André Diniz • Juliana Lins SUPLEMENTO DIDÁTICO

Elaborado por André Diniz (doutorando em Literatura Brasileira na PUC-RJ, professor de Música e História em universidades e escolas do e autor de livros sobre a história do ) e Juliana Lins (roteirista e tradutora).

RIO DE JANEIRO, CAPITAL CULTURAL DO PAÍS

apital do Império e depois da Repúbli- Esses migrantes passaram a conviver com ca, o Rio de Janeiro viveu um crescimen- as transformações “modernizantes”, planejadas C to vertiginoso em seus índices demográ- e realizadas em escala federal e municipal nas ficos no último quartel do século XIX. No iní- diversas áreas da cidade. Era preciso civilizar o cio da década de 1890 a cidade tinha mais de Rio de Janeiro, deixar para o passado as feições meio milhão de habitantes, dos quais apenas a coloniais, com ruelas, saneamento precário, ba- metade naturais; os demais vinham de outras tuques africanos nas ruas, doenças contagiosas, províncias, como Bahia, Minas Gerais, Pernam- cortiços e sujeiras, que reduziam a bela nature- buco e São Paulo. O Rio consolidava-se como o za tropical a um mero detalhe. Assim pensava epicentro político, social e cultural do país, atra- a elite da época, sempre tomando como para- indo milhares de pessoas. digma a civilização européia. Todas queriam uma oportunidade de traba- Mesmo reconhecendo a premência de refor- lho na capital, fugindo do ar atrasado do cam- mas urbanísticas e higiênicas, visto que a falta po ou das pequenas províncias. Eram sobretu- de moradia decente para a população e a con- do negros libertos e mesmo, antes de 1888, es- vivência desta com toda sorte de lixos expostos cravos fugidos. O Rio se viu repleto de artistas, nas ruas causava a morte de milhares de pesso- que acabavam se dedicando aos saraus, às fes- as, é preciso separar o joio do trigo. A tentativa tas familiares e aos bailes populares ou ingres- de “civilizar” a capital da República, abrindo sando nas bandas de música para sobreviver em grandes avenidas, destruindo os cortiços, ex- ambiente muitas vezes inóspito. tirpando a febre amarela e a varíola, expôs aos

1 olhos de todos uma política governamental ex- música popular. As novidades industriais, como tremamente elitista. Modernizar, para a elite da o gramofone, possibilitaram que as pessoas ou- década de 1910, era retirar do centro da cidade vissem música em casa e sem a até então ne- todos os traços de africanidade e de pobreza, cessária presença de músicos. O telefone, o bon- empurrando a população que os representava de elétrico e o automóvel encurtaram os espa- para as favelas e subúrbios. A modernização do ços urbanos e redimensionaram o olhar do ca- Rio caminhava lado a lado com a construção rioca sobre a cidade. moderna da exclusão social. Com o advento da radiodifusão, todas as ex- No aspecto cultural, a cidade viu surgir, nos periências musicais acumuladas na cidade do primeiros anos do século XX, diversos espaços Rio de Janeiro vão, de um forma ou de outra, se de entretenimento, como resultado do cresci- fazer presentes. A musicalidade dos migrantes, mento das camadas médias urbanas. Os grupos com seus ritmos regionais, o choro das cama- de choro, as bandas de música e os sesteiros das simples, o da Cidade Nova, o sam- diminuíram seu papel de principais divulga- ba dos recém-ocupados morros são “exporta- dores da música popular. As reformas no cen- dos” para todo o país, como um exemplo da tro da cidade reorganizaram o lazer do carioca força do primeiro veículo de comunicação de com seus novos teatros, suas salas de cinema massa. A partir de 1930 os milhões de ouvintes (“cines”) e seus bares com música (cafés-can- das rádios cariocas ficaram definitivamente tantes), tudo isso tendo como endereço a pri- atrelados a um padrão de cultura formulado meira avenida, chamada de Central. segundo os interesses da capital federal. Não é As descobertas tecnológicas também influ- à toa que o é elevado a gênero musical enciaram na vida do carioca e na divulgação da da sociedade brasileira.

