. Avaliação da expressão dos genes selecionados por Real-Time PCR, usando ensaios de expressão com sondas TaqMan. Adicionalmente, pretende-se também determinar a origem parental do cromossoma supranumerário em produtos de abortamento aneuplóides (Trissomias dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 e 22) e triplóides recorrendo à técnica de QF- PCR (Quantitative Fluorescense Polymerase Chain Reaction).

III. Metodologia

FCUP 37 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

III. Metodologia

1. Avaliação da expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

1.1.Obtenção e preparação das amostras biológicas

As amostras de produtos de abortamento (fragmentos ovulares, placenta ou tecido fetal) foram enviadas pelo Departamento de Obstetrícia/Ginecologia do Hospital São João para o Departamento de Genética FMUP/HSJ (Campos, 2008). O material foi dividido em duas partes, uma para realização de cultura celular e posterior análise de cariótipo e a restante armazenada em RNA later a -80ºC até à sua utilização. Após realização do cariótipo selecionaram-se 50 amostras com trissomia (quatro amostras com trissomia 13, sete com trissomia 15, onze com trissomia 16, dez com trissomia 18, onze com trissomia 21 e sete amostras com trissomia 22). Adicionalmente foram selecionados 30 controlos com cariótipo normal, provenientes de interrupções voluntárias de gravidez, com informação clínica de provável infeção ou abortamentos de causa materna.

1.2. Extração de RNA

As amostras selecionadas foram submetidas a um processo de desagregação mecânica (MiniLys, Bertin Technologies, França), seguindo-se a extração do RNA total pela técnica convencional do TriPure (Roche Diagnostics, Indianapolis, EUA) (Anexo I). Este reagente leva à disrupção da membrana celular e à desnaturação das nucleases endógenas. Com a adição de clorofórmio e subsequente centrifugação dá- se a separação da amostra em três fases: uma fase superior incolor, uma interfase branca e uma fase inferior vermelha, constituída por substâncias orgânicas. Transferindo a fase superior para um novo tubo é possível recuperar o RNA mediante precipitação com Isopropanol (Figura 14). O RNA total foi eluído em água livre de nucleases.

Fig.14 - Esquema das fases obtidas após adição de clorofórmio na extracção de RNA pelo método convencional do TriPure® FCUP 38 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

A concentração de RNA total extraído por amostra foi avaliada usando o Nanodrop 2000c (Thermo Scientific).

1.3. Síntese de cDNA

Para a síntese de cDNA, 500ng de RNA total foram sujeitos a transcrição reversa com primers aleatórios, usando o kit comercial qScript cDNA Supermix (Quanta BioSciences Inc., Gaithersburg, MD, EUA) de acordo com o protocolo fornecido pelo fabricante. As condições da PCR estão sumariadas na tabela 1.

Tabela 1: Condições da PCR de transcrição reversa

Temperatura (ºC) Tempo (min)

25,0 5,0

42,0 30,0

85,0 5,0

4,0 ∞

1.4. PCR quantitativo em tempo real

Analisaram-se os níveis de expressão de RNA dos quatro genes-alvo selecionados (BUB1, BUB1B, MAD2L2 e KIF2C) e de um gene housekeeping (GAPDH) por PCR quantitativo em tempo real utilizando o sistema StepOne Plus Real- Time PCR™ (Applied Biosystems, Foster City, EUA). Foram usados ensaios Taqman Gene Expression Assays (Sondas MGB, marcadas com o corante FAM; Applied Biosystems, Foster City, EUA) para cada gene: MAD2L2 (Hs01057448_m1), BUB1 (Hs01557701_m1), BUB1B (Hd01084828_m1) e KIF2C (Hs00901710_m1) e para o controlo GAPDH (Hs99999905_m1). As reações foram levadas a cabo num volume de 20µL, de acordo com o indicado na tabela 2, para cada gene. Foi construída uma reta padrão com diluições sucessivas para cada gene analisado (Doria et al., 2010).

FCUP 39 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Tabela 2: Componentes da reação de PCR quantitativo em tempo real

Componentes Volume (µL) por reacção

Mix do ensaio de expressão génica TaqMan® (20X) 1,0

Molde de Cdna 2,0

Água livre de RNAses 7,0

Master Mix TaqMan® Fast Universal PCR (2X), No AmpErase® UNG 10,0

Volume final 20,0

1.5. Análise dos resultados

A análise de resultados foi efetuada usando o software REST 2009 (Relative Expression Software Tool), que permite estimar variações da expressão génica, comparando duas populações: casos e controlos. Esta ferramenta considera ainda fatores como a eficiência da reação e normalização com genes de referência. O teste de hipótese P(H1) representa a probabilidade de a hipótese alternativa de que a diferença entre a amostra e os grupos de controlo se deve apenas ao acaso. A negatividade do PCR em tempo real é definida como a ausência de produto amplificado após 40 ciclos. O valor de significância foi estabelecido em P<0.05. Como o software REST usa para o cálculo os valores Ct e a eficiência da reação ao invés de valores relativos de expressão, assumiu-se que o valor do último ciclo de amplificação (Ct=40 ciclos) corresponde ao valor de ausência de expressão relativa (Doria et al., 2010).