PIXINGUINHA, O MAIOR REPRESENTANTE DA MÚSICA DO POVO

A música popular brasileira é resultado da Esses grupos de instrumentistas populares confluência cultural de três etnias: o índio, o executavam, ao sabor da cultura afro-carioca, branco e o negro. Como manifestação cultural os gêneros europeus mais em voga. O jeito de mais sintomática, deu sinal de vida, ao final do frasear foi cultuando nos cavaquinhos, violões século XVIII, nos principais centros urbanos da e flautas a base do choro, os primeiros passos colônia, notadamente Rio de Janeiro e Bahia, de nossa musicalidade. Os grupos de choro to- entoada por homens simples que cantavam mo- cavam em todos os cantos da cidade: nas casas dinhas e lundus ao violão. simples, da classe média e nos saraus da elite Os chorões, nome que se dá aos músicos que imperial. Os chorões foram os principais divul- tocam choro, surgiram na sociedade carioca em gadores da música do povo até o início do sé- torno de 1870. A palavra choro resultou da “coli- culo XX, quando primeiro as bandas de música são cultural” entre “choro”, de chorar, e chorus, e o teatro de revista, e posteriormente o rádio, igual a “coro”, em latim. No início o termo desig- passaram a cumprir esse papel. nava o conjunto musical e as festas em que esses O flautista Joaquim Antônio Callado (1848-80), conjuntos se apresentavam, mas na década de considerado o pai dos chorões, os pianistas Er- 1910 já se usava o vocábulo choro para falar de nesto Nazaré (1863-1934) e Chiquinha Gonza- um gênero consolidado. Hoje a palavra tanto pode ga (1847-1935) e o maestro Anacleto de Medei- ser usada nessa acepção como para designar um ros (1866-1907), fundador da Banda do Corpo repertório de músicas que inclui vários ritmos. de Bombeiros do Rio de Janeiro, compuseram

2 quadrilhas, polcas, tangos, maxixes, xotes e finada. Os chorões sempre foram os melhores marchas, fundando o que seriam os pilares do instrumentistas da MPB: Dino Sete Cordas, os choro e da música popular carioca da virada bandolistas e Luperce Mi- do século XIX. randa, os violonistas Meira e Raphael Rabello, Pixinguinha herdou toda essa tradição mu- os clarinetistas Abel Ferreira e Paulo Moura, o sical. E foi além. Firmou o choro como gênero trompetista Raul de Barros e Zé da Velha, o ca- musical, elevou o virtuosismo flautístico ao vaquinista Waldir Azevedo são alguns exem- máximo e organizou vários grupos musicais; plos de músicos que ficarão para sempre em como arranjador, deu identidade à música po- nossa história musical. pular da primeira metade do século XX e foi, Não existe um grande compositor brasilei- disparado, o maior compositor de choro de to- ro que não tenha composto choro: Chico Buar- dos os tempos. E ninguém há de falar mal do que, Edu Lobo, Tom Jobim, Caetano Velloso, homem Pixinguinha: “Pixinguinha é o melhor Sivuca; até o roqueiro Raul Seixas, com seu ser humano que eu conheço. E olha que o que Sessão das dez, contribuiu para o gênero. O eu conheço gente não é fácil”, não cansava de choro é nosso ritmo mais nacional, tocado em dizer o poeta , parceiro do todos os cantos do país, cultivado em clubes, chorão em Lamento. quintais, bares e teatros; é “a alma musical do Com mais de cem anos de vida, o choro brasileiro”, segundo Villa-Lobos. E Pixinguinha constitui-se em nossa música popular mais re- é a sua maior expressão!

SUGESTÃO DE ATIVIDADE

Projeto interdisciplinar: des transformações “modernizantes”. Como “Pixinguinha em cartaz” o teatro de revista teve seu berço na Praça Tiradentes, o professor de Geografia terá Tempo: Um a dois bimestres oportunidade de retratar com imagens o Estratégia: Após o estudo da vida de Pixin- passado e o presente da praça. guinha, divida a turma em grupos e organize uma pequena peça de teatro de revista. Os te- Outras Sugestões de mas mais importantes do livro e as músicas de Pixinguinha devem fazer parte do roteiro Trabalhos Interdisciplinares de trabalho. Auto-retrato Eu também nasci chorando O projeto é interdisciplinar; assim, os Como todo mundo nasce professores de Literatura podem ajudar na E embora a chorar vivesse confecção dos textos, os de Teatro partici- Não chorei o que bastasse par da construção da linguagem cênica e os de Artes elaborar o cenário e vestuário No choro a vida passei da montagem. Caso a escola tenha profes- Com prazer e na labuta sor de Dança, ou mesmo de Educação Físi- Sustentei mulher e filho ca, este pode ficar encarregado de orientar Chorando fiz-me um batuta os alunos a desenvolver uma coreografia te- mática. Os professores de História podem Chorei muito choro alheio apresentar um panorama da sociedade ca- Toquei maxixe e marchinha rioca do período áureo do teatro de revista, Alfredo sou por batismo entre 1890 e 1930, etapa marcada por gran- Mas no choro Pixinguinha