FCUP 40 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

2. Avaliação da origem parental do cromossoma supranumerário em produtos de abortamento com trissomia dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 ou 22

2.1. Amostras Biológicas

Nas amostras de produtos fetais (fragmentos ovulares, placenta, tecido fetal, líquido amniótico, vilosidades coriónicas ou sangue do cordão umbilical) com indicação para estudo molecular procedeu-se à extração de DNA e análise da ploidia, pelas técnicas de MLPA ou QF-PCR. Após seleção das amostras com trissomia para os cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 e 22 e triploidia, procedeu-se ao contacto telefónico com os pais no sentido de aferir a sua disponibilidade para colaborar neste estudo. Nos casos em que a resposta foi afirmativa, foi obtido consentimento informado e procedeu-se à recolha do material biológico por esfregaço bucal (IsoHelix SK-1; Cell Projects Ltd, Kent, Inglaterra). Procedeu-se à secagem dos esfregaços bucais à temperatura ambiente e ao seu armazenamento até serem utilizados (não mais do que 72 horas). O procedimento de triagem das amostras biológicas a analisar encontra-se sumariado na Figura 15.

Amostras Aneuplóides e Triplóides

258

Trissomias dos Outras aneuploidias cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 e 22 e triploidias 74 184

Não puderam ser contactadas ou não Amostras analisadas aceitaram participar

164 20

Fig.15 - Processo de seleção das amostras fetais a analisar

FCUP 41 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

2.2. Extração de DNA

O DNA fetal foi extraído usando o kit comercial DNeasy® (Qiagen, Hilden, Alemanha), de acordo com o protocolo fornecido pelo fabricante. O DNA materno e paterno foi extraído a partir de esfregaços bucais recorrendo ao kit comercial JETquick Blood & Cell Culture DNA Spin Kit (Genomed, Löhne, Alemanha) e eluído em 50 µL de água estéril bidestilada. A concentração de DNA das amostras foi posteriormente quantificada usando um Nanodrop 2000c (Thermo Scientific). As amostras foram armazenadas a 4ºC até à sua utilização.

2.3. PCR quantitativo de fluorescência (QF-PCR)

As reações de QF-PCR foram realizadas usando uma mix de primers específica para os marcadores de cada trissomia em particular. Os pares de primers utilizados são compostos por um primer forward marcado com fluorescência e um primer reverse não marcado e estão sumariados na tabela 4. As condições de amplificação estão descritas na tabela 3.

Tabela 3: Condições de amplificação da QF-PCR.

Temperatura Tempo (min) Número de ciclos 95,0ºC 5,0 1 94,0ºC 0,48 35 58,0ºC 0.48 1 72,0ºC 1,0 1 72,0ºC 30,0 1

FCUP 42 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Tabela 4 : Primers utilizados para os diferentes Short Tandem Repeats

Primer Sequência Marcação D15S1028-F TGTCCTGAAATTCCCAAC VIC D15S1028-R GAACTGTGCTCTGTGCTC

D15S211-F AAAAGCCCCAGGTAGGG PET D15S211-R AAGCAGGTGGAATCCTTG

D15S1023-F GGTATTGTTTTGGACCACATCTTAG NED

Trissomia15 D15S1023-R GGGAGGCTGAGACAGTTTC

D15S125-F TTCCACACATGACCGC VIC D15S125-R CCCCTGAAGACCGTGA

D16S539-F GATCCCAAGCTCTTCCTCTT NED D16S539-R ACGTTTGTGTGTGCATCTGT

D16S753-F CAGGCTGAATGACAGAACAA VIC D16S753-R ATTGAAAACAACTCCGTCCA

D16S518-F GGCCTTTTGGCAGTCA PET

Trissomia16 D16S518-R ACCTTGGCCTCCCACC

D16S519-F AGCTTACCAGTCTCACAGGG NED D16S519-R AAACCATGCTTGTCTAGCC

D18S386-F TCAGGAGAATCACTTGGAAC PET D18S386-R TCCATGAAGTAGCTAAGCAG

D18S535-F TCATGTGACAAAAGCCACAC 6-FAM D18S535-R AGACAGAAATATAGATGAGAATGCA

D18S51-F GAGCCATGTTCATGCCACTG VIC

Trissomia18 D18S51-R CAAACCCGACTACCAGCAAC

D18S1002-F CAAAGAGTGAATGCTGTACAAACAGC 6-FAM D18S1002-R CAAGATGTGAGTGTGCTTTTCAGGAG

D21S11-F GTGAGTCAATTCCCCAAG NED D21S11-R GTTGTATTAGTCAATGTTCTCC

D21S1411-F ATGATGAATGCATAGATGGATG VIC D21S1411-R AATGTGTGTCCTTCCAGGC

D21S1412-F CGGAGGTTGCAGTGAGTTG NED

Trissomia21 D21S1412-R GGGAAGGCTATGGAGGAGA

D21S1437-F ATGTACATGTGTCTGGGAAGG 6-FAM D21S1437-R TTCTCTACATATTTACTGCCAACA

2.4. Eletroforese capilar

Para cada poço da placa de 96 poços utilizada foram pipetados 13,7 µL de formamida Hi-Di™ (Applied Biosystems) (agente desnaturante) e 0,3 µL de GeneScan™-600Liz™ (Applied Biosystems) (padrão interno), bem como 2 µL de produto de PCR. Posteriormente as amostras foram desnaturadas a 94ºC por 3 minutos, arrefecidas em gelo por 3 minutos e colocadas no sequenciador automático FCUP 43 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

ABI 3500 Genetic Analyzer (Applied Biosystems, Foster City, EUA) onde se deu a separação dos fragmentos marcados com fluorescência por electroforese capilar.

2.5. Análise dos resultados

A análise dos resultados foi realizada recorrendo ao software GeneMapper v4.1. (Applied Biosystems, Foster City, EUA). Esta ferramenta permite interpretar os picos de fluorescência detetados na eletroforese capilar (Figura 16). O software recorre ao tamanho do padrão incluído em cada amostra para criar uma reta-padrão. Por comparação com esta reta-padrão foi então determinado o tamanho relativo de cada fragmento marcado com fluorescência.

Fig.16 - Picos de fluorescência detetados pelo sequenciador automático ABI 3500 e analisados pelo software GeneMapper v4.1 para a amostra 9. O painel superior corresponde ao DNA fetal, sendo visíveis três picos de fluorescência. O painel intermédio corresponde ao DNA materno e o painel inferior ao DNA paterno, apresentando ambos dois picos de fluorescência.

IV. Resultados

FCUP 47 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

IV. Resultados

1. Avaliação da expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C em produtos de abortamento

No sentido de avaliar a expressão de quatro genes envolvidos no controlo do ciclo celular (MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C) em produtos de abortamento foi realizada uma reação de PCR quantitativa em tempo real em 50 amostras com trissomia dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 e 22 e em 30 controlos com cariótipo normal. As informações clínicas relativas às amostras encontram-se sistematizadas na tabela 5. O cálculo da média das idades maternas para cada trissomia em estudo foi indicativo de que a trissomia 18 teve a idade materna média mais elevada (39,1 anos), seguindo-se a trissomia 21 (37,1 anos), a trissomia 15 (36,3 anos) e a trissomia trissomia 13 (35,8 anos). Para as trissomias 13 e 18 foram obtidas as médias de idade materna mais baixas, 32,6 anos e 32,5 anos, respetivamente. Para a análise dos resultados da PCR quantitativa em tempo real usou-se o software REST 2009 e o gene GAPDH (gliceraldeído-3-fosfato desidrogenase) como gene de referência para a normalização. Os rácios de expressão génica foram calculados usando a fórmula:

Os resultados relativos à análise de todas as trissomias em estudo encontram- se sumariados na tabela 6. Para os genes MAD2L2 e KIF2C não se verificou alteração dos valores de expressão, comparativamente com o grupo controlo. No que diz respeito aos genes BUB1 e BUB1B foi possível detetar sobre-expressão relativamente aos valores obtidos para o grupo controlo (Tabela 6, Figura 17).

FCUP 48 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Tabela 5 : Informação clínica das amostras selecionadas e média das idades maternas para cada trissomia

Idade Gestacional Idade Materna Média da Idade

Nº Amostra (Semanas) (Anos) Materna (Anos)

A22 12 41 A23 ? 32 35,8 A26 ? 32

Trissomia13 A27 ? 38 A36 ? 29

A37 9 40

A38 ? 32 A39 ? 31 36,3

A40 9 42 Trissomia15 A41 ? 42 A42 8 38 A04 ? 33 A05 ? 33 A06 ? 29

A09 ? 31

A10 ? 36 A12 ? 25 32,6

A16 5 25 Trissomia16 A18 6 40 A19 10 38 A21 ? 35 A50 ? 34 A24 17 37 A25 ? 20 A28 15 43

A29 ? 39 A30 17 39 32,5 A31 9 31

Trissomia18 A32 13 36 A33 28 20 A34 13 31 A35 ? 29

FCUP 49 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

A01 ? 34 A02 12 42 A03 9 41

A07 ? 37

A08 18 35 A11 16 40 37,1

A13 ? 33 Trissomia21 A14 ? 37 A15 ? 35 A17 16 36 A20 18 38 A43 7 34

A44 ? 41

A45 8 37 39,1 A46 ? 41

A47 8 38 Trissomia22 A48 ? 42 A49 8 41

Tabela 6 : Valores normalizados de expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C considerando todas as trissomias em estudo.

Gene Expressão 95% C.I. P(H1) Resultado

MAD2L2 1,611 0,000 - 11.498,539 0,509 ↔

BUB1 3,826 0,003 - 29.981,105 0,036 ↑

BUB1B 4,023 0,000 - 78.430,260 0,042 ↑

KIF2C 3,353 0,001 - 29.582,351 0,068 ↔ (C.I.: Intervalo de confiança; P(H1): Probabilidade hipótese alternativa) FCUP 50 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Fig. 17- Diagramas de extremos-e-quartis dos valores normalizados para os genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C; As caixas representam o intervalo interquartil. A linha tracejada representa a mediana dos valores de expressão. Os extremos representam os valores máximos e mínimos observados.