3 Fiz música, fui maestro PAINEL INFORMATIVO Fui Ingênuo, Carinhoso Soprei meu triste Lamento “Foi um verdadeiro escândalo, quando, há E o meu riso mais gostoso uns quatro anos, os ‘oito batutas’ apareceram. Eram músicos brasileiros que vinham cantar nossas coisas brasileiras! Isso em plena Ave- E assim o ciclo se fecha nida [antiga Central e atual Rio Branco], em Pois cumpri o meu papel pleno almofadismo, no meio de todos esses Pintei o choro na terra meninos anêmicos, freqüentadores de caba- Pra colher risos no céu rets, que só falam francês e só dançam tango argentino! No meio do internacionalismo dos Português: No poema “Auto-retrato” Pixin- costureiros franceses, das livrarias italianas, guinha conta sua vida de músico chorão. Tra- das sorveterias espanholas, dos automóveis balhe com os alunos o significado dos versos e americanos, das mulheres polacas, do sno- peça que elaborem de forma similar a narrativa bismo cosmopolita e imbecil! [...] Não falta- de alguns episódios de sua vida. É importante vam censuras aos modestos ‘oito batutas’. Aos frisar que tanto a poesia popular quanto a eru- heróicos ‘oito batutas’ que pretendiam, num dita, apesar de diferenciações estéticas, têm sig- cinema da avenida, cantar a verdadeira terra nificações de igual valor social. brasileira, através de sua música popular, sin- História: em 1922 Os Batutas fizeram a pri- ceramente, sem artifícios nem cabotinismo, meira turnê de um grupo negro e de música po- ao som espontâneo dos seus violões e dos seus pular ao exterior. Muitas foram as vozes, na im- cavaquinhos.” (Benjamim Costallat, escritor, prensa carioca, que criticaram a viagem, vista jornalista e músico, 1887-1961, Gazeta de No- como degradante para a imagem da sociedade tícias, 22 de janeiro de 1922.) brasileira no exterior. Na década de 1920 os ne- gros e mestiços eram considerados um grande empecilho para o desenvolvimento econômico e social do país. A partir do último quartel do outras músicas escolhidas. O lundu e o choro século XIX, teorias racistas pregavam a vinda podem ser retirados do CD Pixinguinha: 100 de imigrantes europeus para acelerar o embran- anos. quecimento da sociedade. Proponha um deba- Geografia: a região por onde Pixinguinha cir- te sobre o racismo na sociedade atual, discu- culava na cidade do Rio de Janeiro era conhe- tindo o legado da escravidão e o apartheid so- cida como Cidade Nova, também chamada de cioeconômico da população negra das grandes “A Pequena África no Brasil”, pelo sambista e cidades, utilizando como exemplo a apresen- pintor . Nela habitavam os tação de Os Oito Batutas no Cine Palais e a via- afro-cariocas, em grande parte originários do gem desses músicos negros à Paris ilustrada. nordeste brasileiro. Discuta em sala de aula os Música: a audição musical é sempre impor- motivos que levaram essa população ao êxodo tante para desenvolver a capacidade de com- rural para o Rio de Janeiro a partir do final do preensão do ritmo e da melodia, além de edu- século XIX. car na distinção dos instrumentos utilizados na Ciências: Alfredo da Rocha Vianna Filho, execução da música. Grave uma fita cassete com o Pixinguinha, provavelmente ganhou esse os 2 gêneros principais para a compreensão do apelido devido a umas “bexiguinhas” em seu universo musical de Pixinguinha: o lundu e o rosto, remanescentes de uma varíola. O Rio choro. Comente com os alunos a diferença e a de Janeiro em que cresceu o menino foi ce- importância dos ritmos na formação da música nário de doenças endêmicas: febre amarela, popular brasileira e aproveite para descrever os varíola e gripe dizimaram milhares de mo- instrumentos utilizados em cada composição radores de uma cidade cujos serviços de co- — o contato com o instrumento proporciona um leta de lixo e de saneamento básico eram melhor entendimento do universo musical. precários, e que não cuidava com eficiência Peça, então, que eles repitam o trabalho com da higiene alimentar. Faça com os alunos um