Tendo em conta a localização do gene BUB1B no cromossoma 15, optou-se por realizar uma segunda análise com o software REST 2009 excluindo as sete amostras com trissomia para o cromossoma 15, no sentido de avaliar se a sobre- expressão detetada para este gene estaria relacionada com a presença de uma cópia supranumerária do gene BUB1B. Os resultados obtidos mostram que, excluindo as amostras com trissomia do cromossoma 15, existe sobre-expressão de BUB1 nas amostras quando comparadas com os controlos. Para os restantes genes testados, incluindo BUB1B, não foram detetadas alterações dos níveis de expressão estatisticamente significativas (Tabela 7, Figura 18).

Tabela 7 : Valores normalizados de expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C, excluindo a trissomia 15.

Gene Expressão 95% C.I. P(H1) Resultado

MAD2L2 1,948 0,000 - 12.210,700 0,380 ↔

BUB1 4,235 0,003 - 34.634,942 0,046 ↑

BUB1B 4,006 0,001 - 83.988,820 0,072 ↔

KIF2C 3,495 0,001 - 30.955,781 0,080 ↔ FCUP 51 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Fig. 18- Diagramas de extremos-e-quartis dos valores normalizados para os genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C excluindo as amostras com trissomia 15; As caixas representam o intervalo interquartil. A linha tracejada representa a mediana dos valores de expressão. Os extremos representam os valores máximos e mínimos observados.

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2. Avaliação da origem parental do cromossoma supranumerário em produtos de abortamento com trissomia dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 ou 22

Com o objetivo de determinar a origem parental do cromossoma supranumerário ou, no caso da triploidia, do complemento cromossómico adicional, foi aplicada a técnica de QF-PCR a vinte amostras de produtos de abortamento. Os resultados obtidos, bem como os dados relativos à idade materna e idade gestacional na altura do abortamento encontram-se sistematizados na tabela 8.

Tabela 8: Dados clínicos e resultado obtido com a técnica QF-PCR.

Idade Idade Materna Idade Materna Amostra Origem parental Gestacional (Anos) Média (Anos) (Semanas) 01 Materna ? 42 Trissomia 15 02 Materna ? 32 35,3 03 Materna ? 32 04 Materna 9 29 05 inconclusiva ? 34 Trissomia 16 33,5 06 Materna ? 31 07 Materna 6 40 08 Materna ? 40 09 Materna ? 20 Trissomia 18 33,8 10 Materna 17 37 11 Materna 12 38 12 Materna ? 33 13 Materna 9 41 Trissomia 21 14 Materna 16 35 38,2 15 Materna 18 38 16 Materna 17 44 17 Materna ? 32 18 Paterna 8 27 Triploidia 32,0 19 Materna 12 31 20 Materna 21 38

V. Discussão

FCUP 55 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

V. Discussão

1. Avaliação da expressão génica de MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C em produtos de abortamento

A necessidade de manter um genoma euplóide equilibrado é uma condição essencial para o sucesso de todos os organismos multicelulares. A divisão celular, absolutamente necessária para a reprodução e desenvolvimento dos organismos superiores é um processo extremamente complexo e, apesar de ser altamente regulado, está sujeito à ocorrência de erros. Se, por algum motivo, este mecanismo falhar, as células-filhas resultantes podem herdar um complemento cromossómico anormal, condição denominada como aneuploidia. Se a aneuploidia tiver sido originada no processo meiótico aquando da formação de gâmetas ou nas primeiras divisões mitóticas de um embrião, denomina-se aneuploidia constitucional. São exemplos deste tipo de aneuploidia as trissomias 13, 18 e 21, responsáveis pelos síndromes de Patau, Edwards e Down, respetivamente. No entanto, a aneuploidia também pode surgir numa célula ou população de células somáticas diferenciadas, designando-se neste caso como aneuploidia adquirida (Jackson-Cook, 2011). Diversos trabalhos indicam que a aneuploidia tem efeitos prejudiciais no desenvolvimento humano, o que é ilustrado pelo efeito letal ainda em período embriogénico bem como pelo severo fenótipo associado às raras aneuploidias compatíveis com a sobrevivência em humanos (Siegel & Amon, 2012, Sheltzer & Amon, 2011). Também em organismos modelo como leveduras e ratinho é possível verificar efeitos deletérios associados à alteração do complemento cromossómico (Torres et al., 2008). Adicionalmente, estes efeitos foram também comprovados ao nível celular, tendo sido verificado que células aneuplóides têm taxas de proliferação consideravelmente inferiores quando comparadas com células semelhantes, mas com complemento cromossómico normal, em condições padronizadas de crescimento (Sheltzer & Amon, 2011). No entanto, estes dados parecem estar em desacordo com as evidências que têm vindo a surgir de que um elevado número de tumores tem cariótipo aneuplóide. A aneuploidia, de facto, tem vindo a ser apontada como uma das principais características da maioria dos tumores sólidos e de cerca de metade dos processos oncológicos hematopoiéticos (Pariente, 2012). Trabalhos na área da oncologia têm vindo a evidenciar que em determinados tumores a aneuploidia adquirida é transmitida de forma estável ao longo das divisões celulares subsequentes. No entanto, mais frequentemente, o complemento cromossómico tem FCUP 56 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

tendência a sofrer alterações rápidas ao longo das sucessivas divisões celulares, sugerindo a existência de defeitos na capacidade das células replicarem ou segregarem corretamente os seus cromossomas (King, 2008). Este fenómeno é designado como instabilidade cromossómica (CIN, do inglês chromosomal instability) e tem vindo a ser descrito em numerosos processos oncológicos na espécie humana (Yuen & Desai, 2008). No seguimento destas evidências, Thompson e Compton realizaram a medição direta das taxas de erro de segregação em linhas celulares derivadas de tumores com instabilidade cromossómica. Esta análise revelou que, em média, estas células falham na correta segregação de um cromossoma a cada uma a cinco divisões celulares (Thompson & Compton, 2008). Algumas evidências apontam no sentido de, ao contrário do que se verifica nos casos de aneuploidia estável, a CIN não acarretar diminuição da proliferação celular (Zasadil et al., 2013). Existem diversos mecanismos que podem estar na origem da CIN, nomeadamente defeitos na coesão cromossómica ou no SAC, número incorreto de centrossomas, alteração da dinâmica das ligações cinetocoro-microtúbulo e desregulação do ciclo celular (Thompson et al., 2010). Muito embora a maioria das situações de CIN derive provavelmente de centrossomas em número anormalmente elevado (Vitre & Cleveland, 2012), a contribuição da alteração da atividade do SAC não deve ser ignorada. A relação entre a aneuploidia constitucional e a instabilidade cromossómica não está bem definida. No entanto, o aumento da prevalência de determinados tipos de cancro com instabilidade cromossómica em pacientes com trissomias sugere a existência de algum tipo de ligação entre estes dois fenómenos (Ganmore et al., 2009). Um dos objetivos deste trabalho consistiu na avaliação do nível de expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C em produtos de abortamento aneuplóides através da técnica de PCR quantitativa em tempo real. Trata-se de genes envolvidos no mecanismo de checkpoint meiótico e mitótico e, particularmente no caso de KIF2C, na monitorização da ligação entre cinetocoros e microtúbulos, mecanismos essenciais para a correta divisão celular. Assim sendo, e atendendo à possível contribuição de alterações no SAC para o desenvolvimento de CIN, equacionou-se a hipótese de existirem alterações na expressão destes genes comparativamente a amostras de produtos de abortamento de constituição cromossómica normal. Os resultados obtidos neste trabalho indicam que, quando consideradas as seis trissomias, dois dos genes estudados, BUB1 e BUB1B, se encontram sobre- expressos nas amostras. Para os genes MAD2L2 e KIF2C não foram detectadas diferenças significativas entre as amostras e os controlos (Tabela 6, Figura 17). FCUP 57 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

A proteína Bub1, codificada pelo gene BUB1, tem um papel crucial no SAC, participando não só no recrutamento de outras proteínas fundamentais como também de forma mais direta no adiamento da progressão para anafase em situações em que o mecanismo de checkpoint não foi satisfeito. A maioria dos trabalhos acerca de BUB1 foca os efeitos da sua sub-expressão, nomeadamente no que diz respeito à redução dos níveis ou da funcionalidade da proteína Bub1, associando-os ao desenvolvimento de processos tumorais e produção de gâmetas haplóides. Os efeitos da sobre- expressão deste gene não têm sido tão visados pela investigação, pelo que não se encontram bem documentados. Em leveduras, Warren et al. demonstraram que a sobre-expressão de BUB1 provoca instabilidade cromossómica, levando à diminuição da competência dos mecanismos de checkpoint e ao aumento da taxa de erros de segregação cromossómica (Warren et al., 2002). Em ratinhos mutantes usados como modelo de cancro da próstata foi também detetada a sobre-expressão deste gene, estando associada ao desenvolvimento de instabilidade cromossómica (Guo et al., 2006). Na espécie humana, sabe-se que existe sobre-expressão de BUB1 em determinados tipos de cancro, nomeadamente gástricos (Grabsch et al., 2003), da mama (Yuan et al., 2006), e linfomas (Alizadeh et al., 2000). Segundo um trabalho de Ricke et al, a sobre-expressão de BUB1 pode ser potenciadora do desenvolvimento de neoplasias de constituição cromossómica aneuplóide por promover erros de segregação cromossómica (Ricke et al., 2011, Ricke & van Deursen, 2011) e, consequentemente, CIN. Atendendo ao seu papel protetor da coesão das cromátides- irmãs (Marchetti & Venkatachalam, 2010), é possível especular que em níveis demasiados elevados, a proteína Bub1 possa atuar atrasando esta separação, culminando num aumento da taxa de aneuploidia nas células-filhas. Relativamente ao gene BUB1B, sabe-se que codifica uma das proteínas cruciais tanto para o funcionamento do SAC, como para a estabilização da ligação dos cinetocoros aos microtúbulos, contribuindo assim para a correta segregação cromossómica (Hanks et al., 2004). A sub-expressão deste gene durante o processo meiótico, à semelhança do que foi descrito para BUB1, tem vindo a ser associada com o desenvolvimento de gâmetas aneuplóides e, consequentemente contribuindo para o aparecimento de aneuploidias constitutivas. Durante a mitose, a redução da expressão de BUB1B relaciona-se com o desenvolvimento de processos tumorais associados a instabilidade cromossómica e prognósticos clínicos pouco favoráveis. Mutações conducentes a expressão reduzida de BUB1B estão ainda implicadas na origem de uma doença rara denominada Síndrome de separação prematura das cromátides- irmãs com aneuploidia variegada em mosaico. Esta condição caracteriza-se por uma elevada instabilidade cromossómica que conduz ao aparecimento de várias FCUP 58 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