4 trabalho de conscientização ecológica, sa- como as de que participava no Rio de Janei- lientando a importância da coleta seletiva de ro. Tempos depois Pixinguinha era persona- lixo, da preservação ambiental e da higiene gem do principal romance do modernismo individual para o bem-estar na sociedade brasileiro: “Então a macumba principiou moderna. deveras se fazendo um sairê pra saudar os Artes: A caricatura é um desenho que real- santos. E era assim: Na ponta vinha o ogã ça detalhes das feições de uma pessoa. Gran- tocador de atabaque, um negrão filho de des nomes da música brasileira foram caricatu- Ogum, Bexiguento e fadista de profissão, se rados por ilustres artistas, e Pixinguinha não chamando Olelê Rui Barbosa”. foge à regra. Depois de explicar a função cultu- (Andrade, Mário de. Macunaíma, o ral da caricatura, peça aos alunos que ressal- herói sem nenhum caráter. Belo Horizonte, tem num desenho o que acham mais relevante Itatiaia, 1989. p. 46) em seu músico predileto. Outro trabalho pode ser realizado, envolven- do a pintura primitiva. São muitos os músicos Opinião sobre Pixinguinha populares pintores: Heitor dos Prazeres, Gui- “Ao contrário de Villa-Lobos, Pixingui- lherme de Brito, Nelson Sargento e o grande nha é o sumo de outra fruta, é flor de ma- amigo de Pixinguinha, João da Baiana. Heitor nacá, não uma orquídea pomposa. Pássaro teve seus quadros admirados na década de 1950 acordando as águas dos riachos, poeta de pela rainha inglesa Elizabeth II. Peça aos alu- redondilhas e de trovas, dono do canto ne- nos que pintem um retrato de Pixinguinha gro e da melodia mestiça, Pixinguinha re- quando garoto, conscientizando-os do valor presenta uma permanência diversa da de estético da pintura popular. Villa-Lobos na música brasileira. Villa foi uma fatalidade anímica para a concepção PAINEL INFORMATIVO erudita, para os faustos das musicalidades teatrais. O meu querido Pixinguinha, da Curiosidades estação de Olaria, é um pássaro de mais modesto porte, mas não menos importante. Mário de Andrade foi um dos grandes Seu CARINHOSO é obra clássica no samba responsáveis pela valorização da música popular.” popular brasileira. Recolhendo informações (Di Cavalcanti, pintor modernista para seu livro Macunaíma, o herói sem ne- carioca, in: Reminiscências líricas de um nhum caráter, Mário encontrou-se com Pixin- perfeito carioca, Rio de Janeiro, Civilização guinha, em São Paulo, e pediu para o cho- Brasileira, 1964, p. 23.) rão descrever uma cerimônia de macumba,

FILMES SOBRE PIXINGUINHA

Antônio Carlos Fontoura. Chorinhos e chorões. 1976, 11 min. (Documentos Musicais, Brasilianas, FUNARTE, n. 13.) Uma pequena história do choro, de Joaquim Callado, o precursor, até Pixinguinha e Jacob do Bandolim, seus maiores expoentes.

Sérgio Sanz. Álbum de música. 1974, 16 min. (Documentos Musicais, Brasilianas, FUNARTE, n. 13) Documentário sobre a música popular brasileira que traz músicas e imagens de Pixinguinha.