aneuploidias em mosaico que, por sua vez, parecem relacionar-se com a elevada prevalência de diversos tipos de cancro nos primeiros anos de vida ou ainda durante o desenvolvimento fetal. Por sua vez, diversos trabalhos indicam que a sobre-expressão deste gene também se correlaciona com determinados tipos de cancro, nomeadamente da tiróide (Wada et al., 2008), rim (Pinto et al., 2008), mama (Maciejczyk et al., 2013) e bexiga (Yamamoto et al., 2007), bem como linfomas (Chen et al., 2013) e neoplasias gástricas (Grabsch et al., 2003, Ando et al., 2010)., associados a instabilidade cromossómica. Por oposição, um trabalho recente de Baker et al refere que a sobre-expressão de BUB1B em ratinhos transgénicos tem um papel protetor relativamente ao surgimento de aneuploidia adquirida e de cancro. Os autores sugerem que o aumento da expressão deste gene reforça a actividade de vigilância do SAC, reduzindo assim a incidência de instabilidade cromossómica. Outra hipótese sugerida no trabalho em questão é a influência desta sobre-expressão em mecanismos pós-zigóticos em que BubR1 também intervém, nomeadamente morfogénese e diferenciação (Baker et al., 2013). Estes resultados parecem colidir com as evidências que associam a sobre-expressão de BUB1B ao desenvolvimento de processos tumorais. Uma explicação possível é que a sobre-expressão de BUB1B tenha um papel protector até um determinado limiar, a partir do qual os seus efeitos passam a ser deletérios. A sobre-expressão de ambos os genes tem vindo a ser associada ao desenvolvimento de processos tumorais relacionados com cariótipos aneuplóides, ou seja, a aneuploidias adquiridas. Até à data, este é o único trabalho a indicar a sobre- expressão destes genes em produtos de abortamento com diferentes trissomias constitucionais. Estes resultados podem permitir, em parte, estabelecer um paralelismo entre as aneuploidias adquiridas e as aneuploidias constitucionais, nomeadamente no que diz respeito à instabilidade cromossómica. Como foi descrito anteriormente, diversos trabalhos associam a desregulação de BUB1 e BUB1B ao desenvolvimento de tumores aneuplóides com instabilidade cromossómica. No caso das aneuploidias constitucionais, a sobre-expressão detetada pode, pelo menos em certa medida, ser responsável pelo aumento da prevalência de determinados tipos de cancro em pacientes com síndromes associados à alteração do complemento cromossómico, cujo exemplo paradigmático é a síndrome de Down. Os resultados obtidos na análise em que foram excluídas as amostras com trissomia do cromossoma 15 continuam a indicar a existência de sobre-expressão de BUB1. No entanto, para BUB1B já não se verifica o aumento de expressão (Tabela 7, Figura 18). A discrepância de resultados entre as duas análises realizadas parece suportar a hipótese de que a sobre-expressão detetada para BUB1B na análise global FCUP 59 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

se poderá dever à presença de uma terceira cópia do gene em questão nas amostras com trissomia 15. Embora o aumento da expressão de BUB1 e BUB1B seja significativo do ponto de vista estatístico, não se tratam de diferenças muito pronunciadas. Assim, existe a hipótese de o aumento de expressão verificado se tratar de um mecanismo para tentar colmatar uma eventual perda de função do SAC. Importa também salientar que o facto de o gene BUB1B se localizar no cromossoma 15 e de este trabalho ter incluído sete casos de trissomia 15, o que pode ter influenciado os resultados obtidos. Por outro lado, os níveis elevados de mRNA detetados podem não se traduzir em efeitos ao nível da quantidade e/ou funcionalidade da proteína. Assim, como perspectivas futuras, seria importante analisar a funcionalidade e quantidade das proteínas Bub1 e BubR1, no sentido de confirmar os resultados obtidos através da quantificação relativa de mRNA. Seria também importante analisar o nível de expressão génica para cada trissomia em particular, sendo para isso necessário aumentar a dimensão da amostra para se obterem resultados representativos.