5 SUGESTÕES PARA OUVIR EM CLASSE

A obra musical de Pixinguinha é uma síntese da Pixinguinha no tempo dos Oito Batutas (Reviven- música popular brasileira urbana. Ao trabalhar esse do). Vinte gravações que o grupo Os Oito Batutas, legado sociomusical em sala de aula, o aluno é trans- liderado por Pixinguinha, realizou em 1923 na gra- portado de seu cotidiano para outra realidade. A mú- vadora Victor de Buenos Aires. sica encurta o tempo e o espaço, proporcionando um deleite estético atemporal. Ressalte, quando da audi- Pixinguinha, Série Para sempre (EMI). Gravações his- ção dos CDs, essa qualidade da produção artística. tóricas de Pixinguinha, incluindo cantados, como o antológico “Carinhoso”. Pixinguinha: 100 anos — 2 CDs (BMG). Gravações históricas das músicas de Pixinguinha, incluindo Teu nome é Pixinguinha, de Marcelo Vianna (Kua- brilhantes performances da dupla Pixinguinha e Be- rup). Marcelo faz um releitura da obra do avô, inclu- nedito Lacerda. indo a gravação de cinco músicas inéditas.

PIXINGUINHA NA INTERNET

www.pixinguinha.com.br Site oficial do compositor (em construção). www.choro-samba.com.br Página de debate sobre choro, samba e MPB, com divulgação de gravadoras espe- cializadas em choro.

GLOSSÁRIO bandas de jazz – Surgiram nos Estados Unidos, na Galdino Barreto, Mário Alvares, Nelson Alves e década de 1910, compostas de negros que toca- Waldir Azevedo o instrumento firmou-se como vam jazz. Conhecidas como jazz-bands, sua for- solista e símbolo da musicalidade brasileira. mação influenciou inúmeros conjuntos de mú- clarinete – Instrumento de sopro, de madeira. No sica popular pelo mundo afora. Brasil é muito utilizado como instrumento solis- bandolim – Pertencente à família dos alaúdes, o ban- ta nas rodas e gravações de choro. Abel Ferreira dolim veio substituir a bandola na música popu- e K-Ximbinho são exemplos de grandes clarine- lar brasileira. Foi durante muito tempo instru- tistas brasileiros. mento de acompanhamento no choro. Na Era do flautim – Instrumento de sopro da família da flauta Rádio Luperce Miranda e Jacob do Bandolim fo- transversa, também é conhecido como piccolo. ram grandes solistas do instrumento. Possui som agudo e penetrante. Muitos chorões, batuque – Nascido como um ritmo para dança, oriun- como os flautistas Benedito Lacerda e Altamiro do da África, o termo batuque passou a designar Carrilho, tocaram e continuam tocando flautim. genericamente coreografias ou danças apoiadas lundu – Dança de origem angolana, considerada “li- em forte instrumental de percussão. Há registro cenciosa” e “indecente” no Brasil colonial. Che- dele no Brasil desde o século XVIII. gou ao país no século XVIII, tornando-se, no sé- cavaquinho – Chegou ao Brasil pelas mãos dos por- culo seguinte, música cantada em todos os seg- tugueses. Nas primeiras décadas do século XX mentos da Corte de d. Pedro II. Ao final do sécu- era mais utilizado como centro — no acompa- lo XIX o lundu se funde com outros gêneros mu- nhamento —, ficando entre os instrumentos de sicais, sobretudo a polca, dando origem à primei- percussão e de harmonia. Com os cavaquinistas ra dança genuinamente brasileira: o maxixe.