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2. Avaliação da origem parental do cromossoma supranumerário em produtos de abortamento com trissomia dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 ou 22

Apesar de na triagem inicial terem sido selecionadas 184 amostras de produtos de abortamento com trissomia dos cromossomas 13, 15, 16, 18, 21 e 22 e triploidia, apenas 20 casais acederam a colaborar com este estudo (Figura 15). Esta reduzida adesão poderá estar relacionada com a carga emocional que um abortamento acarreta. Segundo um estudo conduzido por Adolfsson et al., que consistiu na realização de entrevistas periódicas a mulheres que experienciaram abortamentos, os principais sentimentos envolvidos são o luto, a depressão, a revolta e impotência face ao sucedido (Adolfsson et al., 2004). A maioria dos trabalhos relacionados com o impacto psicológico de um abortamento foca-se na mãe. No entanto, a maioria dos pais também experiencia sentimentos de perda, ansiedade e impotência após um abortamento (Conway & Russell, 2000). Um abortamento pode também ser um fator gerador de tensão no casal, estando registado um ligeiro aumento de separações e divórcios em casais com pelo menos um abortamento, comparativamente com casais que não foram sujeitos a esta condicionante (Gold et al., 2010). Assim, no entender de alguns casais, a participação neste estudo podia de certa forma reavivar a memória desse acontecimento traumático, tendo optado por não participar. Embora a reduzida dimensão da amostra não permita que sejam tiradas conclusões com relevância estatística, é possível observar que a grande maioria das aneuploidias analisadas deriva de erros de origem materna (Tabela 8). Esta tendência está de acordo com o referido na literatura. Relativamente à trissomia 15, embora não seja muito comum, estando presente apenas em cerca de 1,4% dos abortamentos espontâneos, existem trabalhos publicados que indicam uma elevada prevalência da origem materna do cromossoma supranumerário (Zaragoza et al., 1994). Trabalhos relacionados com as síndromes de Prader-Willi e Angelman focando dissomias monoparentais fornecem mais informações acerca da contribuição materna para esta aneuploidia. Assim, sabe-se que em cerca de 73% das trissomias 15 de origem materna a não-disjunção ocorre na meiose I, em 12% dos casos o erro ocorre em meiose II e os restantes 15% são atribuídos a mecanismos pós-zigóticos, também eles com origem materna (Robinson et al., 1996). Neste trabalho foram analisados apenas três casos de trissomia 15, tendo todos eles origem materna, o que está de acordo com o descrito na literatura. FCUP 61 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

A trissomia 16 é a aneuploidia mais comum nas conceções humanas, embora seja incompatível com a vida, exceto quando em mosaico. Segundo vários estudos visando a origem parental e meiótica desta condição, praticamente todos os casos descritos têm origem na primeira divisão meiótica materna. Este padrão de não- disjunção é específico para este cromossoma e ainda não foi devidamente elucidado. Existem evidências que apontam no sentido de este padrão de não disjunção derivar de configurações anormais dos locais de crossing-over (Garcia-Cruz et al., 2010). Os resultados obtidos neste trabalho estão enquadrados com os anteriormente descritos, uma vez que três das trissomias 16 analisadas derivaram de erros de disjunção materna. A origem parental da quarta amostra analisada foi inconclusiva pois os pais eram homozigóticos para os marcadores testados. Quanto ao efeito da idade materna, os casos descritos em trabalhos anteriores referem que a trissomia 16 é transversal a todas as idades maternas. O aumento da idade materna relaciona-se com o aumento da incidência de trissomia 16 de forma muito menos acentuada do que o que se verifica com outras trissomias. A média de idade materna das amostras incluídas neste trabalho foi de 33,5 anos, sendo a segunda mais baixa do conjunto de cinco alterações cromossómicas numéricas analisadas, estando assim de acordo com o que foi previamente descrito. No que diz respeito à trissomia 18, os resultados obtidos neste trabalho vão de encontro aos descritos em publicações anteriores, segundo as quais cerca de 91% dos casos derivam de erros de não-disjunção materna, 31% dos quais devido a erros na meiose I, 60% devido a mecanismos de não-disjunção em meiose II e cerca de 8% devido a erros mitóticos que levaram à duplicação do cromossoma materno (Nicolaidis & Petersen, 1998). Nas quatro amostras analisadas, a aneuploidia foi associada a origem materna. A média da idade materna foi de 33,8 anos, estando de acordo com trabalhos que indicam um aumento da prevalência desta condição quando a idade materna ultrapassa os 30 anos (Savva et al., 2010). A trissomia 21, mecanismo responsável pela maioria dos casos de síndrome de Down, tem sido detalhadamente estudada ao longo das últimas décadas. Os resultados provenientes destes trabalhos indicam que, na maioria dos casos, o cromossoma supranumerário tem origem materna, contribuindo para aproximadamente 90% do total. De entre estes casos, três em cada quatro terão resultado de erros de disjunção em meiose I. Mecanismos de não disjunção na meiose paterna são responsáveis por cerca de 8% do total de casos, dividindo-se de forma praticamente equitativa entre não disjunção em meiose I ou em meiose II. Erros de disjunção nas divisões pós-zigóticas estão na base de uma minoria de 2% do total de casos. Relativamente à idade materna média, os resultados provenientes da literatura FCUP 62 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

mostram que é mais elevada nos casos de origem materna (cerca de 32 anos), não havendo diferenças significativas entre meiose I e meiose II. Nos casos com origem paterna ou pós-zigótica a média de idade materna é semelhante (aproximadamente 28 anos) (Hassold & Sherman, 2000). Neste trabalho foram analisados cinco casos de trissomia 21, tendo todos eles origem materna. A média da idade materna foi de 38,2 anos, o que está de acordo com a relação amplamente descrita entre esta condição e a idade materna avançada. Das aneuploidias analisadas, a trissomia 21 apresentou a idade materna média mais elevada. A origem parental da triploidia permanece de certa forma controversa. Estudos citogenéticos antigos indicavam que a maioria das triploidias teria origem paterna, nomeadamente devido a mecanismos de dispermia. Trabalhos mais recentes, baseados na análise de microssatélites indicam uma prevalência da origem materna. Esta discrepância pode dever-se a diferenças nas populações em estudo. Segundo Zaragoza et al., a dispermia é a principal responsável pela ocorrência de triploidias detectadas em amostras de idade gestacional de 5-18 semanas. Fetos com triploidia de origem materna têm tendência a abortar mais precocemente ou, caso resistam às primeiras semanas de gestação, tipicamente resultam em abortamentos tardios, de fetos já consideravelmente desenvolvidos (Zaragoza et al., 2000). No que diz respeito à triploidia, os resultados obtidos neste trabalho não estão de acordo com o padrão descrito anteriormente. No entanto, foram analisadas apenas quatro amostras sendo que para uma delas não foi possível obter informação relativa à idade gestacional. Assim sendo, esta discrepância pode ser motivada por um enviesamento dos resultados deste estudo, motivado pela reduzida dimensão da amostra que pode não ser representativa da população.

VI. Conclusão

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VI. Conclusão

Em conclusão, devido ao elevado impacto clínico da aneuploidia, é importante conhecer detalhadamente os mecanismos que estão na sua origem e na origem dos fenótipos a si associados. Relativamente à análise da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C em produtos de abortamento de constituição cromossómica aneuplóide, os resultados obtidos permitem equacionar a existência de uma relação entre a aneuploidia constitucional e a instabilidade cromossómica, estabelecendo-se, de certa forma, um paralelismo com a aneuploidia adquirida. No que diz respeito ao estudo da origem parental do cromossoma supranumerário em produtos de abortamento com trissomias, a reduzida dimensão da amostra não permitiu conclusões significativas. Embora os resultados obtidos estejam de acordo com o referido na literatura, é necessário aumentar a dimensão da amostra. Assim, de forma geral, os resultados obtidos neste trabalho contribuíram para aumentar o conhecimento na área da aneuploida, particularmente no que diz respeito à aneuploida em produtos de abortamento.

VII. Referências Bibliográficas

FCUP 69 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

VIII. Referências Bibliográficas

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Anexos

FCUP 79 Estudo de produtos de abortamento: Avaliação da expressão dos genes MAD2L2, BUB1, BUB1B e KIF2C

Anexo I

Extração de RNA – Método Clássico do Trizol

1. Em gelo, distribuir 1 mL de solução de extracção de RNA (TriPure®, Roche Diagnostics, Indianapolis, EUA ) pelos tubos com esferas. 2. Selecionar um pequeno fragmento de tecido e triturá-lo em placa de Petri, com o auxílio de lâminas de bisturi. 3. Colocar no Minilys (Bertin Technologies, França) durante 10 segundos à velocidade máxima (se o tecido não ficar devidamente homogeneizado, repetir este passo). 4. Incubar durante 5 minutos à temperatura ambiente. 5. Transferir para um eppendorf livre de nucleases com o auxílio da P1000. 6. Adicionar 200 µL de clorofórmio. 7. Agitar bem (Vórtex – 15’’). 8. Incubar 3 min à temperatura ambiente. 9. Centrifugar 15 min., 4ºC, 10600rpm. 10. Transferir o sobrenadante (fase superior) obtido em 9 para um eppendorf livre de nucleases. 11. Adicionar lentamente 500µL de isopropanol e homogeneizar, invertendo várias vezes o eppendorf. 12. Incubar 10 min à temperatura ambiente para o RNA precipitar. 13. Centrifugar 10 min, 4ºC, 10600rpm. 14. Descartar cuidadosamente o sobrenadante, sem perturbar a pellet. 15. Adicionar 1mL de etanol a 75% e lavar a pellet utilizando o vórtex (a pellet deve destacar da parede do eppendorf). 16. Centrifugar durante 5 min., 4ºC, 8400rpm. 17. Descartar cuidadosamente o sobrenadante, sem perturbar a pellet. 18. Secar a pellet ao ar, à temp. ambiente.

19. Ressuspender a pellet em 30-200µL de RNA Storage Solution ou H2O estéril livre de nucleases.

Deixar em gelo durante 30 min e guardar a -80ºC.