6 maxixe – Surgiu como dança na Cidade Nova e nos breque, o samba de partido-alto, o samba-canção, cabarés da Lapa, no Rio de Janeiro, em 1875. De- o samba de enredo, entre outros. pois se tornou um gênero musical, fazendo su- saxofone – Instrumento de sopro conhecido no Bra- cesso no teatro de revista, nas primeiras grava- sil desde 1870 graças a Viriato Figueira, foi mais ções de discos e mais tarde em Paris e Londres. difundido nas primeiras décadas do século XX, Resultou da fusão do tango, da polca, da hava- com as jazz-bands. Pixinguinha notabilizou o neira e do lundu. saxofone no meio chorístico, fazendo com ele música popular – Diferente da música folclórica, que contrapontos à flauta de Benedito Lacerda. é transmitida pela oralidade, ou da música eru- teatro de revista – Importante meio de divulgação da dita, criada por músicos de escola, a música po- música popular, o teatro de revista, ou revista de pular caracteriza-se pela simplicidade de suas ano, recebia esse nome porque fazia uma retros- composições transpostas para o registro fonográ- pectiva dos acontecimentos políticos, sociais, eco- fico e por sua veiculação em mecanismos de di- nômicos e culturais ocorridos no decorrer do ano. fusão (aparelho de som, rádio, televisão etc.). Na Seus autores apresentavam ao público, de forma prática, essas classificações não são tão rígidas crítica e bem-humorada, textos musicados pelos assim, podendo a música popular sofrer influ- principais escritores e musicistas da época. ência do folclore e da música erudita. violão de seis cordas – É a mesma guitarra espanho- pagode – Termo existente desde o século XVI, desig- la, com o mi grave a mais. Instrumento basica- na diversão do povo urbano. No Brasil é sinôni- mente urbano, o violão no Brasil acompanhava mo de qualquer reunião festiva animada por o canto, sendo utilizado em larga escala nos gru- música e dança. pos de choro, ao lado da flauta e do cavaquinho. pandeiro – De origem árabe e oriental, o pandeiro Nomes como o de João Pernambuco, Garoto, Ca- era utilizado apenas com batidas de mãos para nhoto da Paraíba e Meira são referências do uso marcar o tempo ou como complemento de dan- do instrumento na MPB. ça. Na Europa chegou até a ser utilizado em ópe- violão de sete cordas – Provavelmente de origem rus- ras, como a Preciosa, de Weber. No Brasil tor- sa, o violão de sete cordas nada mais é do que o nou-se popular pelas mãos de João da Baiana, violão de seis cordas acrescido de uma corda mais nas orquestrações dirigidas por Pixinguinha na grave. É a sétima corda que aumenta a extensão Era do Rádio. do instrumento para o fraseado das baixarias, ou samba – Em sua representação urbana, surgiu no Rio seja, o fraseado nos graves em contraponto à me- de Janeiro da década de 1920, como um aprovei- lodia solista, quase sempre criado de improviso. tamento da tradição afro-carioca. Tem diversas Recentemente Raphael Rabello elevou o violão de vertentes, como o samba de morro, o samba de sete cordas à condição de instrumento solista.

REFERÊNCIAS BIOGRÁFICAS

Anacleto de Medeiros (1886 – 1907) Estudou no Conser- Coelho Neto (Henrique Maximiniano C. N.) (1864 – vatório de Música. Tocava vários instrumentos de 1934) Professor, romancista, crítico, poeta, polí- sopro — com predileção pelo sax-soprano. Fundador tico e teatrólogo, Coelho Neto foi o escritor mais da Banda do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro lido de seu tempo. (1896), suas composições foram executadas pelas (Ernesto Joaquim Maria dos Santos) (1890 – bandas de música e chorões de todo o país. 1974) Formou, ao lado de Pixinguinha e João da China (Otávio da Rocha Viana) (1888 – 1927) Foi Baiana, a “santíssima trindade” da música popu- cantor, violonista e compositor. Integrou, ao lado lar brasileira. Compôs, com Mauro de Almeida, o do irmão Pixinguinha, o grupo Os Oito Batutas. primeiro samba gravado, Pelo Telefone, em 1916. (Francisca Edwiges Neves Gon- Época de Ouro Sob a liderança de Jacob do Bando- zaga) (1847 – 1935) É considerada o maior vulto lim, o conjunto regional Época de Ouro foi fun- feminino da música popular brasileira. Atuou dado em 1966, no Rio de Janeiro. Devido ao per- intensamente no teatro de revista como compo- feccionismo de Jacob e à qualidade dos músicos, sitora e maestrina. Destacam-se em sua vasta pro- o regional foi o primeiro grupo de choro com ca- dução o tango “Corta Jaca”, a canção “Lua Bran- racterísticas camerísticas, com o violão trabalhan- ca” e a marchinha “Ó abre Alas”. do em região diferente, cavaquinho solando com

7 bandolim. O Época de Ouro permanece em ple- Joaquim Callado (Joaquim Antônio da Silva Calla- na atividade. do) (1848 – 1880) É considerado o organizador Ernesto Nazaré (Ernesto Júlio de Nazaré) (1863 – dos grupos de choro na cidade do Rio de Janeiro. 1934) Alguns críticos classificam o músico como Foi amigo e grande incentivador da musicalida- o Chopin brasileiro, pois ele revolucionou a téc- de da maestrina Chiquinha Gonzaga. Sua obra nica pianística de sua época, incorporando ele- mais conhecida é o choro “A flor amorosa”. mentos da música popular e erudita e exibindo-os Paulino Sacramento (Paulino Pinto do Sacramen- com grande maestria. Suas principais composi- to) (1880 – 1926) Hábil trompetista, compositor ções são os choros “Odeon”, “Apanhei-te, cava- e maestro de teatro de revista (teatro musicado), quinho” e “Brejeiro”. Paulino Sacramento dirigia a orquestra do Cine Irineu de Almeida (1870 – 1916) Instrumentista, to- Rio Branco quando Pixinguinha foi contratado. cava oficlide, bombardino e trombone. Compôs Radamés Gnatalli (1906 – 1988) Com formação eru- melodias famosas na história do choro. Integrou dita, tornou-se um dos principais maestros da a Banda do Corpo de Bombeiros e foi professor MPB. Grande admirador do choro e de Pixingui- do menino Pixinguinha. Era mais conhecido no nha em particular, compôs e executou seus cho- meio chorístico como Irineu Batina. ros ao piano. Na década de 1940 revolucionou a Jacob do Bandolim (Jacob Pick Bittencourt) (1918 – orquestração brasileira. 1969) Foi um dos maiores nomes do choro no Rui Barbosa (1849 – 1923) Reconhecido internacio- século XX. Imprimiu uma linguagem peculiar nalmente como brilhante orador e jurista, Rui para o bandolim brasileiro. Barbosa foi um dos políticos mais importantes João da Baiana (1887 – 1974) Compositor e ritmista, do início da República. Foi membro fundador da consolidou o uso do pandeiro na música brasi- Academia Brasileira de Letras. leira. Formou, ao lado de Pixinguinha e Donga, Sinhô (José Barbosa da Silva) (1888 – 1930) É consi- o Grupo da Velha Guarda. derado o sistematizador do samba urbano, fato João de Barro (Carlos Alberto Ferreira Braga ) (1907 – ) que o tornou conhecido como “o rei do samba”. Formou, ao lado de e Almirante, o Freqüentador assíduo da Lapa, área boêmia do Bando de Tangarás. Também conhecido como Rio de Janeiro, Sinhô fez muito sucesso no tea- , escreveu a letra de “Carinhoso”. É um tro de revista. Sua composição mais conhecida é grande compositor de marchinhas de carnaval. o samba “Jura”.

BIBLIOGRAFIA COMENTADA E DIRECIONADA

CABRAL, Sérgio. Pixinguinha vida e obra. Rio de Análise da musicalidade e da cultura dos imi- Janeiro, Lumiar, 1997. grantes baianos residentes na Cidade Nova. Biografia clássica de Pixinguinha, premiada e SCHWARCZ, Lilia Moritz e COSTA, Angela Marques publicada inicialmente pela FUNARTE e reela- da. Virando Séculos (1890-1914): no tempo das borada para essa edição da Lumiar Editora. incertezas. São Paulo, Companhia das Letras, Enciclopédia da Música Brasileira: popular, erudita e 2000. folclórica. São Paulo, Art Editora/Publifolha, 1998. Livro de leitura introdutória às transformações É a enciclopédia com mais informações sobre a sociais, culturais, políticas e econômicas do Rio MPB. (Ver os verbetes sobre o choro, Pixingui- de Janeiro da virada do século XIX e primeiras nha e o teatro de revista.) décadas do XX. LIMA, Evelyn Furquim Werneck. Arquitetura do Série depoimentos: Pixinguinha. Rio de Janeiro, Espetáculo: teatros e cinemas na formação da Museu da Imagem e do Som, 1997. Praça Tiradentes e da Cinelândia. Rio de Janei- O livro contém dois depoimentos de Pixingui- ro, Editora UFRJ, 2000. nha ao MIS — Museu da Imagem e do Som. História das duas praças cariocas, com imagens TINHORÃO, José Ramos. História social da música e textos analíticos. popular brasileira. São Paulo, Ed. 34, 1998. MOURA, Roberto. e a Pequena África no Rio Leitura sociológica do surgimento do choro ca- de Janeiro. Rio de Janeiro, Biblioteca Carioca, 1995. rioca, feita pelo maior historiador da MPB.

